COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES EM DECORRÊNCIA DA COVID-19

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7275368


Autores:
Felipe Gabriel Souza Silva1;
André Paulinelli Bernardo Correa1;
Rafael Leite Carvalho2.


RESUMO

A variante SARS-CoV-2 surgiu em dezembro de 2019 na China, e a partir desse país, houve sua propagação ao redor do mundo, sendo caracterizada como uma doença que pode variar desde sintomas leves, a mais graves. Tal variante afetou severamente o sistema respiratório, entretanto, seus efeitos surgiram nos demais sistemas do organismo, como o cardiovascular, acarretando em possíveis complicações crônicas pós-infecção. Objetivo: evidenciar as complicações da Covid-19 ao sistema cardiovascular; já os específicos se delimitam tanto a efeitos não relacionados somente à parte cardiovascular, quanto ao seu efeito em indivíduos com um bom condicionamento físico. Metodologia: revisão bibliográfica utilizando-se de fontes como: National Library of Medicine National Institutes of Health dos EUA (PUBMED) e Scientific Electronic Library Online (SCIELO) e Google Acadêmico (GOOGLE), sendo incluídos estudos originais, de caso, e revisões, no período (predominantemente) de 2020-2022 com as palavras chave: Cardiovascular, Covid-19, Citocinas, Diabetes, e Atletas. Resultado: Foram selecionados 19 artigos, em sua maioria da língua inglesa, para serem utilizados como referência a esse trabalho. Conclusão: complicações cardiovasculares durante/pós Covid-19 evidenciam a gravidade da infecção, podendo ser potencializadas casa haja algum fator de risco envolvido na clínica do paciente, além disso, há complicações específicas que necessitam de novos estudos para confirmar tais afirmações.

ABSTRACT

The SARS-CoV-2 variant emerged in December 2019 in China, and from that country, it spread around the world, being characterized as a disease that can range from mild to more severe symptoms. This variant severely affected the respiratory system, however, its effects appeared in other systems of the body, such as the cardiovascular system, resulting in possible chronic post-infection complications. Objective: to highlight the complications of Covid-19 to the cardiovascular system; on the other hand, the specific ones are limited both to non-relationship effects only to the cardiovascular part, and to their effect on individuals with good physical conditioning. Methodology: literature review using sources such as: National Library of Medicine National Institutes of Health of the USA (PUBMED) and Scientific Electronic Library Online (SCIELO) and Google Scholar (GOOGLE), including original studies, case studies, and reviews, in the period (predominantly) 2020-2022 with the keywords: Cardiovascular, Covid-19, Cytokines, Diabetes, and Athletes. Result: 19 articles were selected, mostly in the English language, to be used as a reference for this work. Conclusion: cardiovascular complications during/after Covid19 show the severity of the infection, which can be potentiated if there is any risk factor involved in the patient’s clinic, in addition, there are specific complications that require further studies to confirm such statements.

INTRODUÇÃO

Há uma família dos vírus que tornouse relevante nos últimos anos, a dos coronavírus (CoV). Seus primeiros relatos ocorreram em 1960, em que houveram comentários da sua primeira variante, sendo descrita como uma doença respiratória leve, semelhante ao resfriado comum. Ao longo dos anos algumas variantes do coronavírus destacaram-se em relação a suas complicações, sendo a maior delas: a síndrome respiratória aguda grave (SARS). Ela teve início em 2002, na China, onde espalhou-se rapidamente, infectando cerca de 8.000 pessoas, entretanto, foi controlada na mesma velocidade de sua propagação. Em dezembro de 2019, também na China, em Wuhan, houve o surgimento da SARS-CoV-2, sendo uma nova variante, a qual desencadeou, a princípio, uma epidemia na região. Dentro de 3 meses, a mesma já havia se espalhado por diversos continentes, tornando-se assim, um risco mundial. Infectando cerca de 529 milhões de pessoas, até o momento. A propagação se dá através de gotículas expelidas pelo usuário, e a partir disso, o indivíduo inicia o ciclo de contaminação. Sua duração média é de 14 dias, partindo de uma fase com carga viral menor (cerca de três dias antes do primeiro sintoma), em seguida, com maiores sintomas (7º ao 10º dia de contaminação) e por último, sua fase final em que dependendo de sua variante, não há mais risco de contágio (a partir do 11º dia). (OUR WORLD IN DATA, 31/05/2022).

