GRANULOMA EOSINÓFILO TRAUMÁTICO EM PACIENTE COM SÍNDROME DE DOWN: RELATO DE CASO*

TRAUMATIC EOSINOPHIL GRANULOMA IN A PATIENT WITH DOWN SYNDROME: CASE REPORT

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202504301012


Giulia Damico Nascimento da Cruz1
Mariana Catharine Belici Daher2
Orientadora: Profa. Fernanda Heimlich3
Coorientador: Prof. Maicon Mascarenhas Bonfim4


Resumo: O granuloma ulcerativo traumático com eosinofilia estromal (TUGSE) é uma lesão rara, crônica e benigna que afeta a mucosa oral. Pode ocorrer em qualquer idade e afeta tanto homens quanto mulheres de forma igual. A região mais comum de aparecimento é a mucosa da língua. O tratamento costuma ser conservador, já que as lesões geralmente regridem de forma espontânea após a biópsia. O presente relato de caso descreverá o tratamento de uma lesão traumática em um paciente de 23 anos com síndrome de Down, que sofreu um trauma durante uma convulsão ao morder a língua. Será realizada uma biópsia excisional para remoção da lesão, e o material coletado será encaminhado a um laboratório de patologia oral para análise histopatológica. A biópsia é um procedimento que envolve a coleta de amostras de tecidos que apresentam alterações em um organismo vivo, com o objetivo de realizar um diagnóstico preciso. Esse diagnóstico é feito através de uma análise anatomopatológica, que é considerada o principal método especializado de laboratório para identificar certas lesões A expectativa é que o procedimento cirúrgico resultará em boa cicatrização, alívio da dor e melhora nos sintomas relatados pelo paciente. O estudo destacará a importância do diagnóstico e intervenção oportuna em casos de traumas orais em pacientes com condições especiais, como a síndrome de Down.

Palavras-Chave: Fibroma. Granuloma Eosinófilo. Traumático. Síndrome de Down. Biópsia.

ABSTRACT: Traumatic ulcerative granuloma with stromal eosinophilia (TUGSE) is a rare, chronic, and benign lesion that affects the oral mucosa. It can occur at any age and affects both men and women equally. The most common site of onset is the mucosa of the tongue. Treatment is usually conservative, since the lesions usually regress spontaneously after biopsy. This case report will describe the treatment of a traumatic lesion in a 23-year-old patient with Down syndrome who suffered trauma during a seizure while biting his tongue. An excisional biopsy will be performed to remove the lesion, and the collected material will be sent to an oral pathology laboratorya for histopathological analysis. Biopsy is a procedure that involves collecting tissue samples that present alterations in a living organism, with the aim of making an accurate diagnosis. This diagnosis is made through an anatomopathological analysis, which is considered the main specialized laboratory method for identifying certain lesions. The expectation is that the surgical procedure will result in good healing, pain relief and improvement in the symptoms reported by the patient. The study will highlight the importance of timely diagnosis and intervention in cases of oral trauma in patients with special conditions, such as Down syndrome.

Keyword: Fibroma. Eosinophilic Granuloma Traumatic. Down Syndrome. Biopsy.

INTRODUÇÃO 

O granuloma ulcerativo traumático com eosinofilia estromal (TUGSE) é uma lesão rara, crônica e benigna que afeta a mucosa oral. Ao longo do tempo, essa condição foi chamada por diversos nomes, como doença de Riga-Fede em bebês e recém-nascidos, granuloma sublingual, granuloma traumático, granuloma eosinofílico, úlcera eosinofílica e granuloma ulcerativo eosinofílico. É uma lesão que geralmente surge como resultado de trauma ou irritação local, mas apesar de sua aparência, trata-se de uma condição benigna. (Shen et al, 2015; Sharma et al, 2016) 

Pode ocorrer em qualquer idade e afeta tanto homens quanto mulheres de forma igual. A região mais comum de aparecimento é a mucosa da língua. A maioria dos pesquisadores concorda que sua origem está relacionada a um trauma, como sugerido por Baskar e Lilly em 1964, ou, no mínimo, que o trauma desempenha um papel crucial no dano aos tecidos. (Bhaskar & Lilly, 1964) 

