CONSENSO DE DIRETRIZES MÉDICAS BRASILEIRAS SOBRE A LAVAGEM NASAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202506152053


Bruna Fernanda Leite Cordeiro*; Andressa da Silva Freitas; Bruno Teodoro e Silva; Ianna Andrade Oliveira; Karoliny Rodrigues Santini Barretto; Luana de Almeida Jucá; Maria Eduarda Leite Cordeiro; Pedro Antônio de Souza Kredens.


RESUMO

INTRODUÇÃO: A lavagem nasal, uma prática antiga e cada vez mais popular, é fundamental para a saúde respiratória. Ela promove a remoção mecânica de muco e detritos, hidrata a mucosa e melhora o clearance mucociliar. Sua importância é acentuada quando há alta prevalência de doenças respiratórias, como asma e rinite alérgica. Apesar dos benefícios, a falta de consenso sobre métodos e dispositivos gera dúvidas para profissionais e pacientes. OBJETIVO: Analisar o posicionamento de órgãos filiados à Associação Médica Brasileira (AMB) sobre a lavagem nasal, buscando identificar o consenso e a viabilidade de um documento de orientação unificado. METODOLOGIA: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, pesquisando diretrizes e recomendações em sites oficiais de entidades médicas brasileiras. Após a triagem, 15 publicações foram selecionadas para análise detalhada. RESULTADO: As entidades médicas consultadas, selecionadas por sua relevância em pediatria, otorrinolaringologia e alergologia, abordaram a lavagem nasal como um tratamento adjuvante e não farmacológico. O maior volume de publicações veio da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial, demonstrando maior interesse nessa área. Entidades ligadas à saúde infantil e alergias também mostraram interesse significativo. DISCUSSÃO: A lavagem nasal é uma intervenção eficaz e segura para diversas condições como rinite e infecções da via aérea superior. No entanto, contraindicações relativas (corpos estranhos, anomalias anatômicas) e riscos de efeitos adversos (irritação, complicações otológicas, contaminação) devem ser considerados. A solução isotônica é a mais indicada para crianças, com atenção à higiene e técnica correta. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A fragmentação das recomendações sobre lavagem nasal entre as entidades médicas brasileiras destaca a necessidade de um documento de orientação unificado. Um consenso formal pode padronizar práticas, esclarecer indicações e contraindicações, e otimizar o manejo das doenças respiratórias, beneficiando profissionais e pacientes.

Palavras-chave: Lavagem Nasal; Rinite; Consenso.

INTRODUÇÃO

A lavagem nasal, uma prática milenar originária da medicina indiana, tem ganhado proeminência nas últimas décadas como um método terapêutico eficaz para diversas afecções nasossinusais. Embora sua popularidade tenha crescido recentemente, com a utilização de diversos dispositivos e a disseminação diária da técnica, a irrigação da cavidade nasal com soluções de cloreto de sódio remonta a mais de cinco mil anos1. A finalidade principal da lavagem nasal consiste na remoção mecânica do excesso de muco, detritos e material particulado, além de promover a hidratação da mucosa nasal, contribuindo para o aumento do clearance mucociliar e a redução da exposição a alérgenos e poluentes atmosféricos2.

A relevância da lavagem nasal é acentuada pela alta prevalência de doenças respiratórias como a asma e a rinite alérgica, tanto no Brasil quanto globalmente. Estima-se que cerca de 10% da população brasileira seja afetada pela asma e 30% pela rinite alérgica, sendo comum a coexistência dessas condições. A rinite alérgica, embora não tão grave quanto a asma, impacta significativamente a qualidade de vida, gerando distúrbios do sono e dificuldades respiratórias, e frequentemente agrava os sintomas asmáticos, elevando os custos e o sofrimento dos pacientes3. Em escolares brasileiros, as prevalências de asma, rinite e rinoconjuntivite são de aproximadamente 15%, 30% e 15%, respectivamente4.

