IMPACT OF POLYPHARMACY INVOLVING CONTROLLED DRUGS IN PATIENTS WITH COMORBIDITIES
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202504270758
Amanda Dantas Gomes
Prof. Dr. José Rui Machado Reys
RESUMO
A polifarmácia, caracterizada pelo uso de múltiplos medicamentos, representa um desafio crescente na prática clínica, principalmente entre pacientes com comorbidades. O presente estudo tem como objetivo analisar os impactos do uso de medicamentos controlados, os riscos clínicos associados e as estratégias de manejo para minimizar seus efeitos adversos. Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, com buscas realizadas em bases de dados científicas entre 2020 e 2025, selecionando artigos que abordam a relação entre polifarmácia e segurança do paciente. Os resultados do estudo evidenciam que a polifarmácia psicotrópica é altamente prevalente entre pacientes com comorbidades, especialmente aqueles atendidos em Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e instituições de longa permanência. A maioria dos pacientes utilizava múltiplos psicofármacos, como antipsicóticos, antidepressivos e estabilizadores de humor, aumentando o risco de interações medicamentosas e efeitos adversos. Além disso, observou-se uma associação significativa entre o uso de medicamentos psicotrópicos e o desenvolvimento de comorbidades metabólicas, como hipertensão arterial e obesidade, tornando esses indivíduos mais vulneráveis a complicações cardiovasculares. Conclui-se que há a necessidade de um acompanhamento rigoroso para minimizar os riscos da polifarmácia, destacando que a individualização do tratamento e a revisão periódica das prescrições são fundamentais para a segurança dos pacientes. Estratégias como o fortalecimento da atenção farmacêutica, o monitoramento multiprofissional e a implementação de políticas de desprescrição podem reduzir a incidência de eventos adversos e melhorar a qualidade de vida dos usuários. O estudo também aponta para a necessidade de mais pesquisas sobre abordagens seguras para o manejo da polifarmácia, considerando o equilíbrio entre a necessidade terapêutica e a minimização de riscos clínicos.
Palavras-chave: Polifarmácia. Medicamentos controlados. Comorbidades.
INTRODUÇÃO
A polifarmácia, caracterizada pelo uso simultâneo de múltiplos medicamentos, tem sido um desafio crescente na prática clínica, especialmente entre pacientes com comorbidades. Esse fenômeno é frequentemente observado em indivíduos que necessitam de tratamentos contínuos para doenças crônicas, como hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, insuficiência cardíaca, depressão e transtornos ansiosos. Embora a prescrição de diversos fármacos seja, em muitos casos, necessária para o manejo adequado dessas condições, o uso indiscriminado de medicamentos, especialmente aqueles classificados como controlados, pode desencadear complicações significativas para a saúde do paciente (Soares; Okuno, 2024).
Os medicamentos controlados, incluindo ansiolíticos, antidepressivos, antipsicóticos, anticonvulsivantes e opioides, são amplamente utilizados para tratar distúrbios neurológicos e psiquiátricos, além de serem empregados como coadjuvantes no tratamento da dor crônica. No entanto, seu uso prolongado e em associação com outros fármacos pode resultar em interações medicamentosas prejudiciais, aumento do risco de dependência, efeitos adversos potencialmente graves e redução da funcionalidade do paciente. Além disso, a automedicação e a prescrição excessiva desses medicamentos podem comprometer a eficácia do tratamento, dificultando a adesão do paciente e elevando os custos associados à assistência à saúde (Tiago et al., 2020).
A presença de comorbidades torna o cenário da polifarmácia ainda mais complexo, uma vez que diferentes especialidades médicas podem prescrever medicamentos sem uma avaliação integrada do quadro clínico do paciente. Isso pode levar à prescrição inadequada, redundante ou potencialmente perigosa, aumentando o risco de reações adversas e hospitalizações. Dessa forma, o monitoramento rigoroso e a revisão periódica dos tratamentos são fundamentais para evitar consequências deletérias à saúde e garantir um uso mais racional e seguro dos medicamentos controlados (Mainardes et al., 2022).
Os impactos negativos da polifarmácia também incluem alterações cognitivas, como confusão mental e comprometimento da memória, especialmente em idosos, tornando-os mais vulneráveis a quedas e internações. Além disso, a sedação excessiva, um efeito colateral comum de muitos medicamentos controlados, pode reduzir a qualidade de vida e a independência dos pacientes, impactando sua rotina diária. Diante disso, estratégias como a individualização do tratamento, a desprescrição de fármacos desnecessários e a educação do paciente quanto ao uso correto dos medicamentos são essenciais para reduzir riscos e melhorar os desfechos clínicos (Correia; Teston, 2020).
O presente estudo tem como objetivo analisar os impactos da polifarmácia envolvendo medicamentos controlados em pacientes com comorbidades, investigando os riscos clínicos associados, às estratégias de manejo adotadas e as implicações para a segurança do paciente. A pesquisa pretende avaliar como o uso concomitante desses fármacos pode comprometer a adesão ao tratamento e agravar a condição clínica dos indivíduos, além de identificar medidas para minimizar esses efeitos.
A relevância deste estudo se justifica pela necessidade de uma abordagem mais criteriosa na prescrição de medicamentos controlados, especialmente em pacientes que apresentam múltiplas doenças crônicas. A crescente demanda pelo uso desses fármacos exige a implementação de estratégias de vigilância e educação voltadas para a segurança do paciente, visando reduzir complicações e melhorar a qualidade do cuidado. Dessa forma, compreender os desafios impostos pela polifarmácia possibilita a adoção de intervenções eficazes que promovam um tratamento mais seguro e adequado para essa população.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Polifarmácia e Uso de Medicamentos Controlados: Conceitos e Implicações Clínicas
A polifarmácia é um fenômeno caracterizado pelo uso concomitante de múltiplos medicamentos, geralmente cinco ou mais, para o tratamento de condições de saúde variadas. Esse cenário é comum em pacientes com múltiplas comorbidades, especialmente idosos e portadores de doenças crônicas, que necessitam de diferentes fármacos para controlar seus quadros clínicos. Embora a polifarmácia seja, em alguns casos, uma necessidade terapêutica, seu uso indiscriminado pode gerar uma série de consequências negativas, como interações medicamentosas, reações adversas e piora da adesão ao tratamento (Muniz et al., 2024).
