O INÍCIO DA INDUSTRIALIZAÇÃO DO SETOR DE MOTOCICLETAS DO BRASIL NO PERÍODO DE 1951 A 2023.

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202505132123


Cataryna Gabriela Gomes Moreira¹
Luiz Henrique Miura Duque²


RESUMO. Este artigo tem como objetivo analisar o início da industrialização do setor de motocicletas no Brasil, que começou no século XX. A pesquisa aborda as motivações e a necessidade de investimento nessa indústria, destacando a Zona Franca de Manaus como um fator essencial. Para compreender o desenvolvimento da industrialização, utilizamos uma linha do tempo dividida em fases, com ênfase na primeira fase, que representa o início da industrialização. Além disso, examinamos a produção recorde no polo industrial da Zona Franca de Manaus, que incentivou a exportação de motocicletas. Os dados obtidos na pesquisa forneceram dados essenciais para validar nossa proposta, demonstrando que o crescimento das exportações e do consumo de motocicletas é exponencial e que, sem essas exportações, o desenvolvimento do setor motociclístico não teria ocorrido. Além de tudo, analisamos como a tecnologia e suas estruturas influenciaram a fixação das montadoras, ajudando-as a superar crises e possibilitando uma maior adaptação das empresas em seus estágios iniciais.

Palavras-chave. Motocicleta, indústria, veículo, exportação, montadoras.

ABSTRACT. This article aims to analyze the beginning of the industrialization of the motorcycle sector in Brazil, which started in the 20th century. The research addresses the motivations and the need for investment in this industry, highlighting the Manaus Free Trade Zone as an essential factor. To understand the development of industrialization, we utilize a timeline divided into phases, with an emphasis on the first phase, representing the start of industrialization. Furthermore, we examine the record production in the industrial hub of the Manaus Free Trade Zone, which encouraged the export of motorcycles. The data obtained in the research provided essential data to validate our proposal, demonstrating that the growth of motorcycle exports and consumption is exponential and that, without these exports, the development of the motorcycle sector would not have occurred. In addition to all this, we analyze how technology and its structures influenced the establishment of manufacturers, helping them to overcome crises and enabling greater adaptation of companies in their initial stages.

Keywords. Motorcycles, industry, vehicle, exportation,  automakers.

1. INTRODUÇÃO 

No início do século XX, mais especificamente em 1951, a empresa sueca Monark chegou ao Brasil, dando início à industrialização de motocicletas no país. A empresa se destacou por produzir motocicletas acessíveis e práticas, ideais para o mercado brasileiro da época. Posteriormente, montadoras japonesas ganharam espaço no mercado, impulsionando um processo de industrialização cada vez mais tecnológico. Esse avanço levou o país a diminuir a importação de motocicletas inteiras, favorecendo a implantação de montadoras em solo nacional. Esse fenômeno gerou grandes mudanças econômicas, incentivando a entrada de novas empresas no setor e o fortalecimento da indústria local. Entre as principais transformações, destaca-se o aumento de empregos e o desenvolvimento do Polo Industrial de Manaus (PIM), que desempenha um papel estratégico na economia brasileira, incluindo sua participação na exportação de motocicletas para diversos países do continente americano.

Com o objetivo de compreender a evolução da indústria de motocicletas no Brasil e seus impactos, este trabalho busca analisar as tecnologias introduzidas pelo setor, desde a instalação de fábricas até investimentos em inovação e sustentabilidade com tecnologia nacional. Também serão abordados os efeitos socioeconômicos dessa indústria, contemplando aspectos como economia, esporte, infraestrutura e acessibilidade. Além disso, será discutida a relevância das motocicletas como alternativa de transporte acessível e econômica, especialmente em áreas urbanas congestionadas.

Entretanto, é fundamental considerar os desafios que emergem desse cenário. O tópico 2.5 deste estudo representa a problemática da pesquisa, analisando como as motocicletas influenciam a inclusão social e a geração de renda, ao mesmo tempo que expõem seus usuários à precarização do trabalho e aos riscos inerentes à segurança no trânsito. A expansão do mercado informal de motociclistas, impulsionada pelo setor de entregas e transporte alternativo, levanta questões sobre a regulamentação do trabalho e a necessidade de políticas públicas adequadas. Além disso, o impacto ambiental e a crescente taxa de acidentes envolvendo motociclistas evidenciam a urgência de iniciativas voltadas para a segurança viária e infraestrutura urbana.

