EFEITOS COLATERAIS DA INTERAÇÃO ENTRE CAFEÍNA E ÁLCOOL ETÍLICO EM DIVERSOS SISTEMAS DO CORPO HUMANO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7339525


Cecília Rocha Compagno;
Gabriely de Souza A Fonseca;
Isadora Cristina Borges Neves;
Nathalia Esmerito de Oliveira;
Prof. Ms. Leandro Giorgetti (Orientador).

Escola de Ciências da Saúde, Universidade Anhembi-Morumbi, São Paulo, Brasil.


RESUMO

A cafeína e o álcool etílico são algumas das substâncias psicoativas mais utilizadas no mundo. São conhecidas por serem usadas em conjunto extensivamente. Algumas drogas alteram a forma como o etanol é metabolizado e podem aumentar ou diminuir os níveis sanguíneos. E o álcool, por outro lado, altera o metabolismo de várias drogas, afetando os níveis dessas substâncias no organismo, e pode reduzir a eficácia de algumas drogas e acentuar seus efeitos colaterais. A cafeína, por sua vez, é um estimulante, com seu principal alvo de ação no sistema adenosinérgico, com ação antagonista não seletiva de receptores de adenosina. Não é incomum o uso de álcool com bebidas cafeinadas. No entanto, pouco se sabe sobre o grau em que eles podem potencializar mutuamente o consumo um do outro e o resultado dessa exposição a longo prazo. Este artigo descreve a interação do álcool com a cafeína nos sistemas do organismo de modo geral, seus efeitos e riscos, alertando para uma utilização mais segura, eficaz e racional, destacando o papel do farmacêutico e dos profissionais de saúde na gestão das interações e na promoção da saúde.

Palavras-chave: Álcool etílico, Cafeína, Interação entre cafeína e etanol, fisiologia, farmacoterapia, papel do farmacêutico.

1 INTRODUÇÃO

A cafeína e o álcool etílico fazem parte das substâncias psicoativas mais utilizadas no mundo e são conhecidas por serem usadas em conjunto extensivamente. Achados pré-históricos indicam que o ser humano tem feito uso de bebidas alcoólicas desde o período Neolítico, marcado pelo surgimento da agricultura e invenção da cerâmica (SANTOS, 2014). A cafeína, por sua vez, foi descoberta e isolada do café pela primeira vez em 1819 na Alemanha, pelo químico Friedlieb Ferdinand Runge, que nomeou o composto de Kaffe Base (a base que vem do café). Em 1821, os químicos Pierre Jean Robiquet, Pierre-Joseph Pelletier e Joseph Bien Aimé Caventou, isolaram de forma autónoma o composto em questão, o nomeando de caffeine (GALACHO; MENDES, 2012).

O uso dessas substâncias de forma concomitante pode causar interações medicamentosas, este é um evento clínico em que os efeitos de um fármaco são alterados pela presença de outro fármaco, alimento, bebida contendo ou não etanol. Quando a interação causa alteração da biodisponibilidade do fármaco, podemos atribuir às interações de farmacocinética. Alterações que resultam no aumento ou redução da resposta biológica de fármacos são consideradas como interações de farmacodinâmica (SILVA, 2017). Existem classes de medicamentos, que em uso simultâneo com álcool etílico podem ter seus efeitos exacerbados ou reduzidos, devido a capacidade do etanol de alterar a expressão e o funcionamento de enzimas microssomais do citocromo P4502E1, que é responsável pela metabolização do álcool etílico e de alguns fármacos que agem nesta mesma rota metabólica (LOUZADA; LEAL, 2015).

