REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202505101507
Valéria Motta da Silva1
Amanda Calegaro Alves2
Charlam Matos Rabelo3
Elias Ferreira Pôrto4
Resumo:
Objetivo: Analisar os comportamentos de travessia de vias entre idosos, identificando práticas de risco e sua associação com a idade e sinais de fragilidade. Método: Estudo transversal com 180 idosos, utilizando a Escala de Comportamento do Pedestre. Foram avaliadas atitudes relacionadas à segurança viária e percepção do ambiente urbano. Os dados foram analisados por estatística descritiva e correlação de Pearson. Resultados: A maioria dos idosos apresentou comportamentos seguros, como olhar antes de atravessar (98,8%). No entanto, práticas de risco também foram relatadas, como atravessar fora da faixa. Houve correlação significativa entre idade e comportamentos protetivos (ex: caminhar em ambientes fechados, r = 0,56), bem como com comportamentos inseguros (ex: atravessar entre carros parados, r = -0,66). Conclusão: A idade influencia significativamente o comportamento de idosos como pedestres. Os achados destacam a necessidade de ações educativas e urbanísticas voltadas à segurança e mobilidade da população.
Palavras-chave: Idoso; Trânsito; Comportamento do pedestre; Fragilidade; Segurança viária.
Abstract:
Objective: To analyze street-crossing behaviors among older adults, identifying risk practices and their association with age and frailty indicators. Methods: A cross-sectional study was conducted with 180 older adults using the Pedestrian Behavior Scale. Attitudes related to traffic safety and urban environment awareness were assessed. Data were analyzed using descriptive statistics and Pearson correlation. Results: Most participants showed safe behaviors, such as always looking both ways before crossing (98.8%). However, risky behaviors like crossing outside pedestrian lanes were also reported. Age was significantly correlated with protective behaviors (e.g., walking in indoor environments, r = 0.56) and unsafe ones (e.g., crossing between parked vehicles, r = -0.66). Conclusion: Age significantly influences pedestrian behavior among older adults. The findings underscore the need for educational and urban planning strategies to promote elderly pedestrian safety and mobility.
Keywords: Older adults; Traffic; Pedestrian behavior; Frailty; Road safety.
Introdução
Com o avanço da idade, o envelhecimento promove uma série de mudanças físicas, sensoriais e cognitivas que afetam diretamente a mobilidade e a segurança dos idosos em ambientes urbanos. A travessia de ruas controladas por semáforos é uma atividade aparentemente simples, mas pode representar um desafio significativo para essa população, exigindo estratégias de atenção para evitar riscos e garantir1
Entre as mudanças naturais do envelhecimento, destacam-se a redução da força muscular, o comprometimento do equilíbrio e a diminuição da capacidade de ocorrência. Essas alterações tornam a locomoção mais lenta e menos eficaz, dificultando a travessia de vias em tempo hábil antes que o sinal mude. A visão periférica e a acuidade visual também podem se deteriorar, dificultando a percepção dos veículos em movimento ou a leitura correta dos sinais2.
Além disso, problemas auditivos comuns na terceira idade dificultam a percepção de sons de alerta, como buzinas e sinais sonoros nos semáforos. O déficit cognitivo leve, que é prevalente em idosos, pode afetar a capacidade de interpretar rapidamente os estímulos visuais e tomar decisões em situações estressantes3.
Em decorrência do crescimento da civilização idosa, a prevalência de acidentes no trânsito com pessoas nessa faixa etária vem apresentando significativo aumento, apesar de ser comprovado pela Fundação SEADE no Estado de São Paulo, que a maioria dos acidentes ocorrem devido atropelamento, com maior frequência, e queda, devido a redução da visão, enfraquecimento dos ossos e dificuldade em manter-se equilibrado, podendo estar associado ao uso de álcool e medicamentos4.