Dessa forma, este estudo busca contribuir para a compreensão dos efeitos da crescente dependência das motocicletas na sociedade brasileira, avaliando tanto seus benefícios quanto os desafios que demandam atenção. O instrumento metodológico utilizado será a pesquisa explicativa, que visa informar o leitor por meio da identificação das causas dos fenômenos, registrando e analisando suas implicações.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. INÍCIO DA INDUSTRIALIZAÇÃO DE MOTOCICLETAS NO BRASIL

 No artigo “Setor de motocicletas no Brasil: história, dados e figuras importantes como Rodrigo Borges Torrealba”, um estudo foi realizado pela Associação Brasileira de Medicina de Tráfego que afirma que o mercado de motocicletas no Brasil foi suprido principalmente por importações provenientes de marcas europeias e norte-americanas como Indian, Harley-Davidson, FN, Henderson, e NSU eram populares até a chegada da Monark através do modelo de produção popularmente conhecido como CKD (Completely Knock-Down) que consiste no processo fabricação e desmontagem de componentes de um que produto que serão enviados em partes separadas para serem montados em outro local.

Podemos analisar que o setor de industrialização de motocicletas possui 4 períodos, sendo eles: 1° Pioneirismo e Nacionalização (1951-1970) onde se destaca o início da industrialização com a fabricante Sueca chamada Monark em 1951 e o surgimento de outras marcas e incentivos governamentais para produção nacional e redução da dependência das importações; 2° Crescimento e Diversificação (1971-1990) destacado por aumento significativo da produção com a chegada de fabricantes japonesas que até hoje são referência no setor, com a diversificação de modelos e popularização da motocicleta não mais como diversão e entretenimento mas sim como ferramentas de trabalho, com seu uso se tornando comum no transporte de pequenas cargas e, mais tarde, no transporte de pessoas; 3° Globalização e Concorrência (1991-2000) com os marcantes fatos da  abertura do mercado brasileiro para concorrentes internacionais no mercado brasileiro aumentou a competitividade e  a adaptação às novas demandas para companhias que tiveram que se ajustar às novas tecnologias e aos padrões de qualidade; 4° Consolidação e Expansão (2001-2023) que até o presente momento aponta que as multinacionais se firmaram como líderes do mercado, com o mercado nacional se tornando-se um dos maiores do mundo em produção e vendas de motocicletas e com a segmentação de mercado com a introdução de scooters e modelos de alta cilindrada.

Figura 1 – Monark 1951 Centrum 125cc Model M71 M272

Fonte: Sheldon’s Emu (2004)

Podemos considerar também que o fator essencial para crescimento e desenvolvimento do setor se deve pelas Políticas Governamentais e Incentivos, sendo em destaque os Incentivos Fiscais, Financeiros e a Zona Franca de Manaus (ZFM). Ao realizar uma análise profunda relacionada ao incentivos governamentais podemos notar que dentro do período estudado no presente artigo, os incentivos mais importantes são as Substituições de Importação de 1930 até 1956 e o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek implementado de 1956 até 1961, no qual foi responsável por  acelerar o desenvolvimento econômico do Brasil, com foco em infraestrutura e indústria brasileira. 

Com relação à  Zona Franca de Manaus criada em 1967, foi essencial para o desenvolvimento econômico da região Norte, onde promoveu a chegada de grandes investimentos através de incentivos fiscais e alfandegários, tornando a produção de motocicletas mais competitiva e viável economicamente. Este movimento trouxe não só capital, mas também tecnologias avançadas e processos de fabricação mais eficientes, gerando milhares de empregos diretos e indiretos. A presença dessas grandes fabricantes consolidou a região como um polo de inovação tecnológica, com investimentos em pesquisa e desenvolvimento que beneficiam toda a cadeia produtiva.

Já nos dias atuais observamos a importância das relações entre as fabricantes estrangeiras e o governo, como por exemplo as constantes visitas e reuniões com a SUFRAMA (Superintendência da Zona Franca de Manaus) que é uma autarquia federal criada para promover o desenvolvimento econômico na região da Zona Franca de Manaus e nas Áreas de Livre Comércio situadas nos estados da Região Norte do Brasil. 

