ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA E EDUCAÇÃO EM SAÚDE DURANTE A PANDEMIA POR COVID-19

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7668288


Yara Martins Gurgel
Lydhia Rubhia de Lima Torres
Bruna de Souza Diógenes
Valeria Rodrigues Joaquim
Jeferson Silva de Souza
Thiago Roma Gomes
Iana Augusta Ferreira Torres


RESUMO

Introdução: O isolamento causado pela pandemia do Covid-19 trouxe mudanças significativas e afetou de forma direta os mais variados setores da sociedade.  No âmbito escolar não foi diferente, com a suspensão das aulas presenciais nas diferentes faixas etárias, os discentes e equipe pedagógica foram obrigados a se afastarem do ambiente escolar. Nesse contexto fez-se necessário a criação de estratégias, ações e atividades que viabilizassem um processo de ensino aprendizado efetivo, alicerçado nas diretrizes educacionais vigentes. Diante desse cenário, decorre a importância da Fonoaudiologia Educacional, área de atuação responsável por prestar apoio aos pais e professores, principalmente no que se refere a crianças que apresentam algum problema fonoaudiológico, e que compromete significativamente o seu aprendizado. Objetivo: Descrever a atuação fonoaudiológica usando como ferramenta norteadora a educação em saúde durante a pandemia por COVID-19, mediante o trabalho interdisciplinar e colaborativo, destacando os efeitos produzidos. Material e Métodos: Trata-se de um estudo exploratório, de abordagem quanti-qualitativa, desenvolvido no primeiro semestre de 2021. A pesquisa aconteceu em cinco e tapas, sendo: (1) visita institucional e reunião com os responsáveis pela instituição; (2) diagnóstico institucional; (3) aplicação do questionário online na plataforma GoogleForms®; (4) realização da intervenção propriamente; elaboração de vídeos, cartilhas e cartazes educativos, sobre temáticas pertinentes a atuação fonoaudiológica no âmbito educacional em tempos de pandemia por COVID-19, por fim (5) devolutiva dos resultados encontrados.  Em relação aos dados quantitativos será utilizado o programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 21.0 que será utilizado na análise e tabulação dos dados coletados, a fim de calcular as frequências absolutas e relativas, e elaboração de gráficos. Os dados qualitativos serão analisados através de relatórios e diários de campo realizados durante as intervenções. Resultados: A maioria dos participantes era do sexo feminino (95,4%), com menos de 35 anos de idade (72,7%), cor branca (45,4%), estado civil casado (77,3%), com ensino superior completo (86,3%), renda familiar mensal de 2 a 3 salários mínimos (54,5%), situação funcional como efetiva (72,2%) e com tempo de serviço na educação infantil de 11 a 15 anos (54,5%). Dentre os professores 59,1% já conheciam o trabalho da Fonoaudiologia, e 95,4% não tiveram contato com o fonoaudiólogo na escola, e em sua totalidade (100%) afirmam que a atuação do fonoaudiólogo na escola é importante mesmo não tendo trabalhado em alguma escola que tivesse tal profissional e 72,6% dos professores relacionam a atuação fonoaudiológica na escola a ações terapêuticas. Conclusão: As ações desenvolvidas contribuíram para promover melhores condições direcionadas ao processo de ensino aprendizagem sustentado no tripé criança-escola-família, bem como contribuíram para a instrumentalização dos familiares e equipe pedagógica quanto a importância da fonoaudiologia no âmbito educacional.

Palavras-chave: Covid-19; educação; escola; fonoaudiologia educacional; saúde.

