NEGOCIAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: CONVENÇÃO COLETIVA E ACORDO COLETIVO E ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7092929


Autora:
Audrey Karen Prado Paixão


RESUMO

O artigo tem como objetivo analisar e compreender os aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais sobre a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho, analisando e pontuando cada um deles, suas características, semelhanças e diferenças, a forma de elaboração, conteúdo, prazo de vigência, prorrogações, entre outros. Busca-se também analisar a prevalência do negociado sobre o legislado fruto da Lei nº 13.467/2017 que alterou a CLT (Consolidação das leis do trabalho), bem como as críticas que foram feitas a essa inovação legislativa e a posição jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

Palavras-chave: Negociação coletiva, Convenção coletiva; Acordo coletivo; CLT; Jurisprudência; Supremo Tribunal Federal.

ABSTRACT

The article aims to analyze and understand the legal, doctrinal and jurisprudential aspects of the collective agreement and the collective bargaining agreement, analyzing and punctuating each of them, their characteristics, similarities and differences, the form of elaboration, content, term of validity , extensions, among others. It also seeks to analyze the prevalence of the negotiated over the legislated as a result of Law No. About the subject.

Keywords: Collective bargaining, Collective agreement; Collective agreement; CLT; Jurisprudence; Federal Court of Justice.

INTRODUÇÃO

O presente artigo terá por finalidade expor as formas de negociação coletiva cujas espécies são a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho bem como a análise sobre a posição jurisprudencial sobre a inovação legislativa que estabelece a prevalência do negociado sobre o legislado.

O artigo está dividido em 3 capítulos, o primeiro versará sobre a negociação coletiva, o segundo trata das especeis de negociação, a convenção coletiva e o acordo coletivo, apontando suas distinções e características, tais como legitimação, conteúdo, forma, vigência, duração, prorrogação, entre outros.

Por fim, será feita uma análise sobre a constitucionalidade do negociado sobre o legislado fruto da Lei nº 13.467/2017 apontando os argumentos de quem defende sua inconstitucionalidade, bem como as críticas feitas a essa alteração legislativa. Ao final será exposta a posição do Supremo Tribunal Federal com base em um caso concreto.

Para alcançar o desiderato científico proposto, será utilizada a metodologia doutrinária, legalista, e jurisprudencial.

1.   NEGOCIAÇÃO COLETIVA

A negociação coletiva atua como um dos métodos mais importantes de resolução dos conflitos coletivos de natureza trabalhista. Sendo qualificada pelo seu resultado, objetivando a realização de uma convenção ou acordo coletivo, de forma que as partes terminem conciliando seus interesses na busca pela resolução do dissídio.

A negociação coletiva enquadra-se na modalidade autocompositiva de resolução dos conflitos, mas com um viés essencialmente democrático, responsável por gerir interesses profissionais e econômicos de grande relevância social. Neste caso, não há espaço para a renuncia ou submissão, uma vez que a sua atuação deve pautar-se, essencialmente, na transação, razão pela qual também é denominada de transação negocial coletiva.

Contudo, o autor Delgado (2016) faz a ressalva de que por se tratar de uma dinâmica social relativamente complexa, a negociação coletiva também se relaciona com algumas das já citadas formas de resolução heterocompositivas, é o que se observa com a mediação, a greve e a arbitragem (embora esta ainda não seja de uso frequente no Brasil). Assim, esses três mecanismos podem ser considerados instrumentos-meios da negociação coletiva.

Por fim, a Constituição Federal estabeleceu no seu inciso VI, do art. 8º que é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas, no entanto, conforme já destacado, em que pese a referência tenha sido feita no plural, vem-se entendendo que a participação obrigatória nas negociações refere-se apenas ao sindicato profissional e surge em decorrência do princípio da tutela, que só se aplica ao empregado. Assim, podemos concluir que a participação do sindicato patronal nas negociações coletivas não é obrigatória.

A negociação coletiva constitui um instrumento negocial complexo e suas funções são as mais diversas possíveis. Alguns autores classificam suas funções em quatro espécies, quais sejam: I – geração de normas jurídicas; II – pacificação de conflitos de natureza sociocoletiva; III – função sociopolítica; IV – função econômica.

A criação de normas jurídicas ­– esta função representa o marco distintivo do Direito Coletivo do Trabalho, manifesta-se, essencialmente, através da geração de dispositivos obrigacionais que irão dirigir-se aos sujeitos da própria negociação efetivada.

