M. J. Tipton**
INTRODUÇÃO
As ilhas britânicas contêm e são rodeadas por água fria: a temperatura da superfície ao redor da costa varia entre 5 e 9°C em Fevereiro e 13 e 17°C em Agosto [1]. A possibilidade de imersão acidental em água fria é um risco sempre presente, que resulta na morte de cerca de 400 a 1.000 pessoas a cada ano [2, 3]. As mortes por imersão representam a quarta causa mais comum de mortes acidentais na população adulta e a terceira causa mais comum em crianças [3].
Nos últimos anos, pensou-se que o perigo associado à imersão em água fria tendesse a ser por hipotermia, ou por queda da temperatura central das vítimas. Isso, no entanto, está em contradição com a descoberta de que aproximadamente 60% das mortes anuais por imersão no mar ocorrem dentro dos 3m da área de segurança; e dois terços desses que morreram, eram tidos como ‘bons’ nadadores [2]. Tais estatísticas não sugerem que imersão prolongada e resfriamento central sejam causa primaria de morte; ao invés disso, outras respostas e mecanismos mais rápidos são provavelmente os responsáveis.
Golden & Hervey [4] descreveram quatro estágios de imersão fria associados com esse determinado risco. Estes são: (1) respostas iniciais à imersão (0-3 min.), (2) imersão a curto prazo (3-15 min.), (3) imersão a longo prazo (> 30 min.) e (4) pós-imersão. Normalmente, a possibilidade de hipotermia não ocorre até o estágio (3) (30 min.); antes disso, o indivíduo imerso deve sobreviver à resposta inicial à imersão. Estes podem ser amplamente divididos em dois grupos diferentes que receberam o titulo de “resposta ao mergulho” e de “resposta ao choque frio”. Desde o primeiro estudo mais completo feito com vertebrados que mergulham, que foi publicado por Bert em 1870 [5], houve muitos outros excelentes estudos publicados relacionados com esse tópico [6-9]; a presente pesquisa se concentrará, então, na resposta do choque frio em imersão. Isso inclui componentes cardiovasculares, ventilatórios e metabólicos; e diferentemente de muitas outras respostas “reflexas”, não mostra qualquer propósito benéfico. Apesar disso, isso pode representar a primeira, e possivelmente a maior, ameaça para a vida dos indivíduos imersos em água fria.
A RESPOSTA AO “CHOQUE FRIO”
Respostas Cardiovasculares
Vários autores relataram que indivíduos saudáveis manifestaram taquicardia no período de 2-3s de exposição à água fria [10-17]. Cooper et al. [12] relataram que indivíduos nus imersos em água a 10°C responderam com um aumento médio da freqüência cardíaca de aproximadamente 20 bpm a mais do que o observado na imersão em água a 27°C; enquanto que, Hayward & Eckerson [15] registraram um aumento médio da freqüência cardíaca de 49% (87 – 129 bpm) acima dos níveis de pré-imersão, depois da imersão em água a 0°C de mulheres levemente vestidas. O valor correspondente em homens foi de 42% (81-115 bpm); e ambos os aumentos foram maiores do que aqueles observados em imersão em água morna.
A exposição à água fria também mostrou um aumento do trabalho cardíaco [11, 18]: depois de 1 min. de ducha gelada no peito de dois indivíduos, Keatinge et al. [11] mediram o aumento do trabalho cardíaco em 59% (7.9 – 12.4 l /min.) e em 100% (6.5 – 13.0 l /min.) após fases de pré-exposição.
Complementando os efeitos cardíacos, a exposição a águas com temperaturas inferiores a aproximadamente 33°C pode induzir uma vasoconstrição periférica importante e, conseqüentemente, redução do fluxo sanguíneo periférico [19, 20]. Como resultado das respostas cardíacas e vasculares à exposição à água fria, pressões arteriais e venosas aumentam [21], sendo que a pressão arterial aumenta em 2 – 3s de exposição à água fria e alcança níveis máximos em 30s [11]. Relatou-se que a média das pressões sistólica e diastólica de indivíduos submetidos a 1 min. de ducha gelada, aumentou, do estágio de repouso, de 130/76 mmHg (17.3/ 10.1 kPa) a 175/93 mmHg (23.3/ 12.4 kPa), após uma ducha gelada [11].