A função primordial do nariz no aquecimento e umidificação do ar inalado é crucial para a saúde pulmonar. Em períodos de baixa umidade e temperaturas frias, como outono e inverno, o funcionamento inadequado da via aérea superior pode resultar na chegada de ar seco e frio aos pulmões, desencadeando broncoconstrição e crises alérgicas4. Nesse contexto, a lavagem nasal emerge como um coadjuvante terapêutico valioso, facilitando a remoção de secreções patológicas e promovendo alívio sintomático, o que justifica o crescente interesse em investigar seus mecanismos de ação e benefícios em diversas condições nasais2.

Apesar da ampla aceitação e dos benefícios reconhecidos da lavagem nasal, ainda não há um consenso global sobre o melhor método ou dispositivo a ser empregado1. A heterogeneidade de recomendações e a ausência de um documento unificado podem gerar dúvidas entre profissionais de saúde e pacientes, impactando a adesão e a eficácia do tratamento.

O presente estudo tem como objetivo analisar o posicionamento de diferentes órgãos filiados à Associação Médica Brasileira em relação à técnica de lavagem nasal, visando identificar o grau de consenso existente e discutir a viabilidade de um documento de orientação unificado sobre o método.  

MÉTODO

O presente estudo trata-se de uma revisão integrativa da literatura, com o objetivo de identificar o nível de consenso nas recomendações de diretrizes brasileiras sobre as indicações, métodos e frequência da técnica de lavagem nasal. A busca de informações foi conduzida na plataforma on-line Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Foram utilizados os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) ‘Lavagem Nasal’ e termos relacionados, também combinados com ‘Brasil’ e termos equivalentes a ‘diretrizes’ e ‘recomendações’ utilizando o operador AND. Adicionalmente, foi realizada uma busca manual nos sites oficiais de entidades médicas brasileiras.

Os critérios de inclusão foram: diretrizes clínicas, recomendações, consensos e cartilhas informativas sobre lavagem nasal publicadas no período de 2012 a 2025, disponíveis na íntegra em português ou inglês. Foram excluídos artigos de revisão, publicações de autores com conflitos de interesse comercial declarados, opiniões pessoais publicadas em sites não científicos ou jornalísticos, e materiais que não abordam diretamente as indicações e métodos da lavagem nasal. 

A busca inicial nas bases de dados e fontes identificou 49 registros. Após a remoção de duplicatas, 45 títulos e resumos foram triados com base nos critérios de inclusão e exclusão. 22 publicações foram selecionadas para leitura completa, das quais 15 atenderam a todos os critérios de inclusão. Para cada documento, foram extraídas as seguintes informações: órgão/entidade emissora, data de publicação/atualização, indicações específicas para a lavagem nasal, métodos de realização, frequência recomendada e considerações sobre faixas etárias. A síntese dos dados foi realizada de forma narrativa, agrupando as recomendações por indicação e método, destacando o nível de concordância encontradas.

RESULTADO

Foram consultadas as entidades médicas brasileiras que, em virtude de sua área de atuação, poderiam demonstrar interesse científico e clínico no tema “Lavagem Nasal”. A seleção das instituições baseou-se na pertinência do tema à especialidade médica específica, considerando-se o público com maior índice de infecções de via aérea superior (pediatria), a região anatômica de interesse (otorrinolaringologia), a finalidade do procedimento (infectologia e alergologia) e sua aplicabilidade como intervenção terapêutica de baixa complexidade (clínica médica e medicina de família e comunidade). A consulta dos materiais ocorreu diretamente nos endereços eletrônicos oficiais de cada corporação. O quadro 1 ilustra os órgãos consultados e o número de publicações que abordaram o tema.