A pacificação de conflitos de natureza sociocoletiva – em que a negociação coletiva, na modalidade de autocomposição, apresenta-se como o mais importante instrumento pacificatório. A função sociopolítica – representa um dos mais relevantes mecanismos de democratização de poder no âmbito social. Por fim, a função econômica – representa a aptidão que a negociação coletiva possui para adequar a realidade econômica de mercado às relações de trabalho.

2.   DIPLOMAS NEGOCIAIS COLETIVOS: ACORDO COLETIVO E CONVENÇÃO COLETIVA

2.1 Convenção coletiva

A CLT, em seu artigo 611, caput, define a convenção coletiva de trabalho como sendo o acordo de caráter normativo, mediante o qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis no âmbito das respectivas representações às relações individuais de trabalho.

Segundo Maurício Godinho Delgado (2016), a convenção coletiva é resultado de negociações entabuladas pelas entidades sindicais dos empregados e a dos respectivos empregadores envolvendo, portanto, a categoria econômica. E embora sejam de origem privada, criam regras jurídicas (normas autônomas), isto é, preceitos gerais, abstratos e impessoais dirigidos a normatizar situações ad futurum, correspondendo à noção de lei em sentido material.

Entretanto, do ponto de vista formal, as convenções coletivas de trabalho iniciam-se como acordos de vontade entre sujeitos coletivos sindicais e inscrevem-se na mesma linha genérica dos negócios jurídicos privados bilaterais e plurilaterais (DELGADO, 2016).

Deste modo, as convenções coletivas carregam dubiedade estrutural, uma vez que são contratos sociais e privados, mas que também produzem regras jurídicas e não apenas cláusulas obrigacionais.

2.2 Acordo Coletivo

Em relaçao ao acordo coletivo, a CLT também traz sua definição no §1º do Art.611, ao dispor que os sindicatos representativos de categorias profissionais podem celebrar acordos coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, estipulando as condições de trabalho que lhes serão aplicáveis.

Para o autor Maurício Godinho Delgado (2016), o acordo coletivo pode ser definido a partir do texto da Carta Magna de 1988, como o pacto de caráter normativo pelo qual um sindicato representativo de certa categoria profissional e uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica estipulam condições de trabalho aplicáveis no âmbito das respectivas empresas às relações individuais de trabalho.

Mais uma vez, ressalte-se, que apesar  da Constituição Federal de 1988, estabelecer como obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas, a interpretação hoje, já pacífica, é a de que somente é obrigatória a participação dos sindicatos obreiros e não do sindicato patronal.

2.3  Distinções entre Acordo Coletivo e Convenção Coletiva

As duas figuras juridicas distinguem-se em relação aos sujeitos pactuantes e o âmbito de abrangência de suas regras juridicas. Na covenção coletiva figuram, necessariamente, em seus polos subjetivos entidades sindicais,  representativas de empregados e empregadores.

Diferentemente do acordo coletivo de trabalho, que tem em um dos seus polos subjetivos, empregadores, que não necessariamente são representados pelo respectivo sindicato, já que as empresas, individualmente ou em grupos, podem firmar acordos coletivos com os respectivos sindicatos de seus empregados.

Em relação à abrangência desses dois diplomas, temos que a convenção coletiva incide em um campo mais vasto, uma vez que as bases profissionais e econômicas estão devidamente representadas pelos seus respectivos sindicatos, devendo ser observadas as fronteiras máximas das bases territoriais dessas representações.

Já o acordo coletivo tem sua abrangência bem mais restrita, atingindo apenas os empregados vinculados à empresa ou conjunto de empresas que tenham pactuado o referido diploma, não alcançando aqueles que não pacturaram, ainda que se trate da mesmca categoria econômica e profissional.

2.4 Característica do Acordo Coletivo e da Convenção Coletiva

2.4.1 Legitimação

Os sujeitos legitimados pela ordenamento juridico para celebrar a negociação coletiva trabalhista são os sindicatos das categorias profissionais relativos aos trabalhadores e aos empregadores, estes, porém, poderão exercer a legitimação direta, no caso de acordo coletivo, ou indireta por meio do sindicato da categoria econômica.

