IMPACTOS DO EXERCÍCIO FÍSICO NOS MECANISMOS NEUROBIOLÓGICOS DA DOENÇA DE ALZHEIMER

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202504211114


Rafael Serafim Pinto1,2
Luan Pereira Diniz3


RESUMO 

A Doença de Alzheimer (DA) é a forma mais prevalente de demência no mundo e caracteriza-se por um processo neurodegenerativo progressivo, com prejuízos cognitivos, funcionais e comportamentais. Diante da limitação das terapias farmacológicas disponíveis, o exercício físico tem emergido como uma estratégia não farmacológica promissora, capaz de modular diversos aspectos da fisiopatologia da DA. Esta revisão tem como objetivo discutir os efeitos do exercício físico sobre os mecanismos celulares e moleculares da DA, bem como avaliar as evidências oriundas de estudos pré-clínicos e clínicos. Os achados indicam que o exercício contribui para a redução da inflamação e do estresse oxidativo, estimula a biogênese mitocondrial, aumenta a expressão de neurotrofinas como o BDNF e promove a neurogênese. Além disso, ensaios clínicos demonstram benefícios cognitivos e funcionais em indivíduos com comprometimento cognitivo leve e DA em estágios iniciais. Apesar das evidências positivas, ainda existem limitações metodológicas importantes que demandam investigações mais robustas. Conclui-se que o exercício físico representa uma ferramenta promissora na prevenção e no tratamento da DA, devendo ser incluído em estratégias terapêuticas integradas. 

Palavras-chave: Doença de Alzheimer; Exercício físico; Neuroproteção; Neuroinflamação; Cognição. 

ABSTRACT 

Alzheimer’s disease (AD) is the most prevalent form of dementia worldwide and is characterized by a progressive neurodegenerative process that leads to cognitive, functional, and behavioral impairments. Given the limited efficacy of available pharmacological treatments, physical exercise has emerged as a promising nonpharmacological strategy capable of modulating several aspects of AD pathophysiology. This review aims to discuss the effects of physical exercise on the cellular and molecular mechanisms of AD, as well as to evaluate the evidence from preclinical and clinical studies. The findings indicate that exercise reduces inflammation and oxidative stress, stimulates mitochondrial biogenesis, increases the expression of neurotrophic factors such as BDNF, and promotes neurogenesis. Moreover, clinical trials show cognitive and functional benefits in individuals with mild cognitive impairment and early-stage AD. Despite the positive evidence, significant methodological limitations remain, requiring more robust investigations. In conclusion, physical exercise represents a promising tool for the prevention and treatment of AD and should be incorporated into integrated therapeutic strategies. 

Keywords: Alzheimer’s disease; Physical exercise; Neuroprotection; Neuroinflammation; Cognition. 

1. INTRODUÇÃO 

A Doença de Alzheimer (DA) é a forma mais comum de demência, representando cerca de 60 a 70% dos casos, e constitui um importante problema de saúde pública global, sobretudo em países com envelhecimento populacional acelerado, como o Brasil (WHO, 2021). Caracteriza-se por um declínio progressivo das funções cognitivas, comprometendo memória, linguagem, raciocínio e, em estágios avançados, a autonomia funcional do indivíduo (MCKHANN et al., 2011). 

Os mecanismos fisiopatológicos da DA incluem a deposição extracelular de placas de peptídeo beta-amiloide (Aβ), a formação intraneuronal de emaranhados neurofibrilares compostos por proteína tau hiperfosforilada, neuroinflamação, disfunção mitocondrial e estresse oxidativo (HARDY; SELKOE, 2002; HENRIKSSON; CHENG, 2021). Apesar dos avanços em terapias farmacológicas, os tratamentos disponíveis ainda apresentam eficácia limitada, reforçando a necessidade de estratégias complementares ou preventivas que sejam acessíveis, seguras e de baixo custo. 

Nesse contexto, o exercício físico tem emergido como uma intervenção promissora na prevenção e manejo da DA. Diversas evidências demonstram que a prática regular de atividades físicas está associada a menor risco de desenvolvimento da doença, bem como à melhora de parâmetros cognitivos e de qualidade de vida em pacientes diagnosticados (BAKER et al., 2010; ERICKSON et al., 2011). 

