REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202509301024
Jean Carlos Ledur Motta
Pedro Gesser Barbosa
Resumo
O presente artigo científico analisa as complexas dinâmicas do tiro embarcado, uma habilidade tática crucial para forças de segurança que operam em ambientes fluviais. O estudo tem como objetivo central investigar os fatores que influenciam a precisão dos disparos realizados a partir de uma plataforma móvel contra um alvo estático, modalidade de maior relevância e dificuldade para unidades como o Corpo de Operações de Busca e Repressão Anfíbia (COBRA) do Batalhão de Polícia de Fronteira (BPFron). A metodologia adotada combina uma rigorosa revisão da literatura, abrangendo doutrinas militares e estudos de balística externa, com a análise físicomatemática dos fenômenos envolvidos, como o movimento relativo, a compensação lateral e o salto aerodinâmico. Adicionalmente, realiza-se um estudo de campo quantitativo e qualitativo, examinando os dados de quatro exercícios de tiro distintos, envolvendo um total de 87 operadores de diferentes forças táticas (BPFron, NOE-PRF, PMMT). Os resultados quantitativos revelam uma taxa de acerto consistentemente baixa, situando-se abaixo de 5%, o que evidencia a dificuldade intrínseca da tarefa. A análise qualitativa, baseada em feedbacks e observações, aponta para a existência de um conflito cognitivo como principal obstáculo à correta aplicação da técnica, além de fatores como a ansiedade de desempenho e a falta de familiaridade com o armamento. O estudo conclui que a maximização da eficiência no tiro embarcado depende não apenas do domínio técnico e da compreensão dos princípios físicos, mas também da superação de vieses cognitivos e da automação dos fundamentos de tiro. Propõe-se um modelo de treinamento progressivo e a utilização de tecnologias, como designadores laser, como ferramentas eficazes para mitigar as dificuldades observadas e aprimorar o desempenho operacional.
Palavras-chave: Tiro Tático. Operações Fluviais. Balística Externa. Fator Humano. Treinamento Policial.
Abstract
This scientific article analyzes the complex dynamics of vessel-based shooting, a crucial tactical skill for law enforcement agencies operating in riverine environments. The study’s central objective is to investigate the factors that influence the accuracy of shots fired from a moving platform at a static target, the most relevant and difficult modality for units such as the Amphibious Search and Repression Operations Corps (COBRA) of the Border Police Battalion (BPFron). The adopted methodology combines a rigorous literature review, covering military doctrines and external ballistics studies, with a physical-mathematical analysis of the involved phenomena, such as relative motion, lateral compensation (lead/lag), and aerodynamic jump. Additionally, a quantitative and qualitative field study is conducted, examining data from four distinct shooting exercises involving a total of 87 operators from different tactical forces (BPFron, NOE-PRF, PMMT). The quantitative results reveal a consistently low hit rate, below 5%, which highlights the intrinsic difficulty of the task. The qualitative analysis, based on feedback and observations, points to the existence of a cognitive conflict as the main obstacle to the correct application of the technique, along with factors such as performance anxiety and lack of familiarity with the weaponry. The study concludes that maximizing efficiency in vessel-based shooting depends not only on technical mastery and understanding of physical principles but also on overcoming cognitive biases and automating shooting fundamentals. A progressive training model is proposed, along with the use of technologies such as laser designators, as effective tools to mitigate the observed difficulties and enhance operational performance.
Keywords: Tactical Shooting. Riverine Operations. External Ballistics. Human Factor. Police Training.
1 INTRODUÇÃO
O ambiente fluvial, especialmente em regiões de fronteira, apresenta desafios únicos e complexos para as forças de segurança. A vasta extensão de rios e lagos serve como rota para uma miríade de atividades ilícitas, incluindo narcotráfico, contrabando de armas e mercadorias, e crimes ambientais. Nesse cenário, o domínio de táticas de patrulhamento e abordagem em embarcações torna-se uma capacidade operacional indispensável. Dentre as habilidades requeridas, o tiro embarcado emerge como uma das mais críticas e, simultaneamente, uma das mais difíceis de serem executadas com proficiência.1
O presente estudo visa analisar as dinâmicas do tiro embarcado, com foco particular na modalidade em que o atirador se encontra em movimento e o alvo, estático. Esta situação é a mais recorrente nas operações do Pelotão Corpo de Operações de Busca e Repressão Anfíbia (COBRA) do Batalhão de Polícia de Fronteira (BPFron), da Polícia Militar do Estado do Paraná, cujas missões frequentemente envolvem a necessidade de neutralizar ameaças em terra a partir de uma plataforma fluvial em deslocamento.1 A degradação da precisão do tiro, causada pela instabilidade da plataforma, pelo movimento relativo e por uma série de fatores ambientais e balísticos, constitui um problema tático significativo. A literatura policial nacional carece de uma doutrina consolidada que aborde este tema com a profundidade necessária, combinando uma análise física rigorosa com dados empíricos de treinamento, o que justifica a presente investigação.2
O objetivo geral deste trabalho é analisar as dinâmicas do tiro embarcado para desenvolver e validar técnicas que aumentem a eficiência e a taxa de acerto em operações policiais. Para tanto, foram definidos os seguintes objetivos específicos: (1) modelar os princípios físicos e balísticos que governam a trajetória do projétil no contexto embarcado; (2) analisar quantitativa e qualitativamente os resultados de exercícios de tiro realizados por diferentes unidades táticas; (3) identificar os principais fatores (técnicos, ambientais e humanos) que influenciam o desempenho; e (4) propor um conjunto de recomendações e um modelo de treinamento para o aprimoramento da técnica.
