REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7139595
Autores:
Matheus da Silva Sousa1
José Paulo Ernesto de Oliveira2
Joyce Kaline Andrade da Silva3
Júlio Cesar dos Santos Souza4
Orientadora:
Vera Mônica Queiroz Fernandes Aguiar5
RESUMO
O presente estudo tem como problemática se o fornecedor tem reponsabilidade objetiva por vício do produto? Diante disso, o art.18 do CDC prevê que os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem de forma solidariamente pelos vícios de qualidade ou de quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo para que se o destinam. Ademais, para melhor compreensão acerca do tema, será abordado os tipos de vícios trazidos pelo código de defesa do consumidor, as formas de responsabilização impostas aos fornecedores quando seus produtos apresentam alguma falha, quais seus prazos e ainda qual tipo de penalidade a eles aplicadas para analisar de forma mais aprofundada o assunto principal sobre a reponsabilidade por vicio de produtos e distingui-los dos demais tipos. E quanto a metodologia aplicada, será por meio de pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa, com intuito de gerar conhecimento para elaboração do texto cientifico, como o trabalho de conclusão de curso, se faz necessário um estudo pelo método dedutivo, utilizando-se da e de estudos dos principais doutrinadores sobre os assuntos estudados.
Palavras-chave: Fornecedor. Responsabilidade objetiva. Vicio do produto.
ABSTRACT
The present study has as a problem whether the supplier has objective liability for product addiction? In view of this, article 18 of the CDC provides that suppliers of durable or non-durable consumer products are jointly and severally liable for defects in quality or quantity that make them inappropriate or unsuitable for the consumption for which they are intended. In addition, for a better understanding of the subject, the types of vices brought by the consumer protection code will be addressed, the forms of liability imposed on suppliers when their products have a failure, what are their deadlines and what type of penalty is applied to them for analyze in more depth the main issue of liability for product addiction and distinguish them from other types. And as for the methodology applied, it will be through exploratory research, with a qualitative approach, in order to generate knowledge for the elaboration of the scientific text, such as the course conclusion work, a study by the deductive method is necessary, using the and of studies of the main scholars on the subjects studied.
Keywords: Provider. Objective responsibility. Product addiction.
1. INTRODUÇÃO
Com a evolução da humanidade houve a necessidade de ampliação e modernização dos meios de produção para que este pudesse suprir o aumento nas demandas. No entanto, este aumento do consumo e da produção em larga escala, trouxe também problemas como práticas abusivas, assim como a concorrência desleal.
Em virtude disso o estado passou a intervir nas relações de consumo com intuito de proteger a parte mais fraca desta relação, que no caso seria o consumidor. Desde então foram criadas leis para estabelecer as regras desta relação de consumo, até que, por fim, foi criado o Código de Defesa do Consumidor – CDC1, com o objetivo de garantir os direitos e regramentos condizentes às relações consumeristas.
Desta forma, questiona-se: o fornecedor tem reponsabilidade objetiva por vício do produto? Com fulcro no art. 18 CDC os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem de forma solidariamente pelos vícios de qualidade ou de quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo para que se o destinam.
No dispositivo legal do CDC os seus artigos 18 e 19 afirmam que a responsabilidade pelos vícios de qualidade ou de quantidade, que tornem os produtos duráveis ou não duráveis, impróprios ou inadequados ao consumo, são efetivamente do fornecedor. Sendo consideráveis com vício, produtos com diferença das indicações do recipiente, embalagem, rotulagem ou publicidade.
Portanto, é de suma relevância o estudo da reponsabilidade objetiva do fornecedor nas relações consumeristas, com um aprofundamento no estudo relacionado ao vício de qualidade que está presente no artigo 18 do CDC, que mesmo nos dias atuais ainda é confundido com o artigo 12 deste mesmo código que trata sobre o defeito ou fato do produto, que sobrevém quando a falha no produto gera dano a integridade do consumidor. Esta confusão faz com que os comerciantes se utilizem do chamado jogo do empurra, quando procurado por clientes que adquiriram produtos viciados, recebendo a alegação equivocada dos comerciantes de que a responsabilidade é exclusiva do fabricante;
Desta maneira, o objetivo geral é analisar a responsabilidade objetiva do fornecedor por vício do produto. Já os objetivos específicos consistem em verificar quais são os tipos de vícios previstos no CDC; identificar quais são as responsabilidades dos fornecedores; estudar a responsabilidade objetiva do CDC.