Essas primeiras respostas cardiovasculares à imersão em água fria podem dar lugar a um esforço significante do sistema: um aumento rápido da pressão sanguínea e do esforço cardíaco aumenta muito o trabalho exigido ao coração, principalmente o ventrículo esquerdo. Isso pode resultar em uma grande irritabilidade ventricular, irregularidades cardíacas e, em raras ocasiões, fibrilação ventricular precipitada [10, 22], especialmente quando o limiar de fibrilação é menor devido à excitação do miocárdio ventricular [11, 23]. Ambos os batimentos ectópicos – ventricular e atrial – algumas vezes de origem multifocal, foram registrados em imersão em água fria [10, 11]. No entanto, arritmias sinusais registradas por Rochelle & Horvath [14], foram pensadas como vinculadas ao sistema respiratório, ao invés do cardiovascular; respostas essas, que ocorriam ao mesmo tempo.
As respostas cardiovasculares iniciais à imersão em água fria representam apenas um leve risco para indivíduos saudáveis. O risco é maior para pessoas com hipertensão ou doença coronariana: indivíduos com baixo fluxo sanguíneo coronariano são mais propensos a desenvolver isquemia miocárdica depois de um súbito aumento da carga de trabalho cardíaco. O fluxo sanguíneo coronariano pode ser reduzido devido à diminuição do tempo necessário para o enchimento diastólico, decorrência da taquicardia causada na resposta ao choque frio.
Uma resistência periférica importante induz uma sobrecarga cardíaca através do aumento da pós-carga. Em alguns indivíduos, isso pode estar associado às irregularidades cardíacas. Além disso, elevações súbitas da pressão sanguínea, na imersão, aumentam a probabilidade de ruptura de vasos sanguíneos em indivíduos hipertensos ou com aneurisma. Esse último grupo está em risco, principalmente, porque eles podem não estar cientes da sua condição.
Respostas respiratórias
Para a população saudável, são respostas respiratórias ao choque pelo frio que representam a maior ameaça à sobrevivência. Muitos autores relataram que a súbita imersão em água fria produz em indivíduos uma “inspiração gasp” acompanhada de hiperventilação descontrolada, indicada por uma queda significativa na pressão parcial no final do volume corrente e na tensão arterial do dióxido de carbono [11-17, 21, 24-27]. A inspiração gasp ocorre quase imediatamente depois da imersão: Goode et al. [13] mediram uma média gasp de 2 litros, em 1,5s, quando oito homens foram imersos em água a 28°C. Na água a 11°C, os valores correspondentes ao gasp foram de 3 litros em 1,2s.
Em média, imersões em água fria até o pescoço aumentam cerca de quatro vezes a ventilação durante o primeiro minuto de exposição; isso, geralmente, resulta em um maior aumento do volume corrente que na freqüência respiratória [15, 25, 26]. Há uma variação significativa nessa resposta devido a fatores como a temperatura da água e as diferenças entre cada indivíduo. Por exemplo, um aumento na ventilação minuto, de 600% [12] e acima de 1000% [16], foi obtido após a imersão de indivíduos nus em água a 10°C; foi relatado que mulheres respondem à imersão em água fria com um aumento 35% menor na ventilação minuto que homens [26]. Todavia, alguns autores [15, 27] falharam ao identificar qualquer diferença entre os sexos, considerando a resposta ao choque frio.
Os dois perigos da resposta ventilatória são a alcalose respiratória e a hipocapnia, que são resultados da hiperventilação profunda. Reduções significativas na pressão parcial alveolar e na tensão arterial de dióxido de carbono podem ocorrer durante os primeiros minutos de exposição em água fria [10-12], alcançando níveis mínimos dentro de 15s de exposição [11]. Na média da tensão arterial de dióxido de carbono de 10 indivíduos sentados foi registrada uma queda de 39.8 mmHg (5.31 kPa) a 27.8 mmHg (3.71 kPa) depois de 1 min. de ducha gelada no peito [11].
