REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7103518
Autora:
Rani Gomes Gedeon
RESUMO
A violência doméstica e familiar contra a mulher, apesar de significativos avanços legislativos e de políticas públicas, ainda é uma situação que assola muitas famílias brasileiras, tendo aumentado sua incidência com a pandemia do Covid-19, uma vez que com o isolamento, dificultou-se ainda mais a visibilidade.
Desse modo, é importante a difusão de informações para que as vítimas de violência doméstica possam se resguardar e assegurar seus direitos, bem como para que a população, mulheres e homens, saibam como proteger tais vítimas.
INTRODUÇÃO
A violência doméstica e familiar contra a mulher é protegida pela Lei nº 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, a qual recebeu este nome em homenagem à cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que foi agredida pelo marido durante seis anos. Foi a história desta Maria que mudou as leis de proteção às mulheres em todo o país.
Maria da Penha Maia Fernandes, em 1983, foi vítima de tentativa de homicídio por parte de seu então marido, em Fortaleza/CE, o que resultou em sua paraplegia irreversível, bem como outros traumas físicos e psicológicos.
Apesar da denúncia pelo Ministério Público em 1984, passados 15 (quinze) anos, a Justiça Brasileira ainda não havia chegado à condenação definitiva do réu, que esteve em liberdade durante todo esse tempo.
Assim sendo, Maria da Penha denunciou o caso a Comissão Internacional de Direitos Humanos e, em 2001, a CIDH declarou o Estado brasileiro responsável pela violação do direito da vítima à proteção judicial, sendo feitas diversas recomendações.
Entre as recomendações cumpridas pelo Brasil está a criação da Lei Maria da Penha, no ano de 2006, grande avanço legislativa no resguardo dos direitos e garantias das vítimas de violência doméstica e familiar.
Isso porque, antes da promulgação da Lei 11.340/2006, as vítimas de agressão eram amparadas apenas pela Lei n. 9.099/95, que regula os crimes de menor potencial ofensivo, de modo que na maioria dos casos a pena do agressor era convertida em prestação de serviços à comunidade.
A legislação atual protege todos os tipos de violência: a física, psicológica, moral, sexual e patrimonial. Importante atentar-se que o sujeito passivo da violência doméstica objeto da Lei Maria da Penha é a mulher, já o sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade, além da convivência, independentemente de coabitação.
Apesar dos avanços legislativos, os índices de violência doméstica e familiar ainda são elevados, tendo aumentado durante a pandemia do Covid-19, de modo que visa-se por esse estudo, apresentar soluções práticas para a proteção das vítimas, sendo este um papel coletivo.
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR DURANTE A PANDEMIA DO COVID-19
Durante a pandemia do Covid-19, em razão do isolamento social e do confinamento aos quais a população está submetida, a violência de gênero aumentou exponencialmente em todo país.
Isso porque, devido ao crescimento das tensões em casa e ao isolamento das mulheres, somado com o fato de termos menos pessoas nas ruas, menos contato com parentes, amigos ou vizinhos devido ao isolamento social, as mulheres vítimas de violência doméstica estão enfrentando obstáculos adicionais para fugir de situações violentas ou acessar ordens de proteção, se sentindo “presas” aos seus companheiros.
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), em parceria com a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos (ONDH), informou que nos meses de fevereiro, março e abril de 2020 o número de denúncias de violência doméstica teve um aumento de 14,12% comparado com o mesmo período de 2019. Do mesmo modo, o número de denúncias registradas pelo Ligue 180 em março de 2020 foi 17,89% maior do que no mesmo mês de março de 2019.
Nos outros países, o aumento também restou evidenciado, tal como Estados Unidos, Índia e União Europeia, com a estimativa de que a cada três meses da implementação das medidas de restrições de circulação e de fechamento de serviços não essenciais possam gerar 15 milhões de novos casos de violência doméstica, o que representa um aumento de 20%.
Tal identificação e detecção dos casos de violência doméstica e familiar tornou-se difícil até mesmo pelos profissionais de saúde, os quais tiveram que desenvolver estratégias de criação e manutenção de vínculos de confiança e de fornecimento de proteção da vítima, com a utilização de sinais/palavras-código e a elaboração de planos de segurança.
Casa, portanto, para muitas mulheres, não é sinônimo de proteção, mas de violência.
Desse modo, diante de eventos críticos, é esperável que as vulnerabilidades da população atingida aumentem, assim como os recursos diminuam, sendo fundamental a construção de planos de ação e políticas públicas que permitam a proteção das vítimas.
