DERMATITE ATÓPICA INFANTIL E A IMPORTÂNCIA DA HIDRATAÇÃO CUTÂNEA: UMA REVISÃO NARRATIVA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202506242233


Karina Rodrigues Costa1
Victória Carolina Dourado Aragão2
Dania Lemos Dionízio3


RESUMO:

A dermatite atópica (DA) é uma doença inflamatória crônica e recidivante que afeta principalmente crianças, sendo caracterizada por prurido intenso, disfunção da barreira cutânea e predisposição a infecções secundárias. Considerando o impacto significativo na qualidade de vida infantil, este estudo teve como objetivo analisar, por meio de uma revisão narrativa da literatura, a eficácia da hidratação cutânea como estratégia terapêutica na restauração da barreira epidérmica e no controle dos sintomas da DA em crianças de 0 a 12 anos. A pesquisa foi realizada entre janeiro e março de 2025, utilizando as bases de dados PubMed, SciELO e Google Acadêmico, com filtros de acesso gratuito e publicações entre 2020 e 2025. Foram selecionados 20 artigos com base em critérios de inclusão e exclusão previamente definidos. Os resultados apontaram que o uso contínuo de emolientes contendo ativos como ceramidas, ureia, glicerina, dexpantenol e ácidos graxos essenciais promove a redução da perda transepidérmica de água, modula a microbiota cutânea, restaura a função de barreira e reduz a inflamação, resultando em menor frequência e intensidade das crises. Além disso, observou-se que a adesão ao uso diário de hidratantes e a orientação adequada dos cuidadores são fatores cruciais para o sucesso terapêutico. Conclui-se que a hidratação da pele constitui um eixo central no manejo da dermatite atópica infantil, sendo uma intervenção de baixo custo, segura, eficaz e fundamental para a prevenção de exacerbações, especialmente quando integrada à educação em saúde e à prática clínica baseada em evidências.

Palavras-Chave: Dermatite Atópica; Hidratação; Barreira Cutânea; Emolientes; Infância.

ABSTRACT

Atopic dermatitis (AD) is a chronic and relapsing inflammatory disease that mainly affects children, characterized by intense pruritus, specific barrier dysfunction, and predisposition to secondary infections. Considering the significant impact on children’s quality of life, this study aimed to analyze, through a narrative review of the literature, the efficacy of theoretical hydration as a therapeutic strategy in restoring the epidermal barrier and controlling AD symptoms in children aged 0 to 12 years. The research was conducted between January and March 2025, using the PubMed, SciELO, and Google Scholar databases, with free access filters and publications between 2020 and 2025. Twenty articles were selected based on previously defined inclusion and exclusion criteria. The results showed that the continuous use of emollients containing active ingredients such as ceramides, urea, glycerin, dexpanthenol and essential fatty acids promotes the reduction of transepidermal water loss, modulates the specific microbiota, restores the barrier function and reduces thickness, resulting in lower frequency and intensity of attacks. In addition, we recommend that adherence to the daily use of moisturizers and adequate guidance from caregivers are crucial factors for therapeutic success. It is concluded that skin hydration constitutes a central axis in the management of childhood atopic dermatitis, being a low-cost, safe, effective and fundamental intervention for the prevention of exacerbations, especially when integrated with health education and evidence-based clinical practice.

Keywords: Atopic Dermatitis; Hydration; Skin Barrier; Emollients; Childhood.

RESUMEN:

La dermatitis atópica (DA) es una enfermedad inflamatoria crónica y recurrente que afecta principalmente a niños y se caracteriza por prurito intenso, disfunción de la barrera cutánea y predisposición a infecciones secundarias. Considerando su importante impacto en la calidad de vida de los niños, este estudio tuvo como objetivo analizar, mediante una revisión narrativa de la literatura, la eficacia de la hidratación cutánea como estrategia terapéutica para restaurar la barrera epidérmica y controlar los síntomas de la DA en niños de 0 a 12 años. La investigación se realizó entre enero y marzo de 2025, utilizando las bases de datos PubMed, SciELO y Google Scholar, con filtros de libre acceso y publicaciones entre 2020 y 2025. Se seleccionaron veinte artículos según criterios de inclusión y exclusión previamente definidos. Los resultados mostraron que el uso continuo de emolientes con ingredientes activos como ceramidas, urea, glicerina, dexpantenol y ácidos grasos esenciales promueve la reducción de la pérdida de agua transepidérmica, modula la microbiota cutánea, restaura la función barrera y reduce la inflamación, lo que resulta en una menor frecuencia e intensidad de las crisis. Además, se observó que la adherencia al uso diario de cremas hidratantes y la orientación adecuada de los cuidadores son factores cruciales para el éxito terapéutico. Se concluye que la hidratación de la piel constituye un eje central en el manejo de la dermatitis atópica infantil, siendo una intervención económica, segura, eficaz y fundamental para la prevención de exacerbaciones, especialmente cuando se integra con la educación sanitaria y la práctica clínica basada en la evidencia.

Palabras clave: Dermatitis atópica; Hidratación; Barrera cutánea; Emolientes; Infancia.

1. INTRODUÇÃO

A dermatite atópica (DA) é uma dermatose inflamatória crônica e recorrente que acomete indivíduos de todas as idades, com uma prevalência significativa em crianças nos primeiros anos de vida. Caracterizada por prurido intenso, xerose e lesões eczematosas, a DA é uma condição multifatorial com forte componente genético, relacionada a uma disfunção da barreira cutânea e frequentemente associada a um histórico familiar de atopia, como rinite alérgica e asma. A exposição a fatores externos, incluindo alérgenos, poluentes e variações climáticas, bem como alterações no sistema imunológico, também desempenham um papel crucial no desencadeamento e exacerbação da doença (Darmstadt et al., 2023; Laughter et al., 2024).