Ademais, a metodologia utilizada será por meio de pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa, com o escopo de gerar conhecimento para elaboração do texto cientifico, como o trabalho de conclusão de curso se faz necessário um estudo pelo método dedutivo, utilizando-se do CDC e de estudos dos principais doutrinadores sobre os assuntos estudados. A análise dos resultados alcançados ocorreu através da pesquisa e do referencial teórico adotado, de análises bibliográficas, utizando-se da exposição de conteúdo de forma coerente e de fácil entendimento a respeito do tema proposto.
2. CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE O CÓDIGO DO CONSUMIDOR
Inicialmente devemos mencionar acerca do Direito do Consumidor no Brasil. Desta forma, a Constituição Federal de 1988 – CF/882 prevê a proteção do consumidor como direito fundamental em seus artigos 1º, III, 5º, XXXII, 24, inciso V e a sua defesa como princípio da ordem econômica no artigo 170, inciso V. Cujo objetivo precípuo é trazer proteção aos mais vulneráveis, ou seja, ao próprio consumidor, “sendo necessária a intervenção do Estado nas relações privadas de consumo para garantia de defesa e da devida aplicação dos seus direitos”3.
Neste sentido, a CF/88 garante a proteção e os direitos ao consumidor diante de uma situação de violação de seus direitos, desde que haja qualquer situação que vá contra as regras estabelecidas no CDC. Além disso, é oportuno mencionar que o referido código foi criado pela Lei nº 8.078 em 11 de setembro de 1990, passando a vigorar apenas em 11 de março de 1991.
Com a vigência do CDC, no que tange aos direitos do consumidor:
A proteção à vida, saúde, segurança; divulgação adequada sobre o produto; informação clara e liberdade de escolha; proteção contra publicidade enganosa e abusiva; proteção contratual; prevenção e reparação de danos materiais e morais, individuais, coletivos e difusos; acesso aos órgãos de defesa, à inversão do ônus da prova e adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral4.
Assim, todos os direitos básicos do consumidor são aplicados em consonância com princípios basilares do ordenamento jurídico brasileiro, devem ser devidamente aplicados nas situações em que couber tais direitos, ou seja, quando o consumidor for lesado, em uma relação de compra de produtos e/ou contratação de serviços que seja.
Vejamos a seguir o artigo 6º do CDC que menciona sobre os direitos ora mencionados:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas à liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012).
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral5.
Diante dos direitos do consumidor no artigo supracitado, será possível utilizar nas relações jurídicas, uma vez que são regidos pelos princípios consumeristas. Além disso, deve sempre observar as normas constitucionais às quais são submetidos, pois também possuem o intuito de prever sobre as regras das relações de consumo entre fornecedores e consumidores, bem como, suas responsabilidades e deveres, “estabelecendo condutas justas e mecanismos para reparar os danos que venham a ser causados aos consumidores, com definição de prazos e penalidades para fornecedores” 6.
Nesse mesmo sentido, Garcia (2008, p. 48) possui o entendimento que os direitos do consumidor:
Trata-se de um verdadeiro microssistema jurídico, em que o objetivo não é tutelar os iguais, cuja proteção já é encontrada no Direito Civil, mas justamente tutelar os desiguais, tratando de maneira diferente fornecedor e consumidor com o fito de alcançar a igualdade7.
O direito do consumidor deve ser tratado separadamente quando se tratar da figura do consumidor e de fornecedor, pois ambos possuem proteção jurídica distintamente, mas possuem o mesmo intuito, qual seja, o de respeitar o direito de ambos, alcançando a igualdade.
Já sobre o conceito de relação de consumo, Filomeno (1995. p. 47) menciona que:
As relações de consumo nada mais são do que relações jurídicas por excelência, pressupondo, por conseguinte, dois polos de interesse: consumidor – fornecedor e a coisa, objeto desses interesses. No caso, mais precisamente, e consoante ditado pelo Código de Defesa do Consumidor, tal objeto consiste em produtos e serviços8.