ABSTRACT

Introduction: The isolation caused by the Covid-19 pandemic brought significant changes and directly affected various sectors of society. In the school environment, it was no different, with the suspension of in-person classes in different age groups, students and teaching staff were forced to leave the school environment. In this context, it was necessary to create strategies, actions and activities that would enable an effective teaching and learning process, based on current educational guidelines. In this scenario, the importance of Educational Speech and Language Therapy emerges, an area of ​​action responsible for providing support to parents and teachers, especially with regard to children who have a speech-language problem, which significantly compromises their learning. Objective: To describe the role of speech therapy in early childhood education during times of the COVID-19 pandemic, through interdisciplinary and collaborative work, highlighting the effects produced. Material and Methods: This is an exploratory study, with a quantitative-qualitative approach, developed in the first half of 2021. The research took place in five rounds, being: (1) institutional visits and meeting with those responsible for the institution; (2) institutional diagnosis; (3) application of the online questionnaire on the GoogleForms® platform; (4) performing the intervention itself; elaboration of educational videos, booklets and posters, on topics relevant to speech therapy activities in the educational field in times of the COVID-19 pandemic, finally (5) providing feedback on the results found. Regarding quantitative data, the statistical program Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) version 21.0 will be used, which will be used in the analysis and tabulation of collected data, in order to calculate the absolute and relative frequencies, and preparation of graphs. Qualitative data will be analyzed through reports and field diaries carried out during the interventions.  Results: Most participants were female (95.4%), under 35 years of age (72.7%), white (45.4%), married (77.3%), with complete higher education (86.3%), monthly family income of 2 to 3 minimum wages (54.5%), employment status as effective (72.2%) and with length of service in early childhood education from 11 to 15 years (54.5%). Among the teachers, 59.1% already knew about the work of Speech-Language Therapy, and 95.4% had no contact with the Speech-Language Therapist at school, and as a whole (100%) stated that the role of the Speech-Language Therapist at school is important even though they did not work in any school that had such a professional and 72.6% of the teachers relate the speech therapy work at the school to therapeutic actions. Conclusion: The actions developed contributed to promote better conditions directed towards the educational process supported by the child-school-family tripod, as well as contributed to the instrumentalization of family members and the pedagogical team regarding the importance of speech therapy in the educational sphere.

Keywords: Covid 19; Education; School, Educational Speech Language Therapy, Health.

INTRODUÇÃO

Em 2019 o mundo foi surpreendido com o surgimento de um vírus extremamente nocivo denominado COVID-19 que rapidamente se espalhou por todos os continentes se tornado uma doença pandêmica, causando preocupação devido a sua letalidade e fácil disseminação. Em decorrência disso, como medida de segurança e para evitar um contágio ainda maior as escolas tiveram que ser fechadas em março de 2020 e o ensino passou a acontecer de forma remota. ¹

O isolamento causado pela pandemia do Covid-19 trouxe mudanças significativas e afetou de forma direta os mais variados setores da sociedade.  No âmbito escolar não foi diferente, com a suspensão das aulas presenciais nas diferentes faixas etárias, os discentes e equipe pedagógica foram obrigados a se afastarem do ambiente escolar de adaptando a um novo modelo de ensino. ²

Assim, surge o desafio de se manter o processo de ensino-aprendizagem de qualidade aliando os saberes e práticas pedagógicas a outras áreas como a Fonoaudiologia a fim de minimizar os danos causados pela ausência das aulas presenciais promovendo estratégias educacionais, orientações e monitoramento, a fim de dar suporte aos familiares e professores na adaptação dos alunos em situação de isolamento social. ³

Nesse contexto, a fonoaudiologia é uma ciência da área da saúde, que de acordo com o documento Áreas de Competência do Fonoaudiólogo no Brasil determina que esta profissão tenha como objeto de estudo os aspectos da comunicação, exercendo suas atividades nos setores públicos e privados, estando presente em todas as fases da vida do indivíduo, atuando na promoção da saúde, habilitação, reabilitação e aperfeiçoamento humano em relação à voz, audição, linguagem, fluência e motricidade orofacial.

Segundo Bacha e Osório⁵ a fonoaudiologia surge no Brasil nas décadas de 40 e 50, inicialmente ligada à medicina e a educação com a finalidade de reabilitar os alunos que apresentavam distúrbios da comunicação e assim, durante muito tempo esteve associada às práticas voltadas para o caráter clínico característico do modelo biomédico. Para Oliveira e Schier⁶ com o passar do tempo e as influências de outras áreas, ampliou seu campo de atuação e inseriu-se no âmbito da saúde coletiva. Nessa perspectiva suas ações passaram a refletir um trabalho subsidiado na promoção da saúde que propõe condições para que o próprio indivíduo e o coletivo obtenham saúde através dos recursos existentes no ambiente em que está inserido, a fim de melhorar a qualidade de vida da população.

