DISTROFIA MUSCULAR PROGRESIVA DE DUCHENNE: ESTUDO DE 5 CASOS E ELABORAÇÃO DE MANUAL DE ORIENTAÇÃO AOS PAIS

Paula Lumy da Silva*- professora/supervisora de estágio de Pediatria da UNIARARAS, Mestranda em Neurologia Infantil pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP),
Cristina Iwabe** – Docente do curso de fisioterapia da UNIARARAS, supervisão do curso de fisioterapia da UNIP- Campinas, Mestranda na área de neurociência – FCM-UNICAMP.
Cyntia Ramos Franzini***, Marcela Maria Turati***, Viviane G. Baptista***- Acadêmicas da Graduação do curso de Fisioterapia da UNIARARAS.
Autor responsável: Paula Lumy da Silva
Endereço: Rua Clemente Bersanetti, 287- apto8
Jardim das Flores – Araras- São Paulo
CEP: 13600-000
Tel: (019)3543-1452 / (011)9502-9399
e-mail: paulalmy@yahoo.com.br
Resumo
O presente estudo teve como objetivo verificar a evolução da Distrofia Muscular Progressiva de Duchenne (DMD) identificando as variáveis encontradas em diferentes fases da patologia. Fizeram parte do estudo 5 pacientes portadores da DMD entre 4 e 18 anos que passaram por avaliação fisioterapêutica desenvolvida para o estudo e avaliação funcional de membros superiores e inferiores. Após a analise dos dados obtidos, observou-se atraso na aquisição da marcha que ocorreu por volta dos 18 meses e perda da marcha aos 8,6 anos. A média de aparecimento dos primeiros sintomas foi aos 3,2 anos, com sintomas de quedas freqüentes, dificuldade em subir escadas e fadiga muscular. Os pacientes que estão na cadeira de rodas apresentaram curva escoliótica e disfunção respiratória. Após o término do estudo foi realizado um manual de orientação aos pais enfatizando a importância da fisioterapia e da execução de exercícios de alongamento que auxiliará no retardo do aparecimento dos sintomas e deformidades, na diminuição do desgaste físico e a fadiga muscular, possibilitando uma melhora na qualidade de vida destes pacientes.
Palavras- chaves: Distrofia, avaliação e alongamento.
Introdução
A Distrofia Muscular Progressiva de Duchenne ( DMD) foi descrita em 1868 pelo neurologista francês Duchenne, sendo a mais comum e mais grave forma de distrofia muscular, afetando exclusivamente o sexo masculino devido a herança recessiva ligada ao cromossomo X, que contém um gene defeituoso. O produto desse gene é a distrofina, que esta ausente nestes indivíduos, causando uma degeneração da fibra muscular, substituída por tecido adiposo e conjuntivo, ocorrendo uma diminuição progressiva da força e atrofias musculares ( Salter, 2001).
Trata-se da forma mais comum e a mais grave de distrofia muscular, com herança recessiva ligada ao sexo. Os pacientes afetados são do sexo masculino, sendo as mulheres portadoras assintomáticas (ROSEMBERG, 1998; LEITÃO et al, 2001; SALTER, 2001).
A patologia começa a se manifestar nos três primeiros meses de vida, sendo mais evidente quando a criança inicia a marcha, devido às quedas freqüentes e fadigas constantes aos pequenos esforços( Weinstein,2000).
Geralmente, eles se manifestam por volta de três a cinco anos de idade, e vão se agravando progressivamente, levando à incapacidade para andar no início da adolescência e morte precocemente na terceira década (KILMER & AITKENS, 2001).
Na maioria dos casos, ao analisar a história do desenvolvimento motor da criança, encontra-se o atraso na aquisição da marcha, que ocorre por volta dos dezoito meses de idade, porém os primeiros sintomas da DMD surgem por volta dos três a cinco anos de idade caracterizados por quedas freqüentes, dificuldade em pular, correr, subir escadas ou levantar do chão. Como sinais clínicos característicos pode-se citar: a presença de pseudo-hipertrofia do músculo tríceps sural, o levantar miopático característico ou manobra de Gowers e a marcha anserina ou digitígrada (AKIYAMA et al, 1997; ROSEMBERG, 1998; THOMPSON et al, 2000).