Os medicamentos controlados, que incluem ansiolíticos, antidepressivos, antipsicóticos, opioides e anticonvulsivantes, são frequentemente prescritos para o manejo de transtornos neurológicos, psiquiátricos e dores crônicas. O uso prolongado e a associação desses fármacos com outros medicamentos podem aumentar o risco de eventos adversos graves, comprometendo a segurança e a qualidade de vida dos pacientes. Além disso, a prescrição inadequada de medicamentos controlados pode resultar em dependência química e sintomas de abstinência, tornando a retirada do medicamento um processo desafiador (Abreu, 2023).
A prevalência da polifarmácia tem aumentado devido ao envelhecimento populacional e ao crescimento do número de diagnósticos de doenças crônicas. Pacientes idosos, em especial, são os mais afetados por essa prática, pois costumam apresentar múltiplas condições clínicas que demandam tratamentos contínuos. No entanto, a complexidade da farmacoterapia nesses indivíduos exige um controle rigoroso para evitar interações medicamentosas prejudiciais e eventos adversos que podem comprometer a funcionalidade e autonomia desses pacientes (Bordin et al., 2024)
Entre os principais desafios da polifarmácia está a dificuldade de monitoramento dos efeitos dos medicamentos quando usados simultaneamente.
Interações medicamentosas podem alterar a eficácia dos fármacos, potencializar ou reduzir seus efeitos e gerar complicações inesperadas. Por exemplo, a combinação de antidepressivos com benzodiazepínicos pode aumentar o risco de sedação excessiva, quedas e comprometimento cognitivo, o que é particularmente preocupante em idosos e pacientes com doenças neurológicas (Quirino et al., 2020).
Outro aspecto preocupante da polifarmácia é a possibilidade de prescrição redundante ou inadequada, especialmente quando os pacientes são atendidos por diferentes profissionais de saúde que não têm acesso ao histórico completo de medicações. Muitas vezes, um medicamento é prescrito para tratar um efeito adverso de outro fármaco, criando um ciclo de uso desnecessário e aumentando os riscos para o paciente. Esse fenômeno é conhecido como cascata medicamentosa e pode levar a complicações graves, como hospitalizações evitáveis e aumento dos custos com a assistência à saúde (Quirino et al, 2020).
O uso de medicamentos controlados em associação com outros fármacos também pode alterar a resposta terapêutica e aumentar a necessidade de ajustes na dosagem. Pacientes em uso prolongado de opioides, por exemplo, podem desenvolver tolerância ao medicamento, necessitando de doses cada vez maiores para obter alívio da dor, o que eleva o risco de dependência e overdose. Da mesma forma, o uso crônico de benzodiazepínicos pode levar à tolerância e síndrome de abstinência, dificultando a interrupção do tratamento (Baqueiro; Oliveira, 2023).
Os efeitos adversos da polifarmácia podem impactar diretamente a qualidade de vida dos pacientes, comprometendo sua capacidade funcional e aumentando a incidência de eventos como quedas, fraturas e hospitalizações. Além disso, sintomas como tontura, confusão mental, hipotensão postural e sonolência excessiva podem ser decorrentes da interação entre múltiplos medicamentos, dificultando o manejo clínico dos pacientes (Bordin et al., 2024).
A adesão ao tratamento é outro fator relevante quando se discute a polifarmácia. O uso de vários medicamentos pode confundir os pacientes, levando a erros na administração das doses ou até mesmo ao abandono do tratamento. Além disso, regimes terapêuticos complexos podem ser economicamente inviáveis para muitos pacientes, aumentando a probabilidade de uso irregular dos medicamentos e prejudicando os resultados clínicos esperados (Abreu, 2023).
O acompanhamento multiprofissional desempenha um papel fundamental na redução dos riscos da polifarmácia. A atuação de médicos, enfermeiros e farmacêuticos na revisão contínua das prescrições pode ajudar a evitar o uso desnecessário de fármacos e identificar possíveis interações prejudiciais. Estratégias como a reconciliação medicamentosa, que consiste na revisão detalhada das medicações em uso durante as transições de cuidado, são essenciais para garantir a segurança dos pacientes (Muniz et al., 2024).
A individualização do tratamento farmacológico também é uma abordagem importante para minimizar os efeitos da polifarmácia. A prescrição de medicamentos deve considerar fatores como idade, função hepática e renal, histórico clínico e possíveis interações medicamentosas. Além disso, sempre que possível, a adoção de terapias não farmacológicas deve ser incentivada para reduzir a necessidade de uso excessivo de medicamentos controlados (Santos; Baiense, 2023).
A desprescrição, ou seja, a retirada gradual de fármacos considerados desnecessários ou potencialmente prejudiciais, é uma estratégia eficaz para minimizar os riscos da polifarmácia. Esse processo deve ser conduzido de forma cuidadosa e supervisionada, garantindo que o paciente não sofra efeitos adversos durante a retirada do medicamento. Estudos indicam que a desprescrição pode melhorar a qualidade de vida e reduzir eventos adversos, especialmente entre idosos (Correia; Teston, 2020).
