DEPRESSÃO E DEMÊNCIA EM IDOSOS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA SOBRE OS DESAFIOS DO ENVELHECIMENTO COM DIGNIDADE

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202506301653


Simone Gonçalves Campos1
Ariane de Oliveira Villar2
Caren Milena Dantas Pereira3
Claudenice Antonia Aguiar Lima4
Marcos Araújo dos Santos5
Jessica Bruna Gomes Soares6
Melina Ferreira Marinho7
Maria Eliane Ramos8
Raquel Martins Pinheiro9
Homero de Oliveira Junior10


Resumo

Enquadramento: O envelhecimento populacional tem ampliado os desafios relacionados à saúde mental dos idosos, especialmente diante da prevalência crescente de depressão e demência. Esses transtornos, embora distintos, apresentam forte relação entre si e impactam diretamente a autonomia, a qualidade de vida e a dignidade na velhice. Objetivo: Analisar, por meio de uma revisão sistemática da literatura, a relação entre depressão e demência em idosos, destacando os efeitos dessa associação sobre os desafios do envelhecimento com dignidade. Metodologia: Trata-se de uma revisão sistemática baseada em artigos publicados entre 2020 e 2024, nas bases PubMed, SciELO, Lilacs e Google Acadêmico. Utilizaram-se os descritores “Depressão”, “Demência”, “Idosos”, “Envelhecimento” e “Qualidade de Vida”, combinados com operadores booleanos. Após critérios de inclusão e exclusão, 12 artigos foram selecionados para análise qualitativa. Resultados Principais: Os estudos evidenciaram que a depressão pode ser fator de risco, sintoma inicial ou comorbidade da demência, agravando o declínio cognitivo e funcional dos idosos. A coexistência dos transtornos afeta negativamente a qualidade de vida e está associada a maiores níveis de dependência e isolamento. A literatura também aponta falhas na detecção precoce e na oferta de cuidados integrados, além da escassez de políticas públicas voltadas ao tema. Conclusão: A relação entre depressão e demência representa um desafio complexo à promoção de um envelhecimento digno. A enfermagem, enquanto profissão estratégica na atenção ao idoso, deve ser capacitada para o reconhecimento precoce desses quadros e para a oferta de cuidados humanizados, integrando ações clínicas, sociais e educativas. Há necessidade urgente de investimentos em políticas de saúde mental e em pesquisas que proponham estratégias eficazes e acessíveis de enfrentamento.

Palavras-chave: Depressão; Demência; Idosos; Envelhecimento; Qualidade de Vida.

Abstract

Background: Population aging has increased the challenges related to the mental health of the elderly, especially in the face of the increasing prevalence of depression and dementia. These disorders, although distinct, have a strong relationship with each other and directly impact autonomy, quality of life, and dignity in old age. Objective: To analyze, through a systematic review of the literature, the relationship between depression and dementia in the elderly, highlighting the effects of this association on the challenges of aging with dignity. Methodology: This is a systematic review based on articles published between 2020 and 2024, in the PubMed, SciELO, Lilacs, and Google Scholar databases. The descriptors “Depression”, “Dementia”, “Elderly”, “Aging” and “Quality of Life” were used, combined with Boolean operators. After inclusion and exclusion criteria, 12 articles were selected for qualitative analysis. Main Results: Studies have shown that depression can be a risk factor, initial symptom or comorbidity of dementia, aggravating cognitive and functional decline in the elderly. The coexistence of disorders negatively affects quality of life and is associated with higher levels of dependence and isolation. The literature also points to failures in early detection and in the provision of integrated care, in addition to the scarcity of public policies aimed at the theme. Conclusion: The relationship between depression and dementia represents a complex challenge to the promotion of dignified aging. Nursing, as a strategic profession in the care of the elderly, should be trained for the early recognition of these conditions and for the provision of humanized care, integrating clinical, social and educational actions. There is an urgent need for investments in mental health policies and research that propose effective and accessible coping strategies.

Keywords: Depression; Dementia; Elderly; Aging; Quality of Life.