Figura 2 – Visitação do Suframa a Harley-Davidson para identificação de incentivos

Fonte: Portal Gov.br (2023)

Como exemplo, podemos citar a fala do superintendente da Suframa, Bosco Saraiva, que reafirmou o compromisso da Autarquia em proporcionar suporte e cooperação à fábrica e ao setor como um todo. “Duas Rodas” é um importante segmento do Polo Industrial de Manaus por concentrar quase toda a produção de bens finais no nosso Polo Industrial de Manaus, além de grande parte dos fornecedores de insumos, adensando a cadeia produtiva. Estamos à disposição para colaborar no que for possível com vistas ao desenvolvimento da nossa região”.

Decorrente ao incentivo governamental no crescimento de produtores estrangeiros, no qual desencadeou um aumento na participação no mercado externo, destacando o engajamento limitado das empresas japonesas e norte-americanas, uma vez que estavam restritas a um segmento menos dinâmico por conta da indústria emergente e impulsionada pelo custo reduzido da mão-de-obra, que ofereceu vantagens competitivas em comparação com outras indústrias do setor em países mais desenvolvidos.

A reestruturação da indústria no decorrer dos anos se deu durante as décadas de 60 e 70, as motos começaram a ser projetadas com ênfase no desempenho e conforto, introduzindo cilindradas maiores e características que cativaram um público mais jovem e entusiasta. Esse período marcou o aparecimento das motos esportivas, conhecidas por sua agilidade, velocidade e design inovador. Essa evolução transformou a percepção das motos, que passaram a ser vistas não apenas como um meio de transporte, mas também como uma forma de lazer e expressão pessoal. O mercado de motos esportivas e de lazer cresceu continuamente, influenciando tanto a cultura pop quanto a moda da época. O período da década de 80 se caracterizou pelo constante esforço na diferenciação de produtos, implicando na expansão no número de modelos oferecidos para o mercado.

2.2. TECNOLOGIAS UTILIZADAS NAS MONTADORAS DE MOTOCICLETAS

A indústria de motocicletas é classificada como sendo uma indústria de média-alta intensidade tecnológica, uma vez que veículos são considerados produtos complexos, que demandam uma extensa base de conhecimento tecnológico para sua concepção. 

Podemos entender que a primeira fase da modernização de motocicletas no Brasil pode ser identificada no início do século XX. Foi durante este período que as primeiras motocicletas começaram a ser importadas, principalmente da Europa, e a produção local começou a ganhar forma com adaptações e tecnologia Brasileira estabelecendo as bases para uma indústria nacional emergente.

De acordo com Lucas Henrique Oliveira Silva em “Diferentes motores na Área Automobilística Visando a Sustentabilidade”, as montadoras começaram a se preocupar com a modernização tecnológica apenas no fim da década de 70 e no início da de 80, com a chamada “revolução microeletrônica”, que acabou com a vantagem competitiva que a mão-de-obra barata trouxe, sendo essa a segunda fase . Já a terceira fase da modernização de motocicletas compreende toda a década de 80 e início dos anos 90, período no qual a indústria de motocicletas foi afetada por uma crise interna que fez com que as montadoras começassem a mudar definitivamente a base industrial de eletromecânica para a microeletrônica. Durante o período de 1990 e principalmente nos anos 2000, houve um foco crescente em otimizar a segurança e o conforto dos motociclistas. Isso incluiu o desenvolvimento de sistemas de freios ABS (sistema de freios antibloqueio), suspensões mais tecnológicas e melhorias na ciclística das motos.

A quarta fase da modernização de motocicletas no Brasil pode ser associada ao período de expansão que teve início nas últimas décadas, especialmente a partir dos anos 2010. Durante essa fase, houve um aumento significativo na produção e na diversificação dos modelos disponíveis no mercado brasileiro. Alguns pontos marcantes dessa fase incluem:

