CONTRIBUIÇÕES DA ABORDAGEM PSICANALÍTICA NO TRABALHO COM CRIANÇAS VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7348372


Kamylla Regianne Cruz De Melo¹
Raissa Ferreira De Souza¹


RESUMO

A abordagem psicanalítica trouxe diversas contribuições para a área da sexualidade humana uma dessas contribuições foi a possibilidade de tratamento para os traumas psíquicos que seria um sintoma ou seja uma consequência que ocorre em crianças vítimas de abuso sexual que muitas vezes são violentadas por um parente ou familiar de primeiro grau que tem acesso as mesmas, sendo assim, neste estudo se tem os seguintes objetivos geral descrever o tratamento terapêutico psicanalítico para crianças vítimas de abuso sexual e os objetivos específicos 1) indicar o que é abuso sexual e suas consequências na saúde mental da criança 2) apresentar as características da psicoterapia de orientação psicanalítica 3) identificar os benefícios da terapia psicanalítica no tratamento de crianças vítimas de abuso sexual. Tendo como metodologia a abordagem qualitativa e como método revisão de literatura e o propósito descritivo.

Palavras-chave: abuso sexual infantil, psicoterapia psicanalítica, crianças.

ABSTRACT

The psychoanalytic approach has brought several contributions to the area of human sexuality, one of these contributions was the possibility of treatment for psychic traumas that would be a symptom or a consequence that occurs in children victims of sexual abuse that are often violated by a relative or first degree family member who has access to them, In this study we have the following general objectives to describe the psychoanalytic therapeutic treatment for child victims of sexual abuse and the specific objectives 1) to indicate what is sexual abuse and its consequences on the child’s mental health 2) to present the characteristics of psychoanalytically oriented psychotherapy 3) to identify the benefits of psychoanalytic therapy in the treatment of child victims of sexual abuse. The methodology is qualitative approach and the method is literature review and descriptive purpose.

Keywords: child sexual abuse, psychoanalytic psychotherapy, children. 

Introdução

A abordagem psicanalítica é um ramo da ciência, ou seja, da psicologia que trata processos psicológicos da mente humana. Neste artigo será apresentado contribuições psicanalíticas no trabalho com crianças vítimas de abuso sexual sendo cometido muitas vezes por um adulto e homem. A partir da abordagem psicanalítica se propõe através de seus métodos a associação livre que é uma forma de se acessar o inconsciente da pessoa a fim de o paciente expressar tudo o que pensa, sentimentos, emoções de forma que o terapeuta seja capaz de auxiliar o paciente nessas associações.

O abuso sexual infantil é um tema alarmante e corriqueiramente está em jornais, rádio e televisão e há uma relevância social porque é um tema delicado e poucas vezes debatido, porém, visto com sensacionalismo, por conta do Brasil ser um local difícil para crianças viverem com segurança por meio da cultura e renda que são fatores propícios para as crianças viverem esse tipo de violência.

Tema de importância para os psicólogos e terapeutas que trabalham com crianças vítimas de violência sexual assim tendo uma contribuição de se conhecer um pouco mais sobre a abordagem psicanalítica no trabalho dessas crianças.

Este artigo procura trazer novas contribuições psicanalíticas na comunidade acadêmica sobre abuso sexual buscando trazer atualização da literatura melhorando esses conceitos e contribuindo para a sociedade no tratamento das vítimas de abuso sexual infantil. O interesse em abordar sobre este assunto surgiu motivado por discussões que ocorreram em sala de aula, por documentários vistos na televisão e de debates familiares acerca do tema.

Sendo os seguintes capítulos que contém neste artigo, Teoria psicanalítica, psicoterapia psicanalítica em crianças, abuso sexual, abuso sexual e suas consequências, abuso sexual infantil e suas consequências de acordo com a psicoterapia psicanalítica e tratamento nesses casos e benefícios da terapia psicanalítica no tratamento de crianças vítimas de abuso sexual.

A partir desta pesquisa será o método revisão de literatura com a metodologia de pesquisa bibliográfica com o propósito descritivo.