Quadro 1 – Resultados de pesquisa por entidades médicas brasileiras:

Observou-se uma variedade de tipologias textuais nas publicações encontradas, incluindo artigos científicos, manuais, consensos, cartilhas informativas, capítulos de livros, diretrizes clínicas (guidelines) e anais de eventos. O público-alvo dessas publicações também se mostrou diversificado, abrangendo desde médicos especialistas associados e médicos residentes até acadêmicos de graduação e pacientes.

Em relação ao conteúdo dos documentos analisados, verificou-se que o termo “lavagem nasal” não constituiu o foco principal na maioria dos estudos. Em vez disso, a técnica foi abordada de maneira adjuvante, como um mecanismo de prevenção e/ou tratamento não farmacológico de doenças do sistema respiratório (alérgicas ou infecciosas).

O maior volume de publicações foi identificado na Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cervicofacial, com três documentos. A Associação Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia apresentaram, cada uma, duas publicações. A Associação Médica Brasileira contribuiu com um único documento.

Os resultados sugerem um maior interesse na investigação e na divulgação da técnica de lavagem nasal por parte das entidades médicas com atuação científica centrada na região anatômica da via aérea superior, no público infantil e em condições clínicas relacionadas a alergias e imunodeficiências.

DISCUSSÃO

A compreensão das diversas perspectivas e a busca por diretrizes consolidadas são cruciais para otimizar o manejo de doenças respiratórias, garantindo a segurança e a efetividade dessa intervenção terapêutica.

A fisiologia nasal desempenha um papel central na manutenção da homeostase do sistema respiratório, atuando como a primeira linha de defesa contra injúrias externas1. As fossas nasais são responsáveis pelo aquecimento e umidificação do ar inspirado, além da filtragem de partículas e microrganismos5, 6. O ar que atinge a rinofaringe, por exemplo, possui uma temperatura média de 34°C e umidade relativa de 100%, demonstrando a eficácia do nariz nesse processo. Adicionalmente, o sistema de imunidade de mucosas nasal reconhece continuamente antígenos, iniciando respostas imunológicas e mantendo o equilíbrio entre a flora microbiana comensal e patogênica, desde as cavidades nasais até os alvéolos pulmonares1.

A importância do nariz na respiração é ainda mais crítica em crianças, especialmente em recém-nascidos e lactentes, que são respiradores nasais exclusivos até os dois meses de vida6. As cavidades nasais infantis, por serem mais estreitas, tornam-se mais suscetíveis a obstruções decorrentes de partículas, alterações climáticas (frio e clima seco), processos alérgicos como a rinite e infecções respiratórias3. A camada mucociliar, que reveste as cavidades nasais, tem um papel ativo na homeostase respiratória, com função ciliar, secreção de muco e liberação de mediadores inflamatórios6.

A alteração do fluxo de ar normal pelas vias aéreas, resultando em respiração oral ou oro-nasal, pode comprometer a ventilação adequada e gerar desconforto, manifestando-se por batimento de asas nasais e dificuldade na alimentação6. Além disso, a respiração oral dificulta o cumprimento das funções nasais de filtração, aquecimento e umidificação do ar, impactando a relação com outras estruturas adjacentes como os seios da face, olhos, ouvidos, garganta e pulmões. Consequentemente, condições como rinite podem levar a complicações em todas essas estruturas, manifestando-se como sinusite, conjuntivite, amigdalite, faringite, otite, tosse e sintomas pulmonares5.

A lavagem nasal com solução salina atua diretamente na melhoria da função do clearance mucociliar, um mecanismo de defesa inespecífico das vias aéreas superiores. Este mecanismo depende intrinsecamente da frequência do batimento ciliar e da viscosidade do muco nasal, estabelecendo uma barreira física contra elementos potencialmente danosos. Dessa forma, a irrigação com solução salina contribui para manter boas condições de limpeza e umidade da cavidade nasal6, 7. Embora o ciclo nasal, fenômeno de alternância de resistência entre as fossas nasais, seja identificado em adultos e contribua para a recuperação das funções nasais, este não está bem estabelecido em recémnascidos, lactentes e crianças menores devido à imaturidade do controle vasomotor da mucosa nasal e do sistema nervoso simpático1.

