REABILITAÇÃO PÓS-ALTA HOSPITALAR NO PACIENTE ACOMETIDO PELA COVID-19

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Dra. Vanessa Marques Ferreira (SP)
Departamento de Anestesiologia, Dor e Medicina Intensiva – Universidade Federal de São Paulo.
PALESTRANTE CONFIRMADA

Contextualização: O novo coronavírus (CoV) é considerado altamente infeccioso e patogênico e causa a síndrome respiratória aguda grave (SARS)-CoV-2, e responsável pela pandemia. Embora a COVID-19 afete predominantemente o sistema respiratório, as evidências indicam uma doença multissistêmica que é freqüentemente grave e pode resultar em morte. As sequelas de longo prazo da COVID-19 são desconhecidas, mas as evidências de surtos anteriores de CoV demonstram comprometimento da função pulmonar e física, redução da qualidade de vida e sofrimento emocional. Muitos sobreviventes da COVID-19 que necessitaram de cuidados críticos podem desenvolver comprometimentos psicológicos, físicos e cognitivos, demonstrando assim que existe uma clara necessidade de orientação sobre a reabilitação dos sobreviventes da COVID-19.

Desenvolvimento: Um relatório recente relatou que pacientes que receberam alta com pneumonia por COVID-19 ainda apresentavam anormalidades residuais nas tomografias computadorizadas (TC) de tórax, com a opacidade em vidro fosco como o padrão mais comum (1). Sabe-se que o comprometimento persistente da função pulmonar e da capacidade de exercício dura meses ou até anos (2-5) nos sobreviventes recuperados de outras pneumonias por coronavírus (síndrome respiratória aguda grave (SARS) e síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS)). Mo X e colaboradores (6) avaliaram a função pulmonar em pacientes no pós-alta por internação pela COVID-19 e confirmaram que nesses sobreviventes, o comprometimento da capacidade de difusão é a anormalidade mais comum da função pulmonar, seguida por defeitos ventilatórios restritivos, ambos associados à gravidade da doença. Eles reforçam que testes de função pulmonar (não apenas espirometria, mas também capacidade de difusão) devem ser considerados no acompanhamento clínico de rotina de certos sobreviventes recuperados, principalmente em casos graves. Portanto, a reabilitação pulmonar reduz os sintomas, aumenta a capacidade funcional e melhora a qualidade de vida em indivíduos com doença respiratória, mesmo naqueles com alterações irreversíveis da arquitetura pulmonar já que os benefícios do tratamento são das morbidades secundárias causadoras do comprometimento e da melhora da função, em vez do distúrbio respiratório per se.

Após a COVID-19, especialmente naqueles pacientes que necessitaram de cuidados em UTI, é provável que apresente: disfunção muscular periférica (devido ao descondicionamento e diminuição da massa corporal magra, neuropatia na unidade de terapia intensiva, fadiga e efeitos da hipoxemia), disfunção muscular respiratória (padrão respiratório disfuncional e obstrução laríngea induzida pelo exercício), comprometimento e descondicionamento cardíacos e fatores psicossociais (ansiedade, depressão, culpa, perturbação do sono e dependência) (7).

Quanto às consequências cardíacas é provável que sejam multifatoriais e possam resultar de lesão miocárdica viral, hipóxia, regulação negativa do receptor ACE2, hipotensão, carga inflamatória sistêmica elevada ou toxicidade de drogas. Devido a isso, sugere-se que os mediadores pró-inflamatórios envolvidos na COVID-19 resultam em inflamação vascular, miocardite e complicações arrítmicas. A lesão cardíaca aguda, determinada por biomarcadores cardíacos elevados, tem sido descrita como mais alta naqueles com mortalidade aumentada, doença grave e naqueles que necessitaram de suporte ventilatório. Maior risco de mortalidade foi identificado em pessoas do sexo masculino, com idade avançada e com outras comorbidades, incluindo hipertensão, diabetes mellitus, doenças cardiovasculares e doenças cerebrovasculares (8,9).

Dessa forma, qualquer paciente que foi acometido por infecção pela COVID-19 deve ser considerado uma prioridade para reabilitação e ser considerando paciente de risco, pois exige uma avaliação completa uma vez que, além de comprometimento cardiovascular e respiratório, temos descritos comprometimentos hepáticos, hematológicos, neurológicos, psicológicos, entre outros.