Além das estratégias clínicas, a educação dos pacientes sobre o uso racional de medicamentos é essencial para evitar complicações associadas à polifarmácia. Os pacientes devem ser orientados sobre os possíveis efeitos adversos, a importância do seguimento médico e a necessidade de comunicar qualquer sintoma inesperado. A participação ativa dos pacientes no seu próprio cuidado pode contribuir para um uso mais seguro e consciente dos medicamentos controlados (Santos; Baiense, 2023).
O avanço da tecnologia tem facilitado o monitoramento da polifarmácia por meio de prontuários eletrônicos e sistemas de prescrição digital, permitindo que os profissionais de saúde tenham um maior controle sobre as medicações utilizadas pelos pacientes. Essas ferramentas podem ajudar a reduzir erros de prescrição, evitar duplicações e fornecer alertas sobre possíveis interações medicamentosas, promovendo uma abordagem mais segura e eficiente no uso dos fármacos (Bordin et al., 2024).
Apesar das medidas para reduzir os riscos da polifarmácia, ainda há desafios significativos na implementação de protocolos de prescrição racional e na conscientização dos profissionais de saúde sobre o impacto do uso excessivo de medicamentos. Muitos médicos ainda enfrentam dificuldades para desprescrever fármacos, especialmente quando há resistência por parte dos pacientes, que podem temer a piora de seus sintomas caso o medicamento seja retirado (Soares; Oluno, 2024).
Diante do impacto da polifarmácia na saúde pública, políticas e diretrizes para um uso mais seguro de medicamentos têm sido desenvolvidas em diversos países. O fortalecimento da atenção primária à saúde, a capacitação dos profissionais para um manejo mais criterioso das prescrições e a implementação de programas de revisão medicamentosa são medidas fundamentais para reduzir os danos causados pelo uso excessivo de fármacos controlados (Mainardes et al., 2022).
2.2 Interações Medicamentosas e Efeitos Adversos na Polifarmácia
As interações medicamentosas podem ser classificadas em farmacocinéticas e farmacodinâmicas. As interações farmacocinéticas envolvem alterações na absorção, distribuição, metabolismo ou excreção dos fármacos, afetando sua biodisponibilidade e ação terapêutica. Já as interações farmacodinâmicas ocorrem quando dois ou mais medicamentos atuam nos mesmos receptores ou vias metabólicas, resultando em efeitos sinérgicos, aditivos ou antagônicos. Ambos os tipos de interação podem levar a complicações clínicas importantes, como toxicidade, redução da eficácia do tratamento ou aumento da incidência de efeitos adversos (Tinôco et al., 2021).
Um exemplo comum de interação farmacocinética ocorre entre benzodiazepínicos e inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), frequentemente prescritos para pacientes com transtornos de ansiedade e depressão. O metabolismo dos benzodiazepínicos, realizado principalmente pelo fígado, pode ser reduzido pela inibição enzimática causada por alguns ISRS, prolongando a meia-vida da substância no organismo e aumentando os riscos de sedação excessiva e comprometimento cognitivo. Essa interação pode ser especialmente perigosa em idosos, elevando o risco de quedas, fraturas e hospitalizações (Godoi et al., 2021).
A Figura 1 ilustra os mecanismos de ação de diferentes classes de antidepressivos, incluindo os ISRS, que atuam inibindo a recaptação de serotonina (5- HT), aumentando sua disponibilidade na fenda sináptica. Além dos ISRS, a imagem também mostra a ação de outros agentes como os inibidores de recaptação de norepinefrina (NE), os antagonistas dos receptores α2-adrenérgicos e os inibidores da monoamina oxidase (IMAO), todos envolvidos na modulação do humor e potencialmente sujeitos a interações medicamentosas significativas.
Figura 1 – Mecanismos de ação dos antidepressivos sobre as sinapses noradrenérgicas e serotoninérgicas.

Outro exemplo relevante é a interação entre opioides e antidepressivos tricíclicos, que pode potencializar os efeitos sedativos e aumentar o risco de depressão respiratória. Os opioides, usados no controle da dor crônica, podem ser prescritos em conjunto com antidepressivos para melhorar a resposta analgésica. No entanto, essa associação pode levar à sobrecarga do sistema nervoso central, dificultando a vigilância do paciente e aumentando o risco de eventos adversos graves, como depressão respiratória fatal (Morais; Card; Silva, 2024).
As interações medicamentosas envolvendo antipsicóticos também são motivo de preocupação, especialmente quando combinados com medicamentos que prolongam o intervalo QT, como antiarrítmicos e alguns antibióticos. O prolongamento do intervalo QT pode predispor os pacientes a arritmias cardíacas graves, incluindo torsades de pointes, que podem ser fatais. Dessa forma, a prescrição desses fármacos deve ser cuidadosamente monitorada, e exames eletrocardiográficos periódicos podem ser necessários para evitar complicações (Santos et al., 2021). Além das interações medicamentosas, os efeitos adversos resultantes da polifarmácia podem comprometer a qualidade de vida e a adesão ao tratamento dos pacientes. Sintomas como sonolência excessiva, tontura, confusão mental e hipotensão postural são frequentemente observados em indivíduos que fazem uso concomitante de medicamentos controlados. Esses efeitos podem reduzir a autonomia do paciente e aumentar o risco de eventos adversos, como quedas e fraturas, particularmente entre idosos (Tinôco et al., 2021).
A sobrecarga medicamentosa também pode levar ao fenômeno da cascata medicamentosa, no qual um medicamento é prescrito para tratar os efeitos adversos de outro fármaco, sem que a causa primária seja identificada e tratada. Por exemplo, um paciente em uso de anticolinérgicos pode desenvolver constipação intestinal grave, levando à prescrição de laxantes. Caso a causa inicial da constipação não seja abordada, o paciente pode acabar desenvolvendo novos efeitos adversos devido ao uso prolongado de laxantes, criando um ciclo vicioso de medicações desnecessárias (Pio et al., 2021).