A aplicação não-médica do etanol é prevalente, acarretando potenciais interações com variados medicamentos, usados com ou sem prescrição (WANNMACHER, 2007). As interações entre algumas classes de medicamentos e o álcool etílico podem interferir na biodisponibilidade destes, resultando no acúmulo ou redução plasmática de ambos, causando efeitos antagônicos, alterando a eficácia e aumentando efeitos adversos (SILVA, 2017). O risco causado pelo uso concomitante de bebidas alcoólicas e medicamentos são muitas vezes negligenciados pela população, sobretudo em situações festivas nas quais se observa exposição aguda ao etanol ou em condições crônicas como no etilismo (OLIVEIRA NETO, 2018).

Neste trabalho descrevemos a interação do álcool etílico com a cafeína, seus efeitos e riscos, com a perspectiva de utilizar o ato da dispensação como uma oportunidade para reduzir os riscos associados à farmacoterapia. Alertando para uma utilização mais segura, eficaz e racional dessas substâncias, destacando o papel do farmacêutico e dos profissionais de saúde na gestão das interações e na promoção da saúde.

2 MATERIAL E MÉTODOS

Foi realizada uma revisão de literatura sobre os efeitos colaterais da cafeína e etanol em diversos sistemas do corpo humano com a base de dados do Elsevier, Google Scholar, PubMed, Scielo e Wiley. Para encontrar os artigos que melhor correspondiam ao tema pesquisado, foram utilizadas os seguintes termos em inglês: caffeine, alcohol, interaction, effects of alcohol on the body, effects of caffeine on the body, central nervous system, respiratory system, urinary system, caffeine alcohol interaction in the human system. Quando a pesquisa foi realizada em português os mesmos termos foram apenas traduzidos.

Os critérios para a seleção dos artigos encontrados nessa revisão foram, em ordem: textos escritos em inglês que continham as características gerais da cafeína e do etanol. Foram analisadas as características farmacodinâmica e farmacocinética. Quando as informações pesquisadas não foram encontradas em artigos em inglês os mesmos termos foram pesquisados em português, entre livros e artigos foram analisadas 24 referências entre os anos 1991 a 2022.

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1. ÁLCOOL ETÍLICO

O Álcool etílico (Etanol) é uma molécula orgânica simples composta de um grupo hidroxila, uma cadeia alifática curta com dois carbonos e representado pela fórmula molecular CH3CH2OH, os radicais hidroxil e edil conferem propriedades tanto hidrofílicas e lipofílicas. O etanol também pode danificar componentes celulares essenciais e aumentar o dano ao DNA no cérebro. Os danos provocados pelo álcool etílico são vários e todos dignos de estudo científico.

De acordo com Laranjeira e Romano (2004) o etanol é uma substância capaz de causar danos de três mecanismos distintos: toxicidade, direta ou indireta, sobre diversos órgãos e sistemas corporais; intoxicação aguda; e dependência: Os danos podem ser agudos ou crônicos e dependem do padrão de consumo de cada pessoa, não só com a frequência com que se ingere, mas a quantidade por episódio.

Além disso, o álcool etílico é uma substância que sinaliza a adenosina, aumenta sua síntese e inibe seus transportadores. A principal atuação do etanol é no Sistema Nervoso Central (SNC), sendo classificado farmacologicamente como uma droga depressora do SNC. No entanto, essa substância pode apresentar efeitos estimulantes, dependendo do tempo e da dose consumida. Consumido em doses baixas, o álcool etílico tem efeito estimulante, causando desinibição, sentimentos de euforia. Já em doses mais altas, têm efeitos depressores e sedativos, levando a incoordenação motora, relaxamento, déficit cognitivo e de memória (BRANDES, 2014; BRUNTON, 2012; GIGLIOTTI; BESSA, 2004; VENGELIENE et al., 2008).