Neste artigo o problema ao qual o artigo respondeu refere-se à psicanálise, pois sempre foi vista como uma ciência de elite pelas camadas sociais em que o psicanalista ficava com seu caderno de anotações fazendo e sintetizando perguntas ao paciente, tal abordagem que mais é vista na graduação de psicologia podendo intrigar os alunos por se falar em sexualidade infantil e o seu desenvolvimento, sendo no século passado amplamente estigmatizada como uma ciência que era pervertida, sendo a teoria psicanalítica vindo de tal ciência, porém foi mal interpretada na época, o abuso sexual abala psiquicamente a criança assim sendo um tema sensível de abordar, assim buscou-se responder se a abordagem psicanalítica é um método eficaz para se trabalhar com essas vítimas?

Para se chegar aos resultados a base de dados foram das seguintes revistas Scielo (Scientific Eletronic Library OnLine), o portal Unisep, pepsic (O portal de Periódicos Eletrônicos de Psicologia) com o ano das publicações 2015-2020, Psicoterapias (Cordiolli, Grevet, 2019), obras clássicas de FREUD e site do Governo Federal (MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS), a partir dos seguintes descritores, abuso sexual infantil, clínica psicanalítica, e abordagem psicanalítica. 

Violência Sexual

A violência sexual infantil é identificada sendo uma seríssima questão de saúde pública, pois é comprovado diante dos registros no alto índice de violência sexual que acomete crianças e adolescentes no Brasil e no mundo, pelo estrago social, físico e psicológico causados para o indivíduo, para a sociedade e para a família prejuízos que podem perdurar por longos anos ou por toda a vida (COGO et al., 2011).

Muitas vezes o abuso é praticado por alguém adulto do convívio familiar. Em todas as situações de abuso consumado o indivíduo não consegue se defender e fica à mercê do abusador principalmente se tratando de crianças.

Com base nisso é considerado abuso todo e qualquer tratamento desonesto praticado a uma pessoa que esteja em desigualdade seja de força, experiência ou poder. Obrigar alguém a praticar um ato contra sua vontade fazendo uso da força física o poder  de forma intencional afim de prejudicar, coagir e perverter os direitos de outrem, em condições desiguais onde o indivíduo seja incapaz de defender-se e se aproveitar desta condição para realizar humilhações que acarretem danos psicológicos, físicos e moral (OMS, 2016).

Causando na vítima traumas tanto físicos como psicológicos como dor física, transtornos mentais como depressão, ansiedade e transtornos sexuais que podem se desenvolver através desses atos de violência cometidos.

A partir disso fica definido que o abuso sexual é uma relação que vai contra o consentimento da vítima como algumas parafilias sexuais que ocorrem como pedofilia, voyeurismo, ou exploração online de forma a explorar a vítima (American Psychiatric Association, 2014).

A ação sexual do abusador é despertar o na vítima de forma a realizar atos sexuais para se satisfazer não pensando nos prejuízos para o próximo que são indivíduos menores de treze anos ou menos (Rezende, 2013).

Diante disso, fica claro o intuito do abusador ao se aproximar da vítima e decidir praticar o ato instigando a criança em busca do próprio prazer e satisfação sexual.

Segundo Rezende (2013), a violência sexual infantil pode acontecer de diversas formas, valendo-se o abusador de agressão física ou não, devido a criança ainda não ser capaz de compreender tal violência pode aceitar os toques, pois ela ainda não tem maturidade suficiente para entender a gravidade que é o abuso sexual.

É muito comum acontecer casos de abuso no ambiente familiar ou por pessoas que tem proximidade com a família da criança. Quando o abuso é praticado por indivíduo que não tem ligação consanguínea com a criança é denominado de abuso extrafamiliar, esse tipo de abuso geralmente é cometido por um conhecido da família, vizinho, educador escolar, pois são pessoas em quem o menor tem maior confiança podendos ser permitido pela mesma os toques.

Cogo e colaboradores (2011) apontam o incesto como “Despertar o interesse sexual” em um determinado membro do grupo familiar com a intenção de praticar os atos sexuais, mesmo sabendo que tem uma ligação consanguínea com a vítima. Desta forma o incesto é classificado como o abuso sexual onde há vínculo parental entre vítima- abusador.

É mais prejudicial do que o abuso não incestuoso contra crianças pois o incesto faz parte do conflito emocional e familiar.