Resumen

Antecedentes: El envejecimiento poblacional ha incrementado los desafíos relacionados con la salud mental de las personas mayores, especialmente ante la creciente prevalencia de depresión y demencia. Estos trastornos, aunque distintos, tienen una fuerte relación entre sí e impactan directamente en la autonomía, la calidad de vida y la dignidad en la vejez. Objetivo: Analizar, a través de una revisión sistemática de la literatura, la relación entre depresión y demencia en el adulto mayor, destacando los efectos de esta asociación en los desafíos del envejecimiento digno. Metodología: Se trata de una revisión sistemática basada en artículos publicados entre 2020 y 2024, en las bases de datos PubMed, SciELO, Lilacs y Google Scholar. Se utilizaron los descriptores “Depresión”, “Demencia”, “Anciano”, “Envejecimiento” y “Calidad de Vida”, combinados con operadores booleanos. Después de los criterios de inclusión y exclusión, se seleccionaron 12 artículos para el análisis cualitativo. Resultados principales: Los estudios han demostrado que la depresión puede ser un factor de riesgo, síntoma inicial o comorbilidad de la demencia, agravando el deterioro cognitivo y funcional en el adulto mayor. La coexistencia de trastornos afecta negativamente a la calidad de vida y se asocia a mayores niveles de dependencia y aislamiento. La literatura también señala fallas en la detección precoz y en la prestación de atención integrada, además de la escasez de políticas públicas dirigidas al tema. Conclusión: La relación entre depresión y demencia representa un desafío complejo para la promoción del envejecimiento digno. La enfermería, como profesión estratégica en el cuidado del anciano, debe ser entrenada para el reconocimiento temprano de estas condiciones y para la prestación de cuidados humanizados, integrando acciones clínicas, sociales y educativas. Existe una necesidad urgente de invertir en políticas de salud mental e investigación que propongan estrategias de afrontamiento efectivas y accesibles.

Palabras-clave: Depresión; Demencia; Ancianos; Envejecimiento; Calidad de Vida.

Introdução

Nas últimas décadas, o mundo tem vivenciado um acelerado processo de envelhecimento populacional. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que, até 2050, o número de pessoas com 60 anos ou mais ultrapassará os 2 bilhões, representando cerca de 22% da população global. No Brasil, o cenário segue a mesma tendência: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que, até 2030, haverá mais idosos do que crianças no país. Com esse crescimento, emergem novos desafios relacionados à saúde física, mental e social da população idosa, entre eles o aumento significativo de casos de depressão e demência (Melaré, et al. 2020).

A depressão em idosos é um transtorno comum, mas frequentemente negligenciado. Estudos indicam que cerca de 15% a 20% dos idosos apresentam sintomas depressivos, sendo que muitos desses casos não são diagnosticados ou tratados adequadamente. Isso se deve, em parte, à dificuldade de diferenciar os sintomas da depressão das mudanças naturais associadas ao envelhecimento, como a diminuição da energia, perda de apetite ou distúrbios do sono. A falta de diagnóstico pode agravar o quadro, levando à perda de autonomia, isolamento social, maior risco de comorbidades e até ao suicídio, cuja taxa é mais elevada entre idosos em comparação com outras faixas etárias (Botelho, et al. 2024).

Paralelamente, a demência é outro importante problema de saúde pública. Estima-se que mais de 55 milhões de pessoas vivam com algum tipo de demência no mundo, sendo a Doença de Alzheimer a forma mais comum, representando de 60% a 70% dos casos. No Brasil, esse número já ultrapassa 1,7 milhão de indivíduos. A demência compromete progressivamente a memória, o pensamento, a linguagem, o julgamento e a capacidade de realizar atividades diárias, afetando profundamente a qualidade de vida dos idosos e exigindo cuidados constantes por parte da família ou de cuidadores formais (Santos, et al. 2021).

Apesar de distintas, a depressão e a demência frequentemente coexistem e apresentam uma relação bidirecional. A depressão pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de demência, além de também se manifestar como sintoma precoce de comprometimento cognitivo leve. Por outro lado, idosos com demência têm maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de quadros depressivos, especialmente nos estágios iniciais da doença, quando ainda mantêm consciência sobre suas perdas cognitivas (Nascimento, et al. 2021).‌

Diante disso, esta revisão sistemática tem como objetivo analisar a literatura científica recente sobre a presença e a inter-relação entre depressão e demência em idosos, discutindo seus impactos na saúde mental, no cuidado e na dignidade no envelhecimento. Ao identificar padrões, lacunas e possibilidades de intervenção, busca-se contribuir para a construção de estratégias mais eficazes e humanas no enfrentamento desses desafios, promovendo uma velhice mais saudável, ativa e respeitosa.