O etanol altera a comunicação entre neurônios excitatório e inibitório do Sistema Nervoso Central. Os efeitos do etanol podem causar uma comunicação alterada entre neurônios, por ação direta ou indireta, mediada principalmente pelos neurotransmissores glutamato e ácido gama-aminobutírico (GABA), e também dopamina, acetilcolina e serotonina (WAKITA et al., 2012; ZALESKI et al., 2004). Um dos principais alvos de ação do etanol é a sinapse inibitória GABAérgica (FISCHER; FRANKE; ILLES, 2003; WAKITA et al., 2012). Os receptores GABA se subdividem em GABAA e GABAB e o etanol tem maior influência nos receptores GABAA, que são ionotrópicos e possuem três principais subunidades (α, β e γ), que delimitam canais de cloreto (Cl- ). Quando o etanol atinge o SNC, seu efeito potencializa a ação do GABA, permitindo o aumento da passagem do Cl- para o interior da célula neuronal, hiperpolarizante e ativando seu efeito inibitório. Com o tempo, a exposição crônica ao álcool etílico causa algumas mudanças adaptativas, tais como diminuição da liberação de dopamina no sistema mesolímbico e estriado e aumento da transmissão de glutamato.

Figura 1- Fórmula estrutural álcool etílico.

Legenda: A estrutura química do álcool etílico. Bolinhas pretas representam átomos de carbono, as brancas hidrogênio e a vermelha oxigênio.
Fonte: Elaborada pelas autoras, 2022

3.2. CAFEÍNA

A cafeína é uma molécula orgânica com fórmula molecular C8H10N4O2 (figura 2), um dos alcalóides com atividade biológica mais ingeridos no planeta, um alcalóide de xantina, suas designações IUPAC são 1,3,7-trimetilxantina, cuja estrutura contém um esqueleto de purina. Suas propriedades físicas e químicas são pó branco, inodoro, fácil de sublimar quando aquecido. É pouco solúvel em água e álcool (FARMACÓPEIA, 2022). A molécula está compreendida no grupo dos alcalóides de xantina. É uma droga psicotrópica, considerada pela Organização Mundial da Saúde como uma droga estimulante do sistema nervoso central (SNC) e, dependendo em parte do consumo, pode ter múltiplos efeitos em outros órgãos, capaz de modificar uma ou várias funções do nosso organismo (Carvalho, JM et al., 2006; OMS, 2022).

Figura 2.- Fórmula estrutural cafeína

Legenda: A estrutura química da cafeína Bolinhas pretas representam átomos de carbono, as brancas hidrogênio, vermelha oxigênio e azul nitrogênio.
Fonte: Elaborada pelas autoras, 2022

Pode ser encontrada em grande quantidade nas folhas de chá verde (Camellia sinensis) e nas sementes de café (Coffea sp.). Também pode ser achada em outros produtos vegetais, como no cacau (Theobroma cacao) e na erva-mate (Ilex paraguayensis). Uma parcela pequena da população consome cafeína na forma de fármacos, como por exemplo, os antigripais, além de grande parte deste alcalóide ser ingerida na forma de bebidas, sendo elas bebidas energéticas, uma xícara de café e no refrigerante coca-cola.

O consumo constante habitual de grandes doses de cafeína produz tolerância e dependência. Quando em indivíduos não habituados ao consumo de café, ela produz irritabilidade, nervosismo e dispepsia, quando em indivíduos de administração habitual (350 mg ao dia), aumenta o estado de alerta, reduz irritabilidade e sensação de satisfação, porém provoca dependência física e tolerância à droga. Em uma dose única, porém elevada de cafeína produz insônia, inquietação, ansiedade, confusão mental, palpitações, vertigem, cefaléia, transtornos visuais e auditivos, esses efeitos também podem ocorrer na retirada da droga de pessoas tolerantes, caracterizada como uma síndrome de abstinência. Esses efeitos são mais nítidos e se apresentam com doses menores em indivíduos não habituados ao consumo, também possui efeitos reforçadores que podem ser parcialmente devidos à ativação do sistema dopaminérgico. E em doses muito altas podem causar convulsões, delírios e aumento da frequência cardíaca (SCHUBERT et al, 2014)