Expansão da Produção: A produção de motocicletas no Brasil atingiu níveis recordes em 2023, com aproximadamente 1,57 milhão de unidades fabricadas, um crescimento de 11,3% em relação a 2022 onde os dados foram divulgados pela Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo). Esse crescimento foi impulsionado pela alta demanda por motos de baixa cilindrada, que representam a maior parte da produção; Introdução de Modelos Eletrônicos: O mercado de motos elétricas começou a se expandir no Brasil, com marcas como Shineray e Yamaha introduzindo novos modelos eletrificados. Essa tendência reflete a globalização e a busca por soluções mais sustentáveis; Inovações Tecnológicas: Houve um aumento na incorporação de tecnologias avançadas nas motocicletas, como sistemas de freios ABS, suspensões aprimoradas e recursos de conectividade, como carregadores USB e sistemas de navegação e por fim o crescimento das Exportações: Embora as exportações tenham apresentado uma retração em 2023, há expectativas de crescimento no futuro, com projetos de expansão das linhas de produção e novos mercados internacionais.

2.3. CONCENTRAÇÃO DE PRODUÇÃO EM MANAUS E SEUS BENEFÍCIOS.

Conforme a Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) , O Polo Industrial de Manaus (PIM) é o encarregado por um dos maiores PIBs do Brasil, produzindo itens que estão presentes no cotidiano de todos os brasileiros, como motocicletas, televisores, barbeadores e canetas esferográfica. Por possuir processos de industrialização regidos por Processos Produtivos Básicos (PPBs), os produtos produzidos possuem alto valor agregado, e, aproximadamente 95% da produção do PIM tem como destino o mercado interno.

A Zona Franca de Manaus nasceu com o  intuito de ser um porto livre voltado ao estoque, vantagens e remoção de produtos importados (SUFRAMA, 2024). Após o golpe militar de 1964, o presidente Castello Branco vigorou o Decreto-Lei nº 288, que reestruturou a ZFM criada através da Lei Nº 3.173 de 1957, onde ela passou a possuir uma área de 10 mil quilômetros quadrados (Brasil, 1957, 1967). O intuito do governo era melhorar economicamente e habitar o local que, posteriormente, se tornaria um dos principais pontos de produção de motocicletas no Brasil com 98% da produção nacional (CAPRA, 2024).

Figura 3 – Área de atuação da SUFRAMA

Fonte: GOV.SUFRAMA (2023)

De acordo com Oliveira, a Zona Franca de Manaus oferta variados tipos de incentivos fiscais, entre eles redução do Imposto de Importação (I.I.), redução do Imposto sobre Produtos industrializados (I.P.I.). redução do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), isenção da contribuição para o PIS/PASEP e Cofins nas operações dentro da Zona Franca de Manaus. Além de restituições e isenções em outros impostos estaduais e municipais.

Exceto uma montadora, todas as demais encontram-se na Zona Franca de Manaus. Esse fato se dá devido aos benefícios fiscais encontrados na região (CAPRA, 2024).

A grosso modo, a ZFM conta com diversos incentivos e benefícios fiscais que proporcionam a redução da carga tributária sobre as empresas fixadas no Polo Industrial. Isso acontece devido a uma carga tributária especial que é aplicada com um objetivo extrafiscal, pois os impostos não visam apenas a coleta de recursos pelo governo, mas, ao contrário, têm como intuito influenciar o comportamento do contribuinte, encorajando-o a adotar ações que beneficiem o bem-estar público (SANTOS,2024).

No que diz respeito à parte norte do país, os interesses são fundamentados na tríade de propósitos que são característicos da república brasileira, especialmente aqueles estabelecidos pela Constituição: a promoção de uma sociedade livre, justa e solidária, assegurar o crescimento nacional, combater a pobreza e a exclusão social, diminuir as desigualdades sociais e regionais, e fomentar o bem-estar de todos, sem discriminações relacionadas à origem, raça, gênero, cor, idade ou qualquer outra forma de preconceito. Sendo assim, para que a região amazônica atinja os propósitos constitucionais se torna preciso incidir nela um modelo tributário que lhe conceda formas de desenvolvimento (SANTOS,2024).

2.4. EMPRESAS PIONEIRAS NO MERCADO DE MOTOCICLETAS NO BRASIL.

De acordo com artigo da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego “A MOTOCICLETA NO BRASIL DO SÉCULO XXI” e Renan da Silva Abachi, a industrialização de motocicletas teve seu início com a fabricante Sueca chamada Monark em 1951, com o modelo Centrum de 125 cilindradas com motor 2 tempos na qual foi conhecida por ser a pioneira na industrialização de motocicletas no Brasil em 1951. A expansão do setor se deu após finalmente a motocicleta se tornar popular para o público brasileiro justamente em 1970 com a chegada da Yamaha Motor Company trazendo grandes inovações e seu semblante de qualidade. Consequentemente a Yamaha gerou a competição e crescimento do setor incentivando outras marcas desenvolverem seus produtos e mais montadoras estrangeiras se instalarem no Brasil.   