Desse modo, é de suma importância que o consumidor saiba quais são os seus direitos diante de uma relação de consumo, independentemente de qual seja o tipo de contrato, trata-se de produto ou prestação de serviços, para que o mesmo não seja lesado pelo fornecedor diante do CDC.
2.1 Conceito de Consumidor
É importante neste primeiro momento trazermos as principais definições utilizadas nesta pesquisa, neste sentido é fundamental iniciarmos conceituando o consumidor, que é considerado uma das peças chave da pesquisa.
O conceito legal de consumidor está previsto no artigo 2° da Lei n° 8.078/90 (CDC) da seguinte maneira:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo9.
Desta concepção entende-se que o código se preocupou em englobar tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica como consumidores, desde que utilizem o produto ou serviço como destinatário final, além ainda de equiparar o consumidor à qualquer pessoa, mesmo que indeterminável, que porventura interveio na relação de consumo.
Filomeno (2022), um dos participes do anteprojeto do CDC, entende que:
Consumidor vem a ser qualquer pessoa física que, isolada ou coletivamente, contrate para consumo final, em benefício próprio ou de outrem, a aquisição ou a locação de bens, bem como a prestação de serviços. Além disso, há que se equiparar a consumidor a coletividade que, potencialmente, esteja sujeita ou propensa a referida contratação10.
Como bem mencionado pelo doutrinador ainda se enquadra como consumidor toda a coletividade de pessoas que estejam sujeitas à contratação ou dano decorrente de um produto.
Interpretando esse dispositivo a doutrinadora Marques (2010) assenta que:
(…) destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica. O destinatário final é o consumidor que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utiliza-lo (destinatário final fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico), e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é o consumidor final, ele está transformando o bem, utilizando o bem. Esse conceito, como se vê, abrange a concepção econômica de consumidor final, limitação esta que nem sempre é acolhida pelo direito, eis que outras considerações podem intervir nesse conceito11.
Para Nunes (2018) é notável um problema em tal conceituação, conforme expõe:
O problema do uso do termo destinatário final está relacionado a um caso específico: o daquela pessoa que adquire o produto ou serviço como destinatário final, mas que usará tal bem como típico de produção. por exemplo, o usineiro que compra uma usina para produção de álcool. Não resta dúvida de que ele será o destinatário final do produto (a usina): contudo, pode ser considerado consumidor?12.
Deste modo observa-se que existe um embate na interpretação acerca do destinatário final, dividindo desta forma os doutrinadores em duas correntes sendo elas a finalista e a maximalista.
A teoria finalista (utilizada no direito brasileiro) busca enquadrar como consumidor apenas aqueles que realmente sejam vulneráveis na relação jurídica, enquanto a teoria maximalista tenta enquadrar como consumidor o maior número possíveis de agentes. Por seguinte se constata também no artigo 17 do mesmo diploma legal a preocupação em reforçar a definição de consumidor, equiparando “[…] aos consumidores todas as vítimas do evento danoso” 13.
De igual forma o artigo 29 do CDC14 amplia o conceito de consumidor para abranger “todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.” Dessa forma o conceito de consumidor vai além daquele que utiliza ou compra bens e serviços, alcançando também todos que possam ser expostos a práticas abusivas. Observa-se assim que artigo 2º se refere a pessoas determinadas ou indeterminadas, enquanto o artigo 29 conceitua o consumidor como sendo qualquer pessoa ligada a prática comercial.
Assim, conforme as fundamentações expostas, podemos chegar à conclusão que consumidor vem a ser toda pessoa física ou jurídica que utiliza ou compra produtos e serviços como destinatário final em uma relação comercial. É ainda equiparado a consumidor todas as pessoas sejam determináveis ou indetermináveis, que porventura possam ser vítimas de evento danoso ou estar ligadas a relações de consumo. Desta maneira qualquer pessoa exposta, mesmo que de maneira indeterminada na relação de consumo ou que se equipare a consumidor recebe proteção pelo CDC.
