REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7274304
Larissa Filgueira Miranda1
Iara Maria Pires Perez2
RESUMO
Na pandemia do COVID-19, teve um impacto imediato e dramático no sistema de saúde e na sociedade devido à disseminação do vírus. Entretanto, existe uma preocupação com toda essa questão pela falta de conhecimento sobre a patologia e as medidas de tratamento adequadas. Nesse ambiente a longo prazo, identifica-se um problema alarmante com o aumento da resistência microbiana aos antimicrobianos, devido ao uso indiscriminado de antibióticos em pacientes com SARS-CoV-2 podendo ter um aumento da pressão seletiva, possibilitando uma disseminação de isolados multirresistentes. O objetivo desse estudo é compreender como o uso inadequado de antibióticos intensificado pela pandemia impacta na resistência microbiana e seus danos de curto a longo prazo. O estudo é uma revisão bibliográfica, onde foram utilizados os dados das plataformas Scientific Electronic Library Online (SciELO), Google Acadêmico, Biblioteca Virtual da Saúde (BVS) indexadas à Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). Os artigos encontrados afirmam que o uso incessante de antibióticos no tratamento de Covid-19 estimula a resistência antimicrobiana e essa questão tornase uma preocupação e desafio para os pesquisadores quanto a ameaça em futuro próximo, tendo como consequências internações longas, com mais custos, agravo de doenças, aumento de uso de mais medicamentos, que podem evoluir a óbitos.
Palavras-chave: COVID-19. Antibióticos Multirresistentes. Enfermagem.
ABSTRACT
The COVID-19 pandemic had an immediate and dramatic impact on the healthcare system and society due to the spread of the virus. However, there is a concern with this whole issue due to the lack of knowledge about the pathology and the appropriate treatment measures. In this long-term environment, it identifies an alarming problem with the increase in microbial resistance to antimicrobials, due to the indiscriminate use of antibiotics in patients with SARS-CoV-2, which may have an increase in selective pressure, allowing the spread of multidrug-resistant isolates. The aim of this study is to understand how the inappropriate use of antibiotics intensified by the pandemic impacts microbial and fungal resistance and its short-term and long-term damage. The study is a bibliographic review, where data from the Scientific Electronic Library Online (SciELO), Google Scholar, Virtual Health Library (BVS) platforms indexed to Latin American and Caribbean Literature on Health Sciences (LILACS) were used. The articles found state that the incessant use of antibiotics in the treatment of Covid-19 stimulates antimicrobial resistance and this issue becomes a concern and challenge for researchers regarding the threat in the near future, having as consequences long hospitalizations, with more costs, aggravation disease, increased use of more drugs, which can lead to deaths.
Word keys: COVID-19. Antibiotics. Multi-resistant. Nursing
1 INTRODUÇÃO
No ano de 2019, à saúde recebeu um cenário de ameaça global, a doença de Coronavírus global (COVID-19), provocada pela síndrome respiratória aguda grave coronavírus 2 (SARS-CoV-2) com rápida disseminação no mundo, ocasionando mudanças na vida das pessoas (CONFESOR et al., 2021). Os primeiros registros aconteceram na China em dezembro de 2019 (HADAD et al., 2021).
Assim, houve um impacto imediato e avassalador no sistema de saúde e na sociedade em decorrência da disseminação do vírus. Entretanto, nascia uma preocupação com todo essa problemática pelo desconhecimento da patologia e com as medidas de tratamento adequados. Nesse meio, ao longo prazo, como consequência da pandemia, existe uma questão alarmante com o aumento da resistência microbiana aos antimicrobianos. Pelo fato de a patologia ser semelhante com as manifestações da pneumonia bacteriana, o uso desenfreado de antibióticos associado ao tratamento cresceu repentinamente no sistema de saúde (ANVISA, 2021).
Nesse viés, os antibióticos, principalmente de amplo espectro como Azitromicina e Levofloxacina, começaram a ser utilizados, porém, sabe-se que não tem eficácia no tratamento de infecções virais. Desse modo, o uso indiscriminado em pacientes com SARS-CoV-2 pode ter como consequência um aumento da pressão seletiva, possibilitando uma disseminação de isolados multirresistentes (ANVISA, 2021).