MEIOS DE RESGUARDAR OS DIREITOS DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Sendo vítima, o primeiro passo é saber como identificar essa violência. Ela apresenta um padrão cíclico, com atitudes que costumam se repetir, cada vez com maior violência e menor intervalo entre as fases, vejamos:
1º estágio: TENSÃO (humilhações, ofensas e provocações)
2º estágio: EXPLOSÃO (sexo forçado, tapas e socos)
3º estágio: LUA DE MEL (juras de amor, pedidos de desculpas, promessas e presentes)
Reconhecendo essa violência, o ideal éprocurar ajuda o mais rápido possível. Comunique para alguém de sua família, por mais que possa ser intimidador, é importante que um terceiro esteja ciente dessas agressões e possa lhe ajudar, proteger e encorajar.
Depois, você pode procurar entidades de apoio e grupos voluntários. Bem como, pode e deve ir a uma delegacia para fazer um registro de boletim de ocorrência e requerer medidas protetivas de urgência, as quais podem ser:
I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas;
II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
As denúncias poderão ser efetuadas pelo telefone ou online, consoante números e site disponibilizados ao fim do texto.
Outra opção, para quem morar em São Luís/MA, é a Casa da Mulher Brasileira, onde funciona 24h, com apoio psicossocial, delegacia especializada, alojamento temporário, promotoria, defensoria, e serviços de saúde.
Ademais, vale citar uma campanha bem interessante realizada pelo Conselho Nacional de Justiça e apoiada pelo Tribunal de Justiça do Maranhão, é a do Sinal Vermelho contra a violência doméstica. Com o desenho de “X” vermelho na mão, exibido nas farmácias, a vítima pode pedir socorro e os atendentes e farmacêuticos deverão acionar as autoridades competentes em seu auxílio.
Essa iniciativa é muito louvável, tendo em vista a dificuldade que é para muitas mulheres denunciarem a violência doméstica. Por exemplo, depois de fortes agressões sofridas, vão aos hospitais, mas sequer contam o real motivo, porque muitas vezes estão acompanhadas pelo próprio agressor. Assim, essa é uma forma mais discreta e que do mesmo modo irá chamar atenção das autoridades responsáveis.
Você tem muitas opções, lembre-se que não está sozinha. E recorde-se também do ciclo que expus, mesmo depois da fase da reconciliação, provavelmente a da agressão vai voltar!
Em segundo lugar, caso você seja testemunha de alguma violência ou de qualquer forma queira ajudar a combater essa violência de gênero, você também possui muitas alternativas para isso. Ajudando, denunciando, compartilhando informações nas suas redes sociais, conversando sobre isso com seus grupos de amigos, chamem sempre atenção para esse assunto. Seja você mulher ou homem.
Para os homens, é importante que não perpetuem e repreendam atitudes machistas, e se sensibilizem com a causa.
Afinal, é necessário que esses direitos e campanhas cheguem às mulheres vítimas e que elas se sintam acolhidas e protegidas.
Inclusive, recentemente foi promulgada uma Lei do Estado do Maranhão que obriga condomínios residências a comunicar à polícia casos de violência doméstica contra as mulheres, crianças, adolescentes e idosos, devendo esta legislação ser fixada nas áreas de uso comum dos condomínios.
Ademais, caso se interesse, você também pode participar de redes de apoio de voluntariadas, tal como o programa nacional intitulado Justiceiras, liderado pela promotora de justiça de São Paulo, Dra. Gabriela Manssur, o qual é uma rede de acolhimento para as vítimas de violência de gênero. Há uma prestação de orientação online, e para se voluntariar você pode ser bacharel em direito, psicólogo ou assistente social. Já são mais de 600 (seiscentos) mulheres ajudadas pelo projeto, e 2000 (dois mil) voluntárias.
CONCLUSÃO
Ao analisar a situação de violência doméstica e familiar no Brasil, é importante que cada pessoa saiba seu importante papel de combate nessa luta que é coletiva.
Como vítima, essencial a informação de que a violência é cíclica, sendo fundamental a procura de ajuda desde o primeiro instante, que pode ocorrer desde entre vizinhos, como à autoridade policial/judicial.
Como sociedade, necessário saber como resguardar os direitos de tais vítimas, seja pela exclusão de comportamentos machistas, bem como por participação em grupo de voluntariados.
O Estado, a família e a sociedade caminhando juntos irá, sem dúvidas, evidenciar a ocorrência da violência doméstica familiar e resguardar o direito e tantas famílias, afinal, em briga de marido e mulher, se mete a colher sim!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS. Coronavírus: sobe o número de ligações para canal de violência doméstica na quarentena. 27 mar. 2020.
AGÊNCIA BRASÍLIA GDF reforça combate à violência doméstica durante isolamento Disponível em: . Acesso em: 21/05/2020.
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ROCHA, Pâmela. Isolamento social e o aumento da violência doméstica: o que isso nos revela? 2020. Disponível no site: https://www.scielo.br/j/rbepid/a/tqcyvQhqQyjtQM3hXRywsTn/?lang=pt . Acessado em 10 de junho de 2020.
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