A cafeína é metabolizada pelo fígado e eliminada pela urina, está disponível no sangue entre 15 e 45 minutos, é rápida e completamente absorvida pelo trato gastrointestinal e é prontamente distribuída por todos os tecidos do corpo. As concentrações plasmáticas máximas após o consumo normal são geralmente em torno de 50 μM e as meias-vidas para eliminação variam entre 2,5 a 10 h (MAGKOS F, Kavouras SA., 2005). A velocidade de metabolização varia de acordo com fatores de gênero, idade, medicamentos e condição de saúde do indivíduo (BODENMANN et al., 2012; CARVALHO et al., 2006). Os efeitos desta inibição proporcionam estado de alerta e revigoramento (BALLONE, 2003).

Grande parte desta molécula é metabolizada nos microssomas hepáticos em mais de 25 derivados, enquanto consideravelmente menos de 5% da dose ingerida é excretada inalterada na urina, mas há uma variabilidade considerável na manipulação da cafeína pelo organismo de cada indivíduo, devido a fatores ambientais e genéticos. Evidência de estudos in vitro fornecem uma riqueza de diferentes ações celulares que podem contribuir potencialmente para os efeitos observados da cafeína em humanos in vivo. O mecanismo de ação fisiologicamente mais relevante é provavelmente o bloqueio dos receptores de adenosina, mas evidências sugerem que, pelo menos sob certas condições, outros mecanismos bioquímicos também podem estar operacionais. (Magkos F, Kavouras SA., 2005).

3.3. INTERAÇÃO CAFEÍNA E ETANOL

A cafeína e o álcool fazem parte das substâncias psicoativas mais utilizadas no mundo, que são conhecidas por serem usadas em conjunto extensivamente, como quando indivíduos fazem o uso de fármacos contendo cafeína e consomem bebida alcoólica ao tomar uma ou várias xícaras de café antes ou depois de se embriagar, e até mesmo misturar bebidas alcoólicas com bebidas energéticas cafeinadas (ARRIA et al., 2011; BRYANT LUDDEN; WOLFSON, 2010; REISSIG; STRAIN; GRIFFITHS, 2009).

A cafeína mascara os efeitos intoxicantes do álcool etílico e isso faz com que as pessoas não identifiquem o próprio nível de embriaguez, e por isso as pessoas tendem a ingerir maiores quantidades deste, o que pode levar a comportamentos mais arriscados (ARRIA et al., 2011; BRYANT LUDDEN; WOLFSON, 2010; REISSIG; STRAIN; GRIFFITHS, 2009). A ingestão de bebidas alcoólicas com bebidas energéticas está se tornando cada vez mais comum. Estas bebidas vêm sendo utilizadas para potencializar os efeitos das bebidas alcoólicas, devido possivelmente a uma redução dos efeitos depressores do etanol pela ação estimulante da cafeína no córtex cerebral. A ingestão de bebidas alcoólicas é tida como um ato comum pela sociedade, de modo que isto dificulta a distinção e o rastreio de consumo associado ao alcoolismo como doença, tornando-se complexas as estratégias utilizadas pelos profissionais para minimizar os problemas subsequentes desta prática (HICKMANN; SILVEIRA, 2009).

O etanol é capaz de alterar a comunicação entre neurotransmissores que estão presentes na comunicação entre neurônios do sistema excitatório e inibitório do cérebro, sua principal ação é mediada pelos neurotransmissores glutamato, ácido gama-aminobutírico (GABA) e também dopamina. Além disso, o álcool etílico pode promover a sinalização da adenosina, aumentando sua síntese e inibindo seu transportador, além de ser capaz de lesionar constituintes celulares essenciais, aumentando o dano ao DNA no cérebro. A cafeína, por sua vez, é um estimulante, com seu principal alvo de ação no sistema adenosinérgico, com ação antagonista não seletiva de receptores de adenosina.