O uso irracional de antibióticos é uma problemática que já preocupava pesquisadores antes do surgimento da pandemia, um alerta feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019 projetava quê, em 2050, aconteceria 10 milhões de mortes por ano, devido a infecções resistentes, sendo a primeira causa de morte global (GONZÁLEZ, 2021). Segundo a OPAS (2020), as taxas de mortalidade e morbidade crescem em decorrência do uso de antibióticos em excesso pelo aumento do risco da transmissão de bactérias multirresistentes, e ainda ser um tratamento mais difícil de controlar.
O aumento do uso de antibióticos na pandemia da COVID-19 pode ter acelerado o nível de resistência que era esperado ter somente em 2030. A contribuição para essa estimativa foi o aumento de pessoas com sintomas respiratórios tratados com antibióticos profiláticos, principalmente o uso do ‘Kit COVID’, que possui o antibiótico Azitromicina e outras medicações que, confirmado pelo Ministério da Saúde não possuem benefícios clínicos contra a COVID-19, e o aumento nos procedimentos invasivos realizados que também necessitam de antibióticos profiláticos (ZORN, 2021).
Isso resulta em um cenário alarmante no futuro, de acordo com Zorn (2021), “aconteceriam coisas que nem nos ocorre pensar, como que uma criança caia, abra o joelho, seja levada ao hospital e o médico lhe diga que não há nada a fazer, que sente muito”. De acordo com o exposto, torna-se relevante o estudo dos impactos ocasionados no presente e a longo prazo na saúde pública do uso indiscriminado de antibióticos e como o enfermeiro do controle de infecções pode atuar para amenizar esta problemática.
O estudo tem, como objetivo geral, compreender como o uso inadequado de antibióticos intensificado pela pandemia, impacta na resistência microbiana e fúngica e seus danos de curto a longo prazo. Logo, os imprescindíveis estudos específicos compreendem analisar o uso irracional de antibióticos na pandemia da COVID-19, descrever os impactos ocasionados a saúde pública e destacar a atuação do enfermeiro do controle de infecções no controle de antimicrobianos.
Portanto, esse estudo é de suma importância para novos contextos de pandemia e um alarmante porque o uso descontrolado de antibióticos não só acarreta a saúde pública, mas também, à saúde do paciente. A resistência bacteriana pode levar um cenário caótico, onde não existiria fármacos potentes para combater as infecções existentes, além de complicações como, por exemplo, uma hepatite medicamentosa, que pode evoluir a óbitos.
2 METODOLOGIA
O estudo trata – se de uma revisão bibliográfica, onde foram utilizados os dados das plataformas Scientific Electronic Library Online (SciELO), Google Acadêmico, Biblioteca Virtual da Saúde (BVS) indexadas a Literatura Latinoamericana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), dentre outros, utilizando também reportagens e entrevistas de fontes confiáveis e livros de acordo com a temática.
A pesquisa foi feita utilizando as palavras chave: COVID-19, KIT COVID, resistência bacteriana, uso indiscriminado de antibióticos e enfermagem no controle de antimicrobianos. Nos critérios de inclusão foram destacados artigos relacionados nos períodos de 2018 a 2022, isso por se tratar de um tema da atualidade, utilizando-se a abordagem qualitativa, em língua nacional e inglesa. Foram escolhidos artigos que descreviam sobre o uso indiscriminado de antibióticos na pandemia, sendo realizado seleções para os que traziam os principais itens que buscam a compreensão dos impactos que esta problemática causa na saúde pública e como a enfermagem pode atuar na redução desses impactos.
3 REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Surgimento da COVID-19 e o uso de antibióticos
Os primeiros coronavírus humanos foram isolados em 1937 e somente no ano de 1965 que o vírus foi denominado Coronavírus, em virtude do perfil na microscopia eletrônica, semelhável a uma coroa. Logo no ano de 2002 e 2003, um tipo específico, o SARS-CoV ocasionou um surto da Síndrome Respiratória Aguda Grave na China com um total de 900 mortes (HARAD et al., 2021).
Em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, na China, foi identificada uma nova cepa de coronavírus em seres humanos que ficou conhecida como, COVID-19. Trata -se de uma doença infecciosa causada pelo SARS-CoV-2, que provoca diversos sintomas como: tosse seca, dor de cabeça, febre, dor de garganta, entre outros (OPAS, 2021).
Por conseguinte, desse ano em diante, houve uma propagação disseminada do SARS – CoV-2 em nível mundial. Em março de 2020, a Organização Mundial de Saúde decretou situação de pandemia do Covid, visto que o novo vírus encontravase em vários continentes (HARAD et al., 2021).