Embora a avaliação da gravidade da DA seja fundamental para orientar o tratamento, a ausência de um biomarcador específico ou de um diagnóstico padrão-ouro representa um desafio clínico. Para superar essa limitação, foram desenvolvidos instrumentos de avaliação da extensão e do controle do comprometimento cutâneo, como o Scoring Atopic Dermatitis (SCORAD) , utilizado por profissionais de saúde. Adicionalmente, o Patient Oriented Eczema Measure (POEM) e o Patient-Oriented SCORAD (PO-SCORAD) permitem que o próprio paciente avalie a gravidade da sua condição (Prado et al., 2022).

Nos últimos anos, estudos recentes evidenciam a composição da microbiota cutânea com direta influência sobre a atividade clínica da DA. A colonização predominante de microrganismos patogênicos, a exemplo do Staphylococcus aureus, está relacionada ao agravamento das manifestações clínicas cutâneas. Em contrapartida, uma microbiota mais diversificada e equilibrada, com a presença de espécies comensais como o Staphylococcus epidermidis, contribui para a modulação da resposta inflamatória e a atenuação das lesões eczematosas. Dessa forma, é evidente que intervenções que visam à modulação da microbiota, por meio de prebióticos e probióticos incorporados a formulações hidratantes, configuram uma estratégia terapêutica complementar promissora (Wulandari; Lubis; Paramita et al., 2021).

A abordagem terapêutica para o controle da DA é multifacetada, envolvendo o uso regular de hidratantes como base fundamental, combinado com tratamentos anti-inflamatórios quando necessário (Danby et al., 2022). No arsenal farmacológico, inibidores de calcineurina e anti-histamínicos são frequentemente prescritos, enquanto corticosteróides tópicos, antibioticoterapia sistêmica e imunomoduladores são indicados para o manejo de crises agudas. Adicionalmente, a adoção de hábitos de higiene adequados, como banhos rápidos em água morna com sabonetes neutros líquidos, e a lubrificação constante da pele, são medidas fundamentais para otimizar a eficácia da intervenção (Gomes et al., 2024).

É válido ressaltar, que a perda de água transepidérmica (Transepidermal water loss- TEWL), característica da DA, compromete a função de barreira da pele e favorece infecções secundárias. Para minimizar esses efeitos, recomenda-se a realização de banhos mornos, com duração entre cinco e dez minutos, visando à remoção de resíduos irritantes. Evidencia-se que a aplicação de emolientes imediatamente após o banho é essencial para promover a retenção hídrica e auxiliar na reestruturação da barreira epidérmica. Indicadores recentes apontam que o uso de óleos emolientes durante o banho pode contribuir para a redução da carga bacteriana  e  da  inflamação  cutânea,  devido  às  suas  características anti-inflamatórias e antibacterianas, que auxiliam a diminuir a carga microbiana na superfície da pele e a modular a resposta inflamatória local (Pagliaro et al., 2024).

A terapia emoliente constitui, portanto, a base essencial do tratamento da dermatite atópica, especialmente em crianças. Os hidratantes recomendados são formulados com componentes específicos para a reconstrução da barreira cutânea, incluindo emolientes combinados que retêm a hidratação da derme preenchendo os espaços intercorneocitários, compostos oclusivos que minimizam a perda de água através da formação de uma camada hidrofóbica na epiderme, e umectantes que preservam a estrutura do estrato córneo e aumentam a hidratação. A utilização regular e adequada desses produtos não apenas alivia os sintomas existentes, como o prurido e a secura, mas também desempenha um papel fundamental na prevenção de novas lesões e na manutenção da saúde da pele a longo prazo em crianças com dermatite atópica (Gomes et al., 2024; Seite et al., 2022).

Embora a DA seja uma condição crônica sem cura definitiva, a terapia visa primordialmente reduzir a sintomatologia, limitar a extensão das lesões e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Nesse contexto, a hidratação da pele emerge como um pilar central no manejo da DA. Estudos recentes têm demonstrado que o uso contínuo de emolientes não apenas contribui para a redução da necessidade de terapias anti-inflamatórias, mas também pode prolongar os períodos de remissão da doença (Gomes et al., 2024; Simpson et al., 2023). Ao restaurar e manter a integridade da barreira cutânea, a terapia umectante atua de forma preventiva, retardando a progressão do eczema e reduzindo a frequência e a intensidade das exacerbações.

Considerando a importância da integridade da barreira cutânea no controle da dermatite atópica e o papel central que a hidratação desempenha na prevenção e no manejo das manifestações clínicas da doença, este estudo propõe-se a analisar a eficácia da hidratação cutânea como estratégia terapêutica na dermatite atópica infantil, com foco na recuperação funcional da barreira epidérmica, no controle da inflamação e na promoção da remissão clínica. Para alcançar esse propósito, pretende-se examinar as alterações estruturais associadas à disfunção da barreira cutânea em crianças com dermatite atópica; avaliar os benefícios do uso contínuo de hidratantes na redução da perda de água transepidérmica e na melhora dos sintomas clínicos; identificar os principais componentes presentes nas formulações emolientes indicadas para o público pediátrico; além de discutir, com base em evidências científicas atualizadas, de que maneira a hidratação regular pode contribuir para a diminuição da necessidade de tratamentos farmacológicos e a ampliação dos períodos de remissão da doença.

2. METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão narrativa da literatura, cujo objetivo é reunir e analisar publicações científicas que abordam a hidratação da pele como estratégia terapêutica no manejo da dermatite atópica em crianças. Esse tipo de revisão permite a integração de diferentes tipos de estudos (quantitativos e qualitativos), oferecendo uma compreensão mais ampla e crítica do tema.

A pesquisa foi realizada de forma independente por um(a) pesquisador(a), a partir de fontes secundárias e de domínio público, o que dispensa a submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), conforme a Resolução nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.

Estratégia de busca

A busca bibliográfica foi conduzida entre janeiro e março de 2025, nas seguintes bases de dados: PubMed/MEDLINE, SciELO e Google Acadêmico. Para garantir a padronização terminológica e a precisão dos resultados, foram utilizados descritores controlados dos vocabulários DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) e MeSH (Medical Subject Headings).

  • PubMed/MEDLINE, utilizaram-se os seguintes descritores MeSH: “Dermatitis, Atopic”, “Child”, “Therapeutics” e “Emollients”.
  • SciELO, foram empregados os descritores equivalentes do DeCS: “Dermatite Atópica”, “Criança”, “Terapêutica” e “Emolientes”.
  • Google Acadêmico, complementou-se a busca com palavras-chave em português: “dermatite atópica”, “criança”, “tratamento” e “hidratação”, para ampliar a captação de literatura cinzenta e estudos não indexados nas bases tradicionais.

Foram aplicados os filtros de acesso gratuito ao texto completo e de publicações nos últimos cinco anos, abrangendo o período de janeiro de 2020 a dezembro de 2025, com o objetivo de garantir a atualidade das informações.

Critérios de inclusão

  • Artigos científicos publicados em português ou inglês;
  • Estudos que abordam o tratamento da dermatite atópica infantil, recém- nascido a 12 anos, com foco na hidratação da pele;
  • Publicações disponíveis gratuitamente em texto completo.

Critérios de exclusão

  • Artigos duplicados;
  • Trabalhos que não estivessem disponíveis para acesso integral;
  • Estudos que abordassem exclusivamente outras formas de tratamento da DA (por ex: imunobiológicos, fototerapia etc.);
  • Pesquisas voltadas para a população adulta ou não especificada.

      Seleção e análise dos artigos

      A busca inicial resultou em 1.286 artigos. Após aplicação dos filtros e triagem por título e resumo, 524 artigos foram selecionados para leitura. Com a aplicação dos critérios de exclusão, 20 estudos foram incluídos na análise final desta revisão.

      Os artigos selecionados foram organizados em uma tabela estruturada, contendo: autor, ano, base de dados, título, objetivos, tipo de estudo e principais conclusões. A análise foi realizada de forma descritiva, comparativa e qualitativa, buscando identificar padrões, divergências e lacunas no conhecimento atual sobre o papel da hidratação da pele no controle da dermatite atópica infantil. O Fluxograma 1 apresenta o processo de seleção dos artigos.

      O Fluxograma 1 – Processo de seleção dos artigos:

      Fonte: Elaborado pelas próprias autoras, 2025.

      Para esclarecer os resultados, foi realizada uma leitura comparativa entre os artigos, com o intuito de identificar similaridades. Posteriormente, os dados extraídos das pesquisas selecionadas foram organizados em uma tabela estruturada com os seguintes itens: base de dados, autor/ano, título do estudo, objetivo, delineamento e resumo. Esse formato visou facilitar uma análise comparativa e contribuir para a obtenção de respostas à problemática da pesquisa.

      3.  RESULTADOS E DISCUSSÃO

      Esta revisão de literatura analisou 20 estudos científicos publicados entre 2020 e 2025, todos selecionados com base nos critérios de elegibilidade previamente definidos. A avaliação desses trabalhos forneceu uma visão abrangente e detalhada sobre o impacto do uso de hidratantes na qualidade de vida dos pacientes, na gravidade das condições clínicas, na frequência das crises e nos efeitos sobre a função de barreira cutânea em crianças com DA. A Tabela 1 apresenta um resumo das principais informações de cada estudo selecionado, incluindo a Base de Dados, Título, Autores/ Ano/ Método de pesquisa, Objetivo do estudo e Resultados observados. Os métodos de pesquisa utilizados variaram, englobando ensaios clínicos randomizados, estudos de caso, revisões sistemáticas e narrativas, o que permitiu uma visão completa dos dados e a validação das evidências.

      Tabela 1. Sistematização dos dados dos artigos incluídos para estudo.

      Fonte: Elaborado pelas autoras, 2025.

      A Tabela 1, portanto, não apenas sintetiza os achados principais de cada artigo, mas também serve como um guia para as discussões subsequentes. Ela ilustra como diferentes intervenções podem impactar positivamente a função de barreira cutânea, reduzir exacerbações e melhorar a qualidade de vida de crianças com DA.

      Pontua-se em primeiro lugar que, a pele, além de ser o maior órgão do corpo humano, atua como a principal barreira físico-imunológica frente a agentes patogênicos e substâncias nocivas do meio externo. Entretanto, ela sustenta uma microbiota cutânea, um ecossistema microbiano dinâmico e interdependente, que exerce funções essenciais na preservação da homeostase e na manutenção da saúde cutânea. Disfunções neste equilíbrio ecológico, conhecidas como disbiose, predispõem os indivíduos ao desenvolvimento de condições inflamatórias, como a dermatite atópica (Abreu, D. et al., 2022; Caldas, E. et al., 2024).