Enquadramento

O envelhecimento é um processo natural que pode ser acompanhado por diversas mudanças físicas, cognitivas e emocionais. Entre os principais transtornos que afetam a saúde mental de idosos, a depressão e a demência se destacam tanto por sua prevalência quanto pelo impacto que causam na autonomia, na qualidade de vida e na dignidade desses indivíduos (Bezerra, et al. 2021).

A depressão é uma condição psiquiátrica comum na terceira idade, embora frequentemente subdiagnosticada. De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), a depressão geriátrica pode apresentar sintomas atípicos, como queixas somáticas, apatia, irritabilidade e prejuízo cognitivo leve. Estudos apontam que aproximadamente 15% dos idosos apresentam sintomas depressivos relevantes, e que a depressão pode estar associada a fatores como perda de entes queridos, aposentadoria, isolamento social, doenças crônicas e limitações funcionais (Ferreira, et al. 2021).

A demência, por sua vez, é definida como uma síndrome caracterizada pelo declínio progressivo das funções cognitivas, interferindo nas atividades diárias do indivíduo (Seixas, et al. 2024). A Doença de Alzheimer é o tipo mais comum de demência, mas há outras formas, como a demência vascular, demência por corpos de Lewy e demência frontotemporal. Dados da Organização Mundial da Saúde (2021) indicam que mais de 55 milhões de pessoas vivem com demência, com quase 10 milhões de novos casos a cada ano (Mattos, et al. 2020).

A literatura aponta que há uma relação significativa entre depressão e demência. Alguns estudos sugerem que a depressão pode ser tanto um fator de risco quanto um sintoma precoce de processos demenciais. Segundo Torres, et al (2024), indivíduos com histórico de episódios depressivos apresentam maior risco de desenvolver demência na velhice. A hipótese neuro inflamatória é uma das mais aceitas atualmente para explicar essa associação, apontando que processos inflamatórios crônicos relacionados à depressão podem contribuir para alterações neurodegenerativas (Nogueira, et al. 2022).

Além disso, a coexistência de depressão e demência agrava o quadro clínico, dificultando o diagnóstico diferencial e comprometendo ainda mais a funcionalidade do idoso. Em muitos casos, a depressão pode mascarar sintomas iniciais da demência ou ser confundida com ela, principalmente na presença de prejuízo de memória e lentificação cognitiva. Isso ressalta a importância de avaliações clínicas e neuropsicológicas cuidadosas (Botesini, et al. 2022).

Outro ponto recorrente na literatura é a necessidade de atenção especial aos determinantes sociais da saúde mental em idosos. A solidão, o baixo nível socioeconômico, o acesso restrito a serviços de saúde e a ausência de suporte familiar são fatores que aumentam a vulnerabilidade para ambos os transtornos. Alguns autores destacam que políticas públicas integradas e centradas no idoso são fundamentais para prevenir o agravamento de doenças mentais nessa população (Souza, et al. 2023).

A literatura também evidencia lacunas no cuidado e na abordagem multidisciplinar voltada à saúde mental do idoso. Muitos profissionais ainda apresentam dificuldades em reconhecer sintomas depressivos nos idosos, especialmente em contextos de demência. Além disso, há uma carência de programas de saúde voltados à prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado dessas condições no sistema público de saúde, especialmente em países em desenvolvimento (Santos, 2025).

Em síntese, a literatura científica demonstra que tanto a depressão quanto a demência representam sérios desafios para o envelhecimento digno, sendo urgente a ampliação do conhecimento técnico sobre o tema, o investimento em ações preventivas e a valorização do cuidado humanizado no atendimento à população idosa.

Questão de investigação

Qual é a relação entre a depressão e a demência em idosos, e de que forma esses transtornos impactam os desafios do envelhecimento com dignidade?

