A APLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA EM CASOS DE PORNOGRAFIA DE VINGANÇA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7093136


Autor:
Michael Douglas Ferreira de Araújo1
Robinson Brancalhão da Silva2


RESUMO

Este estudo tem por objeto de investigação: A aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de pornografia de vingança, sob a perspectiva do Direito penal com o intuito de examinar as conjecturas que retratem as questões da dignidade da pessoa humana. No Brasil, há um crescimento dos casos de pornografia por vingança, normalmente sendo cometido por companheiros da vítima dentro da vida doméstica. Muitos são os casos de ex companheiros que não aceitam o fim do relacionamento e expõe ou apenas ameaça a vítima a essa situação. Assim esta pesquisa tem como objetivo analisar a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de Pornografia de Vingança em razão do avanço tecnológico. O referencial teórico utilizado, ocorreu través de pesquisas na temática: Lei Maria da Penha e pornografia de vingança. Trata-se de uma pesquisa qualitativa com estudo caso exploratório e bibliográfico. Os resultados demonstram que a Lei Maria da Penha precisa ser aprimorada para punir as pessoas que divulgam imagem íntimas de outrem na internet.

Palavras-chave: Lei Maria da Penha. Mulheres. Pornografia de Vingança.

ABSTRACT

This study aims to investigate: The applicability of the Maria da Penha Law in cases of revenge pornography, from the perspective of criminal law in order to examine the conjectures that portray the issues of human dignity. In Brazil, there is a growth in cases of revenge pornography, usually being committed by the victim’s companions within domestic life. There are many cases of ex-partners who do not accept the end of the relationship and expose or just threaten the victim to this situation. Thus, this research aims to analyze the applicability of the Maria da Penha Law in cases of Vengeance Pornography due to technological advances. The theoretical framework used occurred through research on the theme: Maria da Penha Law and revenge pornography. This is qualitative research with an exploratory and bibliographic case study. The results demonstrate that the Maria da Penha Law needs to be improved to punish people who disclose intimate images of others on the internet.

Keywords: Maria da Penha Law. Women. Revenge porn.

1. INTRODUÇÃO

Quando uma mulher sai de casa durante o dia, ela não está só preocupada nas atividades que terá de executar. Um medo constante a cerca por todos os lados. Começa com as “piadinhas” nas ruas que a rebaixam a categoria de objeto. Então, quando comenta com alguém sobre a situação, algumas vezes há quem sugira mudar o modo de vestir, de andar, de ser quem é. Essa mesma mulher, traz em sua história de vida adaptações de comportamentos que acreditam ser necessários a “uma mulher de respeito”. Se já não fosse suficiente lidar com inúmeros abusos, as mulheres viram nascer uma nova violência denominada de pornografia de vingança.

A internet é um ápice de mudança dentro da sociedade, em que se desenvolveu um novo método de comunicação, tendo como funcionalidade vários benefícios, revolucionando a interação entre as pessoas (SOUZA e CARVALHO, 2019).

Assim, essa evolução tecnológica abriu diversas vertentes, contribuindo para o desenvolvimento de ferramentas, aplicativos de compartilhamento de notícias e mensagens instantâneas que propiciarem a propagação de crimes virtuais, considerando que as pessoas dispõem de fácil acesso a smartphones e tablets, e o conteúdo produzido pode ser facilmente compartilhado (SOUZA e CARVALHO, 2019).

Conforme aponta o autor Kohlrausch (2017) trata-se de “pornografia de vingança” ou revenge porn a violação dos direitos à intimidade e à privacidade de uma mulher, devendo ser abalizado com uma das formas de violência de gênero, especialmente quando advém da divulgação de material íntimo por parte do parceiro e/ou ex-parceiro na internet.

Assim, a pornografia de vingança surge na divulgação de fotos ou vídeos que possui caráter sexual, sem o conhecimento da vítima ali exposta, com o único fundamento de comprometer a honra da pessoa sendo motivado por vingança.

Desse modo, o problema desta pesquisa é: Como têm sido a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em crimes virtuais? Como os tribunais têm discutido acerca do aumento da Pornografia de Vingança no Brasil?

