OTOSCLEROSE: ASPECTOS PATOGÊNICOS, DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS

OTOSCLEROSIS: PATHOGENIC, DIAGNOSTIC, AND THERAPEUTIC ASPECTS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202507161644


Gilmara Morais de Araújo
Humberto Novais da Conceição
Anna Paula de Oliveira Simiema
Lucas Saboia Marinho


Resumo

Introdução: A otosclerose é uma doença osteodistrófica progressiva que acomete o ouvido médio e, ocasionalmente, o ouvido interno. Trata-se de uma causa frequente de perda auditiva condutiva em adultos jovens, caracterizada por remodelação óssea anômala ao redor da janela oval da cóclea, com fixação do estribo. A etiologia envolve fatores genéticos, hormonais e infecciosos. O quadro clínico inclui perda auditiva progressiva, zumbido e, raramente, vertigem. O diagnóstico combina avaliação clínica, exames audiológicos e, quando necessário, imagem. O tratamento inclui dispositivos auditivos, cirurgia (estapedotomia) e, mais recentemente, terapias farmacológicas experimentais. Metodologia: Realizou-se uma revisão narrativa da literatura com busca nas bases PubMed, SciELO, BVS e Portal de Periódicos CAPES, sem restrição de data. Utilizaram-se os descritores “Otosclerose”, “Diagnóstico” e “Tratamento”, com operadores booleanos “AND” e “OR”. Foram incluídos artigos completos, gratuitos e com relevância direta ao tema. Excluíram-se textos duplicados, resumos, revisões não sistemáticas e publicações sem dados clínicos. Resultados e discussão: A doença evolui por fases osteolítica e osteoblástica, levando à perda auditiva condutiva, podendo tornar-se mista se houver acometimento coclear. O diagnóstico é confirmado por audiometria tonal, imitanciometria e, em casos específicos, tomografia. A estapedotomia continua sendo o padrão terapêutico, especialmente com o uso de laser. Para pacientes com contraindicações cirúrgicas, os aparelhos auditivos são eficazes. Estudos recentes avaliam o uso de bifosfonatos, antioxidantes e terapias regenerativas como abordagens promissoras. Conclusão: A otosclerose, embora sem cura definitiva, possui tratamento eficaz que melhora a qualidade de vida. A compreensão dos mecanismos fisiopatológicos e a incorporação de novas terapias ampliam as possibilidades terapêuticas. O diagnóstico precoce e o acompanhamento contínuo são fundamentais para o manejo adequado da doença.

Palavras-chave: Perda audi)va condu)va; Estapedotomia; Diagnós)co audiológico; Remodelação óssea.  

1. INTRODUÇÃO

A otosclerose é uma afecção osteodistrófica progressiva que compromete o ouvido médio e, em alguns casos, o ouvido interno. Trata-se de uma das principais etiologias da perda auditiva condutiva em adultos jovens. Essa condição caracteriza-se pela remodelação anômala do osso esponjoso, particularmente ao redor da janela oval da cóclea, com ênfase na platina do estribo, culminando em sua fixação progressiva e, consequentemente, na limitação da transmissão mecânica do som (Siqueira et al., 2023).

Embora a etiopatogenia da otosclerose ainda não esteja completamente elucidada, há evidências que sugerem a participação de fatores genéticos, hormonais e possivelmente infecciosos. A doença apresenta predileção pelo sexo feminino, com maior incidência entre os 15 e 45 anos de idade, sendo observada uma piora dos sintomas em períodos de alterações hormonais significativas, como a gestação. Clinicamente, manifesta-se por perda auditiva progressiva, zumbido e, em menor proporção, vertigem leve (Testa et al., 2002; Gogoulos et al., 2023).

O diagnóstico é baseado em uma combinação de avaliação clínica e exames complementares, como audiometria tonal, impedanciometria e, em casos selecionados, tomografia computadorizada de alta resolução. A abordagem terapêutica varia conforme a gravidade do comprometimento auditivo. Em quadros leves, os aparelhos de amplificação sonora individual (AASI) podem proporcionar melhora funcional satisfatória. Nos casos mais avançados, procedimentos cirúrgicos como estapedectomia ou estapedotomia — nos quais o estribo imobilizado é substituído por uma prótese — são amplamente utilizados, com resultados audiológicos positivos. Adicionalmente, terapias farmacológicas, incluindo o uso de bifosfonatos, vêm sendo investigadas por seu potencial em retardar a progressão da doença (Freitas et al., 2006).