Batista (2009), revela que os abusos acontecem com maior frequente por uma pessoa em quem a criança confia, é o que mostram as pesquisas onde aponta sendo o sexo masculino como o genitor e padrasto os maiores responsáveis pelos casos registrados de abuso sexual infantil.

De acordo com (Santos et al, 2018) , variados são os tipos de violência sexual, pesquisas apontam que a exploração sexual, assédio, atentado ao pudor, pornografia infantil, estupro são algumas das formas de abuso. Constatando que o estupro aparece com maior prevalência nas pesquisas, possivelmente devido ao fato de os demais tipos de abuso sexual não serem classificados como violência grave. 

Assim, podemos observar que o familiar se aproveita desta confiança para praticar os abusos ele rompe com todo as regras, laços afetivos, moral mesmo tendo consciência das leis ele não consegue se controlar por conta da parafilia chamada pedofilia.

Pesquisas apontam que cerca de apenas 10% dos casos de violência sexual infantil chegam ao conhecimento da justiça e são devidamente denunciados e leva em média quatro anos até a criança falar do abuso sofrido quando envolve um parente e quando ocorre de forma frequente (BATISTA, 2009).

O número é alarmante porque poucas vezes é denunciado e precisa haver uma conscientização para que seja preciso falar, essas crianças se sentem incapazes de falar e temem se serão escutadas.

De acordo com Da Silva (2018) A maioria dos abusos é praticado por uma pessoa do gênero masculino e esta questão de gênero não pode ser vista como natural, contudo, é uma característica que tem origem na cultura e no machismo que ainda persiste na sociedade, principalmente, levando em conta que a maioria das vítimas são do gênero feminino.

Por conta do patriarcalismo que foi passado durante gerações junto com o machismo os homens aprenderam a ser assim, acreditando que as mulheres são submissas a eles.

Teoria psicanalítica

A psicanálise teve início com as experiências de Breuer e Freud ao tratarem de jovens histéricas que tinham sintomas como paralisia das pernas, porém era considerado uma causa psicológica (RABELO, 2011).

A partir disso foi o início das experiências de Freud assim sendo um grande avanço para a medicina da época com a descoberta dessas jovens histéricas que eram sintomas reprimidos.

Porque não tinham causa aparente dessa perda de movimentos, com a hipnose essas pacientes reviviam os traumas que causavam esses sintomas no corpo e voltavam ao normal durante o transe (NISHIKAWA, FIORE, HARDT, 2017).

O conteúdo reprimido é latente e se torna manifesto com a hipnose trazendo assim um paradoxo para a psicanálise e foi constatado que a forma que se obtinha êxito era com outros métodos.

Depois disso foram utilizados novos métodos para se acessar o inconsciente como a livre associação, a interpretação dos sonhos e a análise da transferência (CORDIOLLI, GREVET, 2019).

Mas ao passar esse transe os sintomas voltavam, assim, se descartando que a hipnose era eficaz para a psicanálise.

Freud ao ver que tinha essa instância psíquica onde ficavam as memórias traumáticas ligadas a sexualidade ainda na infância chamou de inconsciente assim criando a teoria psicanalítica (SILVA, GASPARETTO, CAMPEZATTO, 2015).

Tudo que vivemos é registrado para o nosso inconsciente e ficam todas as pulsões humanas fazendo que o ser humano guarde no seu inconsciente suas memórias.

A livre associação: O paciente diz e expressa livremente sem censura seus pensamentos, sentimentos, fantasias, sonhos, imagens, assim como as associações que ocorrem, sem se preocupar sobre sua importância, dizendo tudo que vem a sua mente para o terapeuta que interpreta e o ajuda nessas associações (CORDIOLLI, GREVET, 2019).

A Interpretação dos sonhos: É possível que surja no conteúdo de um sonho um material que no estado de vigília não reconheçamos como nossas memórias lembramo- nos naturalmente de ter sonhado com a coisa em questão (FREUD,1996).

Mas não conseguimos lembrar as ou quando a experimentamos na realidade, porém, se remete na maioria das vezes a algo que esquecemos e foi recalcado sendo um dos métodos em que se mais vem a luz coisas reprimidas da consciência.