3.3.1. EFEITOS COLATERAIS DA INTERAÇÃO DE CAFEÍNA COM ÁLCOOL ETÍLICO

Tabela 1. Comparação entre os efeitos da cafeína, do álcool etílico e da interação entre as duas substâncias em diversos sistemas do corpo humano.


CAFEÍNAÁLCOOL ETÍLICOÁLCOOL ETÍLICO COM CAFEÍNA
Sistema Cardiovascula rElevação dos batimentos cardíacos.Arritmia cardíaca.Potencializa os batimentos cardíacos. As duas substâncias influenciam na irritação do músculo do coração, o miocárdio.
Sistema RespiratórioEfeito broncodilatador.Irritação nos pulmões e brônquios.Aumento da frequência respiratória.
Sistema Nervoso CentralEstimulação, aumenta o metabolismo basal, inibe os neurotransmissores da adenosina, efeito sobre a descarga das células nervosas e a liberação de alguns outros neurotransmissores e hormônios, alivia dores de cabeça. Seu mecanismo é ser antagonista de receptores de adenosina, inibição de acetilcolinesterase (AChE). Provoca impacto RyRs.Lesiona constituintes celulares essenciais, aumenta o dano ao DNA do cérebro, muda o equilíbrio entre as atuações excitatórias e inibitórias do cérebro, resultando em desinibição, ataxia e sedação.A cafeína mascara o efeito depressivo do etanol.
Sistema UrinárioAumento da excreção da urina.Provoca diurese e compromete o processo de filtragem dos rins.Aumenta a diurese.
Sistema DigestivoPromove secreção ácida no estômago.Reduz a absorção de nutrientes, alteração das vias metabólicas no fígado, lesões, inflamações, úlceras gástricas, câncer de cólon e pancreatite, câncer de boca, faringe e laringe.Pode induzir toxicidade, lesões e inflamações severas.
Sistema MuscularLiberação de cálcio, promover contração muscular. Promove inibição de enzimas.Efeito deletério sobre uma série de habilidades psicomotoras, tais como tempo de reação, coordenação mão-olhos, precisão, equilíbrio e coordenação motora para movimentos complexos.Pode gerar uma hipoglicemia, e a função psicomotora é a que mais deteriora.
Fonte: Elaborada pelas autoras, 2022

Sistema Cardiovascular

A cafeína provoca a estimulação do coração, contribui para o risco cardiovascular através da obstrução dos receptores de adenosina, posteriormente acontece a ativação do sistema autonômico e do simpático através do sistema nervoso através do aumento das catecolaminas no plasma sanguíneo que pode resultar em taquicardia (CABALLERO; FINGLAS; TOLDRÁ, 2016). No coração, a cafeína mexe com o sistema nervoso simpático e faz com que ele libere hormônios estimulantes como adrenalina e noradrenalina, gerando aumento da frequência cardíaca e o estreitamento dos vasos sanguíneos, fazendo a pressão aumentar, o que pode causar infarto ou até derrame.

O álcool etílico exerce efeitos tóxicos diretos sobre o coração ao desacoplar o sistema excitatório sistólico, diminuindo o sequestro de cálcio no retículo sarcoplasmático e inibindo as bombas de sódio e potássio dependentes de ATP. As bebidas alcoólicas diminuem as taxas de respiração mitocondrial, alteram a utilização do substrato e aumentam a síntese de proteínas intracelulares e extracelulares. Além disso, alguns metabólitos têm efeitos tóxicos, especialmente o acetaldeído e os ésteres etílicos. O etanol também pode causar deficiências em nutrientes ou micronutrientes, como a tiamina e selênio. Os eletrólitos e o metabolismo são prejudicados com baixos níveis de potássio, magnésio e fosfato, altos níveis de triglicerídeos e certas toxinas presentes ou pelo menos presentes na cerveja e levam a drogas rançosas como cobalto e chumbo (BATLOUNI, 2006).