Para atingir tais objetivos, o artigo está estruturado da seguinte forma: a seção 2 apresenta a fundamentação teórica, revisando a doutrina tática militar e os princípios da balística externa. A seção 3 dedica-se à modelagem físico-balística do tiro embarcado, detalhando os conceitos de movimento relativo, compensação lateral e efeitos aerodinâmicos. A seção 4 descreve a metodologia dos estudos de campo realizados. A seção 5 apresenta e discute os resultados quantitativos e qualitativos obtidos. Por fim, a seção 6 sintetiza as conclusões do estudo e oferece recomendações práticas para a otimização do treinamento e da doutrina de tiro embarcado.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E REVISÃO DA LITERATURA
A eficácia do tiro embarcado não reside apenas na habilidade individual do atirador, mas em uma profunda compreensão dos princípios que regem a balística e das doutrinas táticas que orientam o engajamento de alvos em cenários dinâmicos. Esta seção estabelece o alicerce teórico do estudo, revisando a literatura pertinente em duas áreas complementares: a doutrina tática para engajamento a partir de plataformas móveis e os fundamentos da balística externa aplicada.
2.1 Doutrina Tática para Engajamento de Alvos a Partir de Plataformas Móveis
A literatura militar, especialmente a norte-americana, oferece um arcabouço conceitual robusto para o engajamento de alvos móveis, cujos princípios podem ser adaptados para o cenário do tiro embarcado. O manual de campanha do Exército dos EUA (TC 322.9) define duas técnicas primárias: o “tracking” (rastreamento) e o “trapping” (armadilha ou emboscada).1 O método de rastreamento consiste em acompanhar o movimento do alvo com a mira, mantendo uma compensação (lead) à sua frente, e acionar o gatilho enquanto se mantém o movimento sincronizado. O método de armadilha, por sua vez, envolve mirar em um ponto futuro na trajetória do alvo e disparar quando o alvo atinge esse ponto.4 Ambas as técnicas são diretamente aplicáveis à modalidade de tiro com atirador parado e alvo em movimento, exigindo do operador a capacidade de antecipar a trajetória do alvo.
O Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA (U.S. Marine Corps) reforça essa necessidade, afirmando que “uma compensação é mantida à frente de um alvo em movimento para compensar a distância que o projétil percorrerá enquanto o alvo se move” (MARINE CORPS, 2001, p. 7-15).1 Embora estes manuais se concentrem no engajamento de alvos móveis por um atirador estático, os princípios de compensação baseados no tempo de voo do projétil e na velocidade relativa são universais.
A transposição desses conceitos para plataformas móveis encontra paralelo na doutrina de combate veicular (VCQB – Vehicle Close Quarters Battle) e operações de comboio.6 Manuais como o FM 4-01.45 detalham táticas para engajamento a partir de veículos em movimento, abordando setores de tiro, coordenação de fogos e resposta a emboscadas.7 A complexidade introduzida pelo movimento da própria plataforma do atirador adiciona novas variáveis, como o vento relativo e a instabilidade do terreno (ou, no caso fluvial, das ondulações), mas o fundamento físico da compensação do movimento relativo permanece o mesmo.8
No contexto brasileiro, o Manual de Campanha do Exército de 1986, embora antigo, já preconizava a concentração de fogo à frente de alvos aéreos de baixa velocidade, demonstrando uma compreensão intuitiva da necessidade de “atirar no ponto futuro”.1 Contudo, observa-se uma lacuna na doutrina formal das polícias brasileiras no que tange especificamente ao tiro embarcado, com a maioria dos manuais de tiro policial focando em posturas estáticas e procedimentos de segurança em ambientes urbanos convencionais.2 Esta lacuna reforça a importância de estudos como o presente, que buscam formalizar o conhecimento tático e técnico para um cenário operacional específico e de alta complexidade.