Os idosos enfrentam riscos no trânsito, especialmente ao atravessar vias, devido à diminuição da capacidade sensorial e motora, que compromete sua percepção de velocidade e tempo de resposta. No Brasil, eles representam 36% das mortes por atropelamento e estão mais sujeitos a lesões graves ou fatais, mesmo em acidentes de baixa velocidade. Além disso, fatores como reflexos lentos e doenças pré-existentes aumentam a vulnerabilidade e o tempo de recuperação dos envolvidos5.
Os dados de São Paulo mostram que o estado apresenta um dos índices mais baixos de mortes de idosos no trânsito, com taxas entre 16 e 20 mortes por 100 mil habitantes idosos. No entanto, em outros estados, como Goiás e Mato Grosso, esse índice pode ultrapassar 70 mortes por 100 mil, destacando a disparidade regional na segurança viária para essa população6.
Globalmente, o aumento da longevidade e o envelhecimento da população estão expondo cada vez mais idosos a acidentes de trânsito, exigindo políticas públicas que considerem essas necessidades específicas. Medidas como adequação dos tempos de semáforo e melhoria da acessibilidade em vias públicas são fundamentais para minimizar os riscos e garantir a segurança dos pedestres mais velhos7. Diante disto os objetivos deste estudo foram: Avaliar comportamentos de riscos e a segurança de idosos no trânsito, bem como identificar a relação entre a percepção de risco e o comportamento de idosos pedestres e identificar as possíveis fragilidades que mais colocam o idoso em risco de atropelamento no momento de atravessar o semáforo.
Métodos
Trata-se de um estudo quantitativo, transversal. Esse delineamento permite a análise de dados coletados em um único momento, identificando associações entre variáveis de interesse, como a percepção de risco de atropelamento e o comportamento de travessia de idosos. A escolha de um estudo transversal é incluir para explorar relações e gerar hipóteses preliminares sobre a relação entre percepção de risco e segurança viária em pedestres idosos. Os dados foram coletados em ruas e avenidas da cidade de São Paulo – São Paulo, Brasil. A pesquisa foi realizada com idosos de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 60 anos. A escolha dessa faixa etária justifica-se pela necessidade de investigar as percepções e comportamentos de um grupo populacional mais vulnerável no trânsito.
Foram recrutados 180 idosos residentes em áreas urbanas, utilizando uma amostra por conveniência. A amostra foi composta por indivíduos que atendem aos critérios de inclusão descritos
Participaram deste estudo pessoas que atenderam os seguintes Critérios de inclusão: Idosos com idade igual ou superior a 60 anos. Capacidade cognitiva preservada para responder aos questionários. Disponibilidade para participar da pesquisa e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Não participaram deste estudo Idosos com deficiências cognitivas ou demências graves. Presença de especificações físicas graves que impedem a participação na coleta de dados. Idosos que se recusarem a participar do estudo ou que não se inscreverem no TCLE.
A pesquisa foi realizada no período de outubro de 2024 a fevereiro de 2025. A coleta de dados ocorrerá em dois locais da cidade de São Paulo, sendo uma no centro e outra no bairro. O centro é uma área com grande concentração de comércios. O bairro, uma região localizada no Sul da cidade, considerado o maior bairro em termos de área, com alta densidade de população idosa, possui características residencial e comercial. A escolha pelos locais justifica-se por serem dois dos locais de maior ocorrência de atropelamento de pedestres idosos verificado nos anos de 2009 a 2017 no município de são Paulo. Após a abordagem e aceite dos participantes, os mesmos foram convidados a responder a Escala de Percepção de risco e a Escala de Comportamento do pedestre (ECP-BR). Aqueles que não puderam responder as escalas no local, serão contactados posteriormente por telefone e agendado dia e horário para a coleta em domicílio do idoso.
O estudo foi realizado com base no Estatuto do Idoso, Lei n° 10.741, que prevê que nenhum idoso deve ser descriminado ou violentado, dando prioridade e respeitado pela sociedade, além dos princípios éticos do Conselho Nacional da Saúde, nº. 466/2012 e 510/2016, garantindo anonimato e sigilo de informações dos entrevistados.