Suas complicações podem partir desde tosse e febre, a dificuldades para respirar e dores no peito, as quais seriam sintomas mais graves da doença. Essas manifestações possuem relação com o sistema respiratório, entretanto este não seria o único sistema acometido pela Covid-19, pois a mesma pode vir a afetar indiretamente os demais sistemas do organismo, por exemplo: o cardiovascular; possuindo relação com o surgimento de: arritmias, miocardite, aumento da pressão arterial e até mesmo infarto agudo do miocárdio. (PHELAN et al, 2020).

Portanto, é de nosso conhecimento que a Covid-19 afeta, prioritariamente, o sistema respiratório, entretanto, ela pode gerar complicações aos demais sistemas do corpo humano. Ao lidarmos com tal infecção, é de suma importância ter uma visão quantitativa da doença, em que ela pode causar reações que, se não tratadas, desenvolverão cronicidades ao organismo. Diante dos fatos apresentados anteriormente, concluímos que há uma importância em ter uma coletânea de dados atualizada sobre a Covid-19 e suas respectivas complicações envolvendo o sistema cardiovascular, somado isso ao fato de que faltam estudos de revisão a respeito desse tema.

METODOLOGIA

Análise através de uma revisão bibliográfica somado à uma coleta de informações realizada com sistemas de pesquisa online, como Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos (PubMed), Google acadêmico, Scientific Electronic Library Online (SciELO), utilizando-se de recursos através de monografias e artigos publicados até o momento. Ao decorrer da coleta de dados, artigos que não indicavam alguma importância com o estudo, foram excluídos, com base em seus respectivos resumos e ligação com o tema de nossa revisão. Sendo utilizada uma leitura informativa e crítica, com o intuito de filtrar e selecionar os dados de maior relevância científica que foram produzidos pela comunidade acadêmica, esses que eram referentes ao assunto, utilizando-se predominantemente de artigos publicados a partir de 2020. As palavras-chave utilizadas foram: Cardiovascular, Covid-19, Citocinas, Diabetes, Atletas. E suas respectivas traduções para o inglês.

Figura 1. Fluxograma de seleção dos artigos.

Figura 2. Tabela com artigos selecionados.

AutorBase de DadosAno de publicaçãoNome do artigo
1.Dermot PhelanPubMed2020Screening of Potential Cardiac Involvement in Competitive Athletes Recovering From COVID-19
2.Jaqueline Dantas MartinsGoogle Acadêmico2020As implicações da COVID-19 no sistema cardiovascular: prognóstico e intercorrências
3.Ali AttiqPubMed2021The Triumvirate of NF-κB, inflammation and cytokine storm in COVID-19
4.Christle GuevarraPubMed2022Cardiovascular involvement among collegiate athletes following COVID-19 infection
5.Charlotte SteemblockPubMed2022Diabetes and COVID-19: Short- and Long-Term Consequences
6.Joseph Adu- AmankwaahPubMed2020The cardiovascular aspect of COVID-19
7.Michael ChilaziPubMed2021COVID and Cardiovascular Disease: What We Know in 2021
8.Robert FlaumenhaftPubMed2021Vasculopathy in COVID-19
9.Isaias GlezerSciELO2000O fator de transcrição NF-kapaB nos mecanismos moleculares de ação de psicofármacos
10.Charitha GangadharanPubMed2021Diabetes and COVID-19: Role of insulin resistance as a risk factor for COVID-19 severity
11.Mihaela IonescoPubMed2021The Role of Endothelium in COVID-19
12.Maryam KhanPubMed2021Pharmacotherapeutic agents for the management of COVID-19 patients with preexisting cardiovascular disease
13.Fouad KhalilPubMed2022COVID-19 and Cardiovascular Disease: A Comprehensive Review
14.Elnaz KhaniPubMed2021Potential pharmacologic treatments for COVID-19 smell and taste loss: A comprehensive review
15.Marine KirschPubMed2022The COVID-19 Pandemic Lowers Active Behavior of Patients with Cardiovascular Diseases, Healthy Peoples and Athletes
16.Steffen PetersenPubMed2022Cardiovascular Magnetic Resonance for Patients With COVID-19
17.Mahmoud NassarPubMed2021Cardiovascular involvement among collegiate athletes following COVID-19 infection
18.David M SmadjaPubMed2021COVID-19 is a systemic vascular hemopathy: insight for mechanistic and clinical aspects
19.Matthew WilsonPubMed2020Cardiorespiratory considerations for return-to-play in elite athletes after COVID-19 infection

DISCUSSÃO

ECA-2

Variados são os problemas ligados a Covid-19 e sua relação envolvendo o sistema cardiovascular. Há uma dificuldade em seu diagnóstico nas situações em que pacientes não possuem sintomas ligados ao trato respiratório, logo, podendo ser confundido com outros quadros clínicos.