As manifestações clínicas do COVID-19 compreendem: febre, tosse, distúrbios abdominais, fadiga, dispneia, anosmia, cefaleia, dor de garganta, mialgias, diarreia e náuseas, entretanto, 20 a 30% dos indivíduos podem ser assintomáticos e transmitir de igual forma a patologia. Outras manifestações incluem alterações dermatológicas (urticária), alterações hepáticas, alterações renais (hematúria e proteinúria) e alterações cardíacas (isquemia miocárdica) (MENDES et al, 2021).
Em novembro do ano de 2021, o Brasil continua sendo o país de destaque com maior número de infectados pelo SARS-CoV- 2 e com mais de 614 mil óbitos. As principais complicações englobam: as infecções secundárias; lesão cardíaca aguda; hipercoagulabilidade; ventilação mecânica e síndrome respiratória do adulto grave (MENDES et al., 2021).
No início, essa patologia, apesar de ser de origem viral, apresentava manifestações semelhantes de pneumonia bacteriana quando começou a ser tratada por meio de antibióticos. Devido ao alto número de contaminações diversas pessoas foram em busca de tratamentos profiláticos, tratamentos esses que não possuem eficácia, como o ‘Kit COVID’, que possui vários antimicrobianos associados, sendo um deles o antibiótico Azitromicina (SILVA et al., 2022).
Com a pandemia do COVID-19 surge uma nova preocupação no contexto da saúde, que foi o uso inadequado de antimicrobianos resultando no aumento da resistência de multirresistentes. Desse modo, a resistência microbiana é considerada um grave problema de saúde pública e está relacionado ao aumento das taxas de morbimortalidade, do tempo de internação e dos custos no tratamento. Além disso, a estimativa é de 700.0000 mortes a cada ano em decorrência das infecções provocadas por patógenos resistentes aos antimicrobianos (ANVISA, 2021).
Logo, o desconhecimento do novo cenário, o uso indiscriminado de antibióticos e às práticas inadequadas de controle de infecção tornaram-se fatores de risco para essa resistência. Dessa maneira, a pandemia gerou condições que facilitasse a disseminação de microrganismos resistentes como: o crescente número e tempo de internação dos pacientes infectados; pacientes graves com cuidados intensivos; déficit de recursos humanos e equipamentos de proteção individual (EPI); utilização em excesso de antimicrobianos de amplo espectro para tratamentos de infecções secundárias e bacterianas (ANVISA, 2021).
Outro ponto para o uso de antibióticos foi que também houve o uso para o tratamento de infecção hospitalar adquirida na internação. Porém, apenas 8% dos contaminados com COVID-19 apresentaram casos de coinfecções bacterianas e fúngicas, de acordo com um estudo de revisão realizado com pacientes contaminados que foram hospitalizados (RAWSON et al, 2020). Para transmissão em ambiente hospitalar, os microrganismos colonizam profissionais de saúde, pacientes, sobrevivem a superfícies e são resistentes a antimicrobianos e antissépticos. (OLIVEIRA; MOTA, 2018).
No estudo realizado por Oliveira, Silva e Gonçalves (2021), na cidade de Nanuque, Minas Gerais, após um levantamento de dados no ano de 2019, um total de 700 medicamentos da classe de antibióticos foram dispensados. Já no ano da pandemia do COVID-19, esse total mais que duplicou, totalizando 1.436 dispensações de antibióticos, de 33% passou para 67% a comercialização. Logo esses dados são alarmantes e se dá pela inexistência de tratamentos antivirais com eficácia comprovada pelos sintomas semelhantes a pneumonia bacteriana e pelo fato da chance em adquirir coinfecção secundária havendo chances de um crescimento descontrolado de casos de resistência bacteriana pós-COVID.
Fora do âmbito hospitalar, a internet também influenciou que os indivíduos automedicassem, principalmente, pelas notícias “Fake News” para o uso do ‘Kit COVID. Além disso, juntando com as ideologias políticas e a falta de conhecimento digital de inúmeros cidadãos que acreditaram nas notícias sem consultar uma fonte confiável de transmissão de informações, notícias essas que não só reforçaram a automedicação, mas também o uso de outras substâncias que, por consequência, colocaram a vida em risco (GUIMARÃES; CARVALHO, 2021).