O exame neurológico revela que a diminuição da força muscular predomina nitidamente na região das cinturas e ocorre de forma simétrica, gradual e ascendente, iniciando em cintura pélvica e membros inferiores, havendo uma progressão para a musculatura do tronco e postural, da cintura escapular e dos membros superiores (Figura 2). Os reflexos podem ser hipoativos e mesmo abolidos nas fases mais adiantadas da patologia (AKIYAMA et al, 1997; OTTO et al, 1998).
A evolução é inexoravelmente progressiva e ocorre de tal forma que a criança por volta dos sete e treze anos de idade fica incapacitada de realizar a marcha independentemente. Com a necessidade da utilização da cadeira de rodas, os encurtamentos e os problemas posturais se intensificam, ocasionando normalmente uma cifoescoliose e deformidades em flexão de membros superiores e inferiores, conseqüente das contraturas que ocorrem devido ao posicionamento contínuo na posição sentada e pelo próprio processo da patologia. Quando há rotações das vértebras na coluna, observamos deformidade na caixa torácica, que juntamente com a fraqueza da musculatura, leva a complicações respiratórias repetitivas, sendo estas e o comprometimento cardíaco as causas mais freqüentes do óbito do paciente (FENICHEL, 1995; AKIYAMA et al, 1997; OTTO et al, 1998; ROSEMBERG, 1998; DIETZ, 2000; LEITÃO et al, 2001; THOMAS et al, 2002).
SALTER (2001) acrescenta que a maioria dos pacientes desenvolve uma escoliose paralítica progressiva.
Cerca de 50% destas crianças têm uma inteligência subnormal com QI variando entre 50 e 80, sendo que não há explicação satisfatória para isto (ROSEMBERG, 1998).
Segundo AKIYAMA et al (1997) na DMD a fraqueza muscular é proximal e simétrica, porém ocorre em intensidades variadas, levando grupos musculares a hipotrofias em graus diferentes. Como conseqüência da fraqueza muscular, surgem as posturas compensatórias para tentar equilibrar as instabilidades, levando assim à hipotrofia ou mesmo atrofia das fibras musculares que potencialmente ainda estão íntegras. Isto ocorre por não utilização de maneira adequada estas fibras, agravando desta forma a fraqueza muscular, além de propiciar os encurtamentos, contraturas e deformidades. Na realidade, há um verdadeiro ciclo que agrava a fraqueza muscular.
Como pode ser visto nesta breve revisão, por se tratar de uma patologia progressiva, deve ser diagnosticada precocemente para que se possa iniciar um tratamento fisioterapêutico adequado com o intuito de retardar a sua evolução, proporcionando assim uma melhor qualidade de vida a esses indivíduos.
As indicações fisioterapêuticas são traçadas de acordo com cada fase da patologia, as mais comuns são a cinesioterapia com ênfase nos alongamentos, a hidroterapia e a utilização de órteses.
Através deste trabalho traçamos um perfil inicial da patologia e elaboramos um manual de orientação aos pais que enfocasse as principais dúvidas e necessidades da criança em cada fase. Ao final seguem orientações quanto aos exercícios que podem e devem ser realizados pelos pais em casa.
Materiais e métodos
Os dados foram colhidos através de uma avaliação realizada em uma ficha especifica aos portadores da Distrofia Muscular Progressiva de Duchenne elaborada para o estudo, onde foram observados os dados da anamnese, do desenvolvimento motor, trofismo, tônus e força muscular e avaliação funcional de membros superiores e inferiores.
Foi aplicado um questionário aos pais, onde pudemos constatar as principais dúvidas sobre a patologia.
Para coleta de dados utilizamos ficha de avaliação, questionário, goniômetro, fita métrica, martelo de reflexo e para registro dos pacientes e para a elaboração de manual utilizamos máquina fotográfica Sony FD Mavica- Quick Acess FD Drive 2X.
Os pacientes foram avaliados na Clinica de Fisioterapia da UNIARARAS onde realizam tratamento, em 2 entrevistas em média no período de abril e junho de 2002.
Resultados
A idade de aquisição da marcha variou entre 11 meses em 2 crianças (40%), 1 portador (20%) com 15 meses de idade e 2 portadores (40%) adquiriram a marcha aos 24 meses de idade.
Analisando a idade de aparecimento dos primeiros sintomas observamos 2 portadores (40%) iniciaram os sintomas aos 2 anos de idade e 3 portadores (60%) aos 4 anos de idade. Os sintomas freqüentemente relatados na avaliação foram de dores em membros inferiores, fadiga e quedas freqüentes.