Apesar da ausência de cura definitiva, a otosclerose dispõe de alternativas terapêuticas eficazes que possibilitam significativa melhora na qualidade de vida dos pacientes. O diagnóstico precoce e o seguimento médico contínuo são determinantes para a mitigação dos impactos auditivos e funcionais decorrentes da doença (Testa et al., 2002).

A realização de revisões da literatura desempenha papel essencial na consolidação e disseminação do conhecimento sobre a otosclerose. Esse tipo de estudo permite a análise crítica e abrangente dos achados científicos já publicados, identificando avanços, limitações e lacunas no entendimento da fisiopatologia, nas estratégias diagnósticas e nas modalidades terapêuticas.

Particularmente, a sistematização das evidências relacionadas à etiologia e aos mecanismos fisiopatológicos da otosclerose é de grande relevância, visto que muitos aspectos ainda permanecem em debate, especialmente no tocante à contribuição dos fatores genéticoambientais. Além disso, o monitoramento contínuo de abordagens emergentes, como o uso de fármacos moduladores do metabolismo ósseo e o aprimoramento das técnicas cirúrgicas, é fundamental para o aprimoramento da conduta clínica.

Do ponto de vista assistencial, revisões atualizadas oferecem suporte à prática médica, especialmente para otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos, ao fornecerem subsídios para a escolha das estratégias diagnósticas e terapêuticas mais eficazes. Ademais, fomentam a geração de novas hipóteses de pesquisa, incentivam a inovação científica e contribuem para a educação de pacientes e profissionais de saúde.

Dessa forma, o presente trabalho tem como objetivo realizar uma revisão narrativa da literatura sobre a otosclerose, com ênfase na patogênese, no diagnóstico e nos avanços recentes relacionados à prevenção e ao tratamento dessa enfermidade.

2. METODOLOGIA 

Esta é a parte na qual se diz como foi feita a pesquisa. Existem várias formas de se explicitar uma metodologia. Deve-se optar por uma maneira que dê suporte adequado para realização da pesquisa ou sua replicação. 

Nesta parte do trabalho são realizadas descrições dos passos dados e dos procedimentos/recursos que foram utilizados no desenvolvimento da pesquisa. Assim, devem ser mostrados, de forma detalhada, os instrumentos, procedimentos e ferramentas dos caminhos para se atingir o objetivo da pesquisa, definindo ainda o tipo de pesquisa, a população (universo da pesquisa), a amostragem (parte da população ou do universo, selecionada de acordo com uma regra), os instrumentos de coleta de dados e a forma como os dados foram tabulados e analisados. 

Todos os tipos de pesquisa devem apresentar material e métodos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS

A otosclerose é caracterizada por um processo de remodelação óssea anormal que afeta principalmente a região da platina do estribo, na janela oval, levando à sua fixação progressiva e consequente prejuízo na condução do som até a cóclea. Essa remodelação envolve a substituição do osso compacto por tecido ósseo esponjoso e altamente vascularizado. A etiopatogenia ainda não é completamente esclarecida, mas acredita-se que fatores genéticos, hormonais e infecciosos tenham papel relevante. Evidências apontam para um padrão de herança autossômica dominante com penetrância variável, sendo a doença mais prevalente em mulheres, especialmente durante ou após a gestação, sugerindo uma influência hormonal. Além disso, estudos relacionam a infecção viral pelo vírus do sarampo à ativação do processo otosclerótico (Pereira, 2010).

O processo de remodelação óssea ocorre em fases distintas. Inicia-se com uma fase osteolítica, marcada pela reabsorção óssea mediada por osteoclastos, seguida por uma fase osteoblástica, durante a qual ocorre a formação de novo osso esponjoso. Este tecido recémformado é menos rígido, mais vascularizado e contribui para a fixação do estribo, culminando em perda auditiva condutiva. Quando há envolvimento coclear, o quadro pode evoluir para perda auditiva mista, evidenciando a complexidade do processo fisiopatológico. A compreensão desses mecanismos é fundamental para o desenvolvimento de abordagens terapêuticas mais eficazes, capazes de interromper ou retardar a progressão da doença (Gogoulos et al., 2023).