      A DA, sob a perspectiva fisiopatológica, foi definida como uma doença extrínseca e intrínseca, tendo em vista que, a extrínseca, também denominada de alérgica, afeta a maior porcentagem dos pacientes portadores e está diretamente relacionado à níveis elevados de IgE e à sensibilização a alérgenos ambientais. Os dois principais mecanismos patogênicos da DA envolvem a disfunção da barreira epidérmica e a desregulação da resposta imune, os quais estão inter-relacionados, perpetuando um ciclo vicioso de inflamação e comprometimento cutâneo (Vilefort, L. et al., 2022).

      A barreira cutânea é majoritariamente composta pelo estrato córneo, uma estrutura complexa e heterogênea que atua como um compartimento bicomponente. Seus principais constituintes incluem os corneócitos — células anucleadas altamente diferenciadas — imersos em uma matriz lipídica extracelular, a qual é composta predominantemente por proporções equimolares de ceramidas (cerca de 45% a 50%), colesterol (aproximadamente 25%) e ácidos graxos livres (entre 10% e 15%). As ceramidas, subdivididas em mais de sete subclasses distintas, desempenham papel fundamental na integridade funcional da barreira, principalmente I e III. Uma das funções primordiais dessa barreira é regular a permeabilidade cutânea, prevenindo a perda transepidérmica de água (TEWL) e a penetração de agentes externos (Chang, et al., 2024; Vilefort, L. et al., 2022).

      Nesse contexto, destaca-se que a microbiota infantil, ainda em desenvolvimento, apresenta elevada sensibilidade a fatores externos. Uma baixa diversidade microbiana está diretamente associada a um risco mais elevado de desenvolver dermatite atópica. A colonização da pele logo após o nascimento, influenciada tanto pelo tipo de parto (vaginal ou cesárea) quanto pela prática de amamentação, exerce um papel determinante no processo de amadurecimento do sistema imunológico do indivíduo (Freitas, N. et al., 2025).

      A perda da função protetora da pele a torna vulnerável a agressões físicas, químicas e biológicas. Nas crianças afetadas pela DA, observa-se um desequilíbrio do sistema imunológico significativo, caracterizado por uma resposta exacerbada mediada por citocinas pró-inflamatórias (IL-4, IL-5 e IL-13), liberadas por linfócitos Th2 (T-helper 2), e por uma produção aumentada de imunoglobulina E (IgE) (Freitas, N. et al., 2025). Essa desregulação imunológica está diretamente relacionada à deficiência na expressão da proteína filagrina e à colonização e invasão por agentes patogênicos como o Staphylococcus aureus, o que resulta na intensificação da resposta inflamatória (Araújo, A. et al., 2025; Rauber, L. et al., 2024).

      Imagem 1 – Barreira Cutânea: Pele Normal x Pele com Dermatite Atópica.

      Fonte: Adaptado de 911Pharma, 2021.

      A filagrina desempenha uma função indispensável na estruturação da queratina dentro dos corneócitos, enquanto seus produtos de degradação atuam como fatores naturais de hidratação (Natural Moisturizing Factors NMFs), essenciais para a manutenção de níveis adequados de hidratação na pele (Edslev, S. et al., 2020). Alterações na filagrina comprometem a integridade da barreira epidérmica, facilitando a entrada de alérgenos e microrganismos e ocasionando na desidratação da pele. A xerose é uma característica marcante na dermatite atópica (DA), na qual os corneócitos apresentam menor tamanho, renovação celular reduzida e quantidade inferior de aminoácidos hidrossolúveis derivados dessa mutação (Araújo, A. et al., 2025).

      Além disso, esse processo favorece a proliferação do Staphylococcus aureus, um microrganismo oportunista que, embora faça parte da microbiota normal, em níveis elevados intensifica a inflamação cutânea e contribui para a persistência crônica da DA (Rauber, L. et al., 2024; Barbosa, R. et al., 2025). Outro fator relevante é a ação de glicerofosfolipídeos, produtos bacterianos que atuam como ceramidases, em que degradam ceramidas e contribuem para a disfunção da barreira e, consequentemente, causam intenso prurido. A coceira combinada à escarificação estimula a liberação de citocinas pelos queratinócitos, o que reduz o limiar ao prurido. Essa reação leva a um círculo vicioso, agravando o quadro da doença (Araújo, A. et al., 2025).

      A composição da microbiota cutânea difere substancialmente da dos adultos devido ao menor conteúdo lipídico na pele infantil, o que limita o crescimento de bactérias lipofílicas. Durante a puberdade, o aumento da produção de sebo altera o microbioma cutâneo, promovendo a colonização de bactérias como Cutibacterium spp e, frequentemente, contribui para a remissão espontânea da patologia. Esse fenômeno explica a redução da prevalência da DA na vida adulta, em que uma baixa porcentagem da população permanece afetada (Rauber, L. et al., 2024).

      Gráfico 1 – Incidência e Evolução da Dermatite Atópica por Idade.

      Fonte: Adaptado de Araújo, A. et al., 2025.

      Com base nas informações ilustradas no gráfico 1 (Araújo, 2025), é possível observar que a DA pode se manifestar em qualquer etapa da vida, embora sua ocorrência seja significativamente mais prevalente nos primeiros 5 anos de vida, especialmente entre os três e seis meses de idade. Estimativas apontam que cerca de 60% dos casos surgem ainda no primeiro ano, e aproximadamente 90% até os cinco anos de idade. Entre as crianças diagnosticadas antes dos dois anos, cerca de 20% mantêm sintomas persistentes ao longo do tempo, e, aos sete anos, 17% ainda apresentam sinais intermitentes da doença. Em adultos, o aparecimento da DA após a adolescência é raro, sendo registrado em apenas 16,8% dos casos. Embora a remissão espontânea ocorra com frequência na transição para a idade adulta, estima-se que entre 10% e 30% dos indivíduos continuam enfrentando manifestações da condição, em intensidades que podem variar (Araújo, A. et al., 2025).