Dependendo da avaliação e dos sintomas iniciais do paciente, investigações adicionais podem incluir um painel de sangue especializado, eletrocardiograma de repouso (ECG), eletrocardiograma de 24 horas, ecocardiograma, teste de exercício cardiopulmonar e ressonância magnética cardiovascular (10).

Considerações finais: A avaliação inicial é recomendada em tempo hábil assim que for seguro fazê-lo, a depender da reversão da insuficiência respiratória também considerando o status físico e mental do paciente. Exercícios de baixa intensidade (≤3 METs ou equivalente) devem ser considerados inicialmente particularmente para pacientes que necessitaram de oxigenoterapia, sempre com a monitorização dos sinais vitais (frequência cardíaca, oximetria de pulso e pressão arterial). O aumento gradual do exercício deve ser baseado na ausência de sintomatologia (11).

Em casos de pacientes que evoluíram com miocardite, é sugerido um período de repouso pós-infecção a fim de reduzir o risco de insuficiência cardíaca e caso essa se apresente, um profissional específico da cardiologia deve adaptar os exercícios as complicações cardíacas que o paciente apresente.

Referências:

  1. Wang Y, Dong C, Hu Y, et al. Temporal Changes of CT Findings in 90 Patients with COVID-19 Pneumonia: A Longitudinal Study [published online ahead of print, 2020 Mar 19]. Radiology. 2020;200843. doi:10.1148/radiol.2020200843.
  2. Hui DS, Joynt GM, Wong KT, et al. Impact of severe acute respiratory syndrome (SARS) on pulmonary function, functional capacity and quality of life in a cohort of survivors. Thorax. 2005;60(5):401-409. doi:10.1136/thx.2004.030205
  3. Hui DS, Wong KT, Ko FW, et al. The 1-year impact of severe acute respiratory syndrome on pulmonary function, exercise capacity, and quality of life in a cohort of survivors. Chest. 2005;128(4):2247-2261. doi:10.1378/chest.128.4.2247
  4. Ngai JC, Ko FW, Ng SS, To KW, Tong M, Hui DS. The long-term impact of severe acute respiratory syndrome on pulmonary function, exercise capacity and health status. Respirology. 2010;15(3):543-550. doi:10.1111/j.1440-1843.2010.01720.x
  5. Park WB, Jun KI, Kim G, et al. Correlation between Pneumonia Severity and Pulmonary Complications in Middle East Respiratory Syndrome. J Korean Med Sci. 2018;33(24):e169. Published 2018 May 10. doi:10.3346/jkms.2018.33.e169.
  6. Mo X, Jian W, Su Z, et al. Abnormal pulmonary function in COVID-19 patients at time of hospital discharge. Eur Respir J. 2020;55(6):2001217. Published 2020 Jun 18. doi:10.1183/13993003.01217-2020
  7. Spruit MA, Singh SJ, Garvey C, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: key concepts and advances in pulmonary rehabilitation [published correction appears in Am J Respir Crit Care Med. 2014 Jun 15;189(12):1570]. Am J Respir Crit Care Med. 2013;188(8):e13-e64. doi:10.1164/rccm.201309-1634ST
  8. Kochi AN, Tagliari AP, Forleo GB, Fassini GM, Tondo C. Cardiac and arrhythmic complications in patients with COVID-19. J Cardiovasc Electrophysiol. 2020;31(5):1003-1008. doi:10.1111/jce.14479
  9. Madjid M, Safavi-Naeini P, Solomon SD, Vardeny O. Potential Effects of Coronaviruses on the Cardiovascular System: A Review [published online ahead of print, 2020 Mar 27]. JAMA Cardiol. 2020;10.1001/jamacardio.2020.1286. doi:10.1001/jamacardio.2020.1286
  10. Baggish A, Drezner JA, Kim J, Martinez M, Prutkin JM. Resurgence of sport in the wake of COVID-19: cardiac considerations in competitive athletes [published online ahead of print, 2020 Jun 19]. Br J Sports Med. 2020;bjsports-2020-102516. doi:10.1136/bjsports-2020-102516
  11. Barker-Davies RM, O\’Sullivan O, Senaratne KPP, et al. The Stanford Hall consensus statement for post-COVID-19 rehabilitation [published online ahead of print, 2020 May 31]. Br J Sports Med. 2020;bjsports-2020-102596. doi:10.1136/bjsports-2020-102596