O exercício físico pode modular diversos processos biológicos implicados na fisiopatologia da DA, como a neuroinflamação, a plasticidade sináptica, a biogênese mitocondrial e a expressão de neurotrofinas, como o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) (COTMAN; BERCHTOLD, 2002; INTLEKOFER; COTMAN, 2013). Assim, a compreensão dos efeitos do exercício sobre os mecanismos celulares e moleculares da DA pode contribuir para o desenvolvimento de intervenções integrativas mais eficazes. 

Dessa forma, o presente trabalho tem como objetivo revisar criticamente as evidências disponíveis na literatura sobre os efeitos do exercício físico nos aspectos clínicos, fisiológicos e moleculares da Doença de Alzheimer, destacando os principais mecanismos envolvidos, limitações dos estudos atuais e perspectivas para futuras investigações. 

2. FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA DE ALZHEIMER 

A Doença de Alzheimer é caracterizada por um processo neurodegenerativo progressivo que afeta inicialmente o hipocampo e, posteriormente, outras regiões corticais responsáveis por funções cognitivas superiores (MORRISON; BAXTER, 2012). Os principais marcos patológicos da DA incluem a deposição extracelular de placas senis compostas pelo peptídeo beta-amiloide (Aβ), a formação intraneuronal de emaranhados neurofibrilares de proteína tau hiperfosforilada e a perda sináptica generalizada (HARDY; SELKOE, 2002). 

A hipótese amiloide propõe que o acúmulo anormal do Aβ, especialmente da forma oligomérica solúvel Aβ42, é o evento inicial que desencadeia uma cascata de eventos neurotóxicos, incluindo ativação microglial, estresse oxidativo, disfunção mitocondrial e, por fim, morte neuronal (SELKOE; HARDY, 2016). Esse peptídeo é gerado a partir da clivagem da proteína precursora amiloide (APP) pelas secretases β e γ, um processo exacerbado em condições genéticas ou ambientais desfavoráveis. 

Paralelamente, a proteína tau sofre hiperfosforilação e se acumula em forma de emaranhados neurofibrilares, contribuindo para a desorganização do citoesqueleto neuronal e o colapso do transporte axonal (BRION, 1998). A presença desses emaranhados está fortemente associada à gravidade da disfunção cognitiva, sendo considerada um marcador mais diretamente relacionado à perda neuronal (BUEE et al., 2000). 

Outro fator central na fisiopatologia da DA é a disfunção mitocondrial, evidenciada pela redução da atividade dos complexos da cadeia respiratória, aumento na produção de espécies reativas de oxigênio (ROS) e prejuízos na biogênese mitocondrial (SQUITIERI; PETRUCCI; RIGGIO, 2010). Esses eventos culminam em estresse oxidativo, comprometimento energético e apoptose neuronal. 

Além disso, há um componente inflamatório significativo na DA, caracterizado pela ativação de astrócitos e microglia, que passam a secretar citocinas pró-inflamatórias, como IL-1β, TNF-α e IL-6, perpetuando o ciclo de neurodegeneração (HENRY et al., 2009). A cronicidade dessa resposta inflamatória afeta negativamente a plasticidade sináptica e contribui para o agravamento dos déficits cognitivos. 

A inter-relação entre esses diversos mecanismos – acúmulo de Aβ, disfunção tau, inflamação, estresse oxidativo e perda sináptica – resulta na deterioração progressiva das funções cognitivas e comportamentais observadas na DA. 

3. TIPOS DE EXERCÍCIO FÍSICO E SEUS EFEITOS GERAIS NO SISTEMA NERVOSO CENTRAL 

O exercício físico é uma intervenção não farmacológica capaz de promover múltiplos benefícios ao sistema nervoso central (SNC), atuando sobre circuitos neuronais, sinapses, processos inflamatórios e funções cognitivas (HILLMAN; ERICKSON; KRAMER, 2008). Diferentes modalidades de exercício – como aeróbico, resistido e multicomponente – parecem produzir efeitos distintos, mas complementares, sobre a saúde cerebral. 

3.1 Exercício Aeróbico 

O exercício aeróbico, caracterizado por atividades de longa duração e intensidade moderada, como caminhar, correr ou pedalar, é a modalidade mais estudada em relação à cognição. Diversos estudos demonstram que ele promove neurogênese no hipocampo, aumenta a perfusão cerebral e estimula a liberação de fatores neurotróficos como o BDNF (fator neurotrófico derivado do cérebro), contribuindo para a plasticidade sináptica e a manutenção da memória (PEREIRA et al., 2007; ERICKSON et al., 2011). 