A lavagem nasal com soluções salinas tem se consolidado como uma intervenção terapêutica fundamental devido à sua eficácia e segurança em diversas condições4. As principais indicações estão ordenadas no Quadro 2.

Quadro 2: Indicações clínicas para a realização da lavagem nasal.

É crucial, em casos de obstrução nasal em neonatos e lactentes, considerar a avaliação do otorrinolaringologista para diferenciar causas e descartar anomalias congênitas, como atresia de coana ou hipoplasia de maxila8. As alterações anatômicas ou estruturais podem dificultar a realização segura do procedimento ou aumentar o risco de complicações. Pacientes com disfagia e risco de aspiração, fissura palatina, defeitos da base do crânio e fraturas de face demandam extrema cautela1, 7. Além disso, a presença de obstrução física da via aérea superior devido a anomalias congênitas, como estenose congênita da abertura piriforme e massas frontonasais congênitas, contraindica a lavagem nasal, pois o fluxo de ar normal já está comprometido. Nestes casos, exames de imagem são essenciais para um diagnóstico preciso e definição do tratamento adequado8, 9.

Embora amplamente reconhecida por seu baixo risco, baixo custo e poucos efeitos colaterais, a técnica de lavagem nasal apresenta contraindicações que, frequentemente classificadas como relativas, exigem avaliação médica, especialmente na população pediátrica1, 7. A ausência de um entendimento completo de seu mecanismo de ação, aliada à carência de estudos sobre sua eficácia rotineira ou profilática, reforça a necessidade de cautela em determinados cenários clínicos.

Um dos principais pontos de atenção refere-se à suspeita ou presença de corpos estranhos nasais. A lavagem nasal deve ser exaustiva após a remoção de corpos estranhos liberadores de substâncias causticas, como pilhas e baterias, mas a lavagem com o objetivo de remover qualquer corpo estranho pode deslocá-lo para a árvore brônquica, complicando o quadro e exigindo remoção cirúrgica sob anestesia geral11. Essa circunstância ressalta a importância de uma avaliação diagnóstica prévia, preferencialmente por meio de nasofibroscopia, para determinar a viabilidade e segurança da técnica1.

A escolha da osmolaridade da solução e do tipo de dispositivo são fatores importantes para a correta indicação e realização da lavagem nasal. As soluções hipertônicas estão associadas a uma maior incidência de efeitos colaterais, como queimação e prurido, em comparação com as soluções isotônicas1, 7, 10. Embora esses sintomas predominem nos primeiros 3 a 4 dias de uso, atingindo cerca de 9% dos casos, a irritação da mucosa induzida por soluções hipertônicas pode ser atenuada com o emprego de soluções tamponadas, que elevam a alcalinidade, como as que contêm bicarbonato de sódio1, 7.

A decisão sobre a tonicidade da solução deve ser individualizada pelo médico, considerando a patologia a ser tratada, a duração do uso e as particularidades do paciente. Atualmente, não há evidências clínicas inquestionáveis que demonstrem a superioridade de um tipo de solução sobre o outro para todas as condições7, 12, 13.

Quando contraindicada a solução salina, o ringue lactato apresenta-se com alternativa, com igualmente fácil acesso e baixo custo. Em uma pesquisa conduzida com 60 pacientes, o ringue lactato foi superior em conforto e inferior em ardência, e o objetivo primordial (lavagem mecânica) foi atingido14. Outras soluções estão sendo sugeridas para igual substituição da solução salina, como o xilitol em uso pré e pós-operatório de vias aéreas superiores, por sua ação antibacteriana e bactericida15.