      A DA manifesta-se de maneira diferente de acordo com a faixa etária e a evolução da doença. É caracterizada, principalmente, por prurido intenso, sintoma presente em todas as idades e em diferentes formas da condição, e em grande parte dos casos, por ressecamento de pele, que tende a acentuar ainda mais a coceira nas áreas afetadas. As lesões cutâneas costumam apresentar um padrão inflamatório bem definido, com distribuição simétrica que varia de acordo com a idade do indivíduo. Não é incomum que um mesmo paciente apresente características típicas de diferentes fases etárias ao mesmo tempo (Herculano, G. et al., 2021).

      As lesões eczematosas apresentam características diferentes de acordo com o estágio da doença, podem ser agudas, com vesículas exsudativas, crostas e pápulas sobre placas avermelhadas: subagudas, com pápulas ou placas vermelhas e escamosas: ou crônicas, com placas espessadas, levemente pigmentadas ou escoriadas. A localização também varia, afetando áreas específicas como a região ao redor dos olhos, boca, orelhas, testa, pescoço, articulações dos membros e tronco. Em bebês, as lesões são comumente encontradas no couro cabeludo e rosto, podendo se espalhar para o tronco e extremidades, enquanto em crianças mais velhas, a região do pescoço e as fossas cubital e poplítea são mais afetadas (Herculano, G. et al., 2021; Erthal et al., 2021).

      Imagens 2 e 3 respectivamente: Quadro clínico na Fase Infantil e na Fase Pré-Puberal.

      Fonte: PINHEIRO, D. P. et al., 2022.

      Métodos instrumentais, como a corneometria (para medir a hidratação do estrato córneo) e a avaliação da TEWL (Transepidermal water loss), oferecem dados reprodutíveis para monitoramento dessas alterações, permitindo a detecção de mudanças sutis não perceptíveis clinicamente (Araújo, A. et al., 2025). É essencial utilizar instrumentos de mensuração na avaliação de crianças com DA, visto que eles integram os sinais clínicos observados pelo profissional da saúde e os sintomas relatados pelos próprios pacientes ou responsáveis (Barbarot, S. et al., 2023).

      O Scoring Atopic Dermatitis (SCORAD) é um dos instrumentos estipulados, dado que ele combina tanto a avaliação objetiva da intensidade e extensão das lesões cutâneas quanto aspectos relativos, como a dificuldade para dormir e a presença de prurido. Entretanto, em razão da natureza variável da DA, nos períodos de remissão e exacerbação, o SCORAD foi incapaz de avaliar adequadamente o processo da doença fora das consultas médicas. Com o intuito de contornar essa lacuna, foi criado o Patient-Oriented SCORAD (PO-SCORAD), sendo esse uma versão adaptada que possibilita que os responsáveis monitorem o quadro clínico da criança de maneira contínua (Barbarot, S. et al., 2023; Herculano, G. et al., 2021).

      Do mesmo modo, o Patient-Oriented Eczema Measure (POEM) é uma ferramenta que abarca unicamente os sintomas reportados pelo paciente, sendo vantajoso para medir o impacto da atopia na qualidade de vida. Embora ambos os métodos, PO-SCORAD e POEM, sejam eficientes, o PO-SCORAD se destaca por combinar sinais clínicos e sintomas, o que o faz ser um instrumento mais útil na prática pediátrica. O frequente uso dessas metodologias estratégicas auxilia em um monitoramento mais eficaz da DA em crianças, viabilizando uma abordagem centrada no paciente e proporcionando a adesão ao tratamento (Barbarot, S. et al., 2023; Herculano, G. et al., 2021).

      O manejo da DA em lactentes e crianças requer uma abordagem integrada que combine cuidados diários com a pele e intervenções medicamentosas, tanto tópicas quanto sistêmicas, que minimizem as irritações. Corticosteróides tópicos, que variam de baixa a alta potência, são recomendados como tratamento de primeira linha para controlar inflamações e sintomas agudos da DA. Como terapêutica sistêmica, os anti-histamínicos são frequentemente prescritos para reduzir o prurido, embora sua eficácia varie. Além disso, imunomoduladores biológicos, como o dupilumabe, têm mostrado resultados promissores no tratamento de crianças com DA grave ou refratária. Contudo, a segurança de seu uso a longo prazo ainda requer mais estudos (Santos, C. et al., 2024).

      Os corticosteróides podem ser utilizados na técnica de compressas úmidas (wet wrap), como roupas umedecidas, malhas tubulares ou tecidos fixados com bandagens de crepe. Esse método consiste em aplicar o medicamento ou um emoliente diretamente sobre as lesões, seguido por uma camada de gaze ou tecido de algodão embebido em água morna. Em seguida, uma segunda camada, seca, é aplicada com o objetivo de reduzir a evaporação da água e preservar a hidratação da pele. Essa abordagem visa potencializar a absorção de hidratantes e corticosteroides tópicos pela pele e aliviar o prurido (Araújo, A. et al., 2025; Ross, G. et al., 2023).

      Alternativamente, os inibidores de calcineurina também são eficazes, sendo particularmente indicados para áreas sensíveis ou casos em que o uso prolongado de corticosteróides possa acarretar riscos, como atrofia cutânea ou supressão adrenal (Santos, C. et al., 2024). No entanto, esses agentes não são considerados a primeira escolha de tratamento, pois são mais onerosos e podem causar efeitos adversos iniciais, como sensação de ardor e prurido, que tendem a diminuir com o uso contínuo. Entre os principais inibidores da calcineurina estão o tacrolimo e o pimecrolimo. O pimecrolimo é indicado para uso a partir dos primeiros meses de vida, enquanto o tacrolimo é recomendado apenas após os dois anos de idade (Araújo, A. et al., 2025).