O consumo de álcool etílico pode inicialmente causar disfunção diastólica do ventrículo esquerdo devido à fibrose intersticial. Essa condição pode evoluir para hipertrofia ventricular esquerda com preservação da função ventricular e logo em seguida levar à descompensação sistólica ventricular é possível dilatação miocárdica, essa substância é uma das principais causas de cardiomiopatia dilatada não isquêmica. Eventualmente, pode ocorrer insuficiência cardíaca evidente (BATLOUNI, 2006).

Associados aumentam o risco de arritmias porque ambas as drogas afetam o músculo cardíaco e estimulam o músculo cardíaco (BATLOUNI, 2006).

Sistema Muscular

A cafeína pode ocasionar através da indução da liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático a potencialização da contratilidade muscular, a inibição das isoenzimas da fosfodiesterase e acúmulo concomitante de monofosfato cíclico, inibição das enzimas glicogênio fosforilase no fígado e no músculo, antagonista não seletivo do receptor de adenosina, estimulação da bomba de sódio/potássio da membrana celular, comprometimento do metabolismo do fosfoinositídeo, bem como outras ações menos completamente caracterizadas. Nem todos, no entanto, parecem explicar os efeitos observados in vivo, embora um grau variável de contribuição não possa ser prontamente descontado com base em dados experimentais. (MAGKOS F. et al, 2005)

Durante o metabolismo o etanol tem prioridade, o que altera outras vias metabólicas, incluindo a oxidação lipídica, o que favorece o estoque de gorduras no organismo, que se depositam na área abdominal. Para cada grama de álcool etílico metabolizado, são formadas 7,1 kcal/g, uma fonte energética 12 considerável, ao se comparar as proteínas (4 kcal/g), carboidratos (4 kcal/g) e lipídios (9 kcal/g). Acredita-se que pessoas habituadas a ingerir doses altas de etanol não seriam capazes de aproveitar toda caloria fornecida por ele.

Muitos estudos mostraram os efeitos do álcool etílico sobre o desempenho humano e dentre os quais estão: a ingestão aguda pode exercer efeito deletério sobre uma série de habilidades psicomotoras, tais como tempo de reação, coordenação mão-olhos, precisão, equilíbrio e coordenação motora para movimentos complexos; a ingestão aguda não influencia de forma importante as funções metabólicas ou fisiológicas essenciais para o desempenho físico, como o metabolismo energético, o consumo máximo de oxigênio (VO2 máx), a frequência cardíaca, o volume sistólico, o débito cardíaco, o fluxo sanguíneo muscular, a diferença arteriovenosa de oxigênio ou a dinâmica respiratória.

Geralmente quem mistura bebidas alcoólicas e cafeína com exercícios tende a apresentar hipoglicemia. Isso porque a atividade física já promove uma diminuição de glicose no organismo. O etanol e a cafeína acentuam mais ainda esta redução. O corpo começa a usar a proteína como fonte de energia, pois não há mais glicose no organismo. A função psicomotora é a que mais deteriora.

Sistema Respiratório

A cafeína é uma substância que possui efeito benéfico no sistema respiratório. Essa substância promove dilatação dos brônquios. Essa avaliação é realizada com base em uma administração no paciente com medicamento, ou com sinergismo durante uma terapia aplicada. (SMITH, et al ,2014). O consumo considerado agudo, segundo apontam estudos, é de 3 mg/kg para o indivíduo. Essa quantidade ingerida está relacionada a uma melhora no desempenho respiratório, pois aumenta a ventilação pulmonar, quando a concentração plasmática é de 8 até 20 mg/L.