A Escala de Comportamento do Pedestre (ECP-BR)8 foi traduzida e adaptada para o português Brasil por Torquato & Bianchi (2010). O instrumento apresenta um bom índice de confiabilidade para a escala total e para a coerência interna (α= 0,81). A ECP-BR contém 30 itens subdivididos em comportamentos de transgressão (7 itens), erros (15 itens), lapsos (5 itens) que são respondidos em uma escala Likert de 6 pontos sendo 1 “nunca”; 2 “quase nunca”; 3 “às vezes”; 4 “frequentemente”; 5 “quase sempre” e 6 “sempre”. A Escala de Percepção de Risco foi fundamentada na pesquisa de avaliação de risco de Poudel-Tandukar et al. (2007)9 e é composta por 30 itens que descrevem os comportamentos do pedestre no trânsito (mesmos comportamentos listados na ECP-BR) e os associa a uma escala Likert de 6 pontos para o julgamento do grau de segurança sendo 1 “nenhuma segurança”; 2 “quase nenhuma segurança”; 3 “pouca segurança”; 4 “alguma segurança”; 5 “muita segurança” e 6 “segurança total” (Torquato & Bianchi, 2011)10.
O desfecho primário avaliar a associação entre a percepção de risco e o comportamento de travessia de ruas dos idosos e secundário identificar fatores sociodemográficos e de saúde que podem influenciar a percepção de risco e o comportamento de pedestres idosos.
Análises de dados
Os dados serão analisados no Programa Statistical Analysis Software (SAS, version 9.4) (Allison, 2009 a partir de uma base de dados construída por meio do aplicativo Excel. Foi calculada a correlação ponto-bisserial (rpb) para explorar intensidade e o sentido do comportamento mútuo, entre as atitudes do pedestre idoso, a escala de comportamento do pedestre (ECP-BR) e a escala de percepção de risco. A relação entre as escalas de comportamento do pedestre (ECP-BR) e a escala de percepção de risco, será testada por meio do coeficiente de correlação de Spearman (rs). O nível de intensidade dos coeficientes de correlação foi classificado, conforme Mukaka (2012).
Considerou-se um nível de confiança de 95% (α= 0,05).
Resultados
Somente neste primeiro momento fizemos a distribuição dos participantes em dois grupos. E foi verificando que a distribuição quanto a idade entre homens e mulheres são semelhantes. Também foi visto que para os maiores e menos de 70 anos o tempo que moram na capital de São Paulo, o medo de estar envolvido em acidente de trânsito foram proporções semelhantes
Tabela 1 – dados antropométricos e de comportamento do idoso no trânsito para dois grupos.


Tabela 2- proporção de respostas “Nunca, quase nunca, às vezes, frequentemente, quase sempre e sempre para amostra estuda





A Tabela 2 mostra a frequência relativa (em %) com que os idosos relataram determinados comportamentos em situações cotidianas de travessia de ruas, caminhadas urbanas e condutas de segurança. As respostas foram categorizadas em: Nunca, quase nunca, Às vezes, Frequentemente, Quase sempre e Sempre.
Principais Destaques e Padrões Observados
1. Comportamentos seguros predominam em algumas situações:
– “Olho para os dois lados antes de atravessar a rua”: 98,8% responderam “sempre”.
– “Começo a atravessar a rua quando o semáforo para os veículos está mudando para vermelho”: 98,3% responderam “nunca”. o “Desço do ônibus em movimento”: 97,8% responderam “nunca”.
– “Atravesso a rua falando no celular”: 96,7% responderam “nunca”.
2. Comportamentos de risco foram relatados com certa frequência em outras situações:
“Espero o semáforo mudar, parado sobre a via e não na calçada”: 68,1% disseram fazer isso “sempre”.
“Caminho mais em ambientes fechados do que abertos”: 66,4% “quase sempre”.
“Passo por entradas/saídas de garagem sem parar para olhar”: 92,4% responderam “sempre”.
“Erro a estimativa da velocidade de um veículo ao atravessar”: 94,5% disseram “às vezes”, indicando risco perceptivo.