Pacientes polimedicados também apresentam maior risco de reações idiossincráticas, ou seja, efeitos adversos inesperados que não são previsíveis com base na farmacologia do medicamento. Essas reações podem incluir reações alérgicas, hepatotoxicidade e nefrotoxicidade, tornando essencial um monitoramento rigoroso dos parâmetros laboratoriais durante o uso de múltiplos fármacos. Além disso, a individualização da terapia medicamentosa pode ajudar a reduzir esses riscos e melhorar a segurança do tratamento (Morais; Card; Silva, 2024).
A adesão ao tratamento pode ser prejudicada pela complexidade dos regimes medicamentosos associados à polifarmácia. Quando o paciente precisa administrar vários medicamentos em diferentes horários do dia, há um aumento na probabilidade de erros na tomada dos fármacos, seja por esquecimento, confusão com a posologia ou falta de compreensão sobre a importância do tratamento. Estratégias como o uso de organizadores de comprimidos e o acompanhamento por cuidadores ou profissionais de saúde podem auxiliar na correta administração dos medicamentos (Pagotto et al., 2023).
A farmacovigilância desempenha um papel fundamental na identificação e prevenção de interações medicamentosas e efeitos adversos. A implementação de protocolos clínicos para a revisão periódica das prescrições pode ajudar a evitar o uso desnecessário de medicamentos e reduzir o risco de eventos adversos graves. Além disso, a reconciliação medicamentosa, realizada durante a transição de cuidados entre diferentes serviços de saúde, pode garantir que os pacientes estejam recebendo apenas os medicamentos realmente necessários (Santos et al., 2021).
A tecnologia tem se mostrado uma aliada importante na detecção de interações medicamentosas, com o desenvolvimento de softwares e aplicativos que auxiliam os profissionais de saúde na tomada de decisões clínicas. Sistemas de prescrição eletrônica podem alertar sobre interações potencialmente perigosas, evitando erros e contribuindo para um uso mais racional e seguro dos medicamentos. No entanto, a interpretação desses alertas deve ser feita com critério, levando em consideração as características individuais de cada paciente (Carmo et al., 2024).
Diante dos desafios impostos pela polifarmácia e suas consequências, torna-se essencial a adoção de estratégias que promovam o uso racional de medicamentos. A desprescrição, quando realizada de maneira criteriosa e supervisionada, pode reduzir a carga medicamentosa e minimizar os riscos de interações adversas. Além disso, a educação continuada dos profissionais de saúde sobre a identificação de interações medicamentosas e o manejo seguro dos fármacos controlados é fundamental para garantir a segurança dos pacientes (Pagotto et al., 2023).
2.3 Estratégias para o Uso Racional de Medicamentos e a Redução da Polifarmácia
A polifarmácia representa um desafio crescente na prática clínica, especialmente entre pacientes com comorbidades que fazem uso de múltiplos medicamentos, incluindo fármacos controlados. O aumento do consumo de medicamentos pode resultar em interações medicamentosas, efeitos adversos e maior risco de hospitalizações. Diante desse cenário, torna-se fundamental a implementação de estratégias que promovam o uso racional de medicamentos e minimizem os impactos negativos da polifarmácia (Silva; Nogueira, 2021).
Uma das principais abordagens para reduzir a polifarmácia é a revisão periódica das prescrições, garantindo que cada medicamento seja realmente necessário para o tratamento do paciente. Essa estratégia envolve a avaliação contínua dos benefícios e riscos de cada fármaco, bem como a identificação de possíveis interações medicamentosas. Profissionais de saúde devem reavaliar periodicamente a necessidade de manter ou suspender determinados medicamentos, levando em consideração a evolução clínica do paciente (Vieira; Pinheiro, 2025).
A desprescrição é uma estratégia eficaz na redução da polifarmácia e consiste na retirada gradual e supervisionada de medicamentos que não apresentam mais benefícios clínicos ou que estão associados a riscos significativos. Esse processo deve ser conduzido com cautela, pois a interrupção abrupta de alguns fármacos, como benzodiazepínicos e opioides, pode causar efeitos adversos, incluindo sintomas de abstinência. A desprescrição deve ser planejada com base em evidências científicas e nas condições individuais de cada paciente (Reis; Figueiredo; Santos, 2021).
A reconciliação medicamentosa é outro método importante para garantir a segurança dos pacientes polimedicados. Esse processo consiste na verificação e comparação de todas as medicações utilizadas pelo paciente em diferentes momentos do atendimento, como durante internações hospitalares, consultas ambulatoriais e altas médicas. O objetivo é evitar discrepâncias, duplicações e interações medicamentosas que possam comprometer a eficácia do tratamento (Costa et al., 2021).
O papel da equipe multiprofissional na gestão da polifarmácia é essencial para a segurança e eficácia dos tratamentos. Médicos, enfermeiros e farmacêuticos devem trabalhar em conjunto para avaliar os esquemas terapêuticos, identificar possíveis riscos e propor ajustes necessários. A atuação do farmacêutico clínico, por exemplo, é crucial para revisar prescrições, educar os pacientes sobre o uso correto dos medicamentos e sugerir modificações quando necessário (Santos; Baiense, 2023).
A individualização do tratamento farmacológico é uma estratégia fundamental para minimizar os efeitos adversos e garantir um melhor controle das doenças crônicas. Cada paciente possui características clínicas e fisiológicas únicas, o que significa que a resposta aos medicamentos pode variar significativamente. Fatores como idade, função renal e hepática, presença de outras doenças e histórico de reações adversas devem ser considerados na escolha dos fármacos e na definição das doses adequadas (Quirino et al., 2020).