Ademais, em razão dessa problematização levantou-se três hipóteses: a) O crescimento da pornografia por vingança no Brasil se tornou inevitável, tendo em vista o avanço da tecnologia e o acesso livre para um número significativo de pessoas; b) A aplicabilidade da Lei Maria da Penha pode ser eficaz para crimes de pornografia na internet; c) A exposição da intimidade de mulheres na internet tem as deixado vulneráveis.

Considerando as hipóteses, o objetivo geral da presente pesquisa é analisar a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de Pornografia de Vingança em razão do avanço tecnológico e a tipificação dos crimes cibernéticos. Para que esse objetivo geral fosse alcançado, define-se como objetivos específicos: conceitualizar o papel da mulher na sociedade durante a história; abordar a pornografia de vingança sob aspecto jurídico e psicológico; analisar a Lei Maria da Penha; esclarecer a aplicabilidade da Lei Maria da Penha nos crimes cibernéticos.

A motivação para elaboração do presente projeto surgiu observando o atual cenário de crescimento da violência doméstica e pelos novos meios de prática dessa violência como é o caso da pornografia de vingança. Posto isto, o artigo busca apresentar as definições e instrumentos para aplicabilidade da lei, a fim de orientar a sociedade sobre o tema.

Dessa maneira, a metodologia dessa pesquisa é descritiva, qualitativa, exploratória e bibliográfica. Conforme aborda o autor Malhotra (2001) a pesquisa exploratória é empregue para   definir o problema com maior cuidado, o seu principal objetivo é prover critérios e compreensão da temática estudada.

Já a pesquisa descritiva expõe as características de determinada população ou fenômeno, estabelece correlações entre variáveis e define sua natureza (VERGANA, 2000). No caso desse estudo utilizamos o fenômeno do uso da pornografia por vingança.

Além disso, está pesquisa é de caráter qualitativo que apresenta o aprofundamento da investigação das questões relacionadas ao fenômeno em estudo e das suas relações, mediante a máxima valorização do contato direto com a situação estudada.

Já em relação à pesquisa bibliográfica, evidencia-se que todo trabalho científico, toda pesquisa, precisa do apoio e do embasamento na pesquisa bibliográfica, para que não se desperdice tempo com um problema que já foi solucionado e possa chegar a conclusões inovadoras, ou seja, a pesquisa de cunho bibliográfico é primordial para a academia (LAKATOS & MARCONI 2001).

A partir disso, o presente estudo se dividiu em capítulos o primeiro aborda uma análise histórica das mulheres no Brasil propondo demonstrar como era a submissão delas no ambiente familiar. O segundo abrange o conceito de pornografia por vingança apresentando como subtópico Casos de pornografia de vingança no brasil, além disso, expõem-se também jurisprudências acerca da temática; Lei maria da penha e Código Penal; Espaço virtual e a violação da intimidade como subtópicos.

2. ANÁLISE HISTÓRICA DA SUBMISSÃO DAS MULHERES NO BRASIL

No Brasil as mulheres, eram submissas aos homens, principalmente no século XVI, aos quais cabia o provimento das necessidades materiais do lar, visto que, as mulheres eram restringidas à esfera privada, no qual os homens se preparavam e supriam todas as suas necessidades para poderem ser cidadãos livres da esfera pública, considerando as mulheres não possuíam direito algum (PEDRO e GUEDES, 2010).

Em razão do fato apresentado Arendt (1989) renomada filósofa política escreveu: que na Grécia a esfera familiar os homens eram unidos por suas necessidades e carências, as mulheres eram vistas como donas do lar, era portanto, a necessidade que reinava sobre todas as atividades realizadas no lar, a esfera da polis, onde somente os homens tinham acesso era a considerada a esfera da liberdade e se havia uma relação entre essas duas esferas era que a vitória sobre as necessidades da família constituía a condição natural para a liberdade na polis.

Este fato histórico da Grécia apontado por Arendt retrata as questões no Brasil, pois, de certa maneira as mulheres eram vistas da mesma forma, e até os dias atuais, muitas mulheres se sentem oprimidas e acreditam que devem ser submissas aos seus companheiros (ARENDT, 1989)

Conforme Silva e Pinheiro (2017) de fato a   ocorrência  da  violência  de  gênero já era presente nas épocas  mais  primitivas  da convivência  humana,  bem  como à sua  persistência e  crescente  aumento  de  incidência no  período contemporâneo, vários estudiosos lançaram mão de parâmetros e conceitos científicos na tentativa de elucidar as dimensões desse problema, por isso mais do que nunca discutir a temática é fundamental.