2.2 Fundamentos de Balística Externa Aplicada
A balística externa é o ramo da física que estuda o movimento do projétil após abandonar o cano da arma até atingir o alvo.10 A trajetória do projétil é governada por um conjunto de forças, sendo as principais a gravidade, que impõe uma trajetória parabólica, e a resistência do ar (arrasto), que desacelera o projétil e torna a parábola assimétrica.12
Autores como Carlucci & Jacobson (2018) fornecem uma base matemática rigorosa para a modelagem dessas trajetórias, detalhando como fatores como velocidade inicial, ângulo de lançamento e as propriedades do projétil determinam seu percurso.14 A resistência do ar é um fator complexo, dependente da densidade do ar (influenciada por altitude, temperatura e pressão atmosférica), da velocidade do projétil e de sua forma aerodinâmica.12 A eficiência aerodinâmica de um projétil é quantificada pelo seu Coeficiente Balístico (BC), um parâmetro fundamental para cálculos precisos em tiros de longa distância. Projéteis com BC mais alto são menos afetados pelo arrasto e pelo vento, mantendo a velocidade por mais tempo e apresentando uma trajetória mais tensa.16 O trabalho de balísticos como Bryan Litz tem sido fundamental para popularizar a compreensão e aplicação prática do BC, fornecendo dados extensivos para uma vasta gama de projéteis comerciais.17
Além das forças primárias, efeitos secundários como o desvio giroscópico (spin drift), o efeito Coriolis e o salto aerodinâmico (aerodynamic jump) ganham relevância, especialmente em longas distâncias ou em condições específicas, como as do tiro embarcado.17 O salto aerodinâmico, em particular, é de extrema importância para este estudo, pois é induzido por um vento lateral, que no caso do tiro embarcado é gerado pelo próprio deslocamento da plataforma (vento relativo).1
Finalmente, a análise não pode ignorar o fator humano. O desempenho no tiro é uma habilidade psicomotora complexa. A citação de Cunha, mencionada no documento base, ressalta que “atirar é 90% mental” e que a ansiedade pela falta de domínio da arma leva o atirador a “se livrar” do disparo, negligenciando a técnica.1 Esta observação é corroborada por estudos sobre performance sob estresse, que demonstram como a sobrecarga cognitiva e a ansiedade degradam as habilidades motoras finas necessárias para o controle preciso do gatilho e a manutenção da visada.21 Os feedbacks dos operadores nos exercícios analisados neste estudo ecoam essa realidade, apontando o desconforto e a falta de familiaridade com a arma e o ambiente como fatores prejudiciais ao desempenho.1 Portanto, uma análise completa do tiro embarcado deve, necessariamente, integrar os princípios rígidos da física com as variáveis mais fluidas da psicologia e da fisiologia humana.
3 MODELAGEM FÍSICO-BALÍSTICA DO TIRO EMBARCADO
A aparente complexidade do tiro embarcado pode ser desmistificada através da aplicação de princípios fundamentais da física e da balística. Esta seção se dedica a modelar os fenômenos que governam a trajetória do projétil, dissecando o problema em seus componentes vetoriais, analisando a dinâmica da compensação lateral e explorando os efeitos aerodinâmicos secundários que se tornam primários neste contexto específico.
3.1 Análise Vetorial do Movimento Relativo: Uma Questão de Referencial
O cerne da dificuldade no tiro embarcado reside na compreensão do movimento relativo. Do ponto de vista da mecânica newtoniana, não existe diferença fundamental entre um atirador em movimento disparando contra um alvo parado e um atirador parado disparando contra um alvo em movimento. Ambos os cenários são governados pelo mesmo princípio: para que o projétil intercepte o alvo, o ponto de mira deve compensar o movimento relativo total entre o atirador e o alvo durante o tempo de voo do projétil (t).22
A dificuldade, portanto, não é de natureza física, mas sim perceptual e cognitiva. O cérebro humano, por padrão, ancora-se na plataforma em que se encontra (a embarcação) como um referencial “estacionário”. Isso torna o conceito de mirar “atrás” de um alvo fisicamente parado para acertá-lo uma ação profundamente contraintuitiva, pois contradiz o instinto de mirar na ameaça.1
Para ilustrar, considere o cenário principal deste estudo: atirador em movimento, alvo parado. A embarcação se desloca com uma velocidade vetorial Vb. O atirador dispara um projétil com uma velocidade inicial Vp em relação à embarcação. O tempo que o projétil leva para percorrer a distância D até o alvo é t=D/Vp. Durante este exato intervalo de tempo t, a embarcação (e, consequentemente, o atirador) se deslocou uma distância Δx=Vb⋅t. Se o atirador mirasse diretamente no alvo no instante do disparo, no momento em que o projétil chegasse ao plano do alvo, o ponto de impacto estaria à frente do alvo, exatamente pela distância Δx que a embarcação percorreu.
Portanto, para que o projétil atinja o alvo, o disparo deve ser efetuado quando a linha de visada aponta para um “ponto passado”, uma posição a retaguarda do alvo. A distância dessa compensação a retaguarda deve ser precisamente a distância que a embarcação percorrerá durante o tempo de voo do projétil. O que o atirador precisa fazer é calcular (ou estimar) o ponto no espaço onde a trajetória futura do projétil interceptará a posição fixa do alvo, levando em conta o seu próprio deslocamento futuro.
Figura 1 – Diagrama Vetorial do Movimento Relativo no Tiro Embarcado

Fonte: Elaborado pelos autores (2025), valores ilustrativos, tracejado vermelho – linha de voo do projétil, linha amarela – compensação.
3.2 A Dinâmica da Compensação Lateral (Lead/Lag)
A compensação lateral, conhecida no jargão militar como “lead” (adiantamento) ou “lag” (atraso), é a aplicação prática do princípio do movimento relativo. As fórmulas para seu cálculo são idênticas em magnitude para os dois cenários principais, apenas mudando a direção da compensação em relação ao alvo.