3.2 Resistência bacteriana e o aumento do número de bactérias
Segundo Silva et al. (2022), afirmam que o uso incessante de antibióticos no tratamento de Covid-19 estimula a resistência antimicrobiana e essa questão tornase uma preocupação e desafio para os pesquisadores quanto a ameaça em futuro próximo. Dentre os fármacos antibacterianos, utilizados no tratamento do Covid -19, destacam: Amicacina, Trimetropim, Penicilinas, Vancomicina, Azitromicina, Levofloxacino, Doxiciclina que atuam nas diversas inibições da parede celular, metabólitos essenciais e síntese proteica com suas respectivas resistências na bomba de efluxo, alteração de permeabilidade e inativação enzimática.
Segundo o estudo realizado por Nascimento (2021), os medicamentos mais utilizados para a prevenção e o tratamento do COVID-19 foram Ceftriaxona (80%); Dexametasona e Azitromicina (69%); Enxoparina/Heparina (56%); Sabutamol (32%); Ivermectina (20%); Nitaxozamida (2%); Hidroxicloroquina (0%) e Aminofilina (6%).
Consequentemente, com as poucas opções de tratamento e a falta de tratamentos antivirais com eficácia comprovada, a prescrição por antibióticos tornou -se uma rotina durante a pandemia. Contudo, uma problemática se intensifica nesse meio, o uso indiscriminado de antibióticos e, consequentemente, o aumento à resistência antimicrobiana. Desse modo, essa resistência pode comprometer o tratamento de outras patologias emergentes e infecciosas existentes (CONFESOR et al., 2021).
Os pacientes que possuem longas internações apresentam maiores chances de adquirir infecções relacionadas a assistência à saúde (IRAS), principalmente por bactérias multirresistentes. Com a chegada da pandemia, isso ficou ainda mais evidente, uma vez que muitos pacientes necessitaram de um longo período de recuperação em leitos hospitalares. Um estudo realizado em um hospital terciário com 86 pacientes de UTI, evidenciou, após coletas de vigilância, que havia 77% de prevalência de Klebsiella Pneumoniae, em que foi detectado resistência aos betalactâmicos. Esses achados mostraram resistentes à Amicacina (33,3%), resistentes a Gentamicina (12,1%) e resistentes a Polimixina B (24,2%) (DANTAS et al., 2022).
Algumas bactérias fazem parte da nossa microbiota, sendo que a Klebsiella pneumoniae é oportunista, por muitos anos pode estar no organismo do indivíduo sem causar nenhuma doença. Seus sintomas, surgem quando o indivíduo apresenta uma baixa imunidade, no tratamento ou no envelhecimento do mesmo, podendo se manifestar em diversos aspectos, tais como, infecções pulmonares, urinárias, feridas (cirúrgicas ou escarra) e até mesmo sepse (infecção generalizada). (MARQUES; DUARTE; MUNHOZ, 2021, p. 169).
Segundo estudos, sustenta-se que os antibióticos prescritos para pacientes com COVID-19, regularmente diagnosticados com síndrome respiratória aguda grave, receberam, de modo empírico, o tratamento para pneumonia bacteriana, fundamentada na experiência com a infecção pelo vírus da influenza relacionada à infecção por Streptococcus pneumoniae e Staphylococcus aureus (ANVISA, 2021).
Também houve um aumento do crescimento de Pseudomonas Aeruginosa em hemoculturas e secreções traqueais de pacientes internados em leitos de terapia intensiva em julho de 2020. Assim, a contaminação por bactérias em ambiente hospitalar pode levar a pneumonia, principalmente para as associadas a ventilação mecânica (PAV) e infecção de corrente sanguínea. (SILVA, et al. 2021).
A resistência à Poliminixa preocupa os pesquisadores, já que é utilizado como última opção para tratamentos infecciosos os quais não tiveram respostas com outros antibióticos. Foi realizada uma comparação no ano de 2019, a resistência à Poliminixa do microoganismo Acinetobater Baumanii era de 2,5% e, já no ano de 2021, apresentou 5,6%. Também as Pseudomonas aeruginosa, em 2019, apresentou uma taxa de 14% e no ano de 2021, com 51% e as enterobactérias em 2019, com 42% e no ano de 2021, 58% (LISBOA, 2021).
Segundo a OPAS (2020), o uso de antibióticos como tratamento do COVID-19 não é recomendado seja leve ou moderado, exceto que haja suspeita clínica de infecção bacteriana. Nesses casos, segundo uma revisão sistemática com pacientes hospitalizados, somente 8% apresentaram coinfecção bacteriana e fúngica no período de internação, logo, nesses casos justifica-se o uso de antibióticos. Também, em casos de infecção grave, recomenda-se o uso de antimicrobianos empíricos para tratar os possíveis patógenos existentes, porém, deve-se reforçar que a decisão deve basear na clínica: fatores de hospedeiro, epidemiologia local, quadros de sepse e pneumonia. Em contrapartida, o uso generalizado de antibióticos deve ser alertado pelas chances de resistência bacteriana e, consequentemente, aumento da mortalidade durante e após a pandemia (BRASIL, 2020).