2.2 Conceito de Fornecedor
Acerca do conceito do fornecedor, dispõe o caput do artigo 3º do CDC:
Art. 3° fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços15.
Da interpretação desse dispositivo legal, compreendemos que o termo fornecedor busca atingir a maior amplitude possível, responsabilizando desta maneira todos os possíveis corresponsáveis de vender produtos ou serviços com algum vício ou defeito. É notável a preocupação em ampliar da maior maneira possível o rol de sujeitos que colocam o objeto no mercado, em virtude de atividade econômica, serviços ou produtos e disponibilizando estes para utilização ou aquisição por parte dos consumidores. Acerca do tema discorre Nunes (2018):
Na realidade são todas pessoas capazes, físicas ou jurídicas, além dos entes desprovidos de personalidade. Não há exclusão alguma do tipo de pessoa jurídica, já que o CDC é genérico e busca atingir todo e qualquer modelo. São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quotas de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta etc16.
Ainda em importante comento explica Souza et al (2018) acerca dos profissionais liberais como fornecedores:
Para eliminar dúvidas que poderiam alcançar os leigos, é importante frisar que fornecedores de serviços são também os profissionais liberais, quando atuam nesta qualidade, embora sua responsabilidade civil, em decorrência de danos causados aos clientes, seja, por exceção, aferida pela teoria da culpa provada, e não pela objetiva, como nos demais casos17.
Ante o exposto percebe-se que, fornecedor para o CDC é toda pessoa física ou jurídica, que forneça serviço ou produtos com habitualidade. No entanto apesar da amplitude do conceito de fornecedor com sua característica de habitualidade, devem ser excluídos da aplicação do código consumerista os contratos celebrados entre consumidores que não exercem esta prática de comercio de maneira habitual.
3. VÍCIOS ABORDADOS PELO CÓDIGO DO CONSUMIDOR
Conforme já citado anteriormente, o código visando garantir maior proteção aos consumidores criou normas adequadas para cada situação da relação de consumo, dentre elas, podemos destacar: a responsabilidade em virtude de fato e de vícios, sejam eles de produtos ou serviços.
A responsabilidade, por tanto de qualquer defeito que possa gerar danos à saúde ou a integridade do consumidor, bem como a de terceiros é regulada pelo CDC, deste modo é dever dos fornecedores somente colocar no mercado produtos com a qualidade e segurança adequadas a consumo. Deste modo a responsabilidade relativa ao produto ou serviço se refere aos acidentes de consumo, que porventura possam causar dano tanto físico quanto econômico ao consumidor em virtude da insegurança do produto ou prestação de serviços.
Percebe-se ainda que um acidente de consumo pode não apenas atingir o destinatário final, mas como também terceiros que sejam prejudicados de alguma maneira pelo eventual dano. Observa-se que o dano físico ao consumidor por falhas no produto ou serviço está previsto nos artigos 12, 13 e 14 do CDC.
A responsabilidade desses eventuais danos consoante expõe Nunes (2018) será objetiva, e os eventos atinentes aos danos são os denominados acidentes de consumo. Portanto, é amparada na teoria do risco, pois é independente a existência da culpa ou dolo para que se caracterize. Sobre a teoria do risco, Venosa (2012. p. 44) ilustra:
Nesse diapasão poderíamos exemplificar com uma empresa que se dedica a produzir e apresentar espetáculos com fogos de artifício. Ninguém duvida de que o trabalho com pólvora e com explosivos já representa um perigo em si mesmo, ainda que todas as medidas para evitar danos venham a ser adotadas. Outro exemplo que parece bem claro diz respeito a espetáculos populares, artísticos, esportivos etc. com grande fluxo de espectadores: é crucial que qualquer acidente que venha a ocorrer em multidão terá natureza grave, por mais que se adotem modernas medidas de segurança. O organizador dessa atividade, independentemente de qualquer outro critério, expõe as pessoas presentes inelutavelmente a um perigo18.