Mediante isso, é possível afirmar que as relações de gênero estão situadas no patriarcado e pressupõem a determinação das funções sociais, ou seja, a sociedade constrói uma identidade social, que é realizada por meio de distintos papéis que são atribuídos a homens e a mulheres (PEDRO e GUEDES, 2010).

Visto que, a luta das mulheres retratada a libertação de um senso moral construído pela cultura machista, cristalizada durante séculos que deixava as mulheres presas um sistema de inferioridade (PEDRO e GUEDES, 2010). No entanto, não se trata apenas pela igualdade econômica e política que as mulheres conquistam seu espaço; mas são, também, em razão do desenvolvimento de uma sociedade livre de relações preconceituosas e discriminações. Trata-se de uma luta pela liberdade, para além da equiparação de direitos, e pelo respeito à alteridade (PEDRO e GUEDES, 2010).

Outro ponto importante é elencado por PINAFI (2007), é que no Brasil Colônia, a educação que era transferida pela Igreja Católica Romana não se estendia às mulheres, destaca-se que nesse momento da história, a igreja afirmava que a mulher devia ser sujeita primeiramente ao seu pai, e posteriormente ao marido o servindo sem se preocupar com questões externas, somente com seu lar cozinhando, limpando e cuidando dos filhos.

Assim, a mulher para a sociedade em geral era tida pelo catolicismo como pecadora, profana e causadora do banimento do homem do paraíso, e portanto, deveria a submissão e deveres ao homem (PINAFI, 2007)

Este pensamento é fundamental para compreendermos o motivo para acontecer o crime de pornografia por vingança.

3. O CONCEITO DE PORNOGRAFIA POR VINGANÇA

De acordo com Crespo (2011) a internet surgiu na década de 60, porém naquele período o seu uso era inerente as Forças Armadas norte-americanas, a intenção era fazer com que a rede de internet não parasse de funcionar, pois, os ajudaria a ganhar uma possível guerra, desde desse momento a internet promoveu diversos benefícios, porém, também malefícios como os crimes virtuais.

Contudo, de acordo com Kohlrausch (2017) recentemente tem surgido uma nova modalidade criminosa intitulada de pornografia de vingança.

Portanto, pode ser definida como a prática de publicar na internet imagens e/ou vídeos que mostrem nudez ou conteúdo sexual explícito, sendo ou não acompanhados de informações que visam demonstrar antigos ou atuais parceiros sem o consentimento deles (BAMBAUER, 2014).

Outra definição fundamental para esta pesquisa é a da Ministra Nancy Andighi (2018) por meio do recurso n° 1679465/SP, da 3° turma do Superior Tribunal de Justiça, ela define pornografia de vingança como  a propagação de material íntimo ou sexual de maneira não autorizada, essa propagação também  recebeu o nome de exposição pornográfica não consentida, por motivos de ser algo que atualmente tem sido comum em casos de fim de relacionamento, quando as partes colocam o material que foi produzido durante uma relação nas redes sociais, como uma forma de punir à outra pelo encerramento do laço afetivo, assim entende-se que esta exposição trata-se de uma vingança.

Dessa maneira, é possível afirmar que a pornografia de vingança demonstra um traço negativo que veio junto ao nível de alcance conseguido através da internet. Observa-se que atualmente se uma imagem cai na rede, ela pode ser acessada de qualquer lugar e, inclusive resgatada em qualquer momento, ainda que se passem meses e anos (FREITAS, 2015).

3.1 Casos de pornografia de vingança no brasil

Moradora de Maringá do norte do estado do Paraná, a jornalista Leonel que tinha 41 anos, em 2005, teve suas fotos íntimas expostas pelo seu ex-namorado após o fim de relacionamento com Eduardo Gonçalves Dias que durou quatro anos, em razão disso, perdeu amigos, emprego e, chegou a pedir ao filho mais velho que fosse embora do Brasil junto com o pai para que ele não sofresse (JUSTI, 2011).