Atirador Parado, Alvo em Movimento: Neste caso, o atirador deve mirar à frente do alvo, no chamado “ponto futuro”.1 A distância da compensação (lead) é calculada para que o projétil e o alvo cheguem ao mesmo ponto no espaço ao mesmo tempo.
Figura 2 – Compensação Lateral (Lead) para Atirador Parado e Alvo em Movimento

Fonte: Elaborado pelos autores (2025), valores ilustrativos, tracejado vermelho – linha de voo do projétil, linha amarela – compensação.
Atirador em Movimento, Alvo Parado: Este é o foco do estudo. Como demonstrado, a compensação deve ser feita a retaguarda do alvo (“ponto passado”). A magnitude dessa compensação lateral (CL) depende da velocidade da embarcação (Vb ), do tempo de voo do projétil (t) e do ângulo de tiro (θ) em relação à linha de deslocamento da embarcação. A fórmula apresentada no documento original é a ferramenta fundamental para este cálculo 1:
CL=Vb⋅sin(θ) t⋅
Onde:
- Vb é a velocidade da embarcação (em m/s).
- sin(θ) é o seno do ângulo de tiro. Este componente é crucial, pois decompõe o vetor de velocidade da embarcação em sua componente perpendicular à linha de visada. É esta componente perpendicular que causa o desvio lateral.
- t é o tempo de voo do projétil (em s), que pode ser aproximado por t=D/Vp, onde D é a distância ao alvo e Vp é a velocidade média do projétil.
Esta fórmula explica matematicamente por que a compensação é máxima quando o ângulo de tiro é de 90 graus. Em θ=90 , sin(θ)=1, e toda a velocidade da embarcação∘ se traduz em movimento lateral relativo ao alvo. Em θ=0 (disparando diretamente para∘ a proa), sin(θ)=0, e não há necessidade de compensação lateral. Para facilitar a aplicação prática em campo, a sugestão de calcular a compensação máxima (a 90°) e usar frações para outros ângulos (como 7/8 para 60° e 1/2 para 30°) é uma heurística operacionalmente válida e eficaz.1
Figura 3 – Compensação Lateral (Lag) para Atirador em Movimento e Alvo Parado

Fonte: Elaborado pelos autores (2025). Frisando que a compensação aumenta a medida q o ângulo de tiro se aproxima do máximo 90°, após o ângulo máximo a uma redução gradativa da compensação.
3.3 Efeitos Aerodinâmicos Secundários e Sua Relevância Tática
Em um ambiente de tiro de precisão estático, o vento natural é uma das principais variáveis a serem consideradas. No entanto, no tiro embarcado em alta velocidade, o vento relativo — o vento gerado pelo próprio deslocamento da embarcação — torna-se um fator dominante e não pode ser ignorado.1 Este vento relativo, que atua na direção oposta ao movimento, induz um fenômeno balístico crítico:
O salto aerodinâmico.
O salto aerodinâmico é o desvio vertical que um projétil em rotação sofre quando submetido a um vento lateral.11 O mecanismo por trás desse efeito é a precessão giroscópica. Um projétil disparado de um cano raiado possui uma alta velocidade de rotação para manter sua estabilidade em voo. Quando uma força lateral (o vento) atua sobre este giroscópio em movimento, ele não se move na direção da força, mas precessa, ou seja, desvia-se em um ângulo de 90 graus em relação à força aplicada, na direção de sua rotação.25
No contexto do tiro embarcado, a aplicação prática é a seguinte:
- Direção da Rotação do Projétil: A maioria dos fuzis militares ocidentais, incluindo os modelos IMBEL IA2, Taurus T4 e IWI Zion 15 utilizados nos exercícios, possui passo de raia para a direita. Isso significa que o projétil gira no sentido horário quando visto pela perspectiva do atirador.1
- Direção do Vento Relativo: A direção do vento relativo depende do lado da embarcação de onde o disparo é efetuado.
- Disparo por Bombordo (lado esquerdo): O vento relativo incide sobre o projétil da direita para a esquerda.
- Disparo por Boreste (lado direito): O vento relativo incide sobre o projétil da esquerda para a direita.
- Resultado (Salto Aerodinâmico):
- Em Bombordo: Um projétil com giro horário, ao receber uma força da direita, precessa para cima. O resultado é um ponto de impacto mais alto que o previsto.1
- Em Boreste: Um projétil com giro horário, ao receber uma força da esquerda, precessa para baixo. O resultado é um ponto de impacto mais baixo que o previsto.1
A magnitude deste salto é proporcional à velocidade do vento relativo (ou seja, à velocidade da embarcação) e pode ser estimada por fórmulas práticas, como “~0,1 MIL de salto a cada 8 mph de vento relativo”.1 Este efeito é um dos fatores mais complexos e menos intuitivos do tiro embarcado, exigindo compensação vertical além da compensação lateral já discutida.
Figura 4 – Ilustração do Fenômeno do Salto Aerodinâmico em Disparos Embarcados

Fonte: Elaborado pelos autores (2025), representando um projétil cujo raiamento do cano é da esquerda para direita, padrão fuzil IA2, Zion 15 e outros. Seta vermelha: Representa o deslocamento vertical para cima quando o vento relativo vem da direita, ou seja, quando o atirador está a bombordo. Seta verde: Representa o deslocamento vertical para baixo quando o vento relativo vem da esquerda, ou seja, quando o atirador está a boreste.