Desta forma, as contribuições fonoaudiológicas no contexto educacional contemplam desde a equipe pedagógica, a comunidade escolar e os alunos, e mesmo diante da pandemia pode contribuir significativamente no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. Considerando as medidas de segurança estabelecidas em decorrência da pandemia a oferta de encontros virtuais através de plataformas online são um meio eficiente de se realizar atividades como: formação e assessoria para os professores; apoio e grupos de orientação aos familiares dos alunos com dificuldade escolar; participação no planejamento escolar, entre outros.

Por tanto, o objetivo deste trabalho é descrever a atuação fonoaudiológica na educação infantil em tempos de pandemia por COVID-19, mediante o trabalho interdisciplinar e colaborativo, destacando os efeitos produzidos.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo exploratório, de abordagem quanti-qualitativa que foi realizado em creche da rede pública do município de Rio Branco – Acre, durante o 1º semestre de 2021. A escola está localizada em uma região central do bairro Manoel Julião, atende crianças na faixa etária de 03 a 05 anos e possui ampla área de abrangência recebendo alunos de pelo menos cinco diferentes bairros.

A amostra foi composta por 22 educadores que estavam em exercício na rede da educação infantil. Para tanto, foram incluídos, por conveniência, indivíduos de ambos os sexos e maiores de 18 anos de idade. Por sua vez, foram excluídos aqueles que no momento da coleta de dados estavam de férias, em afastamento e/ou readaptação de suas atividades, não quiserem e/ou tiveram condições de responder ao instrumento de pesquisa.

A pesquisa seguiu os princípios teóricos e metodológicos propostos por Minayo e foi realizada em 4 (quatro) etapas Figura 1:

a) Fase exploratória: [1] foi realizada uma reunião via webconferência, com a equipe pedagógica das instituições de ensino selecionadas para a pesquisa; [2] aplicação do questionário online na plataforma GoogleForms®, aos sujeitos envolvidos.

No primeiro momento foi realizada a reunião com a equipe pedagógica, a fim de expor os objetivos do trabalho, levantar as demandas institucionais e pactuar o cronograma de execução com a equipe gestora para desenvolvê-lo junto aos educadores. Em seguida, convidaram os sujeitos para participarem da pesquisa mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).  Reitera-se que foi levado em consideração às particularidades, funcionamento e organograma da escola, a fim de não interferir da dinâmica local. 

Foi utilizado um questionário autoaplicável, por meio da plataforma GoogleForms®, disponibilizadosatravés do correio eletrônico, contendo perguntas sobre as características sociodemográficas (sexo, idade, situação conjugal, renda, vínculo empregatício, transporte utilizado na locomoção, formação e tempo de serviço na área da educação), bem como o conhecimento sobre a fonoaudiologia educacional.

b) Fase de planejamento das ações: o planejamento das ações e atividades foram definidos, de forma interdisciplinar e colaborativa, contando com a presença de alguns gestores da SEME, bem como da equipe pedagógica. É válido destacar que foi delimitada nesta fase a realização das oficinas.

c) Fase de execução: [3] realização da intervenção propriamente dita mediante realização de reuniões interdisciplinares, elaboração de materiais, execução de ações educativas, via webconferência, sobre temáticas pertinentes a atuação fonoaudiológica, no âmbito escolar, em tempos de pandemia por covid-19, sob supervisão da professora responsável pela pesquisa.

Durante a realização dos encontros foram utilizadas como estratégias de recursos: exibição de slides utilizando ferramentas de animação; dinâmicas; mitos e verdades; notícias; vídeos, cartilhas, folder e um design adaptado aos sujeitos de pesquisa.  Ao final de cada oficina, foi realizada uma roda de conversa com o objetivo de fomentar a participação de cada participante sobre seu entendimento, dúvidas e experiências quanto às temáticas apresentadas.

d) Fase de avaliação: realizou-se de forma contínua durante o decorrer da pesquisa, atentando-se ao nível de participação da equipe escolar no que se refere às respostas dadas aos questionamentos e aos relatos pessoais sobre a temática. Após o término dos encontros, foi redigido um relatório como forma de registro dos discursos das participantes e percepção dos pesquisadores. Por fim, foi dada uma devolutiva ao serviço através da apresentação dos achados encontrados.