Em relação ao trofismo muscular de membros superiores e membros inferiores pode ser observado no gráfico 1 que apenas 1 portador da DMD (20%) apresentou pseudohipertrofia, 2 portadores (40%) apresentaram hipotrofia e 2 portadores (40%) apresentaram atrofia muscular.
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Em relação à atividade motora observou-se que 4 portadores (80%) realizam transferência da posição prona para supino, 4 portadores (80%) rolam independentemente, 3 portadores (60%) atingem e permanecem sentados sem auxílio, 3 portadores (60%) permanecem na posição gato/ ajoelhado e apenas 2 portadores (40%) permanecem em pé e realizam a marcha.
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Em relação à marcha os resultados encontrados foram: 2 portadores (40%) apresentam deambulação sendo que estes tem respectivamente 4 e 8 anos , e 3 portadores (60%) não deambulam. Nos pacientes que possuem a marcha observamos alterações como andar nas pontas dos pés, aumento de lordose lombar, menor dissociação de cinturas e déficit de equilíbrio.
A avaliação funcional foi realizada através da escala de avaliação funcional de Vignos modificada por Brooke (tabela I), observamos em membros superiores que 3 crianças (60%) apresentaram grau 1, 1 criança (20%) apresentou grau 3 e 1 criança (20%) apresentou grau 5. Em relação aos membros inferiores 2 crianças (40%) apresentaram grau 1 e 3 crianças (60%) apresentaram grau 9.

Tabela I – Escala de avaliação funcional de Vignos modificada por Brooke em 1983.

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DISCUSSÃO
Em relação ao desenvolvimento motor, observamos atraso na aquisição da marcha que ocorreu por volta dos 18 meses. A marcha manteve-se preservada em apenas dois casos sendo que no restante a perda da marcha ocorreu por volta dos 8,6 anos.
Com relação ao aparecimento dos primeiros sintomas a média de início foi de 3,2 anos, com sintomas de quedas freqüentes, dificuldade em subir escadas e fadiga muscular em membros inferiores.
Nos casos estudados a idade do aparecimento dos primeiros sintomas se relaciona com a idade da perda da locomoção em pé. No geral os casos que os primeiros sintomas iniciaram aos 4 anos a perda da locomoção demorou a se instalar, ao contrário dos casos em que os primeiros sintomas iniciaram aos dois anos onde a perda da locomoção se instalou mais rapidamente.
Em relação ao trofismo muscular, o estudo realizado por PAVON & CORTEZ (1995) confirma os sinais presentes: pseudo hipertrofia, atrofia e hipotrofia muscular.
Entre os casos estudados observou-se que um caso apresentou diminuição na função respiratória principalmente pela dificuldade na locomoção em pé, iniciou precocemente a locomoção por cadeira de rodas. A posição sentada na qual permanece por muito tempo acarretou em uma escoliose que agrava ainda mais a sua função respiratória.
Após o termino do estudo comparativo foi realizado um manual de orientação aos pais demonstrando cuidados necessários com as crianças portadoras de DMD desde o diagnostico da patologia até sua progressão incluindo cuidados na escola, alimentação e brincadeiras, para que estas crianças tenham melhor qualidade de vida. O manual também enfatiza a importância da fisioterapia e sugere sessões de alongamento que irá oferecer melhor habilidade, retardando o aparecimento de deformidades sem que haja desgaste físico e fadiga muscular.
CONCLUSÃO
O tratamento adequado e o diagnóstico precoce podem intervir na evolução da patologia, sendo que os indivíduos com DMD se adaptaram conforme suas necessidades para sua maior independência. Desta forma criaram uma forma de locomoção para se tornarem mais ágeis, como o engatinhar e andar com os joelhos.
Em relação à função respiratória tais adaptações às fases seguintes da patologia interferem na sua progressão ou funcionamento, sendo que o uso cadeira de rodas predispõe o desenvolvimento de mais deformidades, como foi observado em 1dos casos.
Dessa forma o tratamento realizado de forma adequada desde o diagnóstico precoce, pode intervir na evolução, mas também sem a cooperação ou auxílio dos pais não há melhora sendo que a progressão torna -se mais rápida , desta forma é de fundamental importância o auxílio e a cooperação dos pais para a melhora e a diminuição da progressão da patologia.
O trabalho possibilitou a elaboração de um manual de esclarecimento simples sobre a patologia, dúvidas mais freqüentes dos pais informando-lhes para melhores esclarecimentos também como os exercícios e manuseios que podem estar sendo realizados em suas casas,oferecendo assim uma melhor continuidade a fisioterapia,e otimizando a qualidade de vida e sobrevida destes indivíduos.