Após a vítima ter ficado traumatizada, ocorreu a condenação que  foi somente após 6 anos do ocorrido que seu ex sofreu “penalidades” sendo condenado por injúria e difamação em razão das fotos íntimas de Leonel terem sido publicadas na internet, além disso, o que foi muito pouco pelo sofrimento psicológico e emocional que a vítima sofreu ele teve que pagar uma indenização mensal durante um ano e onze mês no valor de R$ 1.200, 00 e prestar serviços comunitários, ressalta-se que decisão ocorreu em segunda instância (JUSTI, 2011).

Diferentemente do caso da jornalista Leonel, um empresário divulgou vídeos de sexo de uma estudante de 20 anos conhecida como Fran, porém, após o julgamento o caso foi encerrado mediante acordo proposto pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) para prestar serviços comunitários por cinco meses (G1, 2014). Na entrevista para o G1 Fran afirma: “A vida dele continua normal. Quem sofreu as consequências fui eu. Eu quero que o meu caso sirva de lição para outras meninas. que passem pelo que eu passei. Eu fui bastante forte em lidar com essa situação, mas várias meninas não” (G1, 2014).

3.2 Entendimento jurisprudenciais

Em um primeiro momento é importante deixar claro que há maioria dos entendimentos jurisprudenciais refere-se ao âmbito civil, se tratando de danos patrimoniais ou não patrimoniais, poucos estão no âmbito penal.

Logo, será pontuado um entendimento do âmbito civil e outro do penal. O primeiro que se segue trata-se de uma ação de indenização, divulgação de fotos íntimas na internet sendo que foi considerado pornografia de vingança.
A divulgação na internet, para conhecido e desconhecidos, de imagens de ex-namorada nua após o término do relacionamento, caracteriza a chamada pornografia de vingança (“revenge porn”) e consubstancia violência moral contra a mulher no âmbito de relação íntima de afeto, a qual foi prevista pelo legislador nacional no art. 5°, III, c/c art. 7°, V, da Lei 11.340/2006 (“Lei Maria da Penha”), ensejando a reparação por dano moral in re ipsa. Apresentada robusta documentação pela Autora no sentido da responsabilidade do Réu pela exposição das imagens e não tendo o demandado se desincumbido do ônus que o art. 373, II, do CPC, lhe impõe, a condenação a pagar indenização compensatória do dano moral é medida que se impõe. Reconhecido o dever de indenizar, o Juiz deve fixar o montante da reparação atendo-se à reprovabilidade da conduta, à intensidade e à duração do sofrimento da vítima e à capacidade econômica das partes, podendo, ainda, aplicar indenização punitiva quando o comportamento do agressor se revelar particularmente censurável. Assim, a despeito dos elementos que impelem à fixação de indenização em patamar elevado, impõe-se, no caso dos autos, a redução do quantum indenizatório arbitrado na sentença, com o fim de adequá-la aos parâmetros anteriormente mencionados. Apelação Cível parcialmente provida (BRASIL, 2017).

Em seguida tivemos uma apelação penal:

APELAÇÃO – PENAL E PROCESSO PENAL – AMEAÇA – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – TÉRMINO DA RELAÇÃO CONJUGAL – ALEGADA INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO – CONFIGURAÇÃO DO VÍNCULO DE AFETIVIDADE – AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS – CONDENAÇÃO MANTIDA – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE – IMPOSSIBILIDADE – NÃO PROVIMENTO (BRASIL, 2017).

Neste caso, tratou-se de um término da relação conjugal, que de fato, competência para investigar o crime não é alterada, pois qualquer ato de agressão por parte de pessoa que coabite com a vítima, seja ela coabitante ou não, é suficiente para constituir violência doméstica, desde que haja indícios de que o arguido cometeu crime de ameaça. Um pedido de absolvição é inaceitável. Não há menção à restrição de direitos em substituição à prisão nos casos de crimes cometidos no âmbito da violência doméstica, por não atender aos requisitos dos arts. 44, I, Código Penal. Devidamente negado provimento ao recurso de defesa em razão do arranjo de provas e da aplicação da lei penal (BRASIL, 2016).

