REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7501590
Paula Gabriela Ferreira Barbosa¹
Juciele Faria Silva²
Patricia Leao da Silva Agostinho³
INTRODUÇÃO
As infecções por coronavirus disease 2019 (COVID-19) atingiram níveis pandêmicos poucos meses após o surgimento dos primeiros casos. O Betacoronavírus causador da doença, denominado SARS-CoV-2 é um vírus respiratório, que afeta principalmente as vias aéreas inferiores (NETTO; CORRÊA, 2020; HENDREN et al., 2021).
Na maioria dos casos a infecção se manifesta de forma leve, com sintomas inespecíficos como tosse seca, cefaléia, coriza, febre, em alguns casos pode ocorrer perda do olfato e paladar, dores musculares e sintomas gastrointestinais (BRANDÃO et al., 2020), entretanto, em casos mais graves, a COVID-19 pode causar insuficiência respiratória, fibrose pulmonar, alterações cardiovasculares e renais, fadiga, fraqueza, hipoxemia e dispneia (SANTANA; FONTANA; PITTA, 2021; SHOKOPLES; FERREIRA; COMEAU, 2022).
Alguns sintomas da doença se mantêm mesmo após a recuperação, perdurando por meses, outros surgindo após longos períodos. Para casos, onde os indivíduos apresentam sintomas muito tempo além do esperado, vem sendo empregado o termo COVID-longa (CALLARD; PEREGO, 2021).
Além de manifestações patológicas físicas, a COVID-19 está associada a depressão e ansiedade. Tais manifestações podem ocorrer mesmo em casos de doença leve, entretanto, são mais comuns entre pacientes criticamente doentes, em especial aqueles que necessitam de ventilação mecânica invasiva (VMI).
A reabilitação pulmonar (RP) é uma abordagem de baixo custo, baseada na avaliação individual do paciente, que visa a melhora da sua qualidade de vida e restabelecimento das suas funções físicas e psicológicas. As intervenções podem incluir exercícios físicos, mudanças de hábitos e educação do paciente (BOHN JÚNIOR et al., 2020).
A COVID-19 é uma doença que surgiu recentemente, dessa forma, protocolos de RP estão sendo adaptados e desenvolvidos nos últimos tempos para melhor atender os pacientes recuperados da infecção que ainda apresentam sequelas (SPIELMANNS et al., 2021). Desse modo é fundamental a realização de estudos que possam embasar e auxiliar os profissionais de saúde na tomada de decisão em relação às técnicas abordadas. Revisões de literatura cienciométricas colaboram para tal fim, pois realizam um levantamento dos estudos que foram desenvolvidos até o momento sobre determinado assunto.
Avaliações cienciométricas fornecem uma análise quantitativa dos trabalhos já realizados, permitindo a avaliação de variáveis como tendências de publicações, colaborações entre instituições e autores, resultados encontrados, dentre outras informações relevantes (MACIAS-CHAPULA, 1998). Assim, o objetivo do presente estudo foi realizar uma revisão cienciométrica acerca dos estudos que avaliaram o efeito da RP em pacientes pós-covid.
MATERIAL E MÉTODOS
Para a realização do presente estudo foram realizadas buscas nas bases de dados: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), PubMed via MEDLINE, e Web of Science (WOS), utilizando-se os seguintes operadores booleanos e descritores em saúde: (rehabilitation) OR (“pulmonary rehabilitation”) OR (physiotherapy) AND (“COVID-19”) OR (“SARS-CoV-2”) AND (“2019nCov”) AND (coronavirus). As buscas ocorreram durante o mês de outubro de 2022.
Foram incluídos no estudo, artigos originais que avaliassem o efeito de programas de reabilitação pulmonar/respiratória em pacientes recuperados da COVID-19, sem restrição de idade ou território, publicados nos idiomas português, inglês e espanhol. Foram excluídos estudos que avaliassem o efeito de medicações e/ou tratamentos adjuvantes, demais protocolos de reabilitação, além de revisões de literatura.
Após as buscas, os artigos foram adicionados à plataforma Rayyan (OUZZANI et al., 2016). A seleção dos trabalhos incluídos foi feita por dois revisores (PGFB e JFS) de forma cega e independente. Os conflitos foram solucionados após leitura e discussão entre os revisores.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As buscas resultaram na recuperação de 4941 artigos, após a triagem dos estudos, 647 foram excluídos por estarem duplicados, 4117 foram excluídos após leitura do título e resumo e 170 foram excluídos após leitura integral do texto (Figura 01).
Figura 01: Fluxograma para triagem e seleção dos artigos a serem incluídos.