Outro efeito aerodinâmico relacionado é o Efeito Magnus, que também descreve uma força de sustentação em um corpo em rotação que se move através de um fluido.26 Este efeito ocorre quando o eixo de rotação do projétil não está perfeitamente alinhado com seu vetor de velocidade (um ângulo de ataque ou guinada), ou quando há um vento cruzado. A rotação cria uma diferença de velocidade do ar nas superfícies opostas do projétil, resultando em uma diferença de pressão (Princípio de Bernoulli) que gera uma força perpendicular à direção do fluxo de ar.28 Embora o salto aerodinâmico (precessão giroscópica) seja o modelo mais direto para explicar o desvio vertical devido ao vento relativo axial, o Efeito Magnus contribui para desvios laterais e verticais adicionais, especialmente em presença de vento natural cruzado, tornando a balística do tiro embarcado um problema de múltiplos corpos e forças interagentes.30
Figura 5 – Diagrama do Efeito Magnus em um Projétil em Rotação

Fonte: Adaptado de Wikipedia (2024).26
Figura 6 – Nomenclatura Náutica Básica da Embarcação

Fonte: Elaborado pelos autores (2025).
4 METODOLOGIA DO ESTUDO DE CAMPO
Para validar os modelos teóricos e investigar os fatores práticos que influenciam o desempenho no tiro embarcado, foi conduzida uma série de estudos de campo. A metodologia empregada buscou coletar dados quantitativos e qualitativos em um ambiente de treinamento controlado, porém representativo das condições operacionais.
4.1 Delineamento da Pesquisa
O estudo foi delineado como uma pesquisa de campo de natureza mista (quantitativaqualitativa). A abordagem quantitativa focou na coleta de dados de desempenho (número de disparos e acertos) para calcular taxas de sucesso e permitir comparações entre diferentes grupos e condições. A abordagem qualitativa utilizou a observação direta pela equipe de instrução e a coleta de feedbacks (relatos verbais) dos participantes para identificar as dificuldades percebidas, os fatores humanos e as sugestões de melhoria.1
4.2 Participantes
A pesquisa envolveu um total de 87 operadores, divididos em quatro grupos de estudo distintos, representando diferentes unidades táticas e níveis de experiência:
- III CPFron (Curso de Policiamento de Fronteira): 26 alunos do curso e 4 cadetes da Escola de Formação de Oficiais (EsFO), totalizando 30 participantes. A maioria não possuía experiência prévia com tiro embarcado.1
- Nivelamento COBRA: 24 alunos (diurno) e 25 alunos (noturno) do nivelamento interno do Pelotão COBRA/BPFron. Este grupo é composto por operadores que atuam no ambiente fluvial, embora muitos ainda estivessem em fase de adaptação à técnica.1
- NOE-PRF GO (Núcleo de Operações Especiais da Polícia Rodoviária Federal de Goiás): 6 operadores experientes, com amplo domínio de seus armamentos de dotação pessoal, mas sem experiência prévia específica na técnica de tiro embarcado aqui estudada.1
- COPFLU PMMT (Curso de Operações Fluviais da Polícia Militar do Mato Grosso): 12 alunos do curso, a maioria sem contato prévio com os conceitos de tiro embarcado ou com equipamentos de visão noturna.1
4.3 Materiais e Equipamentos
Os exercícios utilizaram os seguintes materiais e equipamentos 1:
- Armamento: Carabinas IMBEL modelo IA2 (Cal. 5,56mm), Fuzis IMBEL modelo PARAFAL (Cal. 7,62mm), Fuzis Taurus/T4 (Cal. 5,56mm) e Fuzis IWI/ZION 15 (Cal. 5,56mm).
- Munição: Munição CBC Calibre 5,56mm M193 e Calibre 7,62mm M1 comum.
- Alvos: Alvos de papel do tipo humanoide, com dimensões de 89cm por 59cm. Em alguns exercícios, foram adicionadas referências visuais (marcas a 1 metro de cada lado do alvo) para auxiliar na compensação.
- Embarcações: Lanchas de patrulha do BPFron.
- Equipamentos Auxiliares: Drones para observação aérea, telêmetro a laser para manutenção da distância, Equipamentos de Visão Noturna (OVN), designadores laser infravermelho e bastões luminosos químicos infravermelhos (cyalume IR).
4.4 Procedimentos
Apesar de pequenas variações, todos os exercícios seguiram um procedimento padrão, focado na modalidade de atirador em movimento e alvo parado 1:
- Instrução Teórica: Antes da fase prática, todos os grupos receberam instrução teórica em sala de aula, abordando os conceitos físicos, as fórmulas de compensação lateral, o efeito do salto aerodinâmico e o posicionamento na embarcação.
- Condições do Exercício: Os disparos foram realizados a uma distância média de 100 metros do alvo, com a embarcação mantendo uma velocidade média constante de aproximadamente 55 km/h. O objetivo era criar um cenário padronizado para o treinamento e a coleta de dados.