A transferência: seria de o paciente transferir aspectos que existem de memórias passadas para pessoas e situações principalmente dentro do consultório para o psicólogo (BREUER, FREUD, 1895).

Como impressões de pessoas do passado sendo revividas como um deslocamento (reação emocional transferida para uma pessoa), geralmente essas pessoas ou situações que ele transfere são de pessoas próximas e dos primeiros anos de vida como pais, tio, avó.

Psicoterapia psicanalítica em crianças

A teoria psicanalítica em crianças apesar de ser também utilizada em adultos tem diferenças porque as crianças estão em processo de desenvolvimento, seus níveis emocionais e de maturidade devem ser respeitados, também leva -se em consideração o raciocínio formal, pois só se forma na adolescência, há a necessidade de se formular interpretações de forma que a criança entenda sem diminuir o impacto da interpretação (STÜRMER; CASTRO, 2009). 

A avaliação da criança deve ser feita primeiramente com os pais ou com seus responsáveis, às vezes também pode ser feita com outras pessoas como outros profissionais.

A primeira avaliação há o primeiro contato dos pais com o terapeuta, assim, o psicólogo pode ter suas primeiras impressões sobre a criança também chamada de contratransferência (CORDIOLLI, GREVET, 2019).

O primeiro contato terapeuta – paciente é muito importante, pois é nessa avaliação onde se estabelecerão as primeiras impressões tanto dos pais da criança quanto do terapeuta, nesse momento em que o terapeuta poderá formular terapêuticas sendo fundamental a segurança e habilidade do profissional na condução da avaliação.

O início do tratamento é caracterizado pela criação de um vínculo chamado também de aliança terapêutica onde a criança busca a resolução de conflitos e de sentimentos com a ajuda do terapeuta (CARVALHO, GODINHO, RAMIRES, 2016).

Nos primeiros atendimentos o terapeuta buscará transmitir segurança afim de fazer com que a criança se sinta segura e veja nele uma pessoa em quem pode confiar. Essa segurança uma vez criada fará com que a criança fale livremente ao terapeuta sobre seus sentimentos, esse vínculo de confiança entre terapeuta – paciente deverá perdurar por todo o tratamento, pois é base fundamental para obter resultados positivos da terapia.

No início do tratamento também chamada de fase inicial que é a aliança terapêutica é onde se elabora a hipótese diagnóstica, e onde há o planejamento da terapia (Eizirik, Libermann & Costa, 2008).

Nesse planejamento da terapia pode ser feito uma apresentação da criança ao terapeuta no qual o terapeuta vai buscar os dados essenciais para se planejar a terapia.  

Fase intermediária é a fase que a aliança terapêutica já está consolidada, pois vínculos foram estabelecidos e o paciente já fez suas transferências, o terapeuta procura interpretar comportamentos e falas do indivíduo assim ele mesmo poderá entender seus problemas e situações que está acontecendo com ele também chamado de insight (CARVALHO, GODINHO, RAMIRES, 2016).

O profissional criará um ambiente seguro onde a criança se sinta acolhida e consiga adquirir confiança necessária para falar sobre seus sentimentos, ele poderá ajudar a criança com psicoeducação, trabalhando suas emoções desenvolvendo o autoconhecimento e fornecendo educação sexual.

A fase final que é quando há o término do tratamento que pode vir pela parte do terapeuta, pais ou paciente, a qual parte o paciente já pode lidar melhor com seus conflitos e elaborá-los já não usando mais os mecanismos de defesa primitivos.

O abuso sexual e suas consequências

Ele é compreendido por qualquer ato sexual seja homossexual ou heterossexual contra alguém sem o consentimento, entre eles podem estar sexo oral, sexo vaginal, sexo anal, toques entre outros com a pretensão de prazer do abusador (HOHENDORFF, HABIGZANG, KOLLER, 2015).

Diante disto fica claro que a violência sexual engloba não somente conjunção carnal, mas todo e qualquer ato praticado sem a permissão de uma das partes, não se restringindo apenas a conjunção carnal, mas todo e qualquer comportamento sexual que causa prejuízo psicológico, físico ou moral, social.

Muitas vezes o agressor é alguém próximo com parentesco ou com relação conjugal como o parceiro, os abusadores escolhem suas vítimas como alguém com que eles possam coagir, reprimir e pressionar a partir de seus desejos (SANTOS; DELL’AGLIO, 2010; REZENDE, 2013; HABIGZANG etal., 2005).