Figura 1 – Etapas do percurso metodológico.

Os dados foram revisados no programa Microsoft® Office Excel 2016 e analisados pelo software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21.0, no qual foram calculadas as medidas de frequência para as variáveis de interesse.

A pesquisa respeitou os aspectos éticos com envolve estudos com seres humanos respaldada na resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário UNINORTE com o parecer nº 4.708.132 e CAAE: 43677121.0.0000.8028. 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após leitura dos relatórios e relatos dos diários de campo, os dados e resultados encontrados foram organizados em 2 (duas) categorias de análises, levando-se em consideração, de um lado, o desenvolvimento e instrumentalização dessa prática, e do outro, a caracterização dos sujeitos, as experiências vivenciadas, o conhecimento sobre as temáticas abordadas e a importância da interface Fonoaudiologia e Educação, as quais serão discutidas a seguir.

1.1 Atuação fonoaudiológica em tempos de pandemia por COVID-19: instrumentalização da prática

Inicialmente, foi efetivada uma parceria interinstitucional, mediante termo de cooperação técnica, entre a universidade e a Secretaria Municipal de Educação (SEME), através da qual se tornou possível desenvolver os Estágios Supervisionados de Fonoaudiologia Escolar e Saúde Coletiva. Essa prática pautou-se no planejamento das ações a serem desenvolvida, que foi proposta pela professora supervisora e discutida pelos estagiários e equipe técnica (trabalhadores do serviço de saúde-educação) de maneira a contemplar os objetivos apresentados pela disciplina curricular obrigatória, bem como as demandas relatadas pela instituição coparticipante. É valido destacar que todo o processo foi conduzido de forma colaborativa, dialógica e interdisciplinar, tendo em vista que cada serviço possui características peculiares e demandas específicas aos quais deveriam ser consideradas.

O Quadro 1 apresenta os eixos norteadores propostos para a atuação fonoaudiológica em tempos de pandemia na rede municipal de educação de Rio Branco- AC, Brasil, 2021.

EIXOS NORTEADORESPROPOSTAS DE AÇÕES
Programa de Saúde na Escola: Interface Saúde e EducaçãoCompreensão do processo de trabalho desenvolvido nos espaços do PSE, esfera municipal, a partir de vivências nos setores dessa unidade, participação em reunião de equipe, planejamento e etc.
Diagnóstico InstitucionalTerritorialização, elaboração de mapas que retratam a realidade educacional das instituições; Identificação das principais demandas da equipe escolar, dos familiares e dos alunos; Elencar aspectos fonoaudiológicos relacionados ao processo educativo; Identificar fatores que possam afetar a saúde da coletividade escolar; Observar o ambiente físico escolar em relação ao ruído, iluminação, acessibilidade, entre outros.
Detecção de sinais e sintomas de problemas relacionados à comunicação na comunidade escolar.Levantamento e acolhimento da demanda fonoaudiológica, no contexto escolar, mediante monitoramento e triagens.
Educação em saúdeElaboração de materiais, execução de atividades e ações educativas nas instituições de ensino, com a equipe pedagógica, familiares e crianças.
Planejamento e gestão na interface saúde- educaçãoProposição de estratégias; Contribuir com a elaboração e o desenvolvimento do Projeto Político Pedagógico; Planejar ações com o grupo gestor e a equipe técnica pedagógica; desenvolver ações educativas e pedagógicas para apoio e efetivação da aprendizagem na perspectiva da inclusão e do respeito à diversidade humana;
Monitoramento das açõesRealizar visitas itinerantes às unidades escolares, de maneira sistemática, a fim de verificar e acompanhar a execução das ações planejadas e os indicadores educacionais; Monitorar as ações implementadas por meio de instrumentos de avaliação quantitativos e qualitativos; Avaliar sistemática e continuamente as ações desenvolvidas.