Deste modo é notável que mesmo com a tentativa de eliminar todos os riscos decorrentes da relação de consumo, que possam atingir a segurança social, ainda podem ocorrer situações fora do previsto. Diante disto o direito buscou uma forma de melhor distribuir os prejuízos causados pela atividade produtiva em massa, adotando assim a culpa e a responsabilidade objetiva por parte dos fornecedores.
Em comento ao assunto Marques (2010, p. 155) assinala que:
A responsabilidade adotada no código de defesa do consumidor aparentemente surgiu da influência de dois sistemas: o norte americano, que, partindo de ideias implícitas ou contratuais, chega-se à responsabilidade objetiva. E o da comunidade europeia, que adota o posicionamento de que os defeitos dos produtos industrializados introduzidos no mercado pelo fornecedor imputam responsabilidade objetiva ao fabricante19.
Conclui-se deste modo que o responsável pelos danos gerados por defeito é de responsabilidade de quem exerceu a atividade no mercado de consumo independente de culpa. É o que também é conhecido como a teoria do risco do empreendimento, que é conceituada da seguinte maneira por Cavalieri filho (2008. p. 126):
Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência as normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser gerente dos produtos e serviços que oferecem no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos20.
Feitas as principais ponderações em relação à responsabilidade pelo fato ou serviço, e ainda sobre a teoria do risco, daremos continuidade no estudo para podermos assim adentrar na temática principal da pesquisa.
3.1 A Responsabilidade Objetiva do Fornecedor
Em razão das inovações da vida moderna e graças ao advento da Lei 8078 de 1990, foi estabelecido pela lei que a responsabilidade Civil nas relações de Consumo seria objetiva. Marques (2006, p. 258-259), disserta que:
Realmente, a responsabilidade do fornecedor em seus aspectos contratuais e extracontratuais, presente nas formas do CDC (arts.12 a 27), está objetivada, isto é, concentrada no produto ou no serviço prestado, concentrada na existência de um defeito (falha na segurança) ou na existência de um vício (falha na adequação, na prestabilidade). (….) Se definirmos responsabilidade objetiva simplesmente como aquela que prescinde de culpa, certamente podemos concluir que o artigo 12 do CDC segue a teoria da objetiva, na medida em que este artigo afirma nascer a responsabilidade de determinados fornecedores: independentemente da existência de culpa21.
Assim como descreve o artigo 12 do CDC sobre a independência da existência da culpa por parte do fornecedor, também o artigo 13, deste mesmo código, abrange para o comerciante a mesma responsabilidade, conforme nos ensina Miranda (2009).
Obviamente, isto se o comerciante não puder ser identificado o fabricante, o construtor, o produtor ou importador. Se o comerciante puder identificar, terá direito de regresso contra eles, sendo que cada um responde proporcionalmente pela sua parcela de responsabilidade. Assim, legaliza o parágrafo único deste mesmo artigo, dizendo que aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causa do evento danoso22.
Já o artigo 14 do da Lei nº 8.078 de 1990 – CDC trabalha com a responsabilidade civil dos fornecedores de serviços. Também incluídos em responsabilidade objetiva, respondem pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Miranda (2009)23, enfatiza que, inclui-se como responsabilidade do comerciante se o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador e o mesmo não conservar adequadamente os produtos perecíveis. Sendo assim, a responsabilidade civil exercida pelo comerciante também é objetiva.
Portanto, para haver a responsabilidade do fornecedor é necessário, além é claro, do defeito e do nexo de causalidade entre este e o dano sofrido pelo consumidor, que o produto entre no mercado de consumo de forma voluntária e consciente.
3.2 Responsabilidade Civil dos Fornecedores pelo Vício do Produto
A responsabilidade civil dos fornecedores pelo vício do produto é um tema de extrema relevância para a sociedade e para o meio jurídico. De acordo com a legislação tanto o Código Civil como o Código de Proteção e Defesa do Consumidor a possível reparação por produtos viciados, seja de fácil constatação ou vícios ocultos, encarregando o fornecedor da obrigação de reparar.
Segundo os artigos 12 e 18 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor24, o fornecedor tem a responsabilidade de reparar o dano recorrente do fornecimento de produto ou serviço, não sendo necessário apurar culpa, porque de acordo com a teoria do risco a atividade econômica impõe já um risco ao fornecedor.