O uso de terapias não farmacológicas deve ser incentivado sempre que possível como alternativa ou complemento ao tratamento medicamentoso. Mudanças no estilo de vida, como alimentação saudável, prática de atividades físicas e técnicas de relaxamento, podem reduzir a necessidade do uso excessivo de medicamentos, principalmente em condições como hipertensão arterial, diabetes tipo 2 e transtornos de ansiedade. A adoção de abordagens como fisioterapia, psicoterapia e terapias integrativas também pode auxiliar na redução da dependência de fármacos controlados (Silva; Nogueira, 2021).
A educação dos pacientes sobre o uso racional de medicamentos é uma estratégia essencial para evitar a automedicação e o uso inadequado de fármacos. Pacientes polimedicados muitas vezes desconhecem os riscos das interações medicamentosas e podem utilizar medicamentos sem orientação adequada. Programas de educação em saúde devem ser implementados para esclarecer sobre os benefícios e riscos dos medicamentos, reforçando a importância do seguimento médico contínuo (Reis; Figueiredo; Santos, 2021).
A simplificação dos regimes terapêuticos pode melhorar a adesão ao tratamento e reduzir erros na administração dos medicamentos. Esquemas terapêuticos complexos, que exigem múltiplas doses ao longo do dia, podem dificultar o acompanhamento do tratamento, especialmente em pacientes idosos. Sempre que possível, deve-se optar por medicamentos de ação prolongada ou combinações fixas de fármacos, reduzindo a quantidade de comprimidos e facilitando a adesão ao tratamento (Abreu, 2023).
A implementação de tecnologias para auxiliar na gestão da polifarmácia tem se mostrado uma ferramenta eficaz na prática clínica. Sistemas de prescrição eletrônica, prontuários eletrônicos e softwares de detecção de interações medicamentosas podem ajudar os profissionais de saúde a evitar erros e garantir maior segurança na administração dos fármacos. Essas tecnologias permitem uma abordagem mais precisa na prescrição e reduzem o risco de duplicações e interações prejudiciais (Tiago et al., 2020).
A farmacovigilância desempenha um papel essencial na identificação e prevenção de eventos adversos relacionados ao uso de múltiplos medicamentos. O monitoramento contínuo dos efeitos colaterais, a notificação de reações adversas e a análise de padrões de uso inadequado dos fármacos permitem um ajuste mais seguro das prescrições. Programas de farmacovigilância podem ser incorporados aos serviços de saúde para garantir um acompanhamento mais rigoroso dos pacientes polimedicados (Pio et al., 2021).
O desenvolvimento de diretrizes clínicas baseadas em evidências científicas é uma estratégia fundamental para orientar os profissionais de saúde sobre a prescrição racional de medicamentos. Protocolos clínicos específicos para o manejo de doenças crônicas, a escolha de fármacos mais seguros e a recomendação de ajustes terapêuticos podem contribuir significativamente para a redução da polifarmácia. A capacitação contínua dos profissionais de saúde sobre essas diretrizes é indispensável para garantir sua implementação na prática clínica (Carmo et al., 2024).
A regulamentação mais rigorosa da prescrição de medicamentos controlados é uma medida necessária para evitar o uso indiscriminado destes fármacos. O controle da dispensação de benzodiazepínicos, opioides e outros medicamentos com potencial de abuso deve ser reforçado para reduzir a dependência química e os riscos associados ao uso prolongado. Estratégias como a exigência de receitas controladas e o monitoramento da dispensação de fármacos podem ajudar a conter o crescimento da polifarmácia (Godoi et al., 2021).
A implementação de programas de gerenciamento da terapia medicamentosa pode contribuir para o uso mais seguro e eficaz dos medicamentos. Esses programas consistem na revisão sistemática das prescrições, identificação de problemas relacionados aos medicamentos e intervenções para otimizar a terapia. A atuação de farmacêuticos clínicos nesses programas tem mostrado resultados positivos na redução de eventos adversos e melhora dos desfechos clínicos (Quirino et al., 2020).
Os desafios para a redução da polifarmácia incluem a resistência dos pacientes e profissionais de saúde à desprescrição e a necessidade de mudanças na cultura da prescrição médica. Muitos pacientes se sentem inseguros ao reduzir ou interromper o uso de medicamentos, temendo a piora dos sintomas. Da mesma forma, médicos podem hesitar em desprescrever certos fármacos devido à falta de diretrizes específicas ou à pressão dos próprios pacientes. A conscientização sobre os riscos da polifarmácia e a promoção de uma abordagem mais criteriosa na prescrição são fundamentais para superar esses desafios (Santos; Baiense, 2023).
3. METODOLOGIA
Este estudo trata-se de uma revisão integrativa da literatura, um método que permite a análise ampla e sistematizada das evidências disponíveis sobre determinada temática, contribuindo para a consolidação do conhecimento científico. Para a execução satisfatória da pesquisa, foi utilizada a estratégia PICo (sigla que designa respectivamente P: população/pacientes; I: interesse; Co: contexto), tendo como intuito abordar as especificidades do presente estudo (Santos; Galvão, 2014).
Por meio desta estratégia, a pergunta norteadora foi definida da seguinte forma: “Quais são os impactos da polifarmácia envolvendo medicamentos controlados em pacientes com comorbidades, e de que forma estratégias de manejo podem minimizar seus efeitos adversos?” Essa perspectiva está representada no Quadro 1.
Quadro 1. Elaboração da pergunta do estudo segundo a estratégia PICo.
Acrônimo | Descrição | Termos |
P | População | Pacientes com comorbidades |
I | Interesse | Impacto da polifarmácia envolvendo medicamentos controlados |
Co | Contexto | Prescrição excessiva de medicamentos e suas consequências na saúde |
Para fundamentar o questionamento, foram realizadas buscas online de artigos nacionais e internacionais no mês de fevereiro de 2025, utilizando as bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE/PUBMED) e Google Acadêmico. Foram utilizados descritores controlados e compatíveis com a questão norteadora, conforme descrito no Quadro 2.