De maneira esquemática, a figura 2 apresenta o fluxo das ações desenvolvidas durante a atuação fonoaudiológica em tempos de pandemia por Covid-19.

Figura 2 – Fluxograma de instrumentalização da prática fonoaudiológica.

1.2 Perfil sócio demográfico, formação e conhecimento sobre a atuação da fonoaudiologia educacional

Participaram dessa intervenção 22 (vinte e dois) educadores, dentre os quais estavam presentes: diretora, coordenadora pedagógica, coordenadora administrativa, professores regentes, assistentes educacionais e mediadores, de ambos os sexos.

Conforme a tabela 1, os participantes da pesquisa eram quase que na sua totalidade do sexo feminino (95,4%) com idade superior a 35 anos. Achados que corroboram com estudo realizado em Belém-PA, Irati- Santa Catarina, Uberlândia – MG que têm apontado as relações entre diferenças de gênero e profissões, justificadas por concepções pré-estabelecidas que contribuem para a naturalização das atribuições socialmente associadas ao sexo feminino. ⁹, ¹⁰, ¹¹.  De acordo com os estudos de Gatti e Barreto¹² esse percentual justifica-se pelo fato da profissão de educador infantil ainda estar convencionada a práticas domésticas associadas a funções femininas.

Em relação ao estado civil, renda familiar e autoclassificação racial os professores declaram-se, em sua maioria, casados (73,3%), renda familiar de 2 a 3 salários mínimos (54,5%), cor ou raça branca (45,4,3%) (Tabela 1). De igual modo, nas pesquisas desenvolvidas pelo INEP foi possível verificar maior frequência de participantes da cor branca¹³. Em relação à renda familiar é preciso mencionar uma desvalorização da profissão docente, refletida nos baixos salários, o que demonstra a precária situação financeira da população de um modo geral¹⁴, ¹⁵.

Do total de sujeitos participantes da pesquisa, (72,7%) descreveram sua situação funcional como efetivas, com turmas na Rede Municipal de Ensino. Cavalcante¹⁶, Bondioli e Mantovani¹⁷ reiteram que esta característica é favorável para o desenvolvimento do trabalho, tendo em vista que a baixa rotatividade facilita o compartilhamento de informações e o planejamento das atividades, possibilitando o estabelecimento de um trabalho contínuo, pautado em um relacionamento de confiança entre educadora e a criança. Sobre o nível de escolaridade dos professores, os dados apresentados, na Tabela 1, indicam um predomínio (86,3%) do ensino superior, sendo a maior parte formada em Pedagogia. Estes dados são condizentes com os pressupostos preconizados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação como perfil profissional desejável, tornando obrigatória a formação superior para os que atuam em instituições de educação infantil¹⁸, ¹⁹.

Silveira et al. ²⁰ destacam que a escola se configura como um lugar privilegiado para a aquisição e desenvolvimento da linguagem, sendo esse o espaço um terreno fértil para a atuação primária do fonoaudiólogo. A criança na faixa etária de zero a seis anos se encontra em plena expansão de habilidades preditoras que são essenciais para aquisições tardias mais complexas. Nesse contexto, a atuação do fonoaudiólogo junto às escolas de educação infantil torna-se essencial, pois é durante a primeira infância que as crianças aperfeiçoam a linguagem oral e desenvolvem importantes noções de escrita²¹. Nesse nível de escolaridade, a atuação do fonoaudiólogo pode ter resultados mais efetivos tendo em vista que a criança está em um período de rápidas e significativas transformações em vários aspectos do seu desenvolvimento²².

 Diante do exposto a tabela 2 se propôs a investigar as informações que os professores de educação infantil possuem em relação à Fonoaudiologia na escola. É possível observar que 59,1% referem conhecer o trabalho do fonoaudiológico, enquanto 40,9% negam conhece-lo. Soma-se a isso o fato de que apenas 01 (4,6%) professor teve contato com algum fonoaudiólogo na escola. Apesar desse dado, os 22 (100%) participantes afirmam que a atuação do fonoaudiólogo na escola é importante.