Reduções nos níveis de dióxido de carbono são rapidamente seguidos de hipocapnia em células nervosas sensoriais e motoras; isso resulta uma diminuição do limiar de ativação dessas células [28]. Grandes quedas na tensão arterial de dióxido de carbono foram associadas com fibrilação ventricular em cães e humanos [29-32]. Tais quedas podem também resultar em hipóxia cerebral causada por redução do fluxo sanguíneo cerebral e mudança para a esquerda da curva de dissociação da hemoglobina (efeito Bohr). Essas alterações, provavelmente, referem-se a tetania, desorientação e perturbação mental demonstrada pelos indivíduos durante o primeiro minuto de imersão em água fria [12, 33, 34].
A perda do controle da ventilação torna a respiração, durante a natação, muito difícil: em um nado crawl, a respiração dessincronizada [35] ocorre de modo a poder produzir uma ineficiência dos mecanismos desse estilo de nado, resultando na inalação de água e na falha do nado. Mesmo habilidosos nadadores de água morna podem conseguir nadar apenas poucos minutos na água fria [35-38]. A execução do nado, possivelmente, também é afetada negativamente pela sensação de dispnéia nos indivíduos [21, 25] e, conseqüentemente, iniciar pânico pela imersão em água fria.
Não se imagina que a dispnéia possa ser causada pela bronco-constrição ou mudanças nos mecanismos pulmonares: comprovou-se apenas um pequeno aumento (17%) na resistência das vias aéreas e nenhuma diminuição da complacência pulmonar foi encontrada depois de 30s de ducha gelada [25]. A dispnéia pode ser causada por um efeito direto dos impulsos aferentes que iniciam a resposta respiratória [25], ou por aumento do trabalho exigido pela musculatura respiratória. Alternativamente, pode resultar em uma mudança abrupta e provisória que ocorre no final do volume expiratório do pulmão[21, 25]. Imagina-se que essa mudança é resultado da maior estimulação reflexa da inspiração do que da expiração, e não, da alteração nos mecanismos do pulmão [25]. Depois da exposição, atinge o máximo em duas ou três respirações [25], continuando por entre 1 e 3 minutos dependendo da temperatura da água, para então, declinar lentamente. O tempo de duração da mudança encontrado aproxima-se do período no qual os indivíduos apresentaram falta de ar [21].
Durante a ducha gelada, foi registrada, na média de inspirações, uma mudança de 0,44 litros do final do volume expiratório do pulmão; isso se compara aos 0,36 litros observados durante duchas com água a 15ºC e nenhum efeito significante com duchas em temperaturas mais altas [25]. Uma mudança na média inspiratória no final do volume expiratório do pulmão de 2,3 litros encontrada em oito indivíduos nus imersos em água a 5, 10 e 15ºC (conforme pesquisa não publicada, ao tempo deste artigo, por M. J. Tipton). Na maioria dos indivíduos, esse resultado no volume corrente ocorre dentro de 1 litro da capacidade total do pulmão. As maiores mudanças observadas nesses estudos foram, provavelmente, devido ao emprego da imersão até o pescoço; isso poderia produzir maiores efeitos hemodinâmicos e estresse pelo frio do que a ducha fria.
Talvez a conseqüência mais perigosa das respostas iniciais à água fria seja a redução no tempo de apnéia causado pela resposta da inspiração “gasp”. Esse efeito foi observado por muitos autores [25, 27, 39, 40]; Hayward et. al. [27] encontraram que em mais de uma variação de 0-15ºC da temperatura da água, o tempo máximo de apnéia dos indivíduos foi reduzido para 25-30% do que observado antes da submersão, e para 30-60% do observado na imersão em água em temperatura termo-neutra. Nos estudos de Tipton & Vincent [40], a média do tempo máximo de apnéia de 18 indivíduos vestidos normalmente caiu de 45s no ar termo-neutro para 9,5s na submersão em água a 5ºC; o tempo máximo de apnéia de um indivíduo foi reduzido para 0,2s.