Da responsabilidade no Código de Proteção e Defesa do Consumidor surgiram duas linhas: a do fato do produto ou serviço (vício extrínseco ou causador de um acidente de consumo), por inadequação decorrente da insegurança que o produto ou serviço proporciona ao consumidor; e a do vício do produto ou serviço (vício intrínseco, em face de um defeito notório, de fácil constatação ao oculto), por inadequação que encontra na impropriedade econômica (compreendendo- se aqui a funcionalidade e destinação) do produto ou serviço25.
A segunda é a que interessa a este trabalho, mais especificamente o vício do produto. Para Lisboa:
O vício do produto acarreta prejuízo econômico ao consumidor, pois ele acaba adquirindo ou se utilizando de um bem que não lhe concede a adequação que ordinariamente se poderia esperar, causando-lhe um dano patrimonial. Trata-se, como se pode perceber, de mais uma orientação fundamentada no princípio da boa-fé objetiva, como norma geral de conduta, graças à adoção da teoria da confiança contratual, por parte do legislador consumerista26.
Sendo assim, cabe o fornecedor entregar ao consumidor o produto para uso adequado e eficiente, respondendo este por eventuais vícios que surgirem e tornarem o produto inadequado, inapropriado para utilização e consumo.
Para Lisboa (2006. p. 218)27 nos vícios dos produtos caberá a responsabilidade objetiva e por isso que o mesmo diz que a responsabilidade objetiva: “encontra-se devidamente adaptada à realidade social, viabilizando a efetiva percepção da reparação do dano em favor da vítima e a tutela dos interesses individuais, coletivos e difusos”.
Importante, também, se faz salientar que existem pressupostos para responsabilidade pelo vício, que segundo Almeida (2011. p. 101) diz que:
a) Aquisição, pelo consumidor, de produto colocado no mercado de consumo, de fabricante ou de vendedor, ou contratação de serviço; b) A ocorrência de vício de qualidade ou quantidade que comprometa a funcionalidade do produto ou serviço ou lhe diminua o valor; c) Que a reclamação acerca do vício ocorra dentro do prazo fixado em lei, ou seja, trinta dias para serviços e produtos não duráveis e de noventa dias para serviços e produtos duráveis, iniciando-se o prazo a partir da entrega efetiva do produto ou da conclusão do serviço, ou de sua constatação, tratando-se de vício oculto28.
Ou seja, é uma sucessão de fatos que devem ser observados para que se caracterize a responsabilidade do fornecedor pelo vício do produto, sem deixar de lado os prazos que o Código de Proteção e Defesa do Consumidor estabelecem juntamente com as regrinhas para os tipos de produto.
Notadamente, os produtos colocados no mercado devem ser adequados aos fins que se destinam, deve funcionar bem, atender às justas expectativas do consumidor. Portanto, pode-se considerar produto impróprio ao consumo quando por qualquer motivo se revele inadequado.
Desta forma, para que haja responsabilidade civil é necessária a prática de um ato ilícito, o acontecimento de uma consequência danosa e, ainda, a existência de uma relação de causa entre ato e consequência. Não sendo diferente nas questões de relação de consumo, apenas, o respaldo legal é dado por legislação própria de consumo, não impedindo à recorrência a legislação civil29. No momento atentemos, pois, para a previsão legal da responsabilidade dos fornecedores por vício no produto, trazida pela lei 8.078/90:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária respeitada as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas30.
Dessa maneira, percebe-se que a legislação é taxativa em ordenar que a havendo culpa ou não, o dano deve ser reparado. Entende-se então que a responsabilidade em relação aos danos causados ao consumidor por vício no produto é objetiva, dessa forma, sendo necessário apenas a manifestação do nexo causal entre ação ou omissão e o resultado danoso, desconsiderando assim, a demonstração de dolo ou culpa.