Quadro 2. Descritores controlados e de acordo com a questão norteadora.
DeCS | Mesh |
Polifarmácia | Polypharmacy |
Medicamentos Controlados | Controlled Drugs |
Comorbidades | Comorbidities |
Os critérios de inclusão dos estudos literários abrangeram publicações dos últimos cinco anos (2020-2025), permitindo uma seleção de artigos atualizados e relevantes para o tema. Foram incluídos apenas artigos disponíveis nos idiomas português, inglês e espanhol, que abordassem a temática dentro do contexto da polifarmácia e medicamentos controlados em pacientes com comorbidades.
Como critérios de exclusão, foram desconsideradas literaturas publicadas em meios não oficiais, artigos que ultrapassassem o limite temporal estabelecido, estudos que não contemplassem o objetivo do trabalho e pesquisas que abordassem a temática em cenários distintos, sem relação direta com o contexto investigado.
A busca inicial resultou em 184 artigos. Após a aplicação dos filtros relacionados ao período de publicação, idioma e relevância para a temática proposta, restaram 6 estudos. A pré-seleção foi realizada a partir da leitura e análise dos títulos e resumos, levando em consideração os critérios de elegibilidade. Por fim, os artigos selecionados foram analisados na íntegra e incluídos na revisão conforme sua adequação à questão de pesquisa e ao objetivo estabelecido. Esse processo está representado no Quadro 3.
Quadro 3. Estratégia utilizada para realização das buscas nas bases de dados.
Base | Expressões de busca | Ee | Es | Ei |
BVS | (Polifarmácia) AND (Medicamentos Controlados) AND (Comorbidades) | 47 | 12 | 1 |
PUBMED | (Polypharmacy) AND (Controlled Drugs) AND (Comorbidities) | 42 | 15 | 2 |
GOOGLE ACADÊMICO | Polifarmácia AND Medicamentos Controlados AND Comorbidades | 95 | 12 | 3 |
Legenda:
BVS – Biblioteca Virtual em Saúde
Ee – Estudos encontrados
Es – Estudos selecionados
Ei – Estudos incluídos na revisão após leitura crítica
A seleção final resultou em um conjunto de artigos que abordam a polifarmácia e o impacto do uso de medicamentos controlados em pacientes com comorbidades, possibilitando a análise dos principais riscos, interações medicamentosas e estratégias para minimizar seus efeitos adversos. O estudo busca contribuir para a construção de conhecimento sobre o tema, fornecendo subsídios para a prática clínica baseada em evidências.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Após o cumprimento dos procedimentos metodológicos, 6 artigos disponíveis no Portal da BVS, na base de dados PubMed e no Google Acadêmico foram selecionados. O ano de publicação variou entre 2020 e 2025. O Quadro 4 traz as informações detalhadas dos estudos elegidos para a análise.
Quadro 4. Publicações incluídas no estudo segundo autor/ano, título, objetivo, tipo de estudo e principais resultados. Macéio, AL, Brasil, 2025.
Nº | Autoria /Ano | Título | Objetivo do Estudo | Tipo de estudo | Resultados principais |
1 | Bachur; Rabelo; Christin a 2022 | Manejo de doenças crônicas degenerativas e depressão: desafios da polifarmácia. | Associar a polifarmácia e as classes medicamentosas com o risco de quedas de idosos. | Revisão bibliográfica | Os resultados evidenciam que o aumento da expectativa de vida da população mundial resulta em maior incidência e prevalência de doenças crônico degenerativas e depressão crônica, levando ao uso simultâneo de múltiplos medicamentos, caracterizando a polifarmácia. Dessa forma, o conhecimento sobre o potencial dos medicamentos em causar interações medicamentosas é essencial para a segurança do paciente e eficácia do tratamento. Losartana (anti hipertensivo), sinvastatina (hipolipidêmico) e metformina (hipoglicemiante oral) estão entre os medicamentos mais utilizados para o controle de doenças crônico degenerativas no mundo. A agomelatina surge como uma alternativa terapêutica recente para depressão, com um perfil de segurança relativamente melhor que outros antidepressivos, embora com potencial efeito hepatotóxico. |
2 | Franco; Rezend e 2022 | Análise do consumo de psicotrópicos e o fenômeno da polifarmácia em idosos residentes em uma ilpi: subsídios para a implementação de serviços de atenção farmacêutica | Analisar o consumo de psicotrópicos entre os idosos lá residentes, além de coletar dados sociodemográficos e informações sobre polifarmácia, com vistas a subsidiar a implementação de um serviço de atenção farmacêutica voltado para a farmacoterapia e problemas relacionados aos medicamentos. | Estudo observacional , transversal e quantitativo | Houve uma alta incidência de polifarmácia, com a maioria dos idosos utilizando cinco ou mais medicamentos, com uma média de sete por idoso. Os psicotrópicos foram amplamente utilizados, representando 41% das medicações, com neurolépticos sendo os mais comuns, seguidos por benzodiazepínicos e antidepressivos. Essa tendência é preocupante devido aos potenciais efeitos adversos e riscos associados ao seu uso prolongado, especialmente em uma população idosa vulnerável. |
3 | Souza et al. 2023 | Prevalência de hipertensão arterial em um centro de atenção psicossocial (CAPS) em Salvador/Bahia | Estimar a prevalência de hipertensão através da autorreferência, do uso de medicamentos anti hipertensivos e de valores de pressão arterial maiores ou iguais a 140 e 90 mmHg em população atendida em um Centro de Atenção Psicossocial na cidade de Salvador | estudo transversal e exploratório | Os resultados do estudo evidenciam a alta prevalência da polifarmácia psiquiátrica entre os pacientes atendidos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), com 96,1% dos indivíduos utilizando dois ou mais medicamentos psicotrópicos. Além disso, observou-se uma associação entre o uso excessivo de antipsicóticos e estabilizadores de humor com um maior risco de comorbidades metabólicas, como obesidade e hipertensão arterial (HA), sendo esta última autorreferida por 23,6% dos pacientes. A polifarmácia se mostrou ainda mais preocupante quando associada à HA, visto que 36,3% dos pacientes utilizavam cinco ou mais medicamentos regularmente. O uso concomitante de psicofármacos e anti-hipertensivos pode representar um risco significativo de interações medicamentosas, contribuindo para o descontrole da pressão arterial e aumentando a vulnerabilidade cardiovascular dos pacientes. |