A redução do tempo de apnéia no choque frio aumentou, significativamente, o risco de aspiração de água nas vítimas imersas; esse risco é aumentado ainda mais se a imersão ocorrer em águas agitadas ou envolvendo um período de submersão forçada caso a embarcação vire ou afunde. Em tais situações a morte é associada ao afogamento [41, 42]; ou a uma inibição vagal do coração depois da inalação de água e a estimulação dos receptores da nasofaringe e da glote [43].
Resposta metabólica
A taxa metabólica dos indivíduos aumenta durante os primeiros minutos na imersão em água fria [12, 15-17]. Hayward & Eckerson [15] relatam que a taxa metabólica de 21 indivíduos – homens e mulheres – vestidos levemente, aumenta quatro vezes durante os primeiros minutos de imersão em água a 0°C. Entretanto, com tal elevação, aumentará a produção de dióxido de carbono e reduzirá, na mesma medida, o grau de hipocapnia resultante da hiperventilação [10,12]; pode também aumentar o risco de irregularidades cardíacas pelo trabalho exigido do coração.
Resposta hormonal
Acredita-se, normalmente, que a exposição prolongada ao frio seja um estimulo poderoso para a secreção hormonal no homem [44-46]. A resposta hormonal à exposição ao frio durando apenas poucos minutos é menos clara; Johnson et al. [45] relataram que os níveis de noradrenalina plasmática de seis indivíduos quase dobrou depois de 2 min. de imersão em água a 10°C, descoberta essa, apoiada no trabalho de Buhring & Spies [23]. Outros autores [47,48] registraram um aumento significante nos níveis plasmáticos de noradrenalina e adrenalina após 1-2 min. de imersão de uma mão ou de um pé na água a 0-5°C.
Em contraste, Manager et al. [49] relataram que a resposta à vasoconstrição causada pelo frio não afeta os níveis de catecolamina; e Keatinge et al. [11] não encontraram evidências de liberação de catecolaminas adrenais durante 2 min. de ducha gelada, nas quais os níveis de adrenalina plasmática não foram alterados, e os níveis plasmáticos de noradrenalina foram apenas levemente aumentados. As técnicas analíticas iniciais, por serem pouco confiáveis, podem ter contribuído para a variação encontrada no registro acima. A ausência de consenso impede que se tire qualquer conclusão sólida; em geral, todavia, a evidencia sugere que o aumento rápido nos níveis plasmáticos de noradrenalina pode ocorrer da exposição súbita à água fria como resultado da ativação do sistema nervoso simpático, mas o rápido aumento no nível de adrenalina parece menos provável. Se esse for o caso, o frio, então, pode ser o único dentre os estímulos desagradáveis que não provoca uma rápida liberação de adrenalina da medula adrenal [50].
MECANISMOS DA RESPOSTA AO CHOQUE FRIO
A evidência apresentada na seção anterior, junto com a rapidez com a qual a resposta ao choque frio é iniciada, sugere que isso seja de natureza neurogênica, e tende a impedir qualquer contribuição significativa dos hormônios circulantes. Com base em ambas as magnitudes das respostas observadas na comparação entre a imersão em água morna com a imersão em água fria, e a relação observada entre a temperatura da pele e o impulso respiratório [51], pode ser concluído que a resposta ao choque frio é iniciada por informações sensoriais aferentes que surgem nos receptores periféricos: mais especificamente, esses receptores alteram sua velocidade de excitação na resposta pelo resfriamento [12, 13, 17].
Um estímulo frio aplicado na pele inibe a atividade dos receptores de calor e ativa muitos outros tipos de receptores, incluindo mecanoceptores termossensíveis, nociceptores térmicos e receptores de frio [52, 53]. A profundidade de receptores de frio na língua dos gatos mostrou ser de 0.18-0.22 mm [54], localizados na camada sub-epidérmica superficial. Essa localização superficial explica a rapidez com que a resposta ao choque frio é iniciada, e porque a queda da gordura subcutânea reduz a magnitude da resposta [12, 13].
O caminho do conhecimento associado com a transmissão e processamento da informação termossensorial é baseado em trabalho com animais. Keatinge & Nadel [25] obtiveram grandes aumentos na ventilação em água a 0°C, comparada com água de 25°C, quando foi derramado sobre os troncos de quatro gatos decerebrados, logo abaixo da borda anterior do colículo anterior, e quatro gatos hipotalâmicos. A ventilação não pareceu aumentar quando o experimento foi repetido com dois gatos decerebrados na parte posterior do colículo posterior. Os autores concluíram que o reflexo respiratório era mediado ao nível do mesencéfalo e o cérebro não era essencial para a resposta em gatos.