O tratamento costuma ser conservador, já que as lesões geralmente regridem de forma espontânea após a biópsia. Entretanto, em casos persistentes ou de recorrência, pode ser necessário um tratamento adicional, como a eliminação do fator traumático ou a aplicação de corticosteroides tópicos. Embora incomuns, as recorrências podem ocorrer. (Soyele et al, 2017; Chandra et al, 2014) 

A biópsia é um procedimento que envolve a coleta de amostras de tecidos que apresentam alterações em um organismo vivo, com o objetivo de realizar um diagnóstico preciso. Esse diagnóstico é feito através de uma análise anatomopatológica, que é considerada o principal método especializado de laboratório para identificar certas lesões. A análise oferece uma visão detalhada das características microscópicas do tecido afetado, muitas vezes sendo a única forma de obter um diagnóstico definitivo. A não realização dessa análise pode prejudicar a detecção precoce de doenças graves, como o câncer bucal, levar a baixa suspeita de lesões por parte do profissional de saúde. (Melrose et al., 2007;  Greene FL & Sobin LH, 2009; Gomes et al., 2010.) 

A Síndrome de Down é uma condição biológica resultante da trissomia do cromossomo 21, que afeta aproximadamente 1 a cada 700 nascidos vivos. Essa alteração genética acarreta deficiências no desenvolvimento intelectual, motor e da linguagem, além de estar frequentemente associada a outras comorbidades. (Palomaki et al, 2021).  

O atendimento odontológico de pacientes com Síndrome de Down demanda um manejo diferenciado, assim como conhecimentos e habilidades específicas por parte do profissional, quando comparado ao tratamento de pacientes sem a síndrome. (Lima et al, 2018; Oliveira et al, 2008). 

Na Odontologia, existem múltiplas abordagens para o controle e manejo da ansiedade, do medo, da dor e do comportamento de pacientes com necessidades especiais e odontopediátricos. Esses métodos podem ser de natureza psicológica, como técnicas não farmacológicas, incluindo relaxamento e modificação de comportamento, bem como farmacológica. Em determinados casos, as estratégias não farmacológicas podem não ser suficientes para assegurar a cooperação e a compreensão adequadas do paciente. Nessas situações, o cirurgião-dentista dispõe de diversos recursos farmacológicos, como analgésicos e sedativos, que auxiliam no controle da ansiedade, do medo, da dor e do comportamento, permitindo alcançar o nível desejado de sedação consciente, mantendo o paciente responsivo aos comandos verbais e colaborativo durante o atendimento. (ADA, 2007) 

Os Benzodiazepínicos (BZDs) são amplamente mencionados na literatura como fármacos de primeira escolha para o controle da ansiedade em consultórios odontológicos, devido à sua eficácia e às suas propriedades ansiolíticas, sedativas, relaxantes musculares e anticonvulsivantes. A sedação consciente por via oral com benzodiazepínicos apresenta baixa incidência de efeitos adversos, além de ser uma opção de custo acessível e de fácil administração. (RANG et al., 2007; GLASSMAN et al., 2009). 

A mucosa oral está sob influência de estímulos internos e externos, sendo propensa à distúrbios de desenvolvimento, inflamação, irritação e condições neoplásicas. Vários termos são utilizados na odontologia para descrever uma lesão fibrosa não neoplásica, podendo se destacar: fibroma de irritação, hiperplasia fibrosa focal, fibroma traumático, hiperplasia fibrosa inflamatória e pólipos fibroepiteliais. Os fibromas, são tumores benignos de natureza proliferativa e se desenvolvem em consequência de reações hiperplásicas relacionadas com irritações crônicas de intensidade baixa, classificada como uma das lesões mais comuns da cavidade bucal. (Borkar et al, 2019; Di Stasio et al, 2017; Yadav et al, 2017) 

Os fibromas geralmente são encontrados na mucosa jugal, labial e língua, onde clinicamente manifestam-se como nódulos solitários e indolores bem delimitados, de base séssil ou pediculada, textura firme e comumente possuem formato arredondado. (Horta & Souza, 2016; Yadav, 2017) 

Seu diagnóstico, é realizado por biópsias orais dos espécimes cirúrgicos, com isso, é possível determinar o tratamento adequado, evitando recorrências da lesão fibrosa. O profissional deve se atentar às manifestações clínicas que podem acometer a cavidade oral, favorecendo desta forma, auxílio no diagnóstico e no tratamento. Dentre as formas de tratamento a principal consiste na excisão cirúrgica da lesão. Quanto às recidivas, são raras, capazes de ser originadas por traumas repetitivos na mesma região, destacando a importância do manejo no local do trauma. (Brazão et al, 2018; Dutra et al, 2019; Sahani et al, 2017; Yadav et al, 2017) 

Esse relato propõe uma biópsia excisional de granuloma eosinofílico na língua em um paciente com síndrome de Down, utilizando a técnica de sedação mínima, destacando as características clínicas, diagnósticas e terapêuticas, bem como discutir as particularidades dessa condição em indivíduos com necessidades especiais. 