Como podemos observar o contexto histórico a produção nacional teve início com motocicletas de baixa cilindrada, que eram majoritariamente fabricadas de forma artesanal e com componentes importados, devido à falta de conhecimento local para produzir diversos componentes essenciais. No início dos anos 1960, outras empresas entraram no mercado, como a Gulliver, que fabricava os ciclomotores “Gulivette”, e a B. Herzog, com o ciclomotor “Leonette”. A italiana Vespa também fez sua entrada, embora as escalas de produção dessas empresas fossem pequenas e a distribuição dos produtos fosse geograficamente limitada. A Lambretta foi a primeira empresa a produzir em larga escala, iniciando sua produção em 1955 na cidade de São Paulo.

Nos anos 70, as empresas japonesas Honda, Yamaha, Kawasaki e Suzuki começaram a atuar no Brasil, inicialmente como importadoras. As duas primeiras rapidamente buscaram estabelecer a produção local. A Yamaha foi a primeira a construir uma fábrica, localizada na cidade de Guarulhos, São Paulo, inaugurando sua primeira planta fora do Japão. A produção começou em 1974 com a RD 50, apelidada de “cinquentinha”. A Honda, por sua vez, adquiriu um terreno em Sumaré, São Paulo, para construir sua fábrica no Brasil, mas optou por mudar a localização para a Zona Franca de Manaus (ZFM) para aproveitar os incentivos fiscais. Em 1976, a empresa Honda inaugurou sua primeira fábrica no Brasil, localizada em Manaus, Amazonas. O grupo Honda fez seu segundo maior investimento externo, menor apenas que o investimento nos EUA. A falta de fabricantes locais de peças e componentes resultou em uma grande integração vertical. A fábrica de Manaus tornou-se a mais verticalizada do grupo

Honda em todo o mundo. De maneira semelhante, a Yamaha também enfrentou a escassez de fornecedores. Para contornar esse desafio, incentivou fornecedores da cadeia automotiva a produzir componentes para motocicletas e passou a fabricar componentes internamente. Vale ressaltar que em período de 1977 e 1990 a Honda e Yamaha possuíram um duopólio por conta de que em 1977 o governo emitiu uma portaria que restringia a entrada de novas empresas no setor de produção de motocicletas no Brasil. Essa medida garantiu um mercado exclusivo para as duas empresas que já estavam estabelecidas. Em 1990 no governo Collor retira as restrições assim possibilitando a presença tardia da instalação das empresas que tentaram se adentrar o mercado brasileiro, entre elas: Suzuki, Kawasaki, Harley-Davidson e Sundown. As reações das empresas dominantes geraram pressões significativas contra as novas entrantes, que decidiram não se filiar à ABRACICLO e formaram sua própria associação setorial. Isso resultou em um novo direcionamento, onde as novas empresas escolheram, em sua maioria, competir em nichos de mercado distintos dos ocupados pela Honda e Yamaha. Entretanto, houve exceções. A Suzuki, por exemplo, não apenas lançou produtos de nicho, mas também competiu diretamente com Honda e Yamaha no segmento de motocicletas até 250cc. Outras empresas que desafiaram os líderes do mercado foram a Sundown, com tecnologia chinesa, e a Kasinski, com tecnologia sul-coreana.

 Nos anos 1970, a Honda conseguiu impedir a entrada da Kawasaki no mercado. Anos depois, a Kawasaki abre sua fábrica no Brasil em 2008 no mercado de motocicletas com modelos de alta performance, destacando-se com a popularidade das suas motocicletas “Ninja” na qual já circulavam em território nacional nos anos 90. Por outro lado, a Harley-Davidson investiu na sua imagem de motocicleta “clássica”, muito reforçada pelo cinema e propaganda em massa. Suas motos eram famosas para viagens de longa distância e pilotagem em estradas. Apesar de afirmar que suas motos eram extremamente duráveis, enquanto as japonesas eram menos resistentes, a Harley-Davidson utilizava carburadores de origem japonesa. 