Ou seja, priorizando pessoas mais vulneráveis como na maioria dos casos de violência sexual, as crianças, as adolescentes e as mulheres, deixando consequências físicas e psicológicas nas mesmas

“Ao discorrer sobre as consequências do abuso sexual praticado contra crianças e adolescentes, é essencial pensar o quanto é monstruosa a deturpação da condição física, biológica ou orgânica,” (FLORENTINO, 2015, p. 141).

Podendo deixar marcas na pele, rasgos nas regiões íntimas, vermelhidão, escoriações pelo corpo, inchaço, dor e entre outros sintomas.

Precisando de um tratamento terapêutico que aborde seus traumas com suas consequências para que a vítima possa viver uma vida normal sem implicações nos seus relacionamentos.

Abuso sexual infantil e suas consequências de Acordo com a teoria psicanalítica e tratamento nesses casos

A partir do trauma a criança pode produzir defesas patológicas em seu Ego que tentaria utilizar os mecanismos de defesa que são maneiras de a mente tentar se proteger de situações que considera como ameaça.

E segundo Freud os mecanismos de defesa são repressão, negação, regressão, deslocamento, projeção, isolamento e sublimação (FREUD, 1894).

Esses mecanismos são realizados pela mente de forma automática como forma de tentar superar o trauma.

Esses traumas psíquicos pela criança ter vivência sexual prematura por não conseguir entender tal ato pode ser como um corpo estranho para o psiquismo (FREUD, 1923).

Sendo que o psiquismo trabalha essa energia psíquica tentando fazer que se aplaque o sofrimento utilizando mecanismos de defesa.

Muitas crianças simplesmente esquecem o abuso sexual se for em uma idade precoce, mas podendo ter lapsos de memória que podem acarretar problemas no desenvolvimento psíquico.

Benefícios da terapia psicanalítica no tratamento de crianças vítimas de abuso sexual

De acordo com as referências quanto a atuação de psicólogos no serviço de proteção social a crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual publicadas pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2009) declara que o psicólogo deve prestar atendimento psicossocial às vítimas e suas famílias estando assim em consonância com as diretrizes do SUAS. O atendimento psicossocial, segundo esse documento, difere da psicoterapia pela forma de intervenção e pelos seus objetivos. Consiste, então, em um conjunto de procedimentos técnicos especializados, onde visa estruturar intervenção de proteção a essas vítimas, isso engloba crianças e adolescentes contribuindo para o fortalecimento da autoestima e autoconfiança deste indivíduo pelo restabelecimento de seu direito à convivência familiar e em sociedade como um todo proporcionado condições dignas de vida e a superação da situação de violação de direitos e minimizar os efeitos da violência sofrida (CFP, 2009).

Ainda segundo o documento do CFP (2009, p. 50), os serviços de psicoterapia “têm o seu lugar na atenção à saúde, mais especificamente nos serviços de saúde mental”, sendo o(a) psicólogo(a) responsável por avaliar a necessidade de encaminhamento para esses serviços. Segundo o artigo 1º da resolução 10/2000 do CFP (2000), a psicoterapia é um processo científico de compreensão, análise e intervenção que se realiza através da aplicação sistematizada e controlada de métodos e técnicas psicológicas reconhecidos pela ciência, pela prática e pela ética profissional, promovendo a saúde mental e propiciando condições para o enfrentamento de conflitos e/ou transtornos psíquicos de indivíduos.

A psicoterapia, aqui de orientação psicanalítica infantil é uma prática da psicologia e tem como objetivo favorecer o bem-estar e a qualidade de vida da criança e de sua família, com técnicas da livre associação através do discurso da criança. O psicanalista fará a interpretação destes apresentados pela criança e assim conduzirá a análise da melhor forma afim de trazer alívio e autoconhecimento para a criança. Tem o objetivo de aumentar a qualidade de vida da criança abusada e prevenir a ocorrência de psicopatologias na infância, adolescência e idade adulta.