Foi sugerido que fatores emocionais podem complicar a resposta pelo frio em humanos; isso foi, em seguida, confirmado quando uma maior resposta ventilatória foi obtida em indivíduos imersos no mar comparado com condições correspondentes em laboratório [12]. Isso também apareceria se indivíduos não habituados pudessem suprimir conscientemente a resposta ventilatória ao choque frio [13], em alguns casos por mais de 75% (conforme pesquisa não publicada, ao tempo deste artigo, por M. J. Tipton).
Tem-se como hipótese que os termoaferentes dos receptores periféricos de frio aumentam a ventilação por estímulo direto do centro respiratório [10, 13]. A sensibilidade dos quimioceptores centrais foi relatada como inalterada [12]. Parte da resposta ventilatória pode ser resultado de uma estimulação reflexa a nível espinhal de motoneurônios-α inervando os músculos intercostais e diafragma [51].
Pensou-se que o aumento do ritmo cardíaco seria devido à estimulação reflexa do sistema nervoso simpático; o aumento da atividade simpática pode ocorrer como uma conseqüência direta da rápida queda da temperatura da pele [45, 46], e ambos efeitos do coração, inotrópicos e cronotrópicos [11, 55]. Imaginou-se que a resposta era mediada através do tegumento do mesencéfalo e do hipotálamo; a velocidade com a qual isso é iniciado sugere o envolvimento de caminhos simples.
O sistema nervoso simpático também está envolvido nas respostas de vasoconstrição periférica e pressão sanguínea que ocorrem durante a imersão em água fria [11, 19, 57]. Trabalhos com ratos [58] sugerem que a vasoconstrição cutânea frio-induzida está integrada na área pré-óptica do hipotálamo e pode depender de conexões entre esta área e a área de pressão da medula através dos feixes mediais da parte anterior do cérebro.
A difusão da noradrenalina liberada pelos terminais dos nervos simpáticos subcutâneos ou por estimulação dos receptores hipotalâmicos, pode resultar na contração da musculatura lisa periférica e constrição de vasos sanguíneos [59]. Em acréscimo a vasoconstrição simpática eferente, a vasoconstrição periférica de vasos sanguíneos pode também ser causada por efeito direto do resfriamento [60]. O mecanismo hipoteticamente envolvido na despolarização da musculatura lisa arterial, como resultado do resfriamento [57] e como causa da vasoconstrição periférica frio-induzida, é pelo menos, tão importante quanto o impulso simpático [50].
Frey et al. [55] examinaram as respostas cardiovasculares à imersão de um pé de seis indivíduos em água a 4°C. Eles relataram que essa manobra iniciou um estimulo à taquicardia e aumentou a vasoconstrição periférica. Usando propanolol mais atropina eles determinaram quais as respostas obtidas na imersão do pé após 16 – 30s foram mediadas neuralmente. Concluiu-se que a resposta cardiovascular inicial indicava uma expansão do fluxo simpático ao coração e vasos, provavelmente acompanhada por inibição vagal. A resposta da pressão arterial à imersão do pé não foi demonstrada como diretamente influenciada pelas drogas usadas: então, concluiu-se que essa resposta resultou do aumento da resistência periférica causada pela estimulação dos α-adrenoceptores. Essa conclusão se apóia nas pesquisas iniciais de Obrist et al. [61].
O crescimento da taxa metabólica na imersão em água fria é provavelmente determinado, de maneira ampla, pelo aumento geral da tensão muscular que acompanha tal exposição ao frio. Isso também pode ser causado como um resultado do aumento da utilização do oxigênio pela musculatura respiratória durante q ualquer hiperventilação ocorrida nesse tempo. Foi também sugerido [51] que algum aumento inicial do consumo de oxigênio depois da imersão pode ser devido às respostas hidrostática e hemodinâmica que ocorrem depois da imersão a qualquer temperatura, e produz um aumento da perfusão pulmonar [62-66].