De acordo com um estudo feito por Dermot Phelan, é dito que pode haver o surgimento de sintomas mais severos ao longo do contágio, como: miocardite, arritmias e infarto agudo do miocárdio (PHELAN et al, 2020). Somado isso ao fato de um índice maior de mortalidade pós Covid-19 em pacientes com doenças cardiovasculares (DCV). (INCOR 2021). É importante ressaltar que mesmo o paciente não possuindo um histórico de problemas cardiovasculares, ele pode vir a apresentar as complicações citadas anteriormente, sendo a miocardite como uma das mais graves. Essa que é fruto de um desequilíbrio do sistema

regulador de pressão reninaangiotensina, ligado a enzima ECA-2, que por sua vez acaba sendo um receptor funcional para o vírus.

A ECA-2 é uma enzima que tem como função a conversão da angiotensina-2 (ang-2) em angiotensina-1-7, a qual é diretamente associada ao sistema de regulação de pressão sanguínea. Sua relação com o SARS-CoV-2 acontece devido a uma proteína da membrana viral (spike) que se conecta a ECA-2, que está presente na membrana das células atacadas pelo vírus, sendo tal enzima evidente em grande quantidade no coração, pulmão, e em outras partes do corpo não ligadas à região torácica, como o pâncreas (SOCORRO et al, 2021). Por conta desta relação única, há uma diminuição drástica da atividade da ECA-2, gerando uma concentração excessiva da ang-2, que por sua vez não é mais convertida.

Figura 3. Referência 4.

Tal complicação promove vasoconstrição e efeitos inflamatórios devido a uma sobrecarga no coração e no sistema vascular, propiciando uma hipertrofia das células musculares cardíacas, e consequentemente, um aumento da pressão arterial (MARTINS et al, 2020).

Tempestade inflamatória

Acredita-se que a gravidade da doença e sua mortalidade podem ser causadas por diversos fatores, dentre eles, a “tempestade inflamatória”. Normalmente, a infecção do SARSCoV-2 induz uma resposta imunológica do organismo, conduzindo-o a uma recuperação, entretanto, em casos mais graves o vírus estimula uma reação imunológica exacerbada, causando um desequilíbrio sistêmico. Toda resposta inflamatória inicia-se a partir dos linfócitos T CD4+ e CD8+, sendo eles fontes produtoras de citocinas, em que atuam como um sistema de

“cura” da doença. A partir da produção das citocinas há uma estimulação do fator de transcrição NF-κB envolvido na expressão de genes, inclusive aos ligados à resposta inflamatória, além de estimular a produção de mais citocinas, como a Interleucina-1 (IL). Além disso, a proteína spike possui uma subunidade chamada de Cov2S1, a qual foi identificada como uma potente indutora da tempestade inflamatória, pois tem a habilidade de incitar a NF-κB, ocasionando uma resposta imunológica exacerbada (ATTIQ et al, 2021).

Figura 4. Referência 6 .

O acúmulo dessas citocinas somado as células inflamatórias gerais no local da lesão são a “tempestade inflamatória” em si, que em longo prazo, devido a necrose e apoptose das células, acarretam em diversos problemas como: desequilíbrio homeostático; aterosclerose; acidentes vasculares hemorrágicos (AVE); alterações na corrente sanguínea (leucopenia ou leucocitose, trombocitopenia e anemia). Todas essas condições podem ocasionar um infarto agudo do miocárdio ou, até mesmo, falência múltipla dos órgãos.

Relação com a Diabetes Mellitus I e II

Há uma presença abundante de ECA2 fora da região torácica, sendo encontrada também no pâncreas, servindo de porta de entrada para o vírus nesta região, gerando efeitos semelhantes a DMT2 agravando o seu quadro. Tal patologia metabólica consiste na falta da produção de insulina através das ilhotas beta pancreáticas ou na resistência ao próprio hormônio.