Apesar da maioria dos professores declarem conhecer o trabalho fonoaudiológico, contudo, eles não especificam que este trabalho esteja voltado para as áreas de promoção da saúde e prevenção dos agravos. Esse dado pode ser justificado pelo fato de apenas 4,6% dos professores, dado significante, terem entrado em contato com algum fonoaudiólogo na escola, demonstrando que a atuação fonoaudiológica nesse âmbito ainda é recente²³. Outro aspecto que merece destaque diz respeito ao fato de que 72,6% dos professores relacionam a atuação fonoaudiológica na escola a ações terapêuticas.  Conforme a revisão de literatura, este fato justifica-se pela própria origem dos cursos de fonoaudiologia, essencialmente vinculados a área da saúde, que remete a própria história da Fonoaudiologia na escola, através da qual dirigia o enfoque para atuação clínica em distúrbios já instalados²⁴⁻²⁶.

Com base nas informações apresentadas até o momento pretende-se descrever como se deu a atuação fonoaudiológica na educação infantil, durante a pandemia por Covid-19.

 Uma das primeiras atividades realizadas foi à vivência nos setores que compõem a SEME, mais especificamente o PSE e o entendimento do processo de trabalho que lá acontece, bem como as principais ações desenvolvidas, parcerias e composição da equipe de profissionais. A partir desta experiência, foi possível perceber que o programa apresenta como objetivo primordial ações de promoção da saúde e prevenção dos agravos nas mais variadas áreas, de forma interdisciplinar, funcionando como um campo potencializador para o desenvolvimento de ações no âmbito da fonoaudiologia.

Quanto aos aspectos operacionais, foi possível verificar que o programa é composto por uma série de setores que se conversam e formam um todo que contribuem para a efetivação do processo de ensino e aprendizado sustentando na interface com os profissionais da saúde, a exemplo do setor de transporte, departamento de educação infantil e fundamental; diretoria de ensino; divisão de manutenção da estrutura física da rede escolar; departamento de educação especial; departamento de Educação de Jovens e Adu ltos – EJA; departamento de Gestão de rede escolar; divisão de saúde na escola; dentre outros.

Dentro da instituição selecionada na presente pesquisa o desenvolvimento das ações, estratégias e procedimentos encontram-se alicerçado na necessidade da interface entre Fonoaudiologia e educação, tendo em como objetivo central o aprimoramento dos processos educativos, mediante a construção de saberes que se complementam em busca do enfrentamento das desigualdades educacionais; desenvolvimento de estratégias voltadas para o processo de ensino-aprendizagem; alfabetização; letramento; aspectos de envolvam a comunicação e suas relações com o aprendizado.  Nesse sentido, dentro da escola o fonoaudiólogo (a) passa a ser corresponsável pelo bom desempenho dos alunos, juntamente com os demais profissionais da equipe. 

Para tanto, faz-se necessário um trabalho colaborativo e interdisciplinar, sustentado na tríade criança-escola-família, entendendo que esse processo reflete e sofre a influência de cada uma dessas instanciam entendidas, compreendidas e analisadas na sua totalidade e integralidade. 

Pensando sob esse viés foram realizadas visita institucional, realização de diagnóstico institucional e reuniões com a equipe pedagógica. Esse momento foi crucial para o desenvolvimento de todas as ações de forma coordenada e atendendo às demandas de cada instituição.

O diagnóstico institucional funcionou com o ponto de partida do trabalho na escola e foi entendido enquanto um processo detalhado que permitiu identificar o maior número de características de cada sistema ou unidade educacional. Entre os aspectos importantes a serem levantados podemos relacionar os seguintes: Natureza da instituição; Filosofia da instituição; Metodologia adotada; Estrutura da instituição; Funcionamento; Recursos Físicos e Materiais.

É valido destacar que as instituições educacionais representam uma entidade heterogênea e com características peculiares, onde não se pode aplicar um planejamento padrão. Assim sendo, faz-se necessário conhecer minuciosamente cada uma delas e os seus anseios, expectativas dos profissionais em relação ao fonoaudiólogo, e só depois, em conjunto, definir as prioridades para aquela comunidade.