A cafeína possui outro mecanismo de ação que está na atuação dessa substância nos receptores. Segundo, Bruce et al, 2005 foi relacionado que a ingestão de 200mg de cafeína acarreta diminuição de óxido nítrico liberado pelo receptor de adenosina.(AR) ou com ação de cíclico GMP. Esses resultados sugerem que a cafeína está associada a uma melhora na função pulmonar, porém são necessários mais estudos para avaliar esses dados. Apesar de efeitos benéficos, é bom salientar que também a cafeína possui efeitos negativos como elevar o risco de desenvolvimento de doenças associadas ao consumo excessivo.

No sistema respiratório, o álcool etílico danifica as células imunológicas e as estruturas responsáveis por eliminar patógenos das vias aéreas, e também uma parte do etanol é eliminado pelos pulmões e brônquios provocando irritações nesses órgãos (SARKAR, 2015).

Sistema Nervoso Central

A cafeína é um estimulante com principal alvo de ação no sistema adenosinérgico com antagonismo não seletiva aos receptores de adenosina.

A cafeína é uma substância que possui múltiplos sítios de ação no sistema nervoso central. Esses locais de ação são receptores são rianodina, receptores de ácido γ-aminobutírico e isoenzimas de nucleótido cíclico fosfodiesterase. O mecanismo de ação desempenhado em A2ARs pode justificar o efeito estimulante em associação a dopaminérgicos. A cafeína, com antagonismo dos receptores de adenosina tem influência na cognição, memória e sono. Além de afetar as doenças do sistema nervoso, como por exemplo enxaqueca, epilepsia, Parkinson e Alzheimer (RIBEIRO, 2010).

A cafeína é inibidora de um neurotransmissor conhecido como acetilcolinesterase (AChE) (POHANKA; DOBES, 2013). A inibição de acetilcolinesterase pode justificar com base nos resultados de estudos que comentam que doses baixas (<2 μg/mL no sangue), a metilxantina realiza a estimulação do SNC., porém dosagens superiores (10-30 μg/mL), podem ocasionar eventos adversos como excitação, insônia, dores de cabeça (IARC, 1991).

Segundo, Kaplan et al, 1997 observaram-se, estudos em que menores concentrações (dose de cerca de 250 mg), a cafeína implica em benefícios como sensação de prazer e tranquilidade, porém em doses de 500mg ocasiona irritabilidade, tremores e ansiedade. Os benefícios ou malefícios da cafeína estão relacionados estão na quantidade que é consumida. Em baixas concentrações possui benefícios terapêuticos como auxiliar no tratamento de dor, porém em alta dosagem pode afetar funções cerebrais e prejudica as doenças desse sistema.

O etanol quando está presente no sistema nervoso central tem a capacidade de produzir sensação de relaxamento e desinibição no consumidor. O efeito pode ser verificado nas membranas celulares, pois estes locais permitem a passagem de substâncias necessárias ao organismo humano a fim de garantir a homeostase, altera a maneira que o sistema nervoso central funciona durante os estágios iniciais de consumo, podendo ser mal interpretado como útil para a vida social. Os efeitos colaterais reduzem a consciência, a memória e a sensibilidade, prejudicando a cognição do indivíduo.

Sistema Urinário

A cafeína provoca o aumento da excreção urinária. Em razão da inibição do hormônio antidiurético (ADH), a cafeína aumenta a diurese resultando no balanço eletrolítico negativo com potencialização da excreção de cálcio e magnésio da urina (GRAHAM, 2001).

Já o álcool etílico além de produzir hormônios antidiuréticos (ADH), tem função diurética no organismo, e pode levar a alterações na função renal. Reduz a capacidade dos rins de filtrar o sangue, afetando a capacidade do corpo de reter uma quantidade adequada de água. Quanto mais se ingere, mais será eliminado. E com essa eliminação por meio da urina vão-se embora eletrólitos importantes para a manutenção da nossa saúde, como o sódio e o potássio. E pode acabar ocasionando a desidratação.

Associados aumentam a diurese, pois os dois têm função diurética no organismo.