A resposta ao choque frio diminui após 2 – 3 min e retorna para os níveis de pré-imersão. A resposta ventilatória chega ao máximo nos primeiros 30s e diminui pra aproximadamente duas vezes dos níveis de pré-imersão do terceiro ao quinto minuto de imersão [10-13, 15, 67]. A fase dinâmica da resposta metabólica é completa em aproximadamente 3 min da imersão, cujo tempo registrou-se 50% maior que nos valores de pré-imersão [15]. Pensou-se que a diminuição da resposta ao choque frio seja devido à habituação dos receptores periféricos [10], e suas respostas dinâmicas ao frio diminuem. O retorno da resposta da freqüência cardíaca para os níveis de pré-imersão é também, possivelmente, influenciada pela resposta reflexa dos barorreceptores ao aumento da pressão arterial; isso explicaria porque essa habituação é mais rápida que as outras respostas [55].
FATORES MODIFICADORES DA RESPOSTA AO CHOQUE FRIO
Efeitos hidrostáticos e hemodinâmicos da imersão
Imersão em água aumenta a pressão hidrostática atuando sobre o corpo. O resultado das alterações hemodinâmicas ocorre dentro de seis batimentos cardíacos em imersão até o pescoço [64], inclui um aumento de 500–700 ml. no volume sanguíneo central [62, 63], na pressão venosa central, no enchimento diastólico ventricular e da pré-carga no coração [20]. Algumas dessas respostas possivelmente modificam as respostas cardíacas observadas na imersão em água fria; isso também pode impor limitações na ventilação pulmonar [51, 65, 66].
Temperatura da água
Alguém poderia esperar que a diminuição na temperatura da água produzisse taxas mais rápidas de queda na temperatura da pele e, conseqüentemente, uma maior resposta dinâmica dos receptores periféricos, resultando em uma maior resposta ao choque frio. Descendo para uma temperatura de água moderadamente baixa, há mesmo uma relação inversa entre a temperatura da água na qual indivíduos nus são imersos e a magnitude de sua resposta ao choque frio [10-17].
Todavia, na água de temperaturas baixas, essa relação cessa e a resposta fisiológica máxima é evocada. A temperatura na qual isso ocorre é uma questão pra debates. Hayward & Eckerson [15] concluíram que o padrão e a magnitude do metabolismo, das respostas das taxas respiratórias e cardíacas obtidas na imersão em água até 0°C foram similares àquelas observadas em água a 5 – 15°C. Essa descoberta é, ao mesmo tempo, apoiada [13] e contestada [12] pelos resultados de outros pesquisadores, e pode depender da resposta a ser examinada [10].
Vestuário
Em acréscimo à mudança na taxa da temperatura da pele, a magnitude da resposta ao choque frio iniciada na imersão em água fria é também determinada pela área da superfície exposta ao estímulo frio [40, 68]. Esse efeito temporal e espacial pode variar de extensão sendo alterado pelas roupas.
Embora roupas normais sejam capazes de atenuar a resposta ao choque frio [10, 69], isso pode ainda apresentar níveis de riscos potenciais para os indivíduos [15, 40]. Roupas de proteção especiais fornecem uma proteção significativamente maior [16, 40, 51] através da redução do índice de queda da temperatura da pele e da área da superfície molhada. Apenas um pequeno número de autores atentaram pra determinar quais áreas corporais são particularmente importantes para o inicio da resposta ao choque frio. Como parte de um estudo mais amplo, Keating & Nadel [25] examinaram a resposta ventilatória evocada pelo resfriamento repentino de diferentes partes do corpo com duchas a 15°C. Eles obtiveram a maior resposta quando a frente do tronco e a parte de trás do peito foram resfriados. Uma menor resposta foi iniciada pelo resfriamento da região torácica e lombar das costas e extremidades, apesar da área de superfície das extremidades ser maior que aquela resfriada durante a exposição do tronco.