A relevância do caso, constitui-se em abordar um caso raro de granuloma eosinófilo lingual em um paciente com síndrome de Down, uma condição que apresenta desafios diagnósticos e terapêuticos específicos devido às particularidades anatômicas e imunológicas desses indivíduos. A documentação deste caso contribui para a literatura odontológica, fornecendo experiências sobre o manejo clínico de pacientes especiais e a importância de um diagnóstico precoce e correto, especialmente em populações vulneráveis, como pessoas com síndrome de Down. 

RELATO DE CASO  

Paciente do sexo masculino GRS, 24 anos de idade, portador de Síndrome de Down e Transtorno do Espectro Autista grau I, compareceu à Clínica Odontológica do Centro Universitário São Lucas – Afya, acompanhado de sua responsável, para atendimento especializado a pacientes com necessidades especiais. A queixa principal relatada pela mãe do paciente foi o surgimento de uma lesão na língua, descrita como uma “bolinha”, com crescimento progressivo após um episódio de convulsão. Relatou ainda que a lesão, inicialmente caracterizada como uma ferida, evoluiu ao longo de aproximadamente três meses, apresentando aumento significativo nas últimas duas semanas. A sintomatologia incluía dor local e interferência em funções essenciais como alimentação e fonação.

Ao exame clínico intrabucal, observou-se uma lesão nodular, de coloração semelhante à mucosa adjacente, bordas regulares, formato ovalado e base séssil,

Figura 1: Lesão na borda lateral da língua, antes da biópsia.

Fonte: dados do autor.

localizada na borda lateral esquerda da língua. Diante dos achados clínicos e do relato da responsável, as principais hipóteses diagnósticas consideradas foram hiperplasia fibrosa e fibroma traumática. Como conduta terapêutica, optou-se pela realização de biópsia excisional, visando à remoção completa da lesão e posterior análise histopatológica para elucidação diagnóstica definitiva.

Tendo em vista as condições clínicas do paciente e suas necessidades especiais, foi indicada a sedação mínima medicamentosa com clonazepam, na posologia de 2,5 mg (20 gotas), administradas 1 hora antes do procedimento. O procedimento cirúrgico foi programado para a semana seguinte, sendo fornecidas à responsável todas as orientações pré-operatórias, incluindo a necessidade de jejum prévio e a anuência quanto ao uso da sedação mínima. Informou-se ainda que os custos do procedimento seriam integralmente cobertos pela instituição, cabendo à responsável apenas o pagamento da taxa de envio do material coletado para o Laboratório de Patologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde seria realizada a análise histopatológica. 

                Figura 2: imagem do exame histopatológico, demonstrando eosinofilia tecidual

Fonte: Laboratório de Patologia Oral da UERJ.

O procedimento cirúrgico foi conduzido sob anestesia local, utilizando mepivacaína 2% associada à epinefrina 1:100.000, devido ao seu potencial hemostático, duração intermediária de efeito e segurança quanto a interações medicamentosas. Para melhor exposição da área operada, realizou-se uma sutura de tração na ponta da língua, permitindo a estabilização do campo operatório. Em seguida, com a língua tracionada, procedeu-se à exérese total da lesão por meio de incisão com bisturi ao longo de suas margens, garantindo a remoção completa do tecido alterado. O espécime cirúrgico foi devidamente acondicionado em solução de formol a 10% e encaminhado para exame histopatológico. A hemostasia foi obtida com sutura simples utilizando fio de nylon vicry4-0, e as orientações pós-operatórias foram detalhadamente explicadas à responsável. Como protocolo medicamentoso pós-operatório, foi prescrito ibuprofeno 600 mg, a cada 8 horas por três dias, e dipirona 500 mg, em caso de dor. 