A partir disso, observa-se que as experiências  concretas  demonstram  que  a  liquidez  característica  das plataformas  de  internet,  possuem alto  poder  destrutivo,  que acabam reafirmando  violações  já observadas  no mundo  presencial,  a  exemplo  de  outras  formas  de violência psicológica  e  moral de gênero (SILVA e PINHEIRO, 2017).

3.3 Lei maria da penha e Código Penal

Alburquerque (2022) escreveu que a Lei Maria da Penha foi criada em 7 de agosto de 2006 sendo considerada então recente, ela foi desenvolvida em razão da recomendação realizada pela OEA  (Organização dos Estados Americanos) com o objetivo de combater de maneira definitiva a violência doméstica.

De acordo com Souza e Gomes (2018) alguns dispositivos legais, como a lei Maria da Penha e o Estatuto da criança e do adolescente, poderão ser aplicadas, de acordo com o caso concreto, a fim de garantir proteção as vítimas e punição aos agressores. Também, há vários projetos de leis, com o intuito de tipificar a conduta da Pornografia de Vingança como crime, no entanto, o foco desta pesquisa é a Lei Maria da Penha.

Mediante isso, antes de falarmos sobre a Lei Maria da Penha e o Código Penal é preciso entender que a temática da violência tem recebido intenso enfoque e repercussão nos mais diferentes discursos da atualidade, seja da política, da filosofia, da psicologia, da antropologia, da sociologia, da justiça ou mesmo da religião e do senso comum, no entanto, a legislação demonstra a necessidade de assegurar mulheres vítimas de agressão sejam elas vítimas (GUIMARÃES e PEDROZA, 2015).

De acordo com o autor Souza e Carvalho (2019) o artigo 5° da Constituição Federal, tipifica a questão da privacidade dos indivíduos sendo considerado um direito de todos inviolável à intimidade, à vida privada à honra e à imagem das pessoas, sendo dessa maneira a pornografia de vingança um meio que se tornou frequente para violação do art. 5° e consequentemente da privacidade de alguém.

Mediante isso, a Lei Maria da Penha que visa proteger a mulher da violência relacionada ao gênero dispõe de um aparato que visa contribuir com segurança de mulheres, assim o Poder Judiciário utiliza disposições da Lei 11.340/2006 em busca de combater a violência contra a mulher, visto que, a pornografia de vingança está inserida nesse contexto.

“Assim, as questões de gênero, retroalimentadas nas dinâmicas social e cultural, constituem o lócus discursivo para prática de violências física, psicológica, sexual, patrimonial e moral contra a mulher, previstas no art. 7oda referida lei” (SILVA e PINHEIRO, 2017, p.247).

Conforme aponta Pedro e Guedes (2010) o desenvolvimento da Lei Maria da Penha (11.340/2006), conseguiu caracterizar o que de fato seria violência, pois, até o presente momento do seu vigor a violência era vista somente como agressões que deixassem marcar físicas visíveis como hematomas ou feridas, porém, a lei discorre sobre as diversas formas de violência caráter físico, psicológico, sexual, moral ou patrimonial. É, portanto, uma lei na qual a compreensão da violência refere-se a tudo aquilo que fere a integridade da pessoa.

Nesse sentido, a Lei 11.340/2006 foi criada por meio do movimento feminista no Brasil, na qual condenava todas as formas de violência contra a mulher. Na década de 1980, o movimento ganhou mais força à medida que aumentava o número de homens absolvidos de assassinar suas esposas por respeito à sua honra.

A brasileira Maria da Penha Maia Fernandes ficou paralisada pela tentativa de assassinato do marido. Como mencionado anteriormente, havia cada vez mais casos de maridos assassinando suas esposas em nome da honra, ao mesmo passo que quando as mulheres terminam o relacionamento o homem em nome de sua honra tenta colocar a mulher em uma posição de inferiorização por meio da pornografia por vingança, a fim de mostrar através da internet que a mulher é submissa a ele, denegrindo a imagem da mulher por meio de imagens pornográficas

A partir, disso vejamos que ao longo da história a maneira como as culturas se organizavam não tinha importância, havia sempre uma hierarquização entre o masculino e o feminino. De acordo com JusBrasil (2020), no Brasil Colonial, o homem tinha uma posição hierárquica superior as mulheres por conta do patriarcado da época, conferindo aos homens domínio e poder, sob penas de castigo, podendo chegar a assassinatos, por seus maridos que tinham devida autorização para isso conforme legislação da época.