De acordo com um estudo feito por Charlotte Steenblock, indivíduos que já possuem um quadro de DMT2, apresentavam inflamações subclínicas recorrentes por conta da sinalização à insulina prejudicada, acarretando em uma diminuição das citocinas anti-inflamatórias e um aumento das pró-inflamatórias (IL-1 e IL-6), essas que também influenciam na sinalização à insulina (agravando o quadro de DMT2), sendo que durante a infecção do SARS-CoV-2 esse processo ocorre de forma mais acentuada.

Além disso, as ilhotas beta pancreáticas podem ser danificadas pela infecção do SARS-Cov-2, acarretando em uma resistência à insulina (durante a fase aguda da infecção), tal condição pode ocorrer tanto em pacientes que não possuíam histórico de DMT2 quanto nos que já possuíam alguma pré-disposição à doença. No caso de pacientes completamente saudáveis, há uma possibilidade de desenvolverem um maior predomínio de hiperglicemia e cetoacidose, entretanto, outras doenças de gravidade similar também poderiam causar essa mesma condição, deixando inconclusivo tal afirmação. (STEENBLOCK et al, 2022).

Já a DMT1 poderia ser desencadeada através de um processo que induziria a autoimunidade das ilhotas, porém precisaríamos de mais estudos nessa área para confirmar esses dados.

Entendemos então que a infecção pelo vírus da SARS-CoV-2 possui maiores riscos em indivíduos que possuem distúrbios metabólicos, além de agravar todos os problemas já presentes, podendo desenvolver outras condições com maior facilidade, como a tempestade inflamatória.

Efeito em Atletas

Inúmeras são as complicações que a Covid-19 pode criar em indivíduos sedentários, logo, pessoas com um preparo físico maior (atletas) podem ter uma “vantagem” a infecção.

A priori, sabemos que o sedentarismo acarreta diversos problemas a longo prazo, como: obesidade, diabetes mellitus tipo 2, pressão arterial elevada e problemas cardiovasculares, além de tornar as pessoas mais vulneráveis a patologias. O lockdown teve um papel significativo no aumento desta condição, pois favoreceu a pausa na prática de exercícios físicos, somado a fatores como depressão e ansiedade (ligados a pandemia) (CNN 2021).

A triagem de atletas pós pandemia consiste na avaliação do histórico médico e exames indicadores de alguma alteração (troponina – T, ligada ao cardiovascular), já a avaliação em indivíduos com sintomas persistentes mesmo após a recuperação da Covid-19 será direcionada de acordo com os sintomas (tolerância ao exercício reduzida, dor torácica e dispneia), por exemplo: Eletrocardiograma (ECG) 90A, ECG Holter 24 horas, ressonância magnética cardíaca e teste de exercícios cardio-pulmonares (PHELAN et al, 2020). Em uma pesquisa realizada por Christle C. Guevarra, foi feito um balanço entre jovens atletas (19,9 anos em média) de diversos esportes (futebol, basquete, futebol americano, natação e mergulho e vôlei) com o objetivo de investigar possíveis complicações cardiovasculares pós infecção viral.

Segundo a publicação, de 99 indivíduos testados, apenas três possuiram um eletrocardiograma (ECG) anormal, e nenhum deles vieram a apresentar cardiomiopatias. O mesmo estudo ainda destaca que problemas cardiovasculares pós infecção são raros, (<1-1%) entre atletas de elite e 3,3% entre atletas semi-profissionais (GUEVARRA et al, 2022).

CONCLUSÃO

Complicações cardiovasculares durante a Covid-19 podem determinar a gravidade da infecção, caso o indivíduo tenha algum fator de risco. Entretanto, em pacientes que já possuem quaisquer doenças cardíacas, as chances de complicações aumentam. Além disso, um paciente sadio pode ter algum comprometimento cardíaco, como arritmias e miocardite. Dessa forma, concluímosque qualquer paciente que entrar em contato com a SARS- CoV-2 é suscetível a uma complicação cardiovascular, dependendo do seu estilo de vida, e sistema imunológico. Por mais que haja estudos sobre tal tema, alguns fatos são inconclusivos, necessitando de revisões mais específicas para cada situação e particularidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Filiação:
1. Discente da Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo / SP, Brasil
2. Docente da Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo / SP, Brasil