- Técnicas de Auxílio: Dependendo do exercício, foram empregadas diferentes técnicas para facilitar a aplicação dos conceitos, como o uso de referências visuais nos alvos, o balizamento da distância com boias e o emprego de um operador com telêmetro a laser para garantir a manutenção da distância correta.
- Coleta de Dados: Ao final de cada passagem de tiro, a equipe de instrução realizava a contagem dos disparos efetuados (descontando panes e munições não utilizadas) e dos acertos nos alvos. Os feedbacks dos participantes e as observações da equipe de instrução sobre o comportamento dos atiradores eram registrados para posterior análise qualitativa.
4.5 Análise de Dados
Os dados quantitativos brutos (disparos e acertos), extraídos de cada um dos quatro relatórios de instrução 1, foram compilados e analisados para calcular o percentual de acerto para cada exercício e condição (diurno/noturno). A fórmula utilizada foi:

Os dados qualitativos (feedbacks e observações) foram submetidos a uma análise de conteúdo, na qual foram identificados e categorizados os temas recorrentes, como dificuldades com a compensação, o conflito com o instinto, a ansiedade de desempenho e a eficácia percebida dos auxílios de treinamento.1
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A análise dos dados coletados nos quatro exercícios de campo proporciona uma visão multifacetada do desafio que o tiro embarcado representa. A combinação da análise quantitativa do desempenho bruto com a análise qualitativa das percepções e comportamentos dos operadores permite não apenas medir o “quê”, mas também entender o “porquê” dos resultados observados.
5.1 Análise Quantitativa do Desempenho
Ao longo dos quatro exercícios distintos, foram efetuados um total de 5.101 disparos em condições diurnas e 1.230 disparos em condições noturnas. Os resultados, consolidados na Tabela 1, revelam um padrão notavelmente consistente.
Tabela 1 – Consolidação dos Resultados Quantitativos dos Exercícios de Tiro Embarcado
Exercício | Data | Nº de Participantes | Período | Nº de Disparos | Nº de Acertos | Percentual de Acerto (%) |
III CPFron | 16/07/2024 | 30 | Diurno | 1712 | 55 | 3,21 |
Nivelamento COBRA | 22/08/2024 | 24 | Diurno | 1440 | 58 | 4,02 |
25 | Noturno | 750 | 26 | 3,46 | ||
NOE-PRF GO | 26/04/2025 | 6 | Diurno | 510 | 22 | 4,31 |
COPFLU PMMT | 11/06/2025 | 12 | Diurno | 719 | 26 | 3,62 |
12 | Noturno | 480 | 20 | 4,17 |
Fonte: Elaborado pelos autores (2025), com base em dados. Exceto no Nivelamento COBRA, onde 1 operador não realizou o tiro diurno, somente o noturno, nos demais exercícios repetiu-se os mesmos operadores.1
A análise dos dados diurnos (Figura 7) demonstra que, independentemente do grupo de operadores — sejam alunos em formação (CPFron, COPFLU), operadores especializados da unidade (COBRA) ou de uma força tática externa de elite (NOEPRF) — o percentual de acerto permaneceu consistentemente em uma faixa estreita e baixa, entre 3,21% e 4,31%. Este achado é de suma importância, pois sugere que a dificuldade da tarefa é intrínseca à sua natureza físico-balística e cognitiva, e não primariamente uma função do nível de experiência geral do operador. Mesmo os policiais do NOE-PRF, descritos como tendo “ampla familiaridade operacional” com seus armamentos, alcançaram a maior taxa de acerto diurna, mas ainda assim em um patamar muito baixo (4,31%).1
Figura 7 – Gráfico Comparativo do Percentual de Acerto nos Exercícios Diurnos

Fonte: Elaborado pelos autores (2025), com base em dados.1
A análise comparativa entre os exercícios diurnos e noturnos (Figura 8), realizados com o Nivelamento COBRA e o COPFLU PMMT, oferece uma perspectiva ainda mais rica. No exercício do COBRA, o desempenho noturno (3,46%) foi ligeiramente inferior ao diurno (4,02%). A equipe de instrução atribuiu este resultado, em parte, ao caráter experimental do exercício noturno, ao baixo volume de disparos por operador e ao desgaste físico dos participantes.1
Contudo, no exercício do COPFLU PMMT, ocorreu o inverso: o percentual de acerto noturno (4,17%) foi superior ao diurno (3,62%). Este foi o primeiro grupo a apresentar tal resultado. A explicação reside em dois fatores-chave: um maior volume de disparos por operador na fase noturna, o que permitiu uma melhor assimilação da técnica, e o feedback unânime dos participantes de que o uso do designador laser tornou a tarefa “mais intuitiva” e facilitou a visualização e o ajuste da compensação lateral.1 Este dado quantitativo corrobora fortemente a análise qualitativa sobre o papel das ferramentas tecnológicas na mitigação dos desafios cognitivos da tarefa.
Figura 8 – Gráfico Comparativo de Desempenho: Diurno vs. Noturno

Fonte: Elaborado pelos autores (2025), com base em dados.1
5.2 Análise Qualitativa: O Fator Humano e a Percepção da Tarefa
Se os números mostram o “quê”, os feedbacks e as observações da equipe de instrução revelam o “porquê”. A análise qualitativa aponta para três fatores humanos interligados que são determinantes para o desempenho no tiro embarcado.