Figura 3: (a) Aplicação de anestesia local na borda lateral da língua; (b) Realização da biópsia excisional com auxílio de pinça e lâmina; (c) Aspecto da língua suturada no pósoperatório imediato; (d) Fragmento da lesão removida enviado para análise.

Fonte: dados do autor. 

No retorno pós-operatório, realizado após sete dias, constatou-se cicatrização adequada da região operada, sem sinais de processo inflamatório ou infeccioso. A sutura foi removida sem intercorrências e o paciente relatou ausência de dor ou desconforto no local da cirurgia. 

Figura 4: Aspecto pós-operatório, com cicatrização satisfatória.

Fonte: dados do autor. 

Após onze meses, o paciente compareceu para consulta de acompanhamento. Ao exame clínico, observou-se mucosa íntegra e ausência de recidiva da lesão. A responsável relatou não haver qualquer intercorrência ou alteração relacionada ao procedimento realizado, confirmando o sucesso da intervenção cirúrgica e a estabilidade da condição clínica do paciente. 

Figura 5: Aspecto clínico da região após 11 meses, sinais de integridade tecidual e ausência de recidiva.

Fonte: dados do autor. 

METODOLOGIA 

Este trabalho trata-se de um relato de caso clínico realizado na Clínica Odontológica do Centro Universitário São Lucas – Afya, na cidade de Porto Velho. O objetivo do estudo foi descrever o manejo clínico de um granuloma eosinófilo traumático em um paciente com síndrome de Down, abordando o diagnóstico, a intervenção cirúrgica e a análise histopatológica. A condução do caso ficou sob responsabilidade de alunas do 7º período do curso de Odontologia, sob supervisão de um professor responsável. 

O paciente selecionado foi um homem de 23 anos, com diagnóstico de síndrome de Down, que apresentava uma lesão traumática na língua, clinicamente compatível com granuloma eosinófilo traumático ou fibroma traumático. O processo de inclusão no estudo foi condicionado à concordância do responsável legal, que assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), garantindo a confidencialidade das informações pessoais e clínicas, conforme os princípios éticos estabelecidos pela Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. 

O manejo clínico seguiu um protocolo dividido em etapas. Inicialmente, foi realizada uma avaliação clínica e radiográfica completa, incluindo uma anamnese detalhada e exame intraoral para caracterização da lesão e identificação de fatores predisponentes, como histórico de trauma durante crises convulsivas. Para documentar o caso, foram realizadas fotografias intraorais. Com base nas informações coletadas, foi elaborado o planejamento da biópsia excisional, considerando materiais e técnicas que reduzissem o desconforto do paciente e assegurassem a eficácia do procedimento. Os materiais utilizados incluíram anestésico local (mepivacaína), lâmina de bisturi, fio de sutura, soro fisiológico e instrumental cirúrgico devidamente esterilizado. 

Durante o procedimento cirúrgico, foi realizada a antissepsia da cavidade oral e, em seguida, aplicada a anestesia local. A lesão foi removida em sua totalidade, com uma margem de segurança mínima para assegurar a remoção completa do tecido alterado. O material coletado foi acondicionado em solução de formalina a 10% e enviado ao laboratório de patologia oral para análise histopatológica. Após a remoção da lesão, a área foi suturada adequadamente para promover a cicatrização e controlar o sangramento. 

O acompanhamento pós-operatório foi realizado em consultas regulares, sendo inicialmente semanais e posteriormente quinzenais, para monitorar o processo de cicatrização, o alívio dos sintomas relatados pelo paciente, como dor e desconforto durante a alimentação e higiene oral, e a ausência de complicações, como infecção ou recidiva da lesão. 

A análise dos dados coletados foi de natureza qualitativa e considerou três parâmetros principais: o processo de cicatrização da área afetada, o alívio dos sintomas clínicos do paciente e os resultados da análise histopatológica. Este último foi essencial para confirmar ou refutar as hipóteses diagnósticas iniciais, identificando se a lesão correspondia a um granuloma eosinófilo traumático ou a um fibroma traumático. 