Adicionalmente, a seleção do dispositivo de irrigação também influencia a ocorrência de eventos adversos. Dispositivos de alto volume e alta pressão podem causar desconforto, sensação de queimação e sintomas auditivos, o que exige cautela especial em crianças menores de dois anos. Em pacientes com alterações na função renal ou doenças cardiovasculares, a utilização frequente e em grande volume de soluções salinas pode, potencialmente, aumentar a ingestão diária de sódio, embora não haja evidências robustas. Nessas situações, recomenda-se orientar o paciente a evitar a deglutição da solução7.

Os efeitos adversos mais frequentemente relatados incluem desconforto local (ardor, prurido, queimação), lacrimejamento, epistaxe, otalgia, cefaleia, disfunção da tuba auditiva, hipoacusia transitória, zumbido transitório, vertigem transitória, otorragia, otite média aguda, perfurações da membrana do tímpano, barotraumas otológicos, ressecamento da mucosa nasal (se a irrigação persistir em vigência de irritação), desidratação e irritação da mucosa (com uso prolongado de solução hipertônica em pacientes sem edema), contaminação por ameba (uso de água da torneira não tratada), contaminação bacteriana (de frascos de solução salina)1,7.

A qualidade da água e a higiene dos dispositivos são aspectos críticos para prevenir complicações infecciosas. Há relatos de contaminação por amebas ao utilizar água da torneira não tratada e contaminação bacteriana de frascos de solução salina, podendo ocorrer em aproximadamente 25% dos pacientes. Recomenda-se o uso de água fervida (por pelo menos 1 minuto), filtrada ou engarrafada (destilada ou estéril). As soluções preparadas devem ser refrigeradas e não armazenadas por mais de 7 dias. Além disso, os dispositivos devem ser esterilizados após cada uso e substituídos a cada 3 meses ou conforme as orientações do fabricante1.

A solução isotônica (0,9% de NaCl) é a base para a lavagem nasal rotineira, podendo ser adquirida pronta ou preparada de forma caseira, dissolvendo 9g de cloreto de sódio em 1 litro de água filtrada e fervida. Para aprimorar o pH e aumentar o conforto, pode-se adicionar uma colher de café rasa de bicarbonato de sódio a cada 250mL com sal. A temperatura da solução também é um fator importante; recomenda-se que esteja em temperatura ambiente (25°C) ou levemente aquecida, evitando soluções geladas1, 7, 12. A adição de medicamentos à solução de lavagem nasal em bebês e crianças não é recomendada1.

Embora a solução hipertônica (2% ou 3%) seja mais eficaz na redução do edema e na melhora do transporte mucociliar em casos de congestão intensa, como rinossinusites agudas ou rinite medicamentosa, seu uso deve ser reservado para períodos mais curtos (dias a poucas semanas) devido ao maior risco de desconforto, ardência e irritação da mucosa, especialmente em crianças1, 7, 9. 

A escolha do dispositivo e do volume varia conforme a idade do paciente e a necessidade clínica. Para bebês menores de 6 meses, sprays e conta-gotas são mais indicados para umidificar a mucosa e familiarizar o bebê com a técnica. Em crianças maiores, a limpeza é mais eficaz com o uso de seringas e frascos de alto volume. Estudos em crianças com rinite alérgica mostraram eficácia com volumes variando de 2,5mL por narina (com seringa) a 20mL por narina (com seringa), ou 4-6 sprays por narina, evidenciando a eficácia da lavagem nasal independentemente de um volume único padronizado1. Para rinossinusite aguda bacteriana não grave em crianças de 3 a 12 anos, o uso de 15 a 20mL de solução isotônica por narina, 1 a 3 vezes ao dia (com seringa), demonstrou melhora significativa na qualidade de vida e nos sintomas. Para adultos, volumes menores, como 4mL por narina (com seringa), também mostraram benefícios no batimento mucociliar e nos sintomas10.