Após a seleção foram incluídos sete artigos no presente estudo. Os trabalhos foram publicados em oito países diferentes: Alemanha com dois artigos publicados, Canadá, França, Inglaterra, México e Suíça com um estudo publicado em cada país. Dos trabalhos encontrados, seis artigos foram publicados em 2021, representando 85,7% dos trabalhos, e um foi publicado em 2022, 14,3% dos estudos.
Dos trabalhos selecionados, um foi classificado com estudo de prova de conceito e seis como estudos de coorte, sendo um estudo de coorte transversal, e cinco estudos longitudinais prospectivos (Tabela 02).
Tabela 02: Características dos estudos incluídos na revisão cienciométrica.
Autor | Tipo de Estudo | Título | Nº de participantes (RP) | Desfecho |
Ponce-Campo, et al. | Coorte Transversal | A Physiotherapy Treatment Plan for Post-COVID-19 Patients That Improves the FEV1, FVC, and 6-Min Walk Values, and Reduces the Sequelae in 12 Sessions. | 42 | Estabelecer um novo plano fisioterapêutico para determinar os efeitos da RP em pacientes pós-COVID-19 |
Gloeckl, et al. | Coorte prospectivo | Benefits of pulmonary rehabilitation in COVID-19: a prospective observational cohort study. | 50 | Investigar a eficácia, viabilidade e segurança da RP em pacientes pós-COVID-19. |
Daynes, et al. | Coorte prospectivo | Early experiences of rehabilitation for individuals post-COVID to improve fatigue, breathlessness exercise capacity and cognition – A cohort study. | 30 | Apresentar os resultados do programa inicial de RP pós-COVID-19. |
Hayden, et al. | Coorte prospectivo | Effectiveness of a Three-Week Inpatient Pulmonary Rehabilitation Program for Patients after COVID-19: A Prospective Observational Study. | 108 | Efeito da RP na melhora da dispneia. |
Spielmanns, et al. | Coorte prospectivo | Effects of a comprehensive pulmonary rehabilitation in severe post-covid-19 patients | 99 | Efeito da RP para pacientes pós-COVID-19 |
Bouteleux, et al. | Coorte prospectivo | Respiratory rehabilitation for Covid-19 related persistent dyspnoea: A one-year experience. | 39 | Benefícios da PR para pacientes pós-COVID leve/moderada |
Tanguay, et al. | Estudo de prova de conceito | Telerehabilitation for Post-Hospitalized COVID-19 Patients: A Proof-of-Concept Study During a Pandemic | 07 | Avaliar a viabilidade da telereabilitação; descrever perfis pulmonares e funcionais de pacientes com COVID-19 |
Ao todo, 794 participantes foram incluídos nos estudos, sendo 375 deles no grupo que recebeu a RP para COVID-19. Apenas Spielmanns et al., (2021) incluiu um grupo controle, comparando os resultados da RP aplicada aos voluntários pós-COVID com resultados de 2019 de um programa de RP para pacientes com DPOC. Em relação ao gênero, 200 participantes eram do sexo masculino (53,3%) e 175 do sexo feminino (46,7%).
Com base nos dados informados, 256 participantes das intervenções foram hospitalizados, dos quais 167 permaneceram em observação por ao menos 24 horas (54%), 86 permaneceram em UTI (27,8%), e 56 deles necessitam de VMI (18,2%).
Grande parte dos estudos adotou um protocolo de reabilitação com encontros presenciais, apenas um Tanguay et al., (2021) avaliou os efeitos da telereabilitação. A duração da intervenção variou de 03 a 24 semanas, e incluía exercícios respiratórios, fortalecimento e condicionamento físico.
Todos os protocolos aplicados apresentaram resultados positivos em relação a melhora na qualidade de vida dos participantes, bem como redução das sequelas e melhora da função respiratória, redução da dispneia e fadiga. Entretanto, em alguns casos as funções pulmonares ainda permaneceram prejudicadas em certo nível mesmo após o protocolo aplicado, havendo a necessidade de continuar a reabilitação após o encerramento das avaliações (BOUTELEUX et al., 2021; SPIELMANNS et al., 2021).
Ponce-Campos et al. (2022), observaram uma redução dos índices de dor para 83,3% da coorte, a dispneia reduziu para 65,6% e a fadiga para 78,2% dos participantes, demonstrando a eficiência dos programas de reabilitação aplicado, os resultados indicaram uma melhora de 50% nas sequelas e sintomas persistentes.