Sobre falar do ocorrido pode ser difícil porque a criança foi violentada na maioria das vezes por um adulto deixando – a com sentimento de insegurança e desconfiança a aproximação de alguém desconhecido. O terapeuta poderá julgar necessário perguntar sobre fatos íntimos, por isso o recomendável é que a escuta seja feita por um profissional do sexo oposto do abusador(a), deixando a criança livre para falar, respeitando seu tempo e sua vivência, um exemplo: a criança foi violentada por um adulto homem, de preferência o profissional deverá ser uma mulher com experiência clínica nesses casos para acolhê-la, não colocando a criança apenas como uma vítima de violência mas trazendo todas as suas vivências, histórias, gostos ajudando ela mesma a elaborar sua narrativa.

A psicanálise vem obtendo resultados bastante satisfatórios no atendimento a vítimas de violência sexual. É claro que tais resultados são fruto de um trabalho árduo e diferenciado. A partir de seu percurso analítico é permitido ao sujeito compreender o que se passou com ele, entender que foi vítima de uma violência e que não precisa paralisar sua vida e seus investimentos libidinais e reconstruir, aos poucos, uma imagem corporal dilacerada. Fortalecido emocionalmente terá condições de resistir aos impactos desta experiência limite, suportando as pressões do meio, evitando a autotortura e encontrando saídas para o seu drama através de uma via sublimatória. A análise propiciará a este sujeito a redescoberta de si mesmo enquanto ser humano digno de amor e respeito. Como diz a Dra. Graça Pizá: Ser alguém e possuir um corpo ainda pulsando. este é o tempo de sua análise, tempo de virar o cinismo, a vergonha, o medo imposto e descobrir, longe de seu tirano íntimo, o maravilhoso (AZEVEDO, 2001).

Considerações finais

Com base na pesquisa foi constatado que devastadoras são as consequências que o abuso sexual pode gerar na vida do indivíduo violentado, aqui, crianças, prejuízos que poderão perdurar por toda a vida do sujeito e prejudicar sua saúde, física, social, cognitiva e psicológica. O abuso sexual infantil é tema a ser discutido pelo poder público, mas não somente por ele como também no âmbito familiar, nas escolas, instituições, sociedade em geral a fim de se fazer conhecido e combatido com total empenho e seriedade que o assunto demanda buscando adotar medidas sérias, inovadoras capazes de combater eficazmente o abuso sexual. O abuso sexual tem se perpetuado pela ignorância, cercado pelo silêncio, silêncio esse que sufoca a vítima, um choro contido, uma alma marcada. Neste estudo foi explanado a respeito do abuso sexual, suas consequências para a vida psíquica e subjetividade da criança como ser em processo de desenvolvimento e maturação que ainda não está totalmente preparado para lhe dar com sua sexualidade, buscou-se expor aqui as contribuições da teoria psicanalítica com o intuito de propagar ajuda em forma de conhecimento a essas pessoas, também foi explanado a respeito dos benefícios e avanços na saúde do sujeito submetido ao tratamento com a terapia psicanalítica.

Perante a elaboração desta pesquisa os objetivos foram alcançados, os seguintes objetivos, indicar o que é abuso sexual e suas consequências na saúde mental da criança, apresentar as características da psicoterapia de orientação psicanalítica, identificar os benefícios da terapia psicanalítica no tratamento de crianças vítimas de abuso sexual.

As pessoas têm buscado cada vez mais informação sobre o tema abuso sexual, tendo em vista os aspectos que o envolvem, buscando cada vez mais formas de ajudar quem passou por isso oferecendo apoio para que possa haver não o esquecimento, mas reparo do trauma causado para que a vítima consiga perpassar por este fato tão doloroso e seguir em frente.

E por fim, diante do exposto fica evidente que a violência sexual é capaz de produzir consequências negativas terríveis na vida do sujeito. A psicoterapia aqui apresentada de orientação psicanalítica vem como proposta de intervenção no sentido de conduzir as vítimas de abuso sexual infantil com o objetivo de proporcionar bem- estar e qualidade de vida para essas crianças e suas famílias, com aplicação de técnicas da livre associação através da fala espontânea da criança afim de trazer alívio e autoconhecimento para o menor. Tem como objetivo também, aumentar a qualidade de vida da criança abusada, prevenir a ocorrência de psicopatologias na infância, adolescência e idade adulta.

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