      A limpeza da pele deve ser realizada de maneira cuidadosa e delicada, garantindo a remoção eficiente de crostas e contaminantes bacterianos, especialmente em casos de superinfecção bacteriana. A Força-Tarefa Europeia sobre Dermatite Atópica (ETFAD – Eczema Task Force of Atopic Dermatitis) recomenda banhos regulares ou duchas em água morna, mas não quente, de 2 a 7 vezes por semana. Podem ser utilizados produtos de limpeza com ou sem propriedades antissépticas, desde que possuam fórmulas suaves, não irritantes e com baixo potencial alergênico. É importante que o pH dos produtos esteja na faixa fisiológica da pele, entre 5 e 6, a fim de obter mais benefícios para a barreira cutânea. Considerando que a duração do efeito de alguns antissépticos é limitada, a limpeza mecânica assume maior relevância nesse contexto (Wollenberg, A. et al., 2020).

      A ordem de aplicação do emoliente e do medicamento tópico depende de fatores como o estado da pele, os veículos utilizados nas formulações e a praticidade para o paciente, além da orientação médica. Em geral, hidratantes na forma de cremes ou loções devem ser aplicados antes do medicamento tópico em áreas inflamadas. Por outro lado, pomadas hidratantes devem ser aplicadas após o medicamento tópico. É recomendado aguardar um intervalo adequado entre as aplicações para otimizar a absorção e a eficácia dos produtos (Kulthanan, K. et al., 2021).

      A aplicação ideal dos emolientes tópicos ocorre imediatamente após o banho ou ducha, após uma secagem suave da pele, enquanto esta ainda está levemente úmida. Essa prática é conhecida como “soak-and-seal” (molhar e selar). (Wollenberg, A. et al., 2020). A hidratação proporcionada pelos produtos pode durar de 2 a 6 horas, dependendo da composição do hidratante utilizado. As quantidades recomendadas para diferentes faixas etárias são de aproximadamente 100g por semana para recém-nascidos, 150-200g para bebês e crianças pequenas (Kulthanan, K. et al., 2021). É recomendado aplicar o hidratante ao menos uma vez ao dia, podendo ser necessário aumentar a frequência em períodos de crise ou quando a pele estiver ainda mais seca (Ross, G. et al., 2023).

      Em crianças que apresentam sialorréia, por exemplo, cremes com maior teor de óleo, como os que contém parafina líquida, podem ser vantajosos na proteção de regiões periorais. No entanto, em adolescentes, esse tipo de formulação pode favorecer o aparecimento de lesões acneicas, sendo, portanto, menos indicado. Já em áreas corporais com presença acentuada de pelos, recomenda-se a utilização de loções ou emulsões com textura mais leve, a fim de evitar a obstrução folicular e o surgimento de foliculite (Ross, G., et al., 2023). Com isso, a definição do hidratante mais apropriado para o tratamento da dermatite atópica deve levar em conta fatores como a região do corpo acometida e as particularidades de cada paciente, incluindo idade e tipo de pele.

      Nesse cenário, emolientes com menor potencial alergênico, como cold cream, bases cremosas, ureia em concentrações entre 3% e 10% e petrolato, são preferidos por respeitarem a integridade da barreira epidérmica e apresentarem boa tolerabilidade, especialmente em crianças com maior predisposição à reatividade cutânea (Kulthanan, K. et al., 2021). E de acordo com os resultados desse mesmo estudo, a utilização de hidratantes livres de fragrâncias e conservantes, com fórmulas simples, é mais adequada e minimiza os riscos de exacerbação do eczema atópico.

      Outro aspecto importante abordado pelas pesquisas nos últimos anos é a utilização de hidratantes formulados especificamente para a DA, que incluem ativos como ceramidas e ácidos graxos essenciais, que ajudam a restaurar a função da barreira da pele e reter a umidade (Ross, G. et al., 2023). Alguns desses produtos também incluem prebióticos e probióticos, com o objetivo de equilibrar a microbiota cutânea e reduzir a colonização por S. aureus. Embora os hidratantes especializados apresentem benefícios teóricos, a prática clínica tem mostrado que o mais relevante é garantir o uso regular de qualquer hidratante suave e eficaz, seja especializado ou não (Ross, G. et al., 2023).

      As ceramidas, como descrito por Gomes et al. (2024), são particularmente eficazes na restauração da barreira cutânea, pois podem ser absorvidas pelos queratinócitos e processadas para formar uma matriz lipídica que previne a perda de água e melhora a hidratação. Essa ação é fundamental no contexto da dermatite atópica, em que a função de barreira da pele está comprometida, tornando a pele mais suscetível a irritações e infecções. Logo, a presença de ceramidas nos hidratantes, representa um avanço significativo na estratégia terapêutica, especialmente nas fórmulas que asseguram uma hidratação prolongada.

      Ademais, os emolientes com glicerina e ureia são umectantes, promovem a hidratação do estrato córneo e proporcionam uma proteção significativa contra a irritação cutânea. A pesquisa de Danby et al. (2022) sugere que, embora ambos os ingredientes sejam eficazes na retenção de água, a ureia possui um efeito adicional de aumentar a expressão de filagrina por queratinócitos e, por consequência, aumenta os níveis de fator natural de hidratação (NMF). Esse efeito pode ser benéfico em pacientes com DA, uma vez que a deficiência de filagrina é um dos fatores patogênicos centrais na doença. Portanto, é indicado a utilização de hidratantes com ureia, a fim de obter uma resposta positiva na correção dos efeitos fisiopatológicos da DA e promover alívio sintomático.