4 | Nacamura et al. 2021 | Uso de psicotrópicos por pessoas idosas com hipertensão: prevalência e fatores associados | Analisar os fatores associados ao uso de psicotrópicos por pessoas idosas com hipertensão arterial (HA) acompanhadas pela atenção primária. | Estudo transversal | Os resultados do estudo apontaram que 25% da população estudada faz uso de psicotrópicos, sendo as classes dos antidepressivos e ansiolíticos os mais predominantes. Os medicamentos mais utilizados foram do grupo dos benzodiazepínicos, antidepressivos tricíclicos, inibidores da recaptação da serotonina e outros antidepressivos. Os fatores associados ao consumo de psicotrópicos entre pessoas idosas com hipertensão arterial acompanhados pela atenção primária foram o uso diário de tabaco, sedentário, obesidade, circunferência abdominal alterada e autorrelato de efeitos adversos ao medicamento anti-hipertensivo. |
5 | Normando et al. 2024 | Polifarmácia e risco de intoxicação: análise acerca do uso de psicotrópicos | Analisar através da literatura atual o risco de intoxicação derivado da polifarmácia psicotrópica. | Revisão sistemática | É evidenciado que a combinação de diversos medicamentos psicotrópicos amplia consideravelmente o potencial de efeitos adversos, tais como sedação Polifarmácia e risco de intoxicação: análise acerca do uso de psicotrópicos intensa, comprometimento cognitivo, depressão respiratória e agitação. Essa variedade de substâncias pode complicar a identificação e o manejo de reações adversas, aumentando assim o risco de danos graves, inclusive fatais. |
6 | Silva; Figueir edo; Spindol a 2023 | Polifarmácia psicotrópica e a medicalização da vida em um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas no Distrito Federal | Analisar a relação da medicalização e medicamentalização em psiquiatria, presença e frequência de polifarmácia psicotrópica para usuários de CAPS AD, avaliar, subjetivamente, a farmacoterapia prescrita em um CAPS AD e relacionar teoricamente os resultados obtidos e a medicalização em psiquiatria. | Estudo transversal, descritivo e quantitativo. | A ocorrência de polifarmácia psicotrópica foi identificada em 100% da amostra analisada, com uso de 2 a 6 medicamentos por usuário. Ao todo, os participantes do estudo estavam em uso de 24 psicotrópicos diferentes, sendo que a maior prevalência foi de naltrexona. Também foram identificadas potenciais interações medicamentosas (PIM) em 90,9% da amostra. |
A polifarmácia psicotrópica tem sido um fenômeno amplamente observado em diferentes contextos clínicos, especialmente em populações com doenças crônicas e transtornos psiquiátricos. O estudo de Souza et al. (2023) revelou que 96,1% dos pacientes atendidos em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) utilizavam dois ou mais psicofármacos, o que demonstra a prevalência elevada dessa prática. Esses dados corroboram os achados de Silva, Figueiredo e Spindola (2023), que identificaram polifarmácia psicotrópica em 100% dos usuários de um CAPS AD, evidenciando que a combinação de múltiplos medicamentos tem sido uma realidade na psiquiatria e na atenção psicossocial.
Os riscos associados à polifarmácia psicotrópica são amplamente discutidos na literatura, sendo um dos principais a ocorrência de interações medicamentosas e seus impactos na saúde dos pacientes. Normando et al. (2024) apontam que o uso concomitante de diversos psicofármacos pode resultar em sedação intensa, comprometimento cognitivo, depressão respiratória e agitação, aumentando o risco de intoxicação e efeitos adversos graves. Além disso, Franco e Rezende (2022) destacam que idosos residentes em instituições de longa permanência apresentam elevada incidência de polifarmácia, com uma média de sete medicamentos por idoso, sendo os psicotrópicos responsáveis por 41% dessas prescrições.
A relação entre polifarmácia e doenças crônicas não transmissíveis também merece destaque, uma vez que o uso de medicamentos para controle dessas condições pode gerar interações medicamentosas potencialmente prejudiciais. Souza et al. (2023) identificaram que 36,3% dos pacientes do CAPS utilizavam cinco ou mais medicamentos regularmente, o que reforça o risco aumentado de eventos adversos, especialmente em indivíduos que fazem uso concomitante de antipsicóticos e anti hipertensivos. Esse achado também é evidenciado por Nacamura et al. (2021), que apontam que o uso de psicotrópicos entre idosos hipertensos está associado a fatores como obesidade, sedentarismo e efeitos adversos de medicamentos anti hipertensivos.
A alta prevalência de hipertensão arterial entre pacientes psiquiátricos e sua relação com a polifarmácia também são temas relevantes. Souza et al. (2023) observaram que 23,6% dos pacientes atendidos no CAPS relataram hipertensão, sendo que muitos faziam uso simultâneo de anti-hipertensivos e psicofármacos. Esse dado sugere que a gestão inadequada da polifarmácia pode comprometer o controle da pressão arterial, aumentando o risco cardiovascular dos pacientes. Esse achado é reforçado pelo estudo de Bachur, Rabelo e Christina (2022), que demonstrou que medicamentos como losartana, sinvastatina e metformina estão entre os mais utilizados para o controle de doenças crônicas, exigindo monitoramento rigoroso para evitar interações adversas.