Pensou-se que essas descobertas fossem devido à habituação ao frio pelas extremidades e a escassez de receptores de frio nessa região. Essa última sugestão foi baseada na evidência psico-física da identificação de pontos frios: embora cada ponto frio possa corresponder a uma única terminação de um receptor de frio [70]; a interpretação de cada evidência exige algum cuidado como revelaram estudos eletrofisiológicos em descargas constantes nos receptores de calor e frio a um percentual termo-neutro [52, 71].
Mais recentemente, Tipton & Golden [16] examinaram a melhora da resposta ao choque frio depois do isolamento de uma região na superfície do corpo. Eles relataram que essa proteção dos membros reduz, significativamente, a média da freqüência cardíaca e das respostas ventilatórias observadas em 12 indivíduos durante o primeiro minuto de imersão em água a 10°C, quando comparadas com as respostas registradas durante a imersão de indivíduos nus em água a 10°C. A proteção do tronco reduz, significativamente, a ventilação na imersão, mas falha na redução da resposta da freqüência cardíaca quando comparada com a imersão de indivíduos nus. Os autores concluíram que pode haver diferenças na importância relativa das áreas corporais distintas para o início de algumas das respostas incluídas na resposta ao choque frio.
Exercício e atividades aeróbicas
A performance do exercício brando, durante os primeiros minutos da imersão, não previne a ocorrência de hiperventilação no choque frio e de quedas na pressão parcial do dióxido de carbono no final do volume corrente [12]. Nos níveis de exercício moderado e máximo, a queda na pressão parcial de dióxido de carbono pode ser reduzida ou revertida [10, 12] e, então, ocorre hiperpnéia ao invés da hiperventilação.
Uma adaptação cruzada entre exercícios e a resposta termo-regulatória na exposição ao frio no homem foi observada por diversos autores [10, 72-75]. Poucos pesquisadores examinaram a relação entre exercícios e a resposta ao choque frio. Hull et al. [48] encontraram que atividade aeróbica está inversamente relacionada à freqüência cardíaca no homem, mas não nas mulheres, durante um teste que aumenta a pressão sanguinea através do frio; e Golden & Tipton [76] relataram uma relação inversa entre atividade aeróbica em indivíduos e suas respostas cardíacas e ventilatórias decorrentes do choque frio na imersão em água a 15°C.
O mecanismo por trás dessa adaptação cruzada não é conhecido, mas acredita-se que a preparação do sistema aeróbico, altera o equilíbrio entre a atividade dos sistemas nervosos simpático e parassimpático, assim como o mecanismo colinérgico vagal é aumentado enquanto o mecanismo adrenérgico simpático é inibido [77-79]. Como o sistema nervoso autonômico é envolvido no início da resposta ao choque frio, é possível que alterações exercício-induzidas correspondentes a esse sistema possam atenuar a resposta ao choque frio dos indivíduos.
Habituação ao frio
Apenas poucos autores [10, 12, 14, 17] examinaram as alterações que ocorrem na resposta ao choque frio do homem após repetidas exposições ao frio. Keatinge & Evans [10] relataram que oito imersões em água a 15°C reduzem ou eliminam as respostas iniciais respiratória, de freqüência cardíaca e metabólica à imersão, e aumentam os níveis de dióxido de carbono do final do volume corrente e aumentam o conforto térmico dos indivíduos. Em contrapartida, Rochelle & Horvath [14] não acharam qualquer diferença significante entre a freqüência cardíaca e as respostas ventilatorias de surfistas regulares e não surfistas durante o primeiro minuto de imersão em água a 19°C.
Golden & Tipton [17] confirmaram as descobertas de Keatinge & Evans [10] e descreveram o tempo total de adaptação da freqüência cardíaca e da resposta ventilatória após oito imersões em água a 15°C. O perfil de adaptação dessas duas respostas foi encontrado de maneira diferente; a resposta ventilatória inicial a imersão foi reduzida em grande quantidade, inicialmente, quando comparada com imersões mais longas, apesar da resposta da freqüência cardíaca ser reduzida em grande quantidade na imersão mais longa ao invés da mais curta. Além disso, encontrou-se que a resposta da freqüência cardíaca em imersões mais longas se aproxima do registrado em imersões na água a temperaturas termo-neutras, apesar da resposta ventilatória permanecer significativamente mais alta (250%).