      Em relação ao uso de hidratantes contendo ureia no manejo da DA, observa-se que esse componente pode oferecer bons resultados em termos de hidratação cutânea, especialmente em fases de menor atividade inflamatória da doença. No entanto, seu uso requer cautela durante os períodos de exacerbação, uma vez que, embora atue como um eficaz umectante, pode desencadear desconforto ou irritação em áreas com lesões mais intensas, como demonstrado por Harder et al. (2023).

      Em consonância com esses dados, Guillen et al. (2021) também alerta para a necessidade de se evitar a aplicação de ureia em momentos de inflamação ativa, sugerindo que sua introdução seja postergada até que a pele esteja em uma fase mais estável. Ambos os estudos recomendam, ainda, que a reintrodução do ativo ocorra de forma gradual, permitindo uma avaliação cuidadosa da tolerância individual do paciente e reduzindo o risco de reações adversas. Assim, reforça-se a importância da individualização do tratamento e da adaptação do uso de hidratantes conforme a fase clínica da dermatite.

      O dexpantenol (componente da coenzima A), ou pantotênico (vitamina B5), desempenha um papel aditivo no tratamento, por possuir atividade umectante de hidratação e efeito anti-inflamatório, além de ser importante para o metabolismo de carboidratos, ácidos graxos, hormônios e proteínas. Um estudo in vitro demonstrou os benefícios do dexpantenol sobre os fibroblastos humanos para melhorar a proliferação celular e a cicatrização de feridas (Somjorn, P. et al., 2021). Dessa forma, o dexpantenol tem grande relevância no tratamento de DA, principalmente por ser um umectante e por ter um efeito anti-inflamatório significativo, o tornando uma excelente opção terapêutica para DA leve a moderada.

      O ácido linoleico é um ácido graxo essencial da pele, que desempenha um papel primordial no processo anti-inflamatório na DA. A diminuição desse ácido na pele dos pacientes afetados executa uma função importante na fisiopatologia. O uso de hidratantes que contenham ácido linoleico tem demonstrado benefícios na redução da pontuação do SCORAD, um indicador clínico importante da gravidade da DA, e restaura a função de barreira cutânea. Esse componente combinado com os outros supracitados apresentam atividade hidratante e anti-inflamatória eficaz e importante para a melhora do quadro clínico (Somjorn, P. et al., 2021).

      A Tabela 2 foi elaborada para facilitar a compreensão e comparação de compostos emolientes, como ceramidas, ureia, glicerina, pantenol, parafinas e ácidos graxos, fornecendo exemplos de sua indicação e como podem ser encontrados em produtos dermatológicos.

      Tabela 2: Comparação dos tipos de emolientes.

      Fonte: Elaborado pelos autores, 2025.

      O Epi-oxizoantamina, um composto extraído de organismos marinhos, apresenta um interessante potencial terapêutico, especialmente por suas propriedades antibacterianas, antivirais e anti-inflamatórias. Estudos preliminares indicam que ele pode ajudar a reduzir a inflamação cutânea e aumentar a hidratação da pele em pacientes com DA. Entretanto, mais pesquisas são necessárias para confirmar sua eficácia e entender os mecanismos pelos quais ele pode contribuir para o tratamento da dermatite atópica (Huang, C. et al., 2023).

      Em estudo realizado por Freitas et al. (2025), observou-se que os sintomas persistentes da DA, como o prurido intenso e a aparência estigmatizante das lesões, afetam negativamente a qualidade de vida das crianças, contribuindo para dificuldades escolares, isolamento social e baixa autoestima, fatores associados ao desenvolvimento de transtornos como o déficit de atenção. Em concordância, Mariano et al. (2024) ressalta que esse impacto se estende aos cuidadores, que vivenciam uma sobrecarga emocional. Ambos os estudos reforçam a necessidade de uma abordagem que vá além do tratamento cutâneo, incluindo suporte psicológico ao paciente e à família.

      Por fim, com relação à prevenção da DA, evidências recentes demonstram que iniciar o uso de hidratantes logo após o nascimento do neonato, preferivelmente nas primeiras semanas de vida, e mantê-lo até os seis meses de idade, é capaz de reduzir o risco de desenvolvimento de DA (Kulthanan, K. et al., 2021). Entretanto, há estudos que revelam que não há relação direta entre utilizar hidratantes em bebês e desenvolver dermatite atópica, o que demonstra não haver redução no risco de evoluir para eczema atópico, bem como, tem a possibilidade de aumentar o risco de infecções de pele (NG, P. et al., 2021). Portanto, mais estudos padronizados e de alta qualidade são necessários para esclarecer os benefícios e riscos do uso precoce de hidratantes na prevenção da DA (Kulthanan, K. et al., 2021).

      5. LIMITAÇÃO DO ESTUDO

      Apesar dos avanços alcançados na compreensão do papel da hidratação no manejo da dermatite atópica infantil, este estudo apresenta algumas limitações que merecem ser consideradas. Um dos principais entraves é a escassez de estudos direcionados especificamente à população pediátrica brasileira, o que compromete a aplicabilidade direta dos achados à realidade nacional, marcada por desigualdades no acesso a produtos dermatológicos adequados e orientações especializadas. Muitas das evidências disponíveis foram obtidas em contextos socioeconômicos distintos, onde há ampla disponibilidade de emolientes de alto custo, dificultando a extrapolação para crianças em situação de vulnerabilidade social.