E para finalizar esse contexto histórico da trajetória das pioneiras não poderemos deixar de citar algumas marcas que se instalaram mais próximas de nossa atualidade onde a  Shineray, empresa chinesa, iniciou suas operações no Complexo Industrial de Suape, Pernambuco, em 2015. Essa inauguração marcou um passo significativo para a marca no Brasil.

2.5. O Papel Socioeconômico das Motocicletas no Brasil

A indústria motociclística tem se firmado como um elemento significativo no progresso econômico e social do Brasil. Sua influência transcende os números de produção e vendas, afetando diretamente a dinâmica da mobilidade urbana, o cenário do mercado de trabalho e os processos de inclusão social. Este segmento examina as principais teorias e estudos acadêmicos que fundamentam a análise do papel das motocicletas na sociedade brasileira.

A motocicleta é vista como um dos meios de transporte financeiramente mais acessíveis para uma parcela considerável da população. De acordo com pesquisas sobre transporte nas cidades, as motocicletas oferecem vantagens econômicas e logísticas que facilitam o deslocamento rápido, especialmente em áreas urbanas com tráfego intenso e infraestrutura inadequada. Conforme apontado por Silva e Rodrigues (2020), a acessibilidade das motocicletas contribui de forma direta para a integração de indivíduos em oportunidades de emprego, além de proporcionar maior autonomia nos deslocamentos diários.

A literatura sobre mobilidade urbana também ressalta que as motocicletas suprem uma carência do transporte público, sobretudo em regiões periféricas e rurais. Estudos como o de Santos et al. (2019) evidenciam que a motocicleta constitui o principal meio de transporte para trabalhadores autônomos e prestadores de serviços, assegurando a expansão das possibilidades econômicas para uma parcela expressiva da população.

O mercado de trabalho brasileiro tem testemunhado uma crescente incorporação de motociclistas em atividades econômicas informais, em particular com o desenvolvimento do setor de entregas. Segundo Carvalho (2021), a motocicleta tornou-se indispensável para trabalhadores independentes, incluindo mototaxistas, entregadores e pequenos comerciantes. Essa dinâmica exerce um impacto direto na economia, gerando novas formas de renda e impulsionando setores como o comércio eletrônico e os serviços de entrega.

Apesar dos benefícios, o trabalho informal sobre duas rodas também apresenta desafios, como a precarização das condições laborais, a ausência de regulamentação específica e os riscos associados à segurança no trânsito. Oliveira e Souza (2018) analisam como a informalidade no setor de motocicletas afeta a estabilidade financeira dos trabalhadores e reforçam a necessidade de políticas públicas direcionadas a esse segmento.

A literatura sobre logística urbana demonstra a relevância das motocicletas na distribuição eficiente de produtos e serviços. Pereira et al. (2020) investigam como o uso de motocicletas no transporte de mercadorias reduz os custos operacionais e aumenta a agilidade na entrega, representando um fator essencial para empresas de comércio eletrônico e para a economia digital. Adicionalmente, as motocicletas desempenham um papel estratégico em serviços cruciais, como entregas de medicamentos e transporte de documentos em grandes centros urbanos. Pesquisas conduzidas por Mendes (2019) indicam que a velocidade e a flexibilidade oferecidas pelas motocicletas as tornam um componente fundamental na estrutura logística brasileira. 

 A motocicleta também se destaca como um instrumento de inclusão social, possibilitando o acesso a oportunidades que seriam limitadas sem um meio de transporte próprio. Almeida e Costa (2022) defendem que o uso de motocicletas promove maior independência financeira, especialmente entre mulheres e grupos de baixa renda. Em suas pesquisas, observam que a motocicleta pode atuar como um fator de empoderamento, ampliando as opções de mobilidade e de atuação profissional.

No entanto, é necessário considerar os desafios relacionados ao impacto ambiental e à segurança no trânsito. De acordo com Ferreira (2017), o crescente número de acidentes envolvendo motociclistas evidencia a necessidade de iniciativas focadas na segurança viária, como campanhas educativas e aprimoramento da legislação.