3. Comportamentos potencialmente reflexivos de distração ou falta de atenção:
“Percebo que percorri várias ruas sem prestar atenção no trânsito”: 67% disseram “nunca”, mas 28% “às vezes”.
“Percebo que não tenho clara lembrança do trajeto que acabei de percorrer”: 94,7% “às vezes”.
4. Comportamentos de risco evitados por maioria:
“Atravesso a rua entre veículos parados em engarrafamentos”: 72,5% responderam “nunca”.
“Ando pelas ruas bêbado”: 97,2% “nunca”.
“Atravesso nos semáforos para pedestres quando ainda não estão verdes”: 93,9% “às vezes” – o que ainda é preocupante.
5. Outros comportamentos chamativos:
“Fico impaciente com o pedestre à minha frente”: 81,3% “às vezes”.
“Atravesso fora da faixa de pedestres, mesmo quando há uma faixa próxima”: 93,9% “às vezes”.
Tabela 3. Correlação entre a idade com as questões da Escala de Comportamento do Pedestre

A Tabela 3 mostra os valores de correlação de Pearson (r) entre a idade dos participantes e cada uma das 26 questões da Escala de Comportamento do Pedestre, bem como os respectivos valores de significância estatística (p).
A correlação indica o grau de associação entre o avanço da idade e a frequência dos comportamentos descritos nas questões. Valores de r positivos indicam que comportamentos aumentam com a idade; valores negativos indicam que diminuem com a idade.
Correlações fortes e significativas
• Q4 (r = 0,56, p < 0,0001): Idosos mais velhos tendem a caminhar mais em ambientes fechados do que abertos.
• Q5 (r = -0,66, p < 0,0001): Quanto maior a idade, menor a frequência de atravessar entre veículos estacionados.
• Q8 (r = -0,56, p < 0,0001): Com a idade, diminui a prática de atravessar fora da faixa mesmo quando há uma próxima.
• Q16 (r = -0,59, p < 0,0001): Idosos mais velhos tendem a evitar conversar parado em locais de passagem (entradas/saídas).
• Q22 (r = 0,50, p < 0,0001): Idosos mais velhos têm maior probabilidade de sempre olhar para os dois lados antes de atravessar. Outras correlações moderadas e significativas
• Q2 (r = 0,23, p = 0,0021): Idade associada a maior impaciência com pedestres à frente.
• Q7 (r = -0,30, p < 0,0001): Com a idade, reduz-se a prática de atravessar com o semáforo ainda verde para veículos.
• Q9 (r = -0,31, p < 0,0001): Idosos mais velhos prestam mais atenção ao trajeto (menos distrações).
• Q12 (r = -0,23, p = 0,0028): Redução com a idade da prática de pular barreiras para atalhar o caminho.
• Q14 (r = 0,37, p < 0,0001) e Q15 (r = 0,26, p = 0,0005): Aumenta com a idade o cuidado ao atravessar e o uso de roupas/acessórios visíveis à noite.
• Q17 e Q18 (r ≈ -0,40): Idosos mais velhos têm menor frequência de esbarrar em obstáculos e de andar bêbados.
• Q19 (r = 0,36, p < 0,0001): Caminhar à noite aumenta com a idade, o que pode representar um risco.
• Q20 (r = -0,35, p < 0,0001) e Q21 (r = -0,47, p < 0,0001): Mostram queda na atenção com o tempo ou ao atravessar em locais perigosos.
• Q25 (r = -0,43, p = 0,001): Diminui com a idade a prática de atravessar entre carros em engarrafamento.
Questões sem correlação significativa (p > 0,05)
• Q1, Q3, Q6, Q10, Q11, Q13, Q23, Q24, Q26: Nessas, a idade não apresentou relação estatística com os comportamentos.

O gráfico ilustra a frequência com que idosos relataram esbarrar em obstáculos, como postes, placas ou outros objetos ao caminhar pelas calçadas. Trata-se de uma representação visual das respostas dadas à questão específica da Escala de Comportamento do Pedestre, referente à atenção e percepção espacial ao andar.