Em relação às categorias inorganizadas em sindicatos, Delgado (2016) ressalta que a federação correspondente é quem detém legitimidade para discutir e celebrar as convenções coletivas de trabalho e, inexistindo também a federação (âmbito estadual), assume este papel a confederação (âmbito nacional) correspondente. Essa regra, embora prevista em lei, deriva da liberdade sindical, uma vez que esse principio assegura aos empregados o direito de terem sua entidade sindical representativa e, por meio dela, participem do processo negocial coletivo.

O mesmo vale para o acordo coletivo de trabalho, inorganizada a categoria, os trabalhadores de determinada empresa poderão pleitear à respectiva federação ou, na sua inexistência, solicita à confederação que assuma a legitimidade para a discussão assemblear e celebração do acordo (DELGADO, 2016).

2.4.2 Conteúdo

O conteúdo da convenção e do acordo coletivo está previsto no art. 613 da CLT. Esta matéria, segundo alguns autores, corresponde a requisitos extrínsecos relativos à forma que a lei impõe para a validade do negócio jurídico, uma vez que trata-se de negócio jurídico solene.

Os instrumentos negociais coletivos abrangem em seu contéudo, ao mesmo tempo, dispositivos normativos e dispositivos obrigacionais. As regras jurídicas, de maneira geral, abrangem direitos e obrigações que irão se integrar aos contratos individuais de trabalho das respectivas bases representadas, tendentes a compor a maior parte dos instrumentos coletivos trabalhistas. Podemos citar como exemplos, preceitos que estipulam adicionais maiores que os existentes (adicional noturno, horas extras, etc), reajustes salarias, fixação de pisos normativos, os que asseguram novas garantias provisórias de emprego, etc (DELGADO, 2016).

Já as cláusulas contratuais são aquelas que criam direitos e obrigações para as partes convenentes: sindicato dos trabalhadores e empresa – para os acordos coletivos, e sindicato dos trabalhadores e sindicato empresarial – para as convenções coletivas (DELGADO, 2016).

Alice Monteiro de Barros (2016) salienta que as cláusulas obrigacionais também chamadas de cláusulas de paz, preveem a impossibilidade de se recorrer à greve no decorrer da convenção. A autora entende ainda,  que as penalidades previstas no art. 613, VIII, da CLT, constituem cláusulas obrigacionais.

2.4.3 Forma

A convenção coletiva e o acordo coletivo são instrumentos formais, solenes, que necessariamente devem ser pactuados por escrito, submetidos a divulgação pública, possuindo seus próprios ritos para a sua criação e concretização subordinando-se  a algumas exigências.

Para Delgado (2016) isso demonstra que mesmo que acolha-se a tese da não recepção constitucional das exigências e procedimentos fixados na CLT, não podemos considerar como válida, uma negociação coletiva que não cumpra os requisitos e formalidades fixadas no estatuto sindical, tais como a convocação ampla, pauta publicizada, quórum razoável, entre outros.

Corroborando este entendimento, Martins (2016) afirma que a forma da convenção coletiva deve, necessariamente, ser escrita, uma vez que não se poderia admitir a forma verbal, pois dificultaria a sua aplicação e entendimento. Trata-se a convenção coletiva de um ato formal e não meramente consensual, que não devem ser elaborados com emendas ou rasuras. Ainda, uma vez elaborada a norma coletiva (convenção ou acordo coletivo), serão distribuídas em tantas vias quantas forem os sindicatos convenetes ou as empresas acordantes, além de uma ser destinada a registro, conforme previsão do parágrafo único do art. 613 da CLT.

2.4.4 Vigência

Segundo o art. 614, §1º da CLT a convenção e o acordo coletivo de trabalho entrarão em  vigor três dias após o depósito administrativo. Parte da parte da doutrina entende que esse dispositivo não foi recepcionado pela Constituição de 1988, uma vez que nenhuma formalidade se anteciparia à eficácia da convenção coletiva.

Contudo, a jurisprudência mais recente do TST não vem enxergando a antinomia entre a regra prevista na CLT e o principio autonômico acolhido pela Constituição. Desta forma, mesmo sendo obrigatório o depósito administrativo do diploma, ele preserva seu caráter de documento comum às partes e, nessa qualidade, sua prova em juízo pode ser feita até através de fotocópia simples, não autenticada, com apenas a ressalva de que não haja impugnaçao ao seu contéudo (DELGADO, 2016).

2.4.5 Duração

O art. 614, §3º da CLT prevê que não será permitido estipular convenção ou acordo coletivo de trabalho com duração superior a dois anos.