Quanto às reuniões com a equipe pedagógica, as mesmas aconteciam com o intuito de realizar planejamento, apresentação dos resultados encontrados, devolutivas e avaliação das ações desenvolvidas. Foi possível observar o estreitamento das relações, estabelecimento de vínculo e confiança entre profissionais envolvidos e acadêmicos, possibilitando o desenvolvimento de um trabalho colaborativo, horizontal e dialético o que acabou favorecendo para a efetividade e qualidade das práticas desenvolvidas.  Durante as reuniões foi possível identificar as seguintes dificuldades enfrentadas no ensino remoto como:

  • Adaptação dos profissionais aos meios tecnológicos,
  • Acesso dos alunos à internet,
  • Apoio/participação dos pais dos alunos no desenvolvimento das atividades,
  • Realidade de vulnerabilidade dos alunos e dificuldades financeiras.

De acordo com Oliveira; Silva; Silva²⁷ que em seus estudos enfatizam os desafios enfrentados pelos professores na reorganização da sua prática pedagógica, principalmente no tocante ao uso das tecnologias, bem como a dificuldade dos alunos de se adaptarem a esta nova realidade.

Nesse sentido, como proposta de intervenção, considerando o contexto pandêmico e as principais demandas apontadas pela equipe gestora foram realizadas 2 (duas) oficinas educativas. A primeira oficina intitulada “Uso de tecnologias no ensino remoto”, que contemplou toda a equipe escolar realizada por um profissional da área convidado, inicialmente de forma teórica a fim de embasar as práticas adotadas e apresentação de aplicativos e ferramentas, e após, um momento prático em que os profissionais foram convidados a utilizar as ferramentas passo a passo, tirando dúvidas com o palestrante e apontando suas dificuldades. A segunda oficina intitulada “Práticas inclusivas no ensino remoto”, ministrada por um palestrante especializado na área, com a temática abordada: a importância do atendimento educacional especializado, apresentação de um fluxograma, adaptação curricular para alunos público alvo da educação especial, fluxograma na prática, e por fim, um momento para debater e esclarecer dúvidas, conhecendo a realidade das escolas.

No transcorrer da intervenção foi possível observar a existência de alguns percalços, a saber: a ausência de alguns educadores; dificuldades em participarem como interlocutores nas discussões entre os pares; falta de familiaridade dos sujeitos com as temáticas abordadas; sensação de incapacidade, por parte de alguns, para a utilização de estratégias que pudessem oferecer suporte ao processo de ensino e aprendizagem; alguns educadores estavam com dificuldades de se posicionar em relação ao assunto, expressar suas dúvidas, e alguns desconheciam até mesmo questões simples sobre os aspectos trazidos. Também houveram problemas em relação a conectividade de internet e interação com a plataforma digital por parte dos participantes, o que impossibilitou ou dificultou o acesso de alguns na plataforma. Como forma de minimizar o problema, foram ofertadas assessorias de acesso à plataforma online e em caso de impossibilidade, divulgamos os links de acesso das duas oficinas que foram gravadas para que todos pudessem acessar os conteúdos ministrados.

Apesar das dificuldades supracitadas e enfrentadas podemos apontar algumas mudanças e efeitos: muitos dos educadores se constituíram em interlocutores dentro do grupo de trabalho; construção de novos olhares para o processo de aprendizagem e desenvolvimento de estratégias que contemplassem esse momento; maior entendimento do que constitui a relação criança-escola-família; engajamento dos sujeitos nas discussões mostrando-se envolvidos no processo; professores participam ativamente das discussões sobre os achados e colaboram entre si; experiências pessoais dos participantes relacionados às suas vivências; sensibilização por parte dos envolvidos para as temáticas discutidas; maior reconhecimento do saber popular e a necessidade de respeitá-lo e de encontrar, quando necessário, formas de transformá-lo dentro de uma realidade.