Categorias de Resposta e Frequências:
Nunca: Cerca de 3,8% dos entrevistados afirmaram que nunca esbarram em obstáculos. Quase nunca: 3,2% relataram que isso quase nunca ocorre. Às vezes: A grande maioria, 91,7%, afirmou esbarrar em obstáculos às vezes. Frequentemente, quase sempre, Sempre: Frequências baixíssimas ou nulas (respectivamente, 1,3%, 0% e 0%), indicando que quase nenhum idoso relatou esbarrar com frequência. A maioria dos idosos reconhece que esbarra ocasionalmente, o que pode estar associado a fatores como atenção dividida, condições ambientais (ex: calçadas estreitas ou mal conservadas) ou redução da acuidade visual e cognitiva leve.
Discussão
O objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento dos idosos ao atravessar ruas ou avenidas, focando principalmente em como suas ações no trânsito podem representar riscos para sua segurança. Os resultados encontrados revelam comportamentos alarmantes que merecem uma reflexão crítica sobre as condições do trânsito e as necessidades dessa faixa etária.
Comportamento de atravessar com sinal verde
A primeira constatação relevante foi a alta frequência de idosos que atravessam ruas mesmo quando o sinal está verde para os motoristas. Esse comportamento é especialmente preocupante, pois indica uma falha na percepção do sinal de trânsito e no entendimento das regras de circulação. Atravessar durante o sinal verde é uma infração potencialmente grave, pois coloca o pedestre diretamente na trajetória dos veículos, aumentando significativamente o risco de atropelamento.
Este tipo de comportamento pode ser influenciado por diversos fatores, incluindo a diminuição das funções cognitivas e perceptivas associadas ao envelhecimento11. Estudos anteriores sugerem que muitos idosos enfrentam dificuldades em avaliar corretamente o tempo disponível para atravessar, o que pode levá-los a se arriscar mesmo quando as condições não são seguras12. Além disso, fatores como a perda de visão, diminuição da mobilidade e cansaço podem comprometer a capacidade de julgamento, fazendo com que o idoso tome decisões arriscadas sem perceber o risco real envolvido13.
A idade mostra relação significativa com muitos comportamentos de risco e proteção no trânsito urbano. Em geral, idosos mais velhos tendem a evitar comportamentos de risco (ex: atravessar fora da faixa, conversar parado na via, andar bêbado), demonstrar mais atenção e cautela (ex: olhar para os dois lados antes de atravessar), evitar ambientes abertos, talvez por segurança ou limitação física. No entanto, algumas condutas como andar à noite ou não lembrar claramente o trajeto também aumentam com a idade, o que merece atenção14.
Dificuldade em calcular a velocidade dos veículos
Outro ponto alarmante foi a dificuldade relatada pelos idosos em calcular corretamente a velocidade dos veículos ao atravessar as ruas. Essa dificuldade pode ser atribuída a alterações cognitivas comuns no envelhecimento, como a diminuição da capacidade de atenção e processamento visual, que dificultam a avaliação do movimento dos veículos. Estudos anteriores indicam que a diminuição da percepção espacial e temporal15, muitas vezes associada ao envelhecimento, pode levar o idoso a subestimar a velocidade dos veículos, resultando em tentativas de atravessar a rua em momentos inadequados16.
A baixa velocidade de reação também pode ser um fator limitante. Mesmo que o idoso perceba o veículo se aproximando, ele pode não ser capaz de tomar a decisão de forma rápida e segura. Isso torna o ambiente urbano mais perigoso para os pedestres idosos, especialmente em áreas com tráfego intenso e sem infraestrutura adequada para travessias seguras.