O uso empírico do antibiótico deve ser breve, em média, 5 a 7 dias com avaliação diária da situação do paciente sendo, em qualquer momento, ser suspenso caso não esteja relacionado com alguma infecção bacteriana, secundárias ou fúngicas, visto que, essas são responsáveis pela alta mortalidade de pacientes om COVID-19. Esse aumento no uso de antibióticos pode levar reações adversas como: infecção por Clostridioides difficile, diarreia, febre e colite (OPAS, 2020; ANVISA, 2021).
Segundo Brasil (2020), é fundamental o monitoramento da sensibilidade dos microrganismos aos antimicrobianos. Além disso, reforça-se que não devem ser utilizados no tratamento de viroses, entretanto, pode ser usado no manejo de coinfecções. Portanto, esse cenário da pandemia de poucas evidências exige cautela dos profissionais da saúde na hipótese de esquemas de antimicrobianos e também controle para reduzir a exposição da população aos microrganismos resistentes.
3.3 Consequências à saúde pública do uso de antibióticos
Nesse contexto, observa-se que muitos pontos podem impactar negativamente na saúde pública, já que a resistência bacteriana pode acarretar em mais consultas, remédios, exames, profissionais de saúde para suprir a demanda, internações, novos leitos e, principalmente, quartos de isolamento, para evitar contaminação cruzada que possuem um custo maior que os quartos de internações comuns (OLIVEIRA; PEREIRA; ZAMBERLAM, 2020).
A resistência bacteriana também ameaça o tratamento de infecções comuns, podendo acarretar a morte, visto que não terá antibióticos que sejam suficientes para tratar uma infecção. Teme-se que procedimentos como: cesarianas, cirurgias simples ou até mesmo quimioterapias sejam extremamente perigosos, e ameaçam todo o avanço da medicina ao longo dos anos (SANTOS, 2021).
O surgimento de novos antibióticos não traz lucros às indústrias farmacêuticas, que se possa explicar a falta de investimento nesta problemática. Vale salientar que poderiam ser atingidos rapidamente pela resistência bacteriana, de acordo com este enfrentamento e a preocupação do problema, foi criado um programa de resistência bacteriana que visa destinar fundos para a criação de antibióticos e otimização dos existentes (RUNKAL, 2022).
A resistência bacteriana inativou a atividade de vários antibióticos, principalmente os carbapenemases, utilizado em tratamentos de infecções graves e houve também a propagação de certas carbapenemases em lugares onde ainda não haviam sido detectadas (OPAS, 2021). Interromper tratamentos com antibióticos pode reduzir ou inativar a eficácia do medicamento, também acarretando na resistência bacteriana, que evoluem a internações longas, com mais custos, agravo de doenças, aumento de uso de mais medicamentos, podendo evoluir a óbitos, por consequência, traz um impacto à saúde global e o desenvolvimento (ANVISA, 2020).
Segundo a Anvisa (2021), a falta de dados em relação a essa temática dificulta prever o impacto que pode ser gerado pela disseminação de microrganismos multirresistentes. Contudo, alguns dados nacionais já vêm apontando para esse aumento. As medidas de proteção influenciam diretamente nas taxas de resistência como o isolamento social, o uso de máscaras e a higienização das mãos podem levar a redução de outras infecções virais e menor números de infeções bacterinas resultando menor número de prescrições de antimicrobiano. Sem embargo, o desafio a essa adesão é grande justificada pela escassez de insumos e recursos humanos, profissionais sobrecarregados e serviços lotados.
Mediante isso, a resistência aos antibióticos prolonga os períodos de internação do paciente, aumenta as taxas de mortalidade, limita o tratamento de novas infecções emergentes, infere na saúde do indivíduo que faz o uso errôneo e as consequências podem agravar em cidades interioranas onde os leitos e as unidades intensivas são limitados. Desse modo, o uso dos antibióticos tem grande impacto no contexto da saúde de modo geral e na vida e saúde do indivíduo (OLIVEIRA; SILVA; GONÇALVEZ, 2021).