Metodologia

Esta pesquisa caracteriza-se como uma revisão sistemática da literatura, com o objetivo de identificar, analisar e sintetizar as evidências científicas disponíveis sobre a relação entre depressão e demência em idosos, considerando seus impactos sobre os desafios do envelhecimento com dignidade. Para isso, foi realizada uma busca de artigos científicos nas bases de dados PubMed, SciELO, Lilacs e Google Acadêmico, entre os meses de fevereiro e março de 2025. A seleção dessas bases se deu por sua relevância e abrangência na área da saúde e ciências biomédicas.

Foram utilizados descritores controlados como “Depressão”, “Demência”, “Idosos”, “Envelhecimento”, “Qualidade de Vida” e “Saúde Mental”. A busca foi refinada por meio do uso de operadores booleanos, como AND e OR, com as seguintes combinações: “Depressão AND Demência AND Idosos”, “Demência AND Qualidade de Vida AND Envelhecimento” e “Depressão OR Transtorno Depressivo AND Idosos AND Envelhecimento com Dignidade”.

Foram considerados como critérios de inclusão os artigos publicados entre os anos de 2020 e 2024, disponíveis em português, inglês ou espanhol, que apresentassem o texto completo e abordassem de forma direta a relação entre depressão e demência em idosos, com foco nos aspectos clínicos, sociais, funcionais ou cognitivos. Foram incluídos estudos originais, revisões sistemáticas e revisões integrativas que tivessem relevância comprovada para o tema proposto. Por outro lado, foram excluídos da análise os artigos repetidos entre as bases, estudos que tratassem exclusivamente de depressão ou de demência sem associação entre ambos, pesquisas que envolvessem populações não idosas (indivíduos com menos de 60 anos) e trabalhos acadêmicos sem revisão por pares, como resumos de eventos, dissertações e teses.

A partir da estratégia de busca inicial, foram encontrados 312 artigos. Após a remoção de 92 duplicatas, restaram 220 estudos. A leitura de títulos e resumos resultou na exclusão de 137 artigos por não atenderem aos critérios de inclusão. Dos 83 artigos restantes, 53 foram excluídos após leitura na íntegra por apresentarem foco insuficiente na relação entre depressão e demência ou por não apresentarem dados relevantes para os objetivos desta revisão. Ao final do processo, foram selecionados 15 artigos para compor o corpus da análise.

A análise dos estudos selecionados foi realizada de forma qualitativa, buscando-se identificar padrões nas associações entre depressão e demência em idosos, os principais fatores de risco e proteção, as consequências desses transtornos sobre a autonomia e a qualidade de vida, além das estratégias de enfrentamento propostas pela literatura. Esta abordagem permitiu uma compreensão aprofundada do tema, contribuindo para a discussão sobre o envelhecimento digno frente aos desafios impostos pelos transtornos mentais na terceira idade.

Resultados

A análise dos 15 artigos selecionados revelou uma forte associação entre depressão e demência em idosos, sendo comum a presença concomitante dos dois transtornos. Em diversos estudos, a depressão foi identificada como um fator de risco significativo para o desenvolvimento de demência, especialmente da Doença de Alzheimer. As evidências apontaram que idosos com histórico de episódios depressivos recorrentes apresentam maior probabilidade de desenvolver algum tipo de comprometimento cognitivo ao longo do envelhecimento. Essa relação foi explicada por mecanismos biológicos como inflamação crônica, alterações na neurotransmissão de serotonina e dopamina, além da presença de alterações estruturais cerebrais, como a atrofia do hipocampo (Seixas, et al. 2024).

Outro achado relevante foi que, em muitos casos, os sintomas depressivos podem preceder ou até mascarar os sinais iniciais de demência. Isso representa um desafio importante para o diagnóstico diferencial, uma vez que tanto a depressão quanto os estágios iniciais da demência podem causar prejuízos na atenção, memória e linguagem. Essa sobreposição de sintomas, se não adequadamente investigada, pode levar a atrasos no tratamento e agravar o quadro clínico do idoso. Alguns estudos indicaram ainda que a depressão não tratada em idosos com demência pode acelerar o declínio cognitivo e funcional (Dos Santos, et al. 2024).

Além da relação direta entre os transtornos, a revisão revelou que ambos impactam profundamente a qualidade de vida dos idosos. Os estudos analisados destacaram que a presença de depressão e demência está associada ao maior grau de dependência, isolamento social, sentimento de inutilidade e perda do sentido de vida. Esses fatores, somados à diminuição da autonomia, representam ameaças diretas à dignidade do envelhecimento. Foi observado ainda que o suporte social e familiar reduzido, aliado à falta de políticas públicas eficazes, contribui para a piora do quadro geral dos idosos acometidos (Pereira, et al. 2020).