Todos os procedimentos foram realizados com base nos princípios éticos de autonomia, beneficência e não maleficência, assegurando o bem-estar do paciente durante todo o processo. Os dados coletados foram utilizados exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, com o objetivo de documentar um caso raro na literatura odontológica e contribuir para a compreensão de lesões orais em pacientes com condições especiais. O relato de caso será submetido para publicação em revista científica especializada, ampliando a disseminação do conhecimento adquirido. 

A análise dos dados será realizada de forma qualitativa, a partir da descrição detalhada do caso clínico, da evolução do tratamento e dos resultados da biópsia excisional. Não serão utilizados métodos estatísticos, visto que se trata de um único relato de caso. 

DISCUSSÃO 

O granuloma ulcerativo traumático com eosinofilia estromal (TUGSE) é amplamente reconhecido como uma lesão benigna, associada predominantemente a traumas locais, conforme descrito por Shen et al. (2015) e Sharma et al. (2016). No entanto, apesar do consenso sobre sua etiologia traumática, autores como Bhaskar e Lilly (1964) ressaltam que a contribuição do trauma no desenvolvimento do TUGSE ainda pode ser debatida, visto que nem todas as lesões traumáticas evoluem para essa condição. Essa perspectiva enfatiza a necessidade de uma análise detalhada do histórico clínico do paciente, incluindo fatores predisponentes individuais, como características imunológicas e anatômicas, especialmente em populações vulneráveis como os pacientes com Síndrome de Down. 

Embora o presente relato descreva o manejo clínico de um granuloma eosinófilo traumático com abordagem cirúrgica, é importante considerar perspectivas divergentes. Shen et al. (2015) sugerem que, em alguns casos, a lesão pode apresentar regressão espontânea após a eliminação do fator traumático, questionando a necessidade de intervenções invasivas. Por outro lado, Bencini et al. (2009) enfatizam que, em situações onde o trauma é persistente ou a lesão apresenta crescimento significativo, a biópsia excisional se torna indispensável tanto para diagnóstico definitivo quanto para resolução terapêutica. No caso relatado, o trauma resultante da crise convulsiva possivelmente justificou a intervenção cirúrgica, mas seria relevante discutir se medidas conservadoras poderiam ser inicialmente consideradas, especialmente em pacientes com necessidades especiais, onde os riscos associados ao procedimento invasivo são maiores. 

A realização da biópsia excisional no caso relatado foi considerada essencial, tanto para fins terapêuticos quanto diagnósticos, uma vez que a exclusão de condições malignas, como o carcinoma espinocelular, é indispensável em lesões com características clínicas similares. A literatura confirma que a análise histopatológica é o método mais confiável para diferenciar lesões benignas de condições graves (Melrose et al., 2007). Entretanto, enquanto Soyele et al. (2017) defendem a biópsia como procedimento de primeira escolha, outros autores, como Chandra et al. (2014), sugerem que, em lesões pequenas e de evolução típica, uma abordagem conservadora, com acompanhamento clínico inicial, pode ser suficiente, minimizando o risco de complicações cirúrgicas. 

No que diz respeito ao manejo clínico do paciente, a utilização de sedação consciente com benzodiazepínicos se mostrou uma escolha adequada, considerando a necessidade de controle comportamental em indivíduos com síndrome de Down. Glassman et al. (2009) destacam que a sedação consciente é especialmente indicada em pacientes com limitações cognitivas, pois proporciona maior segurança durante o procedimento e reduz o estresse para o paciente e para a equipe. Por outro lado, Lima et al. (2018) questionam a dependência exclusiva de métodos farmacológicos, sugerindo que técnicas de manejo comportamental, quando aplicadas corretamente, podem ser igualmente eficazes e evitam potenciais efeitos colaterais dos sedativos. 

Em relação ao manejo comportamental e farmacológico, a literatura destaca os benzodiazepínicos (BZDs) como a primeira escolha para sedação consciente em consultórios odontológicos, devido à sua segurança e eficácia no controle da ansiedade (Araújo et al., 2018). Entretanto, a dependência de métodos farmacológicos pode ser questionada, já que a modificação de comportamento e técnicas não farmacológicas, conforme descrito pela ADA (2016), podem ser eficazes em muitos casos, minimizando os riscos associados aos sedativos. No caso em questão, a escolha pela sedação mínima deve ser cuidadosamente justificada, considerando os riscos e benefícios para o paciente. 