Sistemas de pressão positiva (frascos, seringas) e pressão negativa (sprays, gotejadores, aerossóis e nebulizadores) estão disponíveis. Sprays e aerossóis são opções modernas e práticas, com avanços que garantem doses e pressões adequadas e mecanismos para evitar contaminação6. Dispositivos de alto volume e baixa pressão (como garrafas de irrigação), embora padrão-ouro para rinossinusite crônica, devem ser usados com cuidado para evitar pressão excessiva e potenciais barotraumas otológicos, especialmente em crianças1.

Para padronizar a técnica de lavagem nasal de alto fluxo deve-se direcionar o dispositivo no sentido lateral da narina (evitando o septo nasal, prevenindo trauma), aplicar com pressão suave e contínua (sem força excessiva, para evitar barotraumas otológicos e desconforto), estabelecer vedamento da conexão do dispositivo com a narina, direcionar o jato em um ângulo de 45 graus para cima em relação ao plano do palato. Em bebês e crianças incapazes de assoar o nariz, remover crostas e excesso de secreções da porção anterior das narinas com uma haste de algodão antes da aplicação. Posicionar o tronco entre 15 e 30º para frente, abrir a boca e elevar o palato, pressionar a narina oposta, aplicar a solução. Após a lavagem, limpar as narinas gentilmente com uma toalha, evitando assoar com muita pressão.

A lavagem nasal pode ser realizada diariamente, duas vezes ao dia, mesmo na ausência de sintomas, e pode ser repetida quantas vezes forem necessárias, especialmente durante infecções ou períodos de alergia4, 5, 6. A orientação e demonstração correta da técnica por profissionais de saúde são fundamentais para melhorar a adesão e os resultados, garantindo um tratamento eficaz, conservador e de baixo custo6, 7.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de ser uma abordagem antiga, de baixo custo, fácil aplicação e com poucas contraindicações, a lavagem nasal é abordada como tema por poucas entidades médicas brasileiras. A consulta à entidades médicas com interesse científico e clínico no tema, como a Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF), a Associação Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica (ABOPe), a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), revelou uma variedade de tipologias textuais e públicos-alvo nas publicações, abrangendo desde artigos científicos e diretrizes clínicas até cartilhas informativas.

Os resultados demonstram que, embora a lavagem nasal seja amplamente reconhecida e empregada como coadjuvante no manejo de diversas afecções respiratórias, ela não constitui o foco principal na maioria dos documentos analisados. Sua abordagem é predominantemente de caráter preventivo e/ou terapêutico não farmacológico. Observou-se um maior volume de publicações e, consequentemente, um interesse mais acentuado na investigação e divulgação da técnica por parte de entidades médicas com atuação científica centrada na via aérea superior (ABORL-CCF, ABOPe), no público infantil (SBP e ABOPe) e em condições clínicas relacionadas a alergias e imunodeficiências (ASBAI). A própria Associação Médica Brasileira (AMB) contribuiu com um único documento, indicando uma abordagem mais segmentada da lavagem nasal dentro das especialidades.

A técnica é segura e eficaz na maioria dos casos, com o uso de soluções isotônicas sendo o mais recomendado para crianças e atenção rigorosa à higiene dos dispositivos. Contudo, a variedade de abordagens e a ausência de um documento centralizado e abrangente destacam a necessidade de maior harmonização.

A diversidade de posicionamentos entre as diferentes entidades médicas ressalta a viabilidade de um documento de orientação unificado sobre a lavagem nasal. Tal iniciativa poderia consolidar as melhores práticas, padronizar as recomendações sobre tipos de solução, dispositivos e técnicas de aplicação, além de clarificar contraindicações e manejo de efeitos adversos. Um consenso formal, construído a partir da colaboração entre as especialidades envolvidas, seria fundamental para otimizar o manejo das doenças respiratórias em crianças, garantindo maior segurança, efetividade e acessibilidade da informação para profissionais, pacientes e seus cuidadores.

REFERÊNCIA

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*Autor correspondente: brunaflcordeiro@gmail.com