Sistema Digestivo

A cafeína provoca aumento da secreção gástrica, potencializando os sintomas de gastrite e úlcera no indivíduo. A absorção ocorre no trato gastrointestinal e tem passagem pela barreira hematoencefálica e sua metabolização ocorre no fígado, no citocromo P450 (CYP) (CABALLERO; FINGLAS; TOLDRÁ, 2016)

Os citocromos P450 são agrupamentos de 30 enzimas que são responsáveis por realizar biotransformação. A biotransformação é um processo que ocorre no organismo com finalidade de oxidação das substâncias para deixá-las hidrossolúveis e polares. Essa etapa é importante para a cafeína para propiciar sua metabolização e absorção pelo organismo

O álcool etílico (etanol) é uma substância que possui ação no sistema digestivo. O etanol tem sua absorção e metabolização, respectivamente pelo estômago e células hepáticas localizadas no fígado. O uso crônico do etanol pode acarretar malefícios para o fígado. Como consequência está relacionado ao desenvolvimento de cânceres no sistema digestivo. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2022).

Durante um estudo a associação entre cafeína álcool etílico, foi investigada que 76% dos participantes 76% usavam concomitantemente etanol com bebidas energéticas (PRICE et al., 2010). A ingestão maior de bebida alcoólica ocorreu quando foi conjunta com substâncias energéticas (PRICE et al., 2010). Essa relação está de acordo com que é sugerido que durante a associação a percepção da embriaguez é afetada fazendo com que o indivíduo tenha maior ingestão de etanol do que as substâncias consumidas em separado. A maior ingestão de uma ou ambas substâncias potencializa a overdose. O aumento da ingestão total aumenta o risco de overdose de uma ou ambas as substâncias.

4. CONCLUSÃO

Este trabalho teve como objetivo avaliar as interações, efeitos e riscos do álcool etílico e da cafeína em diversos sistemas corporais a partir de uma perspectiva fisiopatológica por meio de uma revisão de literatura de 23 artigos de 1997 a 2022. Ressaltando para um uso mais seguro, eficaz e racional, destacando o papel dos farmacêuticos e dos demais profissionais de saúde na gestão das interações e na promoção da saúde. As associações entre álcool e cafeína, sugerem que o álcool prejudica os benefícios à saúde que a cafeína traz consigo. Já a cafeína, potencializa os efeitos negativos do álcool. (KENDRICK, 2007)

Durante associações incidentais, são consideradas medidas terapêuticas para eventos adversos (como dores de cabeça) causados pelo consumo de álcool. A cafeína faz parte de muitos medicamentos que possuem propriedades analgésicas. Este ingrediente aumenta o alívio da dor em até 40% (TEMPLE et al, 2017). Porém, o uso maior pode acarretar eventos adversos secundários da combinação dos metabólitos do etanol e cafeína.

Outros estudos sugerem que a cafeína promove a apoptose quando o álcool está presente, mas que a morte celular por apoptose ocorre é na presença de álcool, pela alteração do cálcio citosólico, esse efeito é potencializado com a adição da cafeína (HIRATA, 2005), O álcool provoca morte celular por apoptose e estudos mostraram que a cafeína potencializa. Os efeitos da administração simultânea de álcool e cafeína na morte celular, não são muito conhecidos, pois não há até o momento estudos verificando esta questão.

O farmacêutico se inclui nesse contexto, a partir da possibilidade das pessoas adquirirem medicamentos à base de cafeína e bebidas energéticas em drogarias. Nesse caso, o profissional deve orientar ao cliente sobre a forma correta de uso, informá-lo sobre os possíveis efeitos, eventos adversos secundários da combinação, e intervir o possível uso associado dessas substâncias. Mas o objetivo do trabalho de mostrar a interação e o prejuízo na saúde do consumo dessa associação foi alcançado. Mas aponta-se a necessidade da realização de mais estudos a fim de compreensão da interação álcool e cafeína em relação aos efeitos no sistema corporal humano para identificação e tratamento.

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