Todavia, o dever de reparar o produto viciado, seja por ação ou omissão que torne o produto inadequado para o uso, sendo intencional ou não, existirá o dever de reparar. O Manual do Consumidor (2008. p. 67) aponta um detalhe importante acerca da responsabilidade pelo vício do produto:
Um aspecto importante diz respeito à responsabilidade solidária entre os fornecedores pelos vícios dos produtos: tanto o fabricante quanto o comerciante ou qualquer outro integrante do ciclo de produção do bem estão, igualmente, obrigados a efetuar os reparos nos produtos, proceder à devolução do dinheiro, substituir o produto ou efetuar abatimento proporcional do preço. Portanto, eventual ação ou reclamação nos órgãos de proteção dos direitos do consumidor pode ser dirigida contra o lojista, fabricante distribuidor ou qualquer outro fornecedor da cadeia ou contra ambos31.
Além disso, deve-se observar a vida útil dos produtos a fim de conferir o limite temporal da contagem do prazo de reclamação em caso de vício oculto, o que de certa forma, traz a existência prazos benéficos ao consumidor, uma vez que este é a parte vulnerável e hipossuficiente.
Dessa forma, pode-se concluir que existe a possibilidade de responsabilidade civil do fornecedor pelo vício do produto, diante dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais decorrentes das relações de consumo e pelo fornecimento de produtos inadequados para o consumo, sendo que a aplicação da responsabilidade será arbitrada não só de acordo com o Código Civil como também pelo próprio Código de Proteção e Defesa do Consumidor.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a análise do presente estudo, foi verificado que a incidência do Código de Defesa do Consumidor teve grande importância para o ordenamento jurídico, porém mesmo buscando proteger ao máximo a parte hipossuficiente da relação, ainda deixou algumas lacunas que dificultam seu entendimento.
Acerca da responsabilidade dos fornecedores obtemos que o código adotou a responsabilidade objetiva nas relações de consumo de modo que os fornecedores respondem independentemente de culpa. Ainda em relação aos fornecedores foi demonstrado que eles respondem de forma solidária em várias hipóteses, com exceção aos comerciantes que somente responderão por fato de produtos quando não for possível identificar o fabricante, o construtor, o importador ou quando o produto não possuir identificação clara sobre quem seja seu fornecedor mediato.
Além disso, a responsabilidade civil do fornecedor pelo vício do produto nos mais abrangentes sistemas de nossa sociedade contemporânea vem que a relação entre o direito do consumidor e a responsabilidade civil advém da própria relação entre seus objetos de estudo: as relações de consumo e o deve de reparar.
Com base nesses elementos devemos nos ater na proposta do equilíbrio como forma mantenedora das relações de crescimento e desenvolvimento com consciência e razoabilidade de valores dos bens sociais, políticos e econômicos.
Pretendeu-se também estudar a viabilidade e aplicação da responsabilidade civil sobre o fornecedor diante do vício do produto, bem como, apresentar os mecanismos legais já existentes que refletem ou condizem com a implementação destas práticas, devido a gritante situação nas relações de consumo a que já estamos submetidos.
Portanto, foi possível perceber que a reparação do produto viciado é plenamente possível de efetivação, fundado na solidariedade dos fornecedores, ou seja, de uma participação coletiva dos lojistas, fabricantes, distribuidores, para que não reste prejudicado o pleito do consumidor quanto a reparação do produto viciado.
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1Acadêmica de Direito. Artigo apresentado a Faculdade Interamericana de Porto Velho-UNIRON, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Porto Velho, 2022.
E-mail: joycekaline2404@gmail.com
2Acadêmico de Direito. Artigo apresentado a Faculdade Interamericana de Porto Velho-UNIRON, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Porto Velho, 2022.
E-mail: matheusdasilvasousa43@gmail.com
3Acadêmico de Direito. Artigo apresentado a Faculdade Interamericana de Porto Velho-UNIRON, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Porto Velho, 2022.
E-mail: ernestoliveira007@hotmail.com
4Acadêmico de Direito. Artigo apresentado a Faculdade Interamericana de Porto Velho-UNIRON, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Porto Velho, 2022.
E-mail: juliocesar.1564@gmail.com
5Profª. Orientadora (Doutora). Professora de Direito.
E-mail: vera.aguiar@uniron.edu.br