Em relação às estratégias de enfrentamento, poucos artigos trouxeram intervenções práticas voltadas ao cuidado conjunto de depressão e demência. No entanto, os que abordaram intervenções multidisciplinares mostraram resultados positivos, especialmente em abordagens que combinam acompanhamento médico, suporte psicossocial, estimulação cognitiva e envolvimento da família. A importância do diagnóstico precoce, do acesso a serviços de saúde mental e da capacitação de profissionais da atenção básica também foi amplamente destacada como essencial para minimizar os impactos desses transtornos na velhice (Caramelli, et al. 2022).

Discussão

Os resultados desta revisão sistemática reforçam a complexidade da relação entre depressão e demência em idosos, evidenciando não apenas a coexistência frequente desses transtornos, mas também a maneira como um pode influenciar o surgimento ou a progressão do outro. A presença da depressão como possível fator preditivo para o desenvolvimento de demência, especialmente da Doença de Alzheimer, é um ponto recorrente na literatura e reforça a necessidade de atenção clínica redobrada diante de sintomas depressivos persistentes na terceira idade. Tal associação é explicada por processos neurofisiológicos que incluem alterações hormonais, neuroinflamação, e degeneração de áreas cerebrais críticas, como o hipocampo (Da Graça, et al. 2022).

A dificuldade de diagnóstico diferencial entre depressão e demência também foi amplamente discutida nos estudos analisados. Em muitos casos, sintomas cognitivos associados à depressão podem ser interpretados como sinais de demência, e vice-versa, o que compromete o início de intervenções adequadas. Essa sobreposição de sinais exige maior preparo dos profissionais de saúde, especialmente na atenção primária, onde muitas vezes ocorrem os primeiros contatos do idoso com o sistema de saúde. O uso de instrumentos de rastreio padronizados, aliados a uma escuta qualificada e abordagem multiprofissional, é fundamental para evitar sub-diagnósticos ou tratamentos inadequados (Torres, et al. 2024).

Outro ponto central na discussão é o impacto conjunto desses transtornos na qualidade de vida e dignidade do idoso. A perda progressiva de autonomia, a sensação de inutilidade social e o enfraquecimento dos vínculos familiares e comunitários foram aspectos comuns nos estudos revisados. Tais consequências, quando não enfrentadas com políticas públicas adequadas, contribuem para o agravamento do sofrimento psíquico e para a institucionalização precoce do idoso. Isso levanta uma reflexão importante sobre como a sociedade e os sistemas de saúde estão preparados para acolher e cuidar de forma digna e humanizada de uma população que envelhece rapidamente (Moura, et al. 2022).

A revisão também revelou uma carência de estudos focados em intervenções práticas que integrem o cuidado simultâneo da depressão e da demência. Embora algumas abordagens multidisciplinares tenham demonstrado bons resultados, como terapias combinadas, grupos de apoio, programas de estimulação cognitiva e envolvimento familiar, elas ainda são escassas e pouco difundidas, especialmente em países em desenvolvimento. Tal cenário indica a necessidade urgente de investimento em ações preventivas, capacitação de profissionais e fortalecimento de redes de apoio para o idoso e sua família (Barreto, et al. 2023).

Por fim, esta revisão destaca a importância de considerar o envelhecimento não apenas como um processo biológico, mas como uma vivência social que exige respeito, suporte e políticas inclusivas. O enfrentamento dos transtornos mentais na velhice, especialmente da depressão e da demência, passa por reconhecer o direito do idoso a um cuidado integral, digno e respeitoso, capaz de promover bem-estar e sentido de vida, mesmo diante das limitações que a idade pode impor (Ribeiro, 2021).

Conclusão

A presente revisão sistemática permitiu compreender, a partir da literatura científica dos últimos anos, a profunda inter-relação entre depressão e demência em idosos, bem como os múltiplos desafios que esses transtornos impõem ao envelhecimento com dignidade. Observou-se que a depressão pode atuar como fator de risco, sintoma inicial ou comorbidade da demência, o que exige atenção redobrada dos profissionais de saúde para um diagnóstico precoce, preciso e sensível às especificidades da população idosa. A sobreposição de sintomas, o subdiagnóstico e a carência de estratégias de cuidado integradas agravam ainda mais a condição de vulnerabilidade vivida por esses indivíduos.