Além dos riscos metabólicos e cardiovasculares, a polifarmácia psicotrópica também está associada a um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes, particularmente entre idosos. Franco e Rezende (2022) apontam que o uso prolongado de benzodiazepínicos e neurolépticos pode levar à deterioração cognitiva e funcional, além de aumentar o risco de quedas e hospitalizações. Esses achados corroboram os de Normando et al. (2024), que alertam para a necessidade de protocolos rigorosos de prescrição e desprescrição para minimizar os riscos da polifarmácia em populações vulneráveis.
No entanto, alguns estudos apresentam divergências quanto ao impacto da polifarmácia psicotrópica na morbimortalidade dos pacientes. Embora Normando et al. (2024) e Souza et al. (2023) indiquem um risco significativo de intoxicação e eventos adversos graves, pesquisas como as de Bachur, Rabelo e Christina (2022) sugerem que o manejo adequado da polifarmácia, com ajustes de dose e monitoramento rigoroso, pode mitigar esses riscos. Dessa forma, a polifarmácia, quando bem administrada, pode ser benéfica para o controle de múltiplas condições crônicas, sem necessariamente comprometer a segurança do paciente.
Outra divergência relevante se refere à necessidade do uso prolongado de psicotrópicos. Enquanto Franco e Rezende (2022) alertam para o risco de dependência associado ao uso contínuo de benzodiazepínicos e neurolépticos, Silva, Figueiredo e Spindola (2023) argumentam que a medicalização é uma ferramenta essencial no tratamento de transtornos psiquiátricos severos, sendo muitas vezes indispensável para a estabilização do quadro clínico dos pacientes. Nesse contexto, a individualização do tratamento e a revisão periódica das prescrições se tornam fundamentais para garantir um equilíbrio entre os benefícios e riscos do uso de psicofármacos.
A necessidade de implementação de serviços de atenção farmacêutica também é destacada como uma estratégia eficaz para reduzir os riscos associados à polifarmácia. Franco e Rezende (2022) sugerem que a presença de farmacêuticos nas instituições de longa permanência pode contribuir para a identificação precoce de interações medicamentosas e para a otimização dos esquemas terapêuticos. Essa recomendação é corroborada pelo estudo de Souza et al. (2023), que destaca a importância da educação em saúde e do acompanhamento farmacoterapêutico para minimizar os impactos negativos da polifarmácia em pacientes psiquiátricos.
Diante dos desafios impostos pela polifarmácia, torna-se evidente a necessidade de uma abordagem multiprofissional, envolvendo médicos, farmacêuticos e outros profissionais da saúde, para garantir um uso mais racional e seguro dos medicamentos. Normando et al. (2024) enfatizam a importância do monitoramento rigoroso das prescrições e da adoção de protocolos clínicos baseados em evidências para reduzir os riscos de intoxicação e eventos adversos. Além disso, a capacitação dos profissionais de saúde para lidar com a complexidade do manejo farmacológico em pacientes com múltiplas comorbidades é um fator essencial para garantir a segurança do tratamento.
Por fim, os dados analisados evidenciam que, embora a polifarmácia seja um desafio significativo na prática clínica, sua gestão adequada pode minimizar os riscos e otimizar os benefícios do tratamento medicamentoso. A revisão periódica das prescrições, a identificação precoce de interações medicamentosas e a educação do paciente sobre o uso correto dos fármacos são estratégias fundamentais para reduzir complicações e melhorar a qualidade de vida dos indivíduos em uso de psicotrópicos e outros medicamentos de uso contínuo.
5. CONCLUSÃO
A polifarmácia tem se mostrado um fenômeno recorrente em diversos contextos clínicos, especialmente entre pacientes com comorbidades psiquiátricas e crônicas. Os resultados deste estudo evidenciam que o uso simultâneo de múltiplos medicamentos, muitas vezes indispensável para o controle das doenças, está diretamente associado a riscos como interações medicamentosas, efeitos adversos graves e maior vulnerabilidade a eventos cardiovasculares e metabólicos. A presença de doenças crônicas, como hipertensão arterial e diabetes mellitus, combinada ao uso de psicofármacos, reforça a necessidade de um acompanhamento contínuo e de estratégias eficazes para minimizar os impactos negativos da polifarmácia.
Além disso, foi possível identificar que a polifarmácia está relacionada a fatores como envelhecimento populacional, aumento da prevalência de transtornos psiquiátricos e maior disponibilidade de psicotrópicos na prática clínica. No entanto, os achados também indicam que a falta de monitoramento adequado pode comprometer a segurança do paciente, agravando quadros clínicos e aumentando a incidência de hospitalizações. A individualização do tratamento e a revisão periódica das prescrições surgem como medidas essenciais para reduzir riscos e garantir uma abordagem terapêutica mais segura.
Divergências encontradas na literatura reforçam que, embora a polifarmácia seja frequentemente associada a eventos adversos, seu impacto pode ser mitigado por meio de intervenções adequadas, como o acompanhamento multiprofissional e o fortalecimento da atenção farmacêutica. A implementação de serviços especializados em gestão medicamentosa, especialmente em instituições de longa permanência e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), é fundamental para otimizar a prescrição de psicofármacos e reduzir riscos de interações prejudiciais.
Dessa forma, conclui-se que a polifarmácia, quando bem gerenciada, pode ser uma ferramenta indispensável para a estabilização de condições psiquiátricas e crônicas. Investir em educação em saúde, programas de desprescrição e políticas de uso racional de medicamentos é essencial para minimizar os impactos adversos da polifarmácia e garantir uma melhor qualidade de vida para os pacientes. Estudos futuros são necessários para aprofundar a compreensão sobre as melhores estratégias de manejo, considerando as especificidades de cada grupo populacional e os avanços da farmacoterapia.
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