3. MATERIAIS E MÉTODOS  

No presente artigo, foram empregadas pesquisas bibliográficas e qualitativas, utilizando fontes primárias e secundárias. Esses métodos foram selecionados por serem adequados ao objetivo da pesquisa, que é fornecer conhecimentos relevantes dentro de uma área específica, como neste caso, a industrialização. A coleta de dados e informações foi realizada através de artigos científicos, relatórios governamentais e teses, que serviram de base para identificar a linha do tempo que explica o início da industrialização. Outras fontes bibliográficas, como sites confiáveis, incluindo o do Governo do Brasil, também foram utilizadas.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO  

 Após a análise da fundamentação teórica, percebe-se a relevância de compreender a história e a coligação entre as indústrias, bem como seu impacto direto na economia nacional, ocupando uma parte significativa do PIB industrial brasileiro. À medida que as fábricas eram estabelecidas, elas colaboraram de forma sinérgica, gerando capital para o Estado e contribuindo para o avanço tecnológico.

O aumento de incentivos e infraestrutura no Polo Industrial de Manaus, com seus incentivos fiscais, possibilitou o desenvolvimento das indústrias de motocicletas, fazendo com que os números de motos utilizadas tenham crescido consideravelmente, batendo recordes, como é indicado nas tabelas a seguir.

Figura 4 – Gráfico de dados sobre a produção de motocicletas no Brasil no período de 1989 a 2009.

Fonte: ABRACICLO (2010)

 Segundo a Abraciclo, a produção de motocicletas no Brasil atingiu 1,57 milhão de unidades em 2023, representando um crescimento de 11,3% em relação ao ano anterior. Esse aumento reflete a crescente demanda por motocicletas como meio de transporte acessível e eficiente, especialmente em centros urbanos.

Figura 5 – Gráfico de produção de motocicletas no Brasil no período de 2010 a 2023.

Fonte: Abraciclo. Elaboração: Luiz Henrique Miura Duque.

Além disso, o mercado de motocicletas no Brasil continua a demonstrar um crescimento significativo em 2022. Esse crescimento é impulsionado pela demanda crescente dos serviços de entrega e pelo uso das motos como segundo veículo nas famílias.

O crescimento contínuo da indústria de motocicletas no Brasil demonstra sua relevância socioeconômica, tanto na geração de empregos quanto na mobilidade urbana. A participação das fabricantes no Polo Industrial de Manaus tem sido essencial para esse avanço, consolidando o setor como um dos pilares da economia nacional.

5. CONCLUSÃO

 A análise dos processos de desenvolvimento e consolidação do início da indústria de motocicletas no Brasil, evidenciou que ao longo dos anos um aumento significativo no PIB das indústrias de motocicletas no Brasil dentro do período estudado com a produção e venda de motocicletas que cresceram continuamente, com destaque para o Polo Industrial de Manaus (PIM), que se consolidou como um dos maiores centros de fabricação de motocicletas do mundo. Esse crescimento é resultado não só da maior demanda interna, mas também da capacidade das indústrias brasileiras de motocicletas de se adaptarem e inovarem, mantendo a produção em ritmo constante, mesmo enfrentando desafios econômicos e logísticos. A decisão de investir em renomadas montadoras proporcionaram mudanças significativas ao desenvolvimento econômico e tecnológico do país. Dentre os seus acontecimentos, ficou demonstrado que a chegada das primeiras montadoras foi crucial para o desenvolvimento e crescimento do setor. A instalação de fábricas e a produção local de motocicletas não só atenderam à crescente demanda interna, mas também impulsionaram a economia local e geraram empregos. Além disso, a presença dessas montadoras incentivou a inovação e a competitividade, resultando em uma maior variedade de modelos e melhorias contínuas na qualidade e eficiência das motocicletas, essa evolução demonstra a importância da indústria de motocicletas para o Brasil, tanto em termos econômicos quanto sociais. Neste contexto, a proposta foi realizar uma análise de como se deu o início da industrialização de motocicletas no Brasil e as mudanças causadas por seu impacto na sociedade brasileira. Dentre as mudanças observadas, se destacam os investimentos e parcerias feitas entre o governo e as empresas vindas do exterior, criação de institutos de tecnologia de motocicletas, criação de eventos esportivos e fabricação própria de peças nacionais.  

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¹cataryna.moreira@fatec.sp.gov.br
²luiz.duque@fatec.sp.gov.br