3.4 O papel do enfermeiro no controle de antimicrobianos e resistência bacteriana
Os enfermeiros são a parte fundamental no programa de controle de antimicrobianos, trazendo ações como assegurar a realização de culturas bacteriológicas antes do início do tratamento, revisar prescrições médicas diariamente e promover ações de conscientização sobre os danos que o uso irracional de antimicrobianos podem causar ao paciente (ALVIM, 2019)
Diante do cenário de controle aos microrganismos em âmbito hospitalar, podem ser implementadas novas ações como: condição de higiene das mãos, com ambiente adequado e bem distribuído, identificação de pacientes contaminados com bactérias multirresistentes e seu isolamento, para evitar contaminação cruzada, programas de educação continuada frente às medidas de precaução com pacientes contaminados e a importância do uso de EPI’s essenciais, e a importância da lavagem das mãos (OLIVEIRA, 2018).
De acordo com o exposto, não é recomendável o uso de antibióticos para medidas profiláticas para tratamento da COVID-19, antibióticos não tratam vírus e sim infecções bacterianas. Há muito a se enfrentar e compreender sobre os fenômenos dessa problemática, em um contexto de saúde ainda mais complexo com os danos causados pós surgimento da pandemia do COVID-19 (PELUSO et al., 2021).
Segundo Anvisa (2021, p.49), reforçam-se as medidas de prevenção e controle de infecções causadas por microrganismos multirresistentes:
Reforçar as medidas de Precaução-padrão; Higiene das Mãos: capacitação/ educação em higiene das mãos. Aplicação da estratégia multimodal recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS); Reforçar a necessidade de auditoria interna e retorno dos resultados do monitoramento para as unidades assistenciais como forma de melhorar a adesão dos profissionais; Precauções de Contato para os pacientes colonizados ou infectados; Identificar prontamente pacientes já conhecidos como colonizados na admissão hospitalar por meio de um sistema de rastreamento informatizado; Implantar procedimentos padronizados de limpeza e desinfecção do ambiente e monitorar o desempenho para garantir a eficiência do processo; Se possível, dedicar equipamentos médicos para uso exclusivo de pacientes colonizados/infectados; Organizar atividades de capacitação para que os profissionais de saúde entendam a importância de manter as medidas de controle de infecção; Implementar Programa de Gerenciamento do Uso de Antimicrobianos.
As medidas de prevenção e o controle das infecções devem ser reforçados nos serviços de saúde, tanto para prevenir o aumento da morbidade e mortalidade, quanto para controlar a disseminação de microrganismos resistentes, como: a higienização das mãos, uso correto de proteção individual e o gerenciamento do uso de antimicrobianos (ANVISA, 2020).
O enfermeiro desempenha papel importante no controle antimicrobiano como: coleta e registro de dados do paciente sobre infecção; resultados laboratoriais; acompanhamento da terapêutica antimicrobiana e evolução do paciente; limitar a prescrição de antibióticos de amplo espectro sempre que possível e ao tempo adequado; monitorar as prescrições de antimicrobianos endovenosos e, se necessário, participar de discussões para substituição via oral (FELIX; TOLLOFO, 2019).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pandemia do COVID-19 trouxe um cenário repleto de incertezas na saúde pública, tanto na sua atuação, como na profilaxia. Mediante isso, o desconhecimento frente ao SARS-COV-2 resultou em uma preocupação, o aumento exponencial do uso dos antimicrobianos como tratamento, devido, às consequências graves para um futuro próximo e o surgimento de microrganismos resistentes.
Na pandemia, a prescrição e a utilização dos antibióticos intensificaram causando um alerta em relação ao uso excessivo e, por conseguinte, a resistência microbiana. Além disso, as consequências na saúde pública também é um problema pelo aumento das taxas de internação prolongada, o custo e o tratamento longo e a limitação de antibióticos disponíveis para tal tratamento.
Logo, o enfermeiro, nesse contexto, contribui de modo a controlar e reduzir essa questão com estratégias para o uso racional de antimicrobianos, o monitoramento das infecções relacionadas à assistência de saúde e o controle do tempo de uso do medicamento no tratamento, utilização de protocolos e técnicas na administração de antimicrobianos.
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1Acadêmica do 10º período do Curso de Enfermagem da Faculdade Unibras de Goiás.
2Professora do Curso de Enfermagem da Faculdade Unibras de Goiás, graduada em Enfermagem pela Universidade Estadual de Londrina, especialista em Educação na Enfermagem pela Universidade Federal de Goiás e orientadora da pesquisa.