Aponta-se para a necessidade de ressaltar que o fonoaudiólogo, ao atuar nas escolas, deve buscar realizar um trabalho em parceria com os demais profissionais da área da saúde e educação a fim de ultrapassar as barreiras e os limites da mera identificação de alterações e/ou problemas de comunicação que possam afetar a aprendizagem e a qualidade de vida desses sujeitos. Além disso, o mesmo deve ocupar um lugar de atuação ao longo do ano letivo, de forma colaborativa e interdisciplinar, buscando o desenvolvimento de soluções e estratégias que possibilitem o desenvolvimento integral dos sujeitos inseridos na comunidade escolar, educadores, alunos e familiares, de forma horizontalizada na produção dessa assistência e cuidado, que tradicionalmente, é centrada apenas no profissional de saúde.

O trabalho realizado com a equipe educacional foi realizado de forma contínua, além das oficinas, também foram ofertados materiais de apoio que pudessem promover melhores condições de ensino aprendizagem sustentados no tripé (aluno-escola-família). Conforme Santana; Dias; Quintela²⁸ a problemática causada pela pandemia no âmbito educacional faz com haja a necessidade de se readequar a nova realidade, neste sentido a Telefonoaudiologia pode ofertar as seguintes contribuições: formação de professores através de encontros virtuais; assessoria aos professores; apoio e suporte aos familiares dos alunos.

Os materiais informativos ofertados a equipe totalizam 21, desde e-books, cartilhas, cartazes, folders e vídeos, conforme descrito no Quadro 3:

Fonte: Os autores (2021)

A teleducação configurou-se como uma importante ferramenta de instrumentalização da comunidade escolar direcionada para a promoção da saúde e prevenção dos agravos na educação infantil.

CONCLUSÃO

A realização da pesquisa possibilitou evidenciar a necessidade de capacitação da equipe pedagógica e dos familiares, que apresentam riscos para a efetividade do processo de ensino aprendizagem dos alunos. Com base nesses resultados, as intervenções programadas e organizadas seguiram um caminho alinhado com as necessidades da realidade atual.

O processo de ensino aprendizagem, bem como o seu sucesso, não depende apenas da atuação do aluno, ou do professor, pois existe um contexto maior por trás dessa trajetória. A sala de aula com sua heterogeneidade faz com que demandas diferentes surjam no decorrer do tempo e das aulas, que por sua vez, exige uma atuação adaptada do professor e da equipe escolar. É necessário considerar todas as condições e situações que o aluno enfrenta fora de escola, como os problemas sociais, financeiros e clínicos. Mas ao mesmo tempo, também deve-se levar em consideração os desafios propostos ao professor, que em muitas situações, não recebe a capacitação adequada para cada situação específica que surge.

A maior prova desses desafios é a modalidade de ensino remoto que vivenciamos na atualidade, devido à pandemia por COVID-19.  Essa situação trouxe uma demanda de sobrecarga aos professores, equipe escolar e alunos, de forma que necessitaram adaptar o ensinar e o aprender. Com a oferta das ações propostas por esse trabalho, possibilitou-se que a equipe escolar recebesse essa formação continuada, preparando-os melhor para a demanda atual, no que diz respeito à necessidade de readequar o ensino.

A realização deste trabalho evidencia a necessidade de formação continuada sendo ofertada constantemente a todos os agentes envolvidos no processo de ensino aprendizagem, de forma a prepara-los para as situações singulares que possam se deparar no decorrer deste processo, garantindo assim, um ensino equânime e de qualidade.

REFERÊNCIAS

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²TODOS PELA EDUCAÇÃO. Nota técnica: Ensino a distância na educação básica frente à pandemia da covid-19. Abril, 2020. Disponível:  https://www.todospelaeducacao.org.br/_uploads/_posts/425.pdf  Acesso em: 17 set.2020.
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⁷CREFONO3. Conselho regional de Fonoaudiologia da 3ª Região. Fonoaudiologia educacional em tempos de pandemia. Disponível em: https://www.crefono3.org.br/view/fonoaudiologia-educacional-em-tempos-de-pandemia/2237/ Acesso em: 19 mar. 2021.
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