Em razão do que se expõe os autores Souza e Carvalho (2019), pontuam que como exemplos de como se tratar tal conduta, temos os casos da vítima de menor de 18 anos que se houver mantido com o responsável, pelo vazamento do material, relacionamento íntimo, outras legislações poderão ser aplicadas, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou a Lei Maria da Penha, respectivamente. Assim, vejamos a importância de uma legislação eficaz.

Já na ótica da pornografia não consensual, que no material estão inclusos menores de idade, os envolvidos na divulgação ou compartilhamento do material podem ser responsabilizados por crimes referentes à pornografia infantil, previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Este passou por reformas em alguns dispositivos, realizadas nos anos de 2003 e 2008, uma vez que restava notória a impunidade de certos atos praticados, principalmente, com a utilização da internet (SOUZA e CARVALHO, 2019, p. 15)

Desse modo, quando falamos da Lei Maria da Penha, o projeto de lei 5.555/2013 altera a referida lei e o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940). Originalmente, ela estabelecia pena de reclusão de três meses a um ano, mais multa, pela exposição da intimidade sexual de alguém por vídeo ou qualquer outro meio, o que de fato é um progresso na legislação para punir que pratica esse ato (SOUZA e CARVALHO, 2019).

Nesse sentido, há peculiaridades no crime de pornografia de vingança que refere-se na questões de gênero pautadas no inconsciente do coletivo, não obstante aos discursos de pluralismo, tolerância e repúdio à violência de gênero (SILVA e PINHEIRO, 2017).

Dessa forma, conforme os autores Faria, Araújo e Jorge (2015) o comportamento das vítimas femininas, mesmo no contexto moderno de defesa da liberdade, é a expressão e individuação de seus próprios corpos. Isso acontece porque a subjetividade que existe no ambiente virtual também permeia a ética e suas questões de gênero relacionadas.

Ressalta-se, então que dada a perfeita adaptação do sujeito à violência de gênero e melhor aceitação das vítimas, incluindo pensamentos suicidas frequentemente observados em face de mulheres vítimas de violência, a Lei Maria da Penha é a mais adequada para lidar com esse fenômeno Tipos de crimes abrangidos por instrumentos normativos. Além disso, a referida lei mostra-se importante, pois protege melhor os menores, que são importantes membros do público nesses casos e merecem atenção profunda, especialmente devido ao momento particular de desenvolvimento psicossocial em que vivem tais vítimas.

Então, observa-se a importância da Lei Maria da Penha para o combate a pornografia virtual.

3.4 O espaço virtual a violação da intimidade

O espaço virtual, também conhecido como “Ciberespaço” é um ambiente criado de forma virtual, por meio do uso de meios de comunicação modernos, destacando entre eles a internet (RIBEIRO, 2014).

Esse ambiente é como um universo em que os internautas entram quando se conectam à rede, encontrando múltiplos usuários por meio de normas, cosmologia, programas e discursos. Essas culturas de rede são divididas em subculturas porque milhares de pessoas podem acessar o tempo simultaneamente. Toda essa comunicação é possível graças à grande infraestrutura tecnológica no setor de telecomunicações composta por cabos, fios, redes de computadores, etc (RIBEIRO, 2014).

Neste sentido, dentro do espaço virtual é desenvolvido a cibercultura sendo a forma de novas práticas culturais que se estabelecerem pelo uso de novas tecnologias principalmente dentro internet, fica claro que essas práticas como: a pornografia e a pedofilia se tornam algo cultural e comum (RIBEIRO, 2014).

E, por isso conforme aponta Cardoso (2007) é preciso pensar como no espaço virtual se conceitua e exerce a cidadania no contexto da cibercultura, visto que, a autonomia está conectada à capacidade de interação midiática e as novas tecnologias prejudicam os processos de organização social e constituição de subjetividades (CARDOSO, 2007).

Se questiona então, como exerce a cidadania e a liberdade na internet? Cardoso (2007) responde que depende da relação entre o indivíduo e as tecnologias de comunicação e, também das questões formuladas, das ferramentas que se utiliza etc.