      Além disso, observou-se uma carência de investigações que analisem de forma sistemática o impacto da hidratação contínua sobre aspectos psicossociais, como autoestima, desempenho escolar, sono e qualidade de vida dos cuidadores, elementos que são frequentemente comprometidos em quadros de DA moderada a grave. Tais dimensões, embora reconhecidas como relevantes, ainda são pouco exploradas em protocolos clínicos e em avaliações longitudinais.

      Outro ponto limitante refere-se à ausência de padronização nas formulações dos emolientes utilizados nos estudos revisados, o que gera variabilidade nos resultados e dificulta a comparação entre diferentes intervenções. A diversidade nos princípios ativos, veículos e modos de aplicação dos hidratantes analisados impede uma conclusão uniforme quanto à superioridade de determinadas formulações sobre outras.

      Dessa forma, reforça-se a necessidade de novos estudos que contemplem realidades regionais diversas, incorporem desfechos clínicos e psicossociais, e promovam a validação de estratégias terapêuticas seguras, acessíveis e efetivas para o controle da DA na infância.

      6. CONCLUSÃO

      A DA, enquanto condição dermatológica crônica, multifatorial e recidivante, impõe desafios não apenas ao controle clínico de seus sintomas, mas também à manutenção da qualidade de vida das crianças acometidas e de seus cuidadores. Este trabalho permitiu compreender, sob uma perspectiva crítica e integrativa, o papel da hidratação cutânea contínua como eixo central no manejo terapêutico da dermatite atópica na infância, evidenciando sua importância não apenas como medida coadjuvante, mas como elemento estruturante da estratégia de cuidado.

      As evidências analisadas ao longo desta revisão revelam que os emolientes, especialmente aqueles com formulações biomiméticas, exercem múltiplas ações: promovem a restauração da integridade da barreira epidérmica, reduzem significativamente a perda transepidérmica de água, auxiliam na modulação da microbiota cutânea e atenuam a cascata inflamatória característica da DA. Tais benefícios, quando aliados à adesão terapêutica adequada, resultam em diminuição da severidade clínica, menor frequência de crises e maior estabilidade dos períodos de remissão.

      É importante ressaltar que, embora os avanços nas formulações dermatológicas tenham proporcionado alternativas cada vez mais eficazes e seguras, a simplicidade da intervenção baseada na aplicação regular e criteriosa de hidratantes isentos de fragrâncias, conservantes agressivos e agentes irritantes permanece sendo um dos seus maiores trunfos. A adesão ao tratamento, contudo, está diretamente vinculada à orientação adequada por parte dos profissionais de saúde e à compreensão, por parte dos familiares, da importância da continuidade e precocidade na aplicação dos emolientes, mesmo nos períodos de aparente remissão.

      Nesse sentido, destaca-se que a educação em saúde desempenha papel indispensável na condução terapêutica da DA. A capacitação de pais e cuidadores quanto à natureza crônica da doença, seus gatilhos ambientais, as condutas preventivas e o uso racional de produtos tópicos favorece a autonomia da família, reduz a dependência de terapias farmacológicas e contribui para a redução dos impactos psicossociais associados à condição. Conforme apontado por diversos autores, o conhecimento e o envolvimento ativo dos cuidadores são determinantes para minimizar as recaídas, reduzir a ansiedade relacionada à doença e proporcionar um ambiente doméstico mais estável e acolhedor.

      Outro aspecto que emerge com relevância é o impacto psicossocial da DA na infância. O desconforto constante, as restrições nas atividades diárias, as alterações no sono e a percepção estética das lesões influenciam diretamente o desenvolvimento emocional, o rendimento escolar e as interações sociais da criança. Nesse cenário, a implementação de um cuidado dermatológico efetivo, que envolva a hidratação contínua e individualizada, apresenta-se não apenas como medida terapêutica, mas também como estratégia promotora de bem-estar, de autoestima e de inclusão social.

      No entanto, persistem lacunas significativas na literatura, especialmente em relação à eficácia de formulações bioativas em longo prazo, à adaptação das condutas terapêuticas em diferentes contextos socioeconômicos e à integração da atenção primária no fornecimento de orientações e produtos básicos de cuidado. A escassez de estudos longitudinais com populações pediátricas brasileiras reforça a urgência de fomentar novas investigações, capazes de gerar evidências aplicáveis à realidade do Sistema Único de Saúde e de propor diretrizes clínicas contextualizadas.

      Dessa forma, conclui-se que, na ausência de cura definitiva para a dermatite atópica, o controle eficaz da doença passa, inevitavelmente, pelo investimento contínuo em estratégias de baixo custo, alta efetividade e forte embasamento científico — como é o caso da hidratação cutânea. Quando associada à educação em saúde, ao acompanhamento longitudinal e à escuta qualificada das famílias, essa prática torna-se capaz de transformar realidades, minimizar danos e ampliar as possibilidades de saúde integral para crianças com dermatite atópica.

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      1 Graduanda em Medicina. Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos (UNICEPLAC). SIGA Área Especial para Indústria Lote 2/3, Sce St. Leste Industrial, Gama, Brasília (DF), E-mail: karina.costa@medicina.uniceplac.edu.br
      2 Graduanda em Medicina. Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos (UNICEPLAC). SIGA Área Especial para Indústria Lote 2/3, Sce St. Leste Industrial, Gama, Brasília (DF), E-mail: victoria.aragao@medicina.uniceplac.edu.br
      3 Especialista em Pediatria, Reumatologia, Alergia e Imunologia. Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos (UNICEPLAC). SIGA Área Especial para Indústria Lote 2/3, Sce St. Leste Industrial, Gama, Brasília (DF), E-mail: dania.dionizio@uniceplac.edu.br