Além do impacto direto sobre a saúde mental e cognitiva, os estudos analisados revelam que esses transtornos comprometem significativamente a qualidade de vida, a autonomia, os vínculos sociais e o senso de pertencimento do idoso. Nesse sentido, garantir um envelhecimento digno vai muito além de controlar doenças: envolve acolher o idoso em sua integralidade, promovendo bem-estar, inclusão social, suporte emocional e respeito à sua trajetória de vida.

As implicações práticas desta revisão apontam para a necessidade urgente de políticas públicas mais efetivas voltadas à saúde mental do idoso, com investimentos em prevenção, capacitação de equipes multiprofissionais, criação de espaços de convivência e ampliação do acesso a tratamentos humanizados. Também se destaca a importância do fortalecimento das redes de apoio social e familiar, fundamentais para o enfrentamento dos efeitos da depressão e da demência.

No campo científico, há ainda lacunas a serem exploradas, como o desenvolvimento de estratégias terapêuticas conjuntas para o manejo dos dois transtornos, o estudo de marcadores precoces que auxiliem no diagnóstico diferencial, e a avaliação de programas comunitários voltados à promoção de saúde mental na velhice. Futuras pesquisas devem também considerar o contexto sociocultural dos idosos, incluindo aspectos como desigualdades socioeconômicas, gênero, raça e acesso a serviços de saúde, ampliando a compreensão sobre o envelhecer com dignidade em diferentes realidades.

Conclui-se, portanto, que enfrentar os desafios da depressão e da demência na velhice requer não apenas ações clínicas, mas também um compromisso ético e social com a valorização da vida em todas as suas etapas, garantindo aos idosos o direito de envelhecer com respeito, cuidado e dignidade.

Implicações para a prática

Os resultados desta revisão sistemática oferecem contribuições significativas para a área da enfermagem, especialmente no cuidado à pessoa idosa com transtornos mentais. Ao evidenciar a relação entre depressão e demência e seus impactos na qualidade de vida, os achados reforçam a importância do olhar sensível e integral do profissional de enfermagem no reconhecimento precoce de sintomas emocionais e cognitivos que muitas vezes passam despercebidos. A enfermagem, por sua atuação próxima e contínua junto ao paciente, ocupa posição estratégica na triagem, no acompanhamento e na implementação de ações preventivas e terapêuticas, promovendo a autonomia e o bem-estar do idoso. Além disso, os resultados apontam a necessidade de capacitação contínua dos profissionais de enfermagem para lidar com os desafios do envelhecimento, especialmente no que se refere à saúde mental, ao manejo de comorbidades e ao suporte à família e aos cuidadores. A enfermagem também tem papel fundamental na promoção de práticas humanizadas e no fortalecimento de políticas de cuidado centradas na dignidade e nos direitos da pessoa idosa, contribuindo para um modelo de atenção mais inclusivo, acolhedor e resolutivo.

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1Graduanda em enfermagem pela Universidade Paulista e-mail: simoneg.campos@hotmail.com
2Graduanda em medicina pela UNIFIMES, e-mail: villar.ariane@gmail.com 
3Graduanda em enfermagem pelo Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA e-mail:  carenmilenadpereira@gmail.com
4Enfermeira pelo Instituto Florence de Ensino Superior- São Luís- MA, e-mail:  claudenice.a@hotmail.com
5Pós-graduado em Gestão Hospitalar pelo Centro Universitário Celso Lisboa, e-mail: tet.marcos@hotmail.com
6Graduanda em enfermagem pela Faculdade Wenceslau Braz,  e-mail: jessicabrunags15@gmail.com
7Graduanda em Enfermagem pela Faculdade Wenceslau Braz, e-mail: melina.marinho1204@gmail.com
8Enfermeira Pós-graduada pela Uniateneu, e-mail: 2004eliane@gmail.com
9Psicóloga pelo centro universitário da Amazônia UNIESAMAZ, e-mail: rakel.mp@hotmail.com
10Graduando em medicina pela  Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), e-mail: homero2@hotmail.com