O diagnóstico da otosclerose baseia-se na associação entre história clínica, avaliação física e exames complementares audiológicos e de imagem. Os sintomas mais comuns incluem perda auditiva progressiva, geralmente bilateral, acompanhada de zumbido e, ocasionalmente, vertigem leve. O exame otoscópico costuma ser normal, mas em alguns casos é possível identificar a mancha de Schwartze, indicativa de hipervascularização da cápsula ótica (Vicente et al., 2004; Salomone et al., 2008). A audiometria tonal revela perda auditiva condutiva com gap aéreo-ósseo predominante nas frequências graves, sendo a presença do entalhe de Carhart em torno de 2000 Hz um achado típico, relacionado à fixação do estribo. A imitanciometria geralmente demonstra curva tipo A, mas pode indicar ausência ou diminuição do reflexo estapediano, reforçando a hipótese diagnóstica (Cortez Neto et al., 2014).

A tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) do osso temporal pode ser útil em casos atípicos ou para avaliação do envolvimento coclear, ao permitir a identificação de áreas de desmineralização e remodelação óssea. Embora não seja essencial para o diagnóstico em todos os casos, a TCAR representa um importante recurso complementar, especialmente no planejamento cirúrgico (Manning et al., 2022). O diagnóstico diferencial inclui condições como otite média crônica, colesteatoma, disfunções da tuba auditiva e malformações do ouvido médio. Um diagnóstico acurado é essencial para orientar a conduta terapêutica mais apropriada, que pode variar desde o uso de dispositivos auditivos até a indicação cirúrgica (Zahnert et al., 2011).

No que tange às abordagens terapêuticas, a estapedotomia permanece como o tratamento padrão para pacientes com otosclerose moderada a grave. O procedimento consiste na substituição da platina do estribo fixado por uma prótese móvel, permitindo a restauração da condução sonora. Avanços na técnica cirúrgica, como o uso de laser, têm contribuído para maior precisão e redução do risco de complicações, incluindo fístulas perilinfáticas e perda auditiva neurossensorial pós-operatória. Para pacientes que não são candidatos à cirurgia ou que apresentam perda auditiva mista com componente neurossensorial significativo, o uso de aparelhos auditivos convencionais continua sendo uma alternativa eficaz (Testa et al., 2002).

No campo farmacológico, têm sido estudados os bifosfonatos, substâncias que inibem a reabsorção óssea e que demonstram potencial para retardar a progressão da otosclerose, principalmente em casos com envolvimento coclear. Além disso, antioxidantes e antiinflamatórios vêm sendo investigados como estratégias para minimizar a inflamação e a degeneração coclear associadas (Khajuria et al., 2011). Em casos mais avançados ou refratários às terapias convencionais, os implantes auditivos, como os de ouvido médio e os cocleares, surgem como opções viáveis. Pesquisas recentes também exploram abordagens inovadoras, incluindo engenharia de tecidos e terapia gênica, com o objetivo de regenerar o tecido ósseo e prevenir a progressão da doença, abrindo novas perspectivas para o tratamento da otosclerose (Tefili et al., 2013).

5. CONCLUSÃO

A otosclerose é uma afecção do ouvido médio e interno de etiologia multifatorial, cuja principal consequência é a perda auditiva progressiva, impactando significativamente a qualidade de vida dos pacientes. A compreensão aprofundada da sua patogênese — envolvendo remodelação óssea desordenada — permite não apenas um diagnóstico mais preciso, por meio da correlação clínica, audiológica e radiológica, mas também embasa decisões terapêuticas mais assertivas. A estapedotomia permanece como o padrão-ouro de tratamento, mas alternativas farmacológicas e tecnológicas têm avançado, oferecendo opções individualizadas e promissoras. A integração entre diagnóstico precoce, manejo adequado e desenvolvimento de novas terapias pode modificar substancialmente o prognóstico dos indivíduos afetados, tornando o acompanhamento contínuo e multidisciplinar essencial no cuidado desses pacientes.

REFERÊNCIAS

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