Dessa forma, não se tem um consenso quando se pensa nas diferentes maneiras de se comunicar na internet, em razão do uso crescente de novas mídias (FARIA; ARAÚJO; JORGE, 2015)

Isto significa dizer, que o cenário atual em que se vive pode promover práticas de socialização e coesão comunitária, mas também atos de violência simbólica e psicológica, homofobia, racismo, misoginia, etc. Como é o caso da pornografia da mulher na internet (FARIA, ARAÚJO; JORGE, 2015)

Assim, apesar da falta de democratização plena da tecnologia e da conectividade no Brasil, sabe-se que o acesso à internet e a compra de dispositivos móveis com câmeras e acesso à web estão em alta. Novos sistemas operacionais e aplicativos com interfaces simplificadas tornaram esses dispositivos acessíveis a mais usuários que estão encontrando cada vez menos dificuldades para produzir, distribuir e distribuir conteúdo audiovisual (FARIA, ARAÚJO; JORGE, 2015)

Redes sociais como YouTube, Facebook e Instagram, além de aplicativos como WhatsApp, permitem que internautas cadastrados disponibilizem vídeos e imagens que podem ser acessados e compartilhados livremente (desde que não sejam censurados pelas próprias plataformas). No entanto, é importante salientar que, mesmo que o conteúdo seja removido de um determinado site, raramente é perdido. Basta que um internauta copie o material para que possa ser reproduzido em poucos segundos (FARIA; ARAÚJO; JORGE, 2015).

Considerando o que se expos sobre o espaço virtual, os mesmos autores Faria, Araújo e Jorge (2015) apresentando que esse cenário fornece o sexting cada vez mais frequente (troca de vídeos, fotos e outros conteúdos íntimos na internet) e pornografia de vingança, a distribuição não autorizada de imagens que são motivadas pelo desejo de vingança dos ex-parceiros.

Ressalta-se que as gravações geralmente são feitas em celulares e com o consentimento dos participantes, porém, não se limitam ao uso privado dos envolvidos, mas são amplamente divulgadas como forma de constranger e punir as vítimas, muitas vezes foi devido ao término de um relacionamento, uma traição, ou simplesmente querendo expor o sexual (FARIA; ARAÚJO; JORGE,2015).

Em decorrência disso, é visível que nas redes sociais, os mecanismos e proteção do usuário não acontecem como previsto em relação a defesa da vida pessoal das pessoas, pois de acordo Silva (2016), antes de tudo se fala em um direito constitucional e quem o infringe comete um crime que vai de encontro aos direitos personalíssimos de outrem.

Logo, a pornografia não consensual seja vista como um dos crimes que mais tem crescido em publicações na mídia, assim como em ações judiciais ainda é preciso medidas eficazes para combater esse crime na mídia (CANTUÁRIA e NOVAIS, 2019)

Nesse contexto, é importante dar ênfase que a terminologia da espécie do delito digital em tela, a expressão “de vingança”, não seria o termo melhor a se referir, pois nem sempre o agente ativo do delito o pratica simplesmente por vingança, pois em determinados casos nem existe relação pessoal ou afetiva com a vítima  é apenas um desejo oculto de “estragar” a vida do outrem (CANTUÁRIA e NOVAIS, 2019).

4. CONSIDERÇÕES FINAIS

Conclui-se então, a partir dos estudos que a divulgação de mensagens, fotos e/ou gravações sem consentimento demonstrando conteúdo sexual  esta associado a pornografia por diversas motivações conforme mencionado ao longo desse trabalho, além disso, observou-se que ocorre uma caracterização da violência de gênero que é presente no comportamento da pessoa que pratica o crime antes de publicar imagens ou gravações, pois ela faz julgamentos sociais, ameaça e somente após isso expõe a vítima que se encontra fragilizada.

Assim a Lei Maria da Penha, contribui de maneira significativa com o entendimento dos diversos acontecimentos que se caracterizam como pornografia de vingança, além de possibilitar o entendimento acerca da ação penal a ser tomada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARENDT, H. A condição Humana. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1989, 4ª. Edição.

BAMBAUER, Derek. Exposed. Revisão da Lei Minesota, v. 98, n. 6, p. 2025-2102, junho2013/2014.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1679465/SP. Relator: Ministra Nancy Andrighi. DJ: 13/03/2018. JusBrasil, 2018.