Síntese do Manual de Orientação aos Pais de Crianças do Distrofia Muscular Progressiva de Duchenne.
APRESENTAÇÃO
Este manual contendo informações sobre a DISTROFIA MUSCULAR PROGRESSIVA DE DUCHENNE baseia-se em um estudo realizado em 5 portadores da doença, na cidade de Araras, na clinica de fisioterapia da Fundação Hermínio Ometto.
Com os resultados deste estudo, foram observados diferentes fases de progressão da doença, de acordo com a idade de cada individuo e em relação aos cuidados que obtiveram durante o percurso da doença.
Através desses resultados elaboramos este manual para os pais ou cuidadores com o objetivo de oferecer informações necessárias desde o inicio da doença até sua evolução e cuidados especiais para a manutenção das atividades cotidianas dos portadores da DUCHENNE.
Agradecemos as crianças portadoras de Distrofia Muscular de Duchenne e a seus pais por colaborarem com o estudo nos concedendo informações e imagens para a elaboração do mesmo.
Tópicos abordados no Manual de Orientação aos Pais, elaborado pelos autores deste trabalho:
INTRODUÇÃO
1. O QUE É DISTROFIA MUSCULAR PROGRESSIVA DE DUCHENNE
2. SINAIS QUE A CRIANÇA APRESENTA NO INICIO DA DOENÇA:
3. COMO É A EVOLUÇÃO DA DOENÇA:
4. CUIDADOS GERAIS QUE DEVEMOS TER COM AS CRIANÇAS COM DUCHENNE: BRINCADEIRAS, ESCOLA, TRABALHO PSICOLOGICO, TRABALHO COM TERAPEUTA OCUPACIONAL, NATAÇÃO:
5. FISIOTERAPIA
É importante iniciar a fisioterapia logo que a doença for descoberta, e antes que comecem aparecer as deformidades causadas pela fraqueza dos músculos.
A fisioterapia significa tratamento por exercício físico e possui papel importante para manter os movimentos das crianças.
O tratamento deve ser realizado por um profissional especializado, mas alguns exercícios simples podem ser realizados em casa.
Através desse manual descrevemos exercícios, e alguns cuidados especiais para que os pais ou cuidadores possam realizar em casa, lembrando que antes de iniciar qualquer exercício é necessário conversar com o fisioterapeuta no qual irá indicar a melhor forma de realizar os exercícios de acordo com o estágio que a doença se encontra.
Para obter melhores resultados os exercícios devem ser realizados todos os dias, pois eles farão parte da vida dos portadores de DUCHENNE.
ALONGAMENTO PASSIVO
É uma técnica simples usada para aumentar o comprimento do músculo que foi encurtado pela doença, facilitando assim, os movimentos.
O alongamento passivo é realizado com o paciente em posição confortável e relaxada e uma outra pessoa faz o movimento. O alongamento não pode provocar dor, mas sim uma sensação de esticar, que deve ser mantida por 15 a 30 segundos e repetido por 10 vezes cada membro que esteja sendo movimentado; a força aplicada no alongamento não deve ultrapassar o ponto onde houver uma restrição (não forçar).
1. Alongamento dos músculos que movimentam os tornozelos:
Colocar a criança deitada de costas e relaxada, segurar um dos pés com uma mão e com a outra apoiar nos joelhos para que eles não dobrem.
A partir daí a pessoa puxa o pé em direção ao joelho e mantenha por 20 segundos e depois movimentar o pé no sentido do chão por mais 20 segundos.
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2. Alongamento do músculo quadríceps da coxa (músculo que levanta o joelho)
Com a criança deitada de lado e com o joelho dobrado, segurar o joelho, puxando-o para trás, a outra mão deve apoiar no quadril para que este não se movimente. Manter na posição por 20 segundos.
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3. Alongamento dos abdutores da coxa:(músculos que abrem as pernas)
Com a criança deitada de costas, dobrar os 2 joelhos com os pés apoiados no chão e empurra-los para um lado, apoiando uma das mãos no joelho e a outra no corpo para que este fique estabilizado. Fazer o alongamento empurrando as pernas para os 2 lados.
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4. Alongamento dos músculos que movimentam o punho:
Com a criança sentada, fixar o cotovelo com uma das mãos e com a outra movimentar o punho da criança para baixo e depois para cima. Mantendo por 20 segundos cada.
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