O Conflito Cognitivo e o Viés da Mira: O feedback mais recorrente em todos os grupos foi a extrema dificuldade em “ignorar o instinto de mirar na ‘ameaça’/alvo”.1 Os operadores relataram que, quanto mais se aproximavam do alvo, mais forte era o impulso de alinhar as miras com o centro de massa do alvo, abandonando a técnica de compensação a retaguarda que haviam aprendido em sala de aula. Este não é um simples erro técnico, mas um profundo conflito cognitivo. O cérebro está programado para alinhar o sistema de pontaria com o objeto de interesse. A tarefa do tiro embarcado exige que o operador deliberadamente desfaça essa conexão, uma ação que demanda alta carga cognitiva e esforço consciente.
Nesse contexto, a eficácia do designador laser, relatada pelos participantes dos exercícios noturnos, pode ser reinterpretada. O laser não funciona apenas por iluminar o alvo; sua principal vantagem é a capacidade de externalizar o ponto de mira para a compensação. Ao projetar um ponto de luz visível no “ponto passado” (na vegetação ou no terreno atrás do alvo), o laser fornece ao atirador um referencial tangível e concreto para onde apontar. Isso transforma uma tarefa abstrata (“mirar X metros atrás do alvo”) em uma tarefa concreta (“colocar o ponto laser naquele arbusto”). Essa externalização do ponto de mira parece ser uma ferramenta poderosa para contornar o viés cognitivo e facilitar a aplicação correta da técnica.
Ansiedade de Desempenho e Familiaridade com o Armamento: A equipe de instrução observou consistentemente que muitos atiradores demonstravam desconforto e ansiedade, levando-os a “se livrar dos disparos” em vez de executar a técnica de forma deliberada.1 Esta observação se alinha perfeitamente com a análise de Cunha sobre como a ansiedade, combinada com a falta de domínio da arma, leva a uma performance focada em aliviar a tensão, e não em executar o processo corretamente.1
A falta de familiaridade com a plataforma de tiro (arma longa em movimento) atua como um multiplicador de estresse. Foi observado que operadores com maior experiência específica em armas longas, como os detentores do Curso de Atirador Designado Policial, mostraram-se mais confiantes.1 Isso indica que a proficiência no tiro embarcado não é uma habilidade isolada. Ela é construída sobre uma base sólida de domínio fundamental do armamento. Se um operador não está confortável com o recuo, a ergonomia e o acionamento do gatilho de um fuzil em um ambiente estático, a carga cognitiva de adicionar o movimento da embarcação, o cálculo de compensação e a instabilidade ambiental torna-se esmagadora. A recomendação de aumentar o treinamento básico com fuzil não é, portanto, um desvio do tema, mas uma precondição essencial para o sucesso no tiro embarcado.
Avaliação de Distância e Referências Visuais: Outra dificuldade recorrente foi a “falta de noção sobre avaliação de distâncias”.1 Os operadores relataram não conseguir mensurar a distância necessária para a compensação lateral. Isso reforça a natureza abstrata da tarefa. A introdução de referências visuais nos alvos, como as marcações de 1 metro, foi uma resposta a esse feedback e representa um passo na direção certa. A sugestão dos participantes de usar lonas para marcar a região dos impactos é igualmente valiosa, pois forneceria um feedback visual imediato sobre a magnitude e a direção dos erros, acelerando o ciclo de aprendizado.1
6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O TREINAMENTO
A análise detalhada do tiro embarcado, fundamentada em princípios físicos, doutrina tática e, crucialmente, em dados empíricos de treinamento, permite extrair conclusões robustas e formular recomendações práticas para as forças de segurança que operam em ambientes fluviais. O estudo transcende a simples descrição de uma técnica de tiro, revelando-a como uma atividade complexa na intersecção da balística, da mecânica e da psicologia cognitiva.
Síntese dos Achados:
- Baixa Probabilidade Intrínseca: O tiro embarcado, na modalidade com atirador em movimento e alvo parado, é uma técnica de baixa probabilidade de acerto inerente. Os dados de quatro exercícios distintos, envolvendo 87 operadores de diferentes perfis, demonstraram consistentemente taxas de sucesso abaixo de 5%. Este resultado sugere que expectativas de alta precisão nesta modalidade são irrealistas e que a doutrina tática deve considerar seu emprego primariamente para fins de supressão de fogo, buscando criar volume de fogo em uma área-alvo, em vez de precisão cirúrgica em um ponto-alvo.
- O Obstáculo Cognitivo: O principal fator limitante para o desempenho não é a complexidade das fórmulas físicas, mas um profundo viés cognitivo. O instinto de alinhar o sistema de mira com a ameaça é avassalador e dificulta a aplicação da compensação a retaguarda (“ponto passado”), que é contraintuitiva. A superação deste viés é o desafio central do treinamento.
- O Papel da Tecnologia: O uso de tecnologias de auxílio à mira, especificamente designadores laser, demonstrou ser uma ferramenta eficaz para mitigar o viés cognitivo. Ao externalizar o ponto de mira, o laser fornece um referencial concreto que facilita a aplicação da compensação correta. O desempenho superior no exercício noturno do COPFLU PMMT, atribuído ao uso do laser, é a evidência mais forte desta conclusão.