CRESPO, Marcelo Xavier de Freitas. Crimes digitais. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011

DE FREITAS, Kamila Katrine Nascimento. A Pornografia de Vingança e a culpabilização das vítimas pela mídia. XVII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste – Natal – RN, 2015.

G1, GOIÂNIA. Suspeito de divulgar vídeo de sexo faz acordo na Justiça, em Goiânia. G1, globo 2014.

JUSBRASIL. Dialogando com a Lei Maria da Penha. 2020.

JUSTI, Adriana. Dormia com o inimigo’, diz mulher que teve fotos publicadas pelo ex. G1, Globo. Paraná, 2011.

KOHLRAUSCH, André Rodrigo. A “pornografia de vingança” e a lei maria da penha: crime de exposição pública de intimidade sexual. Monografia apresentada para a obtenção do título de bacharel. 64f. Lajeado, 2017.

PEDRO, Claudia Bragança; GUEDES, Olegna de Souza. As conquistas do movimento feminista como expressão do protagonismo social das mulheres. Anais do I Simpósio sobre Estudos de Gênero e Políticas Públicas, p. 1-10, 2010.

SOUZA, Luísa Carla Alencar Macêdo; CARVALHO, Augusto Loureiro. Pornografia de Vingança. Anais do XVI Encontro de Iniciação Científica, v. 8 n. 1 (2019). Fortaleza.

MALHOTRA, N. Pesquisa de marketing. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos metodologia científica. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2001.

VERGARA, Sylvia C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 3.ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2000

SOUZA, Françoyse Santana; GOMES, Keit Diogo. PORNOGRAFIA DE VINGANÇA À LUZ DO DIREITO PENAL. TCC-Direito, repositório UNIVAG, 2018.

GUIMARÃES, Maisa Campos; PEDROZA, Regina Lucia Sucupira. Violência contra a mulher: problematizando definições teóricas, filosóficas e jurídicas. Psicologia & Sociedade, v. 27, p. 256-266, 2015.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro. Apelação Criminal nº 0028387-65.2013.8.19.0066, da 5 Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 23 de setembro de 2015.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Segredo de Justiça XXXXX-67.2011.8.07.0007, da 5 Turma Cível. Data de Publicação: Publicado no dia 27 de setembro de 2017.

FARIA, Fernanda Cupolillo Miana ; ARAÚJO, Júlia Silveira;  JORGE,  Marianna Ferreira.  Caiu na red  é  porn:  pornografia  de  vingança, violência de gênero e exposição da “intimidade”. Contemporanea| Revista de Comunicação e Cultura. V. 13, n. 3, p. 659-667, set.-dez. 2015, p. 659-677.

RIBEIRO, Gustavo. Outras globalizações: cosmopolíticas pós-imperialistas. Editora da universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014

CARDOSO, Gustavo. A mídia na sociedade em rede: filtros, vitrines, notícias. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007

PINAFI, Tânia. Violência contra a mulher: políticas públicas e medidas protetivas na contemporaneidade. Histórica, arquivos São Paulo, 2007

SILVA, Tairys Ialy Gonçalves. A (in) eficácia do ordenamento jurídico brasileiro no combate à pornografia de vingança. 2016. 72f. (Trabalho de Conclusão de Curso). Centro Universitário Tabosa Almeida – ASCES, Caruaru, 2016.

CANTUÁRIA, Aline Isadora Costa; NOVAIS, Joyce Lobato. Responsabilidade penal do agente diante da pornografia não consensual perante os crimes cibernéticos contra a mulher no ordenamento jurídico brasileiro.Revista científica multidisciplinar do CEAP, v. 1, n. 1, 2019.

ALBUQUERQUE, Anderson. A lei maria da penha e a “pornografia de vingança. Blog Direito da Mulher, 2022.

DA SILVA, Artenira; PINHEIRO, Rosana Barros. Exposição que fere, percepção que mata: a urgência de uma abordagem psicosociojurídica da pornografia de vingança à luz da Lei Maria da Penha.Revista da Faculdade de Direito UFPR, v. 62, n. 3, p. 243-265, 2017.


1E-mail: Michaeldouglasf08@gmail.com
2E-mail: Robinson.silva@uniron.edu.nr