Esses resultados sugerem que pela imersão mais longa em água fria a resposta da freqüência cardíaca foi quase completamente habituada, mas a resposta ventilatória não; mesmo porque, isso leva um tempo total mais longo de adaptação ou porque não possui a mesma capacidade para adaptação.
As áreas frontais do córtex cerebral mostraram estar envolvidas na habituação da resposta da freqüência cardíaca em ratos à imersão fria em suas caudas [80] e, pensou-se na hipótese [81] de que o córtex frontal acelera mudanças plásticas ocorridas a nível subcortical: a formação reticular foi envolvida [82]. Com um treinamento físico, repetidas exposições ao frio severo podem resultar na diminuição da resposta simpática ao frio e aumento da resposta vagal [83]. Seja qual for o mecanismo preciso, uma vez estabelecido, a habituação da resposta ao choque frio pode permanecer por alguns meses [82].
Pré-aquecimento
Foi relatado [12, 26] que o pré-aquecimento na sauna, assim como aumenta a temperatura da pele, sem interferir na temperatura central, atenua, significativamente, a resposta ventilatória dos indivíduos para uma subseqüente imersão em água fria. Como a temperatura da pele pareceu cair na mesma velocidade da imersão, com ou sem sauna prévia, os autores tentaram explicar suas descobertas pressupondo a existência de receptores profundos na pele. Sugeriu-se que depois da sauna, os receptores profundos não resfriam rapidamente durante os minutos iniciais de imersão e, como conseqüência, o estímulo aferente da respiração foi reduzido [12].
Durante outro estudo [67] essa sugestão foi confirmada quando o aumento da porcentagem observada na ventilação em imersão na água fria pareceu estar correlacionada com mudanças na temperatura profunda da pele (1 – 2 mm), mas não na temperatura superficial da pele. No entanto, os autores foram incapazes de demonstrar com esse estudo um efeito atenuante da sauna na resposta ventilatória na imersão em água fria.
A RESPOSTA AO CHOQUE FRIO E A RESPOSTA AO MERGULHO
A outra resposta inicial a imersão em água fria é a resposta ao mergulho. Isso é mais proeminente, e foi mais extensivamente investigada em mamíferos que mergulham. Os maiores componentes da resposta ao mergulho foram identificados como sendo apnéia, bradicardia e vasoconstrição seletiva [5-9]; o efeito principal dessa resposta é o aumento do tempo debaixo da água por distribuição do fluxo sanguíneo para tecidos mais susceptíveis à hipóxia, como o cérebro e o miocárdio.
Apesar de sugestões que podem levar a arritmias cardíacas mediadas vagalmente, essas são interrompidas no homem [7, 84, 85] e, é improvável, que influenciem como facilitadores na ressurreição de vítimas imersas [27, 86]; alguns autores [87, 88] acreditam que a resposta ao mergulho pode estar relacionada com a sobrevivência de indivíduos, principalmente crianças, após muitos minutos de submersão. Esse contraste com a resposta ao choque frio é potencialmente perigoso.
Pensou-se que a resposta ao mergulho era iniciada depois da estimulação oftálmica do nervo trigêmio pela imersão da face em água fria [6, 89]. Durante uma imersão acidental com a cabeça de fora, a vítima normalmente demonstra uma resposta ao choque frio, então iniciada pela queda da temperatura da pele. No entanto, quando a imersão acidental envolve a submersão de todo o corpo o estimulo para ambas as respostas, ao choque frio e ao mergulho, estão presentes. Sob tais condições, é a resposta ao choque frio que predomina, segundo registros, tanto em crianças [86] como em adultos [27].
RESUMO E CONCLUSÃO
Essa pesquisa esta resumida na fig 1. Ela concluiu que a resposta ao choque frio pode resultar na morte ou em sérias incapacidades de um individuo, bem antes do desenvolvimento de uma hipotermia geral. Dessa forma, essa resposta é provavelmente responsável pela maioria das mortes anuais por imersão no mar.
Eu sou grato pela assistência dada pelo Capitão Cirurgião F. St. C. Golden (Marinha Real Britânica) na preparação desse artigo.
REFERÊNCIAS
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