Alguns estudos (HAYDEN et al., 2021; SPIELMANNS et al., 2021; TANGUAY et al., 2021) incluíram sessões educativas referentes ao autogerenciamento dos sintomas e controle da respiração, com objetivo de auxiliar os participantes na manutenção dos benefícios após a reabilitação e trabalhar as características emocionais dos voluntários. Sintomas psicológicos como ansiedade e depressão também foram frequentemente citados como sequelas persistentes em pacientes acometidos pela COVID-19, assim como dores crônicas, sintomas que também reduziram após os protocolos de intervenção. Tais resultados indicam que a RP contribui para a melhora dos sintomas e sequelas em pacientes recuperados da COVID-19.
CONCLUSÃO
Os estudos incluídos na presente revisão cienciométrica indicam que protocolos de reabilitação apresentam benefícios positivos na redução dos principais sintomas da COVID-19. Os benefícios da RP se estendem para além das sequelas respiratórias, contribuindo para melhora dos sintomas psicológicos, redução da fadiga e melhora na qualidade de vida dos participantes. Por se tratar de um tema recente, poucos estudos foram selecionados para inclusão no presente estudo, entretanto, novos estudos devem ser desenvolvidos para embasar a tomada de decisão, bem como orientar profissionais da saúde, quanto aos procedimentos e efetividade dos programas de reabilitação para tal população.
REFERÊNCIAS
BOHN JÚNIOR, I. et al. Influence of pulmonary rehabilitation in patients with Chronic Obstructive Pulmonary Disease exacerbator phenotype. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 46, 15 jul. 2020.
BOUTELEUX, B. et al. Respiratory rehabilitation for Covid-19 related persistent dyspnoea: A one-year experience. Respiratory Medicine, v. 189, p. 106648, 2021.
BRANDÃO, S. C. S. et al. Obesidade e risco de covid-19 grave. 1o ed. Recife: 2020.
CALLARD, F.; PEREGO, E. How and why patients made Long Covid. Social Science & Medicine (1982), v. 268, p. 113426, jan. 2021.
HAYDEN, M. C. et al. Effectiveness of a Three-Week Inpatient Pulmonary Rehabilitation Program for Patients after COVID-19: A Prospective Observational Study. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 18, n. 17, p. 9001, 26 ago. 2021.
HENDREN, N. S. et al. Association of Body Mass Index and Age With Morbidity and Mortality in Patients Hospitalized With COVID-19: Results From the American Heart Association COVID-19 Cardiovascular Disease Registry. Circulation, v. 143, n. 2, p. 135–144, 12 jan. 2021.
MACIAS-CHAPULA, C. A. O papel da informetria e da cienciometria e sua perspectiva nacional e internacional. Ciência da Informação, v. 27, p. nd-nd, 1998.
NETTO, R. G. F.; CORRÊA, J. W. DO N. EPIDEMIOLOGIA DO SURTO DE DOENÇA POR CORONAVÍRUS (COVID-19). DESAFIOS – Revista Interdisciplinar da Universidade Federal do Tocantins, v. 7, n. Especial-3, p. 18–25, 22 abr. 2020.
OUZZANI, M. et al. Rayyan—a web and mobile app for systematic reviews. Systematic Reviews, v. 5, n. 1, 2016.
PONCE-CAMPOS, S. D. et al. A Physiotherapy Treatment Plan for Post-COVID-19 Patients That Improves the FEV1, FVC, and 6-Min Walk Values, and Reduces the Sequelae in 12 Sessions. Frontiers in Rehabilitation Sciences, v. 3, p. 907603, 30 maio 2022.
SANTANA, A. V.; FONTANA, A. D.; PITTA, F. Pulmonary rehabilitation after COVID-19. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 47, n. 1, p. e20210034–e20210034, 2021.
SHOKOPLES, B.; FERREIRA, N. S.; COMEAU, K. The Interplay Between COVID-19 and Cardiovascular Disease. McGill Journal of Medicine, v. 20, 2022.
SPIELMANNS, M. et al. Effects of a Comprehensive Pulmonary Rehabilitation in Severe Post-COVID-19 Patients. International Journal of Environmental Research and Public
Health, v. 18, n. 5, p. 2695, 7 mar. 2021.
TANGUAY, P. et al. Telerehabilitation for Post-Hospitalized COVID-19 Patients: A Proof-of-Concept Study During a Pandemic. International Journal of Telerehabilitation, v. 13, n. 1, p. e6383, 2021.
¹Discente do Programa de Pós-graduação em Ciências Aplicadas à Saúde, Universidade Federal de Jataí, Jataí, Goiás, Brasil
²Discente do curso de graduação em fisioterapia, Universidade Federal de Jataí, Jataí, Goiás, Brasil
³Docente do curso de graduação em fisioterapia, Universidade Federal de Jataí, Jataí, Goiás, Brasil