Atravessar fora das faixas de pedestres
A prática perigosa de atravessar fora das faixas de pedestres foi outro comportamento observado entre os idosos. Essa atitude é preocupante, pois, além de aumentar o risco de acidentes, muitas vezes ocorre em pontos onde a visibilidade para os motoristas é reduzida, como em curvas, interseções ou locais de tráfego rápido. Atravessar fora da faixa de pedestres significa, muitas vezes, expor-se a uma maior velocidade dos veículos e reduzir as possibilidades de os motoristas perceberem a presença do pedestre a tempo17.
Esse comportamento pode ser explicado pela falta de confiança na segurança das faixas de pedestres ou pela percepção de que o esforço necessário para atravessar nos locais destinados é muito grande, seja pela distância, seja pela demora em esperar a luz verde do semáforo. No entanto, atravessar fora da faixa aumenta consideravelmente o risco de acidentes, como já foi demonstrado em diversas pesquisas que associam a infraestrutura urbana à segurança dos pedestres18.
Implicações para a segurança no trânsito e recomendações
Os resultados deste estudo indicam que os idosos estão se expondo a riscos significativos no trânsito, o que é um reflexo da vulnerabilidade dessa população frente aos perigos da mobilidade urbana. Além das condições físicas e cognitivas que afetam sua percepção e reação, a falta de infraestrutura adequada para esse público também contribui para comportamentos de risco19. A presença de faixas de pedestres bem sinalizadas, semáforos específicos para pedestres e espaços públicos mais seguros são essenciais para minimizar esses riscos.
A partir desses resultados, é possível sugerir algumas estratégias para melhorar a segurança dos idosos no trânsito: Aprimoramento da sinalização e infraestrutura: A instalação de semáforos com tempos maiores para a travessia de pedestres, faixas de pedestres bem visíveis e pontos de travessia mais seguros são medidas que podem ajudar a reduzir o risco de acidentes. A criação de áreas exclusivas para pedestres idosos, com sinais claros e tempo adequado para atravessar, pode ser uma solução eficaz20.
Campanhas educativas e de conscientização: Informar os idosos sobre os riscos envolvidos em comportamentos inadequados no trânsito, como atravessar fora das faixas ou com o sinal verde, é uma estratégia importante. Além disso, incentivar a realização de exercícios físicos regulares para manter a mobilidade e a capacidade de julgamento pode ser benéfico21.
Treinamento e apoio psicológico: Para aqueles que enfrentam dificuldades cognitivas ou motoras, o desenvolvimento de programas de treinamento para melhorar a percepção e os reflexos no trânsito pode ser uma medida preventiva eficaz. Também é importante oferecer suporte psicológico para lidar com o medo ou ansiedade que pode ser gerado pela insegurança no trânsito22.
Maior fiscalização e engajamento da comunidade: A implementação de campanhas de fiscalização focadas nos comportamentos de risco dos pedestres idosos pode gerar uma maior conscientização. Além disso, o envolvimento das comunidades locais para criar ambientes urbanos mais amigáveis ao idoso também é fundamental.
Conclusão
O comportamento dos idosos ao atravessar ruas e avenidas revela uma série de fatores de risco que exigem atenção especial dos gestores urbanos e profissionais de saúde pública. A combinação de limitações cognitivas e físicas com a infraestrutura inadequada para essa faixa etária coloca os idosos em uma situação de vulnerabilidade no trânsito. Portanto, é fundamental adotar medidas integradas, que envolvam não apenas o ajuste da infraestrutura urbana, mas também a conscientização, a educação e o apoio à mobilidade segura para os pedestres idosos.
Novo Conhecimento
Apesar de muitos idosos apresentarem condutas seguras na maioria das situações, comportamentos de risco ou negligência com a segurança ainda são frequentes, sobretudo no que diz respeito a: desatenção durante o percurso, postura insegura ao aguardar semáforos, atravessar fora das faixas, erro de julgamento da velocidade dos veículos. Esses dados são valiosos para nortear políticas públicas de educação para o trânsito, urbanismo seguro e intervenções voltadas à autonomia e segurança de idosos, especialmente em áreas urbanas.
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4Autor Correspondente : Elias Ferreira Porto
E-mail; profeliasfporto@gmail.com
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