- A Fundação do Desempenho: A proficiência fundamental com a arma de fogo é um pré-requisito indispensável. A ansiedade e o desconforto observados nos atiradores menos familiarizados com fuzis demonstram que a carga cognitiva da tarefa avançada (tiro embarcado) só pode ser gerenciada se a operação básica da arma estiver automatizada e confortável para o operador.
Proposta de um Modelo de Treinamento Progressivo e Integrado:
Com base nestas conclusões, propõe-se um modelo de treinamento estruturado em quatro fases progressivas, projetado para construir a habilidade de forma lógica e eficaz:
- Fase 1: Fundamentação e Automação (Solo Firme): O foco inicial deve ser fora da água. Esta fase consiste em treinamento intensivo em estande de tiro estático, tanto em seco quanto com fogo real. O objetivo é solidificar o manuseio da arma longa (fuzil/carabina), os fundamentos do tiro (postura, empunhadura, visada, respiração, acionamento) e a gestão do recuo.5 A meta é reduzir a carga cognitiva associada à operação da arma, liberando capacidade mental para as fases subsequentes.
- Fase 2: Assimilação Cognitiva (Foco na Compensação): Ainda em ambiente controlado, esta fase introduz o conceito de compensação. Utilizar exercícios em seco e, se possível, simuladores, focados exclusivamente na mecânica de mirar no “ponto passado”. O uso de alvos com referências visuais claras (como os utilizados nos exercícios) é crucial.1 Ferramentas que externalizam o ponto de mira, como designadores laser (mesmo em treinamento diurno), devem ser empregadas para ajudar a construir o novo padrão motor e neural, superando o viés instintivo.
- Fase 3: Integração em Ambiente Controlado (Água Calma): A transição para a água deve ser gradual. Iniciar com exercícios de tiro embarcado com fogo real em baixa velocidade, em águas calmas. O foco deve ser na aplicação correta da técnica de compensação, sem a pressão da velocidade ou do volume de disparos. A velocidade da embarcação e a complexidade dos cenários (múltiplos alvos, ângulos variados) devem ser aumentadas progressivamente, à medida que os operadores demonstram proficiência.
- Fase 4: Validação em Cenário Realista (Condições Operacionais): A fase final consiste em exercícios completos, como os descritos neste estudo, para validar as habilidades adquiridas sob estresse e em condições mais próximas das operacionais. Nesta fase, o volume de disparos e a velocidade são importantes para simular a necessidade de fogo de supressão. O uso de feedback imediato, como lonas para registrar os impactos próximos ao alvo, pode acelerar o ajuste fino da técnica.1
Implicações para a Doutrina e Futuras Pesquisas:
Este estudo sugere que a doutrina de operações fluviais deve formalizar a complexidade desta modalidade de tiro, estabelecendo protocolos de treinamento baseados em evidências e gerenciando as expectativas de comando quanto à sua eficácia. Recomenda-se a realização de pesquisas futuras para: (a) comparar sistematicamente o desempenho com diferentes tecnologias de auxílio à mira (designadores laser, miras holográficas com retículos balísticos, etc.); (b) desenvolver e medir o impacto de programas de treinamento especificamente focados na mitigação de vieses cognitivos; e (c) investigar a transferência de habilidades do tiro veicular (VCQB) para o tiro embarcado.
Em resumo, o domínio do tiro embarcado é uma jornada que começa com o domínio de si mesmo e da própria arma em terra firme. Somente com uma base sólida, uma compreensão clara da física e um treinamento que respeite e supere as barreiras cognitivas, os operadores poderão transformar esta técnica desafiadora em uma ferramenta eficaz para garantir a segurança em nossos rios e fronteiras.
APÊNDICE A – Tabela de Compensação Lateral Sugerida
A tabela a seguir apresenta um exemplo de guia de referência rápida para compensação lateral, calculada para um cenário específico, que pode ser adaptada e utilizada pelos operadores durante o treinamento e em missões. Os valores são aproximados e servem como ponto de partida, devendo ser ajustados com base na experiência prática e nas condições específicas de cada situação.

Fonte: Elaborado pelos autores (2025).¹

Instruções de Uso:
- Estime a velocidade da embarcação.
- Estime o ângulo de tiro em relação ao alvo (90° = perpendicular; 30° = mais à frente ou atrás).
- Utilize a tabela para encontrar a distância de compensação aproximada a ser aplicada a retaguarda do alvo.
- Lembre-se de aplicar a compensação vertical para o salto aerodinâmico: para cima se atirando de bombordo, para baixo se atirando de boreste, podendo usar como base a tabela abaixo, sendo considerado o valor médio de 0,096 MOA de derivação vertical para cada 1 m/s de deslocamento da embarcação.
Referências citadas
- DINÂMICAS DO TIRO EMBARCADO-1.docx
- manual-unificado.pdf – Gobierno del Estado de Tamaulipas, acessado em agosto 14, 2025, https://www.tamaulipas.gob.mx/seguridadpublica/wp-content/uploads/ sites/10/2017/10/manual-unificado.pdf
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