Entretanto, a prática juslaborativa tem demostrado que as partes coletivas tendem geralmente, a restringir essa duração a apenas um ano, em razão das constantes modificações econômicas e socias, que trazem um critério de flexibilização ao sistema (DELGADO, 2016).

2.4.6 Prorrogação, revisão, denúncia, revogação, extensão

O prazo de vigência da norma autonôma é estipulado pelas partes podendo, entretanto, sofrer alterações em virtude de novas negociações que ocorrerem durante o seu período de validade.

Sempre será possível alterar alguma cláusula prevista na convenção ou no acordo coletivo de trabalho, podendo ocorrer uma revisão, prorrogação, denúncia ou até mesmo a revogação de determinada norma presente no instrumento coletivo (BARROSO, 2010).

Porém, caso haja necessidade de alterar o conteúdo original, deverão ser observados os mesmos procedimentos formais que antecederam a sua constituição, conforme determina o art. 615 da CLT.

Segundo Alice Monteiro de Barros (2016) o art. 615 da CLT prevê expressamente a possibilidade de denúncia, com o objetivo de evitar a prorrogação automática da convenção ou para colocar um fim aos diplomas coletivos de prazo indeterminado. Assim, deve a prorrogação seguir o mesmo processo imposto para a celebração (aprovação pela assembleia).

 No que se refere à revisão, processo de adaptação da convenção ou do acordo às novas situações de fato, ressalta-se que apenas será permitida a revisão quando tiverem sido modificadas, substancialmente, as condições de fato vigorantes quando da respectiva celebração, salvo disposição diversa pactuada pelas partes, atentando-se ainda, que a revisão deverá ser aprovada pela assembleia sindical. Já a revogação, temos que as partes convenentes poderão revogar, total ou parcialmente, a convenção antes do termo final estipulado, caso seja desnecessária a sua sequência. (DE BARROS, 2016).

Por fim, a CLT não traz a previsão da extensão do acordo coletivo ou da convenção coletiva para além das bases profissionais e econômicas representadas. Este poder não é conferido às entidades sindicais superiores, tampouco ao Judiciário ou Executivo. Dessa forma, caso os sujeitos coletivos trabalhistas desejem importar diplomas celebrados em outras categorias profissionais ou econômicas, terão de se submeter à nova negociação coletiva nos mesmos moldes e procedimentos já expostos.

3. A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS E A ANÁLISE DA CONSITUCIONALIDADE DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO FRUTO DA LEI Nº 13.467/2017

As relações individuais e coletivas de trabalho tem sido alvo das mais diversas modificações com o objetivo de adequar o direito do trabalho à nova realidade social, surgindo assim, a chamada flexibilização trabalhista.

As definições sobre flexibilização comportam diversos aspectos, dentre eles, sociais, jurídicos, econômicos e até políticos. O conceito de flexibilização está estreitamente ligado ao de desregulamentação, uma vez que esta representa uma espécie de flexibilização feita através da legislação.

No Direito do Trabalho, a flexibilização representa o conjunto de medidas destinadas a adaptar, reduzir ou eliminar direitos trabalhistas conforme a realidade econômica e produtiva enfrentada. Também é visto como um instrumento de política social capaz de adequar as normas jurídicas à realidade econômica, social e institucional.

Muitos questionam a constitucionalidade da reforma trabalhista, pois esses críticos entendem que algumas das suas alterações violam o disposto na Constituição Federal e nas Convenções Internacionais ratificadas pelo Brasil gerando insegurança jurídica.

Para os críticos, o real objetivo da reforma trabalhista não é “flexibilizar” a legislação, mas sim reduzir os direitos dos trabalhadores através da supressão ou redução de inúmeros direitos previstos na CLT.

Para os que defendem a inconstitucionalidade da lei dois são os argumentos principais. O primeiro deles aduz que a reforma trabalhista é inconstitucional porque os direitos sociais previstos no artigo 7º da Constituição são protegidos por cláusula pétrea, sendo assim, não podem ser objeto de emenda tendente a aboli-los ou reduzi-los. O segundo aduz que a reforma afronta o princípio que veda o retrocesso dos avanços sociais.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal tem o pensamento bem diferente do defendido pelos críticos.