O acompanhamento pós-operatório detalhado, descrito no relato, segue as recomendações da literatura, que destaca a importância de monitorar cicatrização, alívio dos sintomas e possíveis complicações, como infecções ou recorrências (Soyele et al., 2017). Contudo, enquanto o relato se baseou na avaliação clínica qualitativa, autores como Peinado et al. (2018) enfatizam a necessidade de parâmetros objetivos, como escalas de dor ou índices clínicos de cicatrização, para documentar de forma mais precisa os resultados e permitir comparações com outros estudos. 

Além disso, o relato aborda as particularidades anatômicas e imunológicas dos pacientes com síndrome de Down, que apresentam maior suscetibilidade a infecções e cicatrização diferenciada devido à hipotonia muscular e alterações imunológicas (Bencini et al., 2009). No entanto, a abordagem limitada às características clínicas poderia ser expandida para incluir uma discussão sobre o impacto psicossocial do tratamento. Estudos como os de Oliveira et al. (2017) destacam que a inclusão da família no processo terapêutico e a adaptação do ambiente clínico são fundamentais para melhorar a experiência do paciente e reduzir barreiras no acesso ao tratamento. 

Outro ponto que merece reflexão é a ausência de estratégias preventivas no relato. Apesar do manejo adequado da lesão, a prevenção de traumas futuros, como o uso de dispositivos protetores durante crises convulsivas, não foi explorada. Este aspecto é destacado por Lima et al. (2018), que argumentam que intervenções preventivas são tão importantes quanto o tratamento curativo, especialmente em populações vulneráveis. 

Por fim, enquanto o relato contribui significativamente para a literatura ao documentar um caso raro, ele poderia ser enriquecido com uma discussão mais ampla sobre alternativas terapêuticas. Abordagens como corticoterapia intralesional ou criocirurgia são defendidas por Chandra et al. (2014) como opções menos invasivas, particularmente em lesões menores, e poderiam ser consideradas em casos semelhantes. A comparação entre diferentes modalidades de tratamento fortaleceria o trabalho, promovendo uma análise crítica das escolhas realizadas. 

CONCLUSÃO 

O presente relato de caso reafirma a relevância do manejo clínico em pacientes com necessidades especiais, destacando as especificidades do diagnóstico e do tratamento de granuloma eosinófilo traumático em indivíduos com síndrome de Down. A intervenção realizada, por meio de biópsia excisional, demonstrou-se eficaz na remoção da lesão, proporcionando melhora significativa nos sintomas relatados, como dor e desconforto, além de evidenciar a importância da análise histopatológica para o diagnóstico definitivo. 

A experiência clínica relatada sublinha a necessidade de protocolos individualizados, que considerem as particularidades anatômicas e imunológicas desses pacientes, garantindo um atendimento humanizado e seguro. A utilização de técnicas de sedação consciente também foi fundamental para o sucesso do procedimento, reforçando a importância do preparo profissional na condução de casos complexos. 

Este relato contribui para a literatura odontológica ao registrar uma abordagem bem-sucedida de uma condição rara, fortalecendo a base de conhecimento para o manejo de lesões traumáticas em pacientes com condições especiais. Ademais, ressalta-se a relevância do diagnóstico precoce e da intervenção terapêutica adequada para minimizar complicações e promover qualidade de vida aos pacientes. 

Agradecimentos 

As autoras expressam seus sinceros agradecimentos ao Laboratório de Patologia Oral da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) pela valiosa colaboração na condução deste trabalho. Agradecemos imensamente pelo criterioso processamento da peça cirúrgica, pela emissão do laudo histopatológico e pela gentileza no fornecimento das imagens microscópicas, que foram fundamentais para o esclarecimento diagnóstico e para a consolidação científica deste relato de caso. 

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1Graduando (a) em Odontologia, pelo Centro Universitário São Lucas, 2025. E-mail: giuddamico@gmail.com
2Graduando (a) em Odontologia, pelo Centro Universitário São Lucas, 2025. E-mail: marianabelici@hotmail.com
3Orientadora: Profa. Especialista em Oncologia e Mestre em Estomatologia.
4Coorientador: Prof. Especialista em Implantodontia.

*Artigo apresentado no Curso de Odontologia, como Trabalho de Conclusão de Curso do Centro Universitário São Lucas 2024, como pré-requisito para conclusão do curso, sob orientação da Professora Fernanda Heimlich