A jurisprudência do STF já se firmou no sentido de reconhecer a validade de acordo ou convenção coletiva de trabalho, ainda que disponha sobre a redução de direitos trabalhistas. Entretanto, a Corte ressalva que a redução ou limitação dos direitos trabalhistas pelos acordos coletivos deve, em qualquer caso, respeito aos direitos absolutamente indisponíveis, constitucionalmente assegurados. Tal ressalva também foi assentada pelo Pleno no julgamento do tema 152 da repercussão geral.

Do mesmo modo, no julgamento do RE 590.415 em sede de repercussão geral, o Min. Roberto Barroso afirma que as regras autônomas juscoletivas podem prevalecer sobre o padrão geral heterônomo, mesmo que sejam restritivas dos direitos dos trabalhadores, desde que não transacionem setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade absoluta.

E embora o critério definidor de quais sejam as parcelas de indisponibilidade absoluta seja vago, afirma-se que estão protegidos contra a negociação in pejus os direitos que correspondam a um patamar civilizatório mínimo, como a anotação da CTPS, o pagamento do salário mínimo, o repouso semanal remunerado as normas de saúde e segurança do trabalho, dispositivos antidiscriminatórios, a liberdade de trabalho etc.

Segundo o Min. Gilmar Mendes enquanto tal patamar civilizatório mínimo deve ser preservado pela legislação, os direitos que o excedem sujeitar-se-iam à negociação coletiva, que, justamente por isso, constituiria um valioso mecanismo de adequação das normas trabalhistas aos diferentes setores da economia e a diferenciadas conjunturas econômicas.

Para o relator do processo (RE 590.415), o Min. Roberto Barroso, no âmbito da repercussão geral, aduziu que não deve ser acolhida a invalidação dos acordos coletivos de trabalho com base em uma lógica de limitação da autonomia da vontade exclusivamente aplicável às relações individuais de trabalho, especialmente porque tal fato violaria os diversos dispositivos constitucionais que valorizam as negociações coletivas como instrumento de solução de conflitos coletivos.

Além disso, o caso concreto julgado tratou de um direito disponível e que foi suprimido pela reforma trabalhista, podendo se sujeitar à autonomia de vontade coletiva expressa mediante acordo e convenção coletiva. Assim, nesse julgamento o STF entendeu que o Tribunal Superior do Trabalho ao não reconhecer a validade do acordo coletivo violou o art. 7º, XXVI, da Constituição Federal.

Desse modo, a Corte julgou válido o acordo coletivo firmado entre as partes, por meio do qual se delimitou o tempo de horas in itinere a ser pago aos trabalhadores, bem como sua natureza salarial.

Ainda, recentemente, no dia 02.06.2022 o STF reafirmou o seu entendimento sobre o tema no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1121633, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.046) na qual foi fixada a seguinte tese: “São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.

CONCLUSÃO

A reforma trabalhista trouxe como uma das suas principais inovações a prevalência do negociado sobre o legislado, o qual foi objeto de muitas críticas e debates sobre o seu objetivo ideal em comparação ao real, no entanto, ela permanece válida até hoje.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da prevalência do negociado sobre o legislado, com a ressalva de que essa negociação não atinja direitos absolutos e indisponíveis dos trabalhadores mantendo um patamar mínimo civilizatório.

A prevalência, importância e superioridade do direito coletivo do trabalho perante o individual foi um grande impulsionador da reforma, inclusive como argumento para demonstrar que a reforma seria mais benéfica não só para os empregadores e o mercado financeiro mas também em prol dos trabalhadores, já que os sindicatos e o direito coletivo estariam mais fortalecidos para realizar essas negociações.

Entretanto, a temática ainda é objeto de crítica por diversos setores ao argumento de que os empregos não cresceram, as relações tornaram-se mais precárias além de que menos trabalhadores estão procurando a Justiça do Trabalho para lutar pelos seus direitos, entre outros. Desse modo, essa é uma temática que merece ser observada de perto para acompanhar sua evolução no meio jurídico e social.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. ed. 10ª. São Paulo: LTR, 2016.

BARROSO, Fábio Túlio. Manual de Direito Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2010.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm>. Acesso em: 10/09/2022.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: LTr, 2016.

Lei nº 13.467/2017. Consolidação das leis do trabalho. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>. Acesso em: 06/08/2022.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 590.415. Santa Catarina. Disponível em:< https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2629027>. Acesso em: 04/08/2022.

Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo. Goiás. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5415427> Acesso em: 10/09/2022.