Além disso, o exercício aeróbico reduz marcadores inflamatórios sistêmicos e melhora a função endotelial, facilitando a oxigenação e nutrição do tecido cerebral (COLCOMBE et al., 2006). 

3.2 Exercício de Resistência 

O exercício resistido, como a musculação, também tem sido associado a benefícios cognitivos, especialmente em idosos. Ele atua na modulação de hormônios anabólicos como o IGF-1 (fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1), que apresenta efeitos neuroprotetores e participa da plasticidade neuronal (CASSILHAS et al., 2007). Estudos também mostram que essa modalidade contribui para a manutenção da integridade da substância branca cerebral e melhora funções executivas. 

3.3 Exercício Multicomponente 

Programas que combinam diferentes tipos de exercício, como o treino funcional, que envolve componentes aeróbicos, de força, equilíbrio e coordenação, têm demonstrado resultados promissores, sobretudo em populações com comprometimento cognitivo leve (Cognitive Impairment – MCI). Essa abordagem integrada favorece ganhos cognitivos mais amplos e pode ser mais eficaz na prevenção da progressão para a Doença de Alzheimer (GHEZALY et al., 2019). 

No geral, as adaptações neurais induzidas pelo exercício físico incluem aumento do volume hipocampal, melhoria da conectividade funcional em redes corticais e fortalecimento das funções cognitivas, como atenção, memória e função executiva, especialmente relevantes no contexto da DA (VOSS et al., 2013). 

4. EVIDÊNCIAS DOS BENEFÍCIOS DO EXERCÍCIO FÍSICO NA DOENÇA DE ALZHEIMER 

A literatura científica apresenta um número crescente de evidências indicando que o exercício físico regular pode atenuar os déficits cognitivos, reduzir biomarcadores patológicos e melhorar aspectos estruturais e funcionais do cérebro em indivíduos com Doença de Alzheimer (DA) ou em risco de desenvolvê-la. Esses achados são derivados tanto de estudos experimentais em modelos animais quanto de ensaios clínicos com seres humanos. 

4.1 Estudos Pré-clínicos (Modelos Animais) 

Modelos murinos transgênicos de DA, como os ratos APP/PS1, têm sido amplamente utilizados para investigar os efeitos neurobiológicos do exercício. Resultados consistentes demonstram que o exercício voluntário em roda ou forçado (esteira) pode reduzir a deposição de placas beta-amiloides no hipocampo e no córtex, além de modular a expressão da proteína tau (ADLARD et al., 2005; YAN et al., 2013). 

Além disso, há melhora da memória espacial e do desempenho em tarefas como o labirinto em Y e o labirinto de água de Morris. O exercício também promove aumento da neurogênese no giro denteado, aumento de BDNF, redução da inflamação microglial e melhora da função mitocondrial (KOHMAN et al., 2010; CHO et al., 2015). 

Tais achados reforçam a ideia de que a atividade física pode atuar diretamente sobre vias fisiopatológicas da DA, sendo uma estratégia promissora para modulação da progressão da doença. 

4.2 Estudos Clínicos (Em Humanos) 

Ensaios clínicos randomizados e estudos observacionais vêm demonstrando que o exercício físico é capaz de promover ganhos cognitivos em indivíduos com comprometimento cognitivo leve (MCI) ou diagnóstico de DA em estágios iniciais. Em estudo clássico, Baker et al. (2010) mostraram que um programa de exercício aeróbico de seis meses resultou em melhora da memória e atenção em idosos com MCI, além de alterações benéficas em biomarcadores como insulina e cortisol. 

Erickson et al. (2011) observaram que a prática de caminhada por 12 meses foi capaz de aumentar o volume do hipocampo e melhorar o desempenho em testes de memória em adultos mais velhos sem demência. Outros estudos revelam que o exercício pode estabilizar ou até melhorar o desempenho cognitivo em pacientes com DA leve a moderada, especialmente em domínios como atenção, função executiva e velocidade de processamento (GROOT et al., 2016). 

Além dos efeitos cognitivos, o exercício também melhora aspectos emocionais e comportamentais, como depressão e apatia, com impacto positivo na qualidade de vida dos pacientes e cuidadores (TOLLESON et al., 2021). 

No entanto, apesar dos resultados promissores, os estudos variam consideravelmente em termos de desenho, intensidade e duração das intervenções, dificultando a padronização de recomendações clínicas. 

5. MECANISMOS MOLECULARES POSSÍVEIS 

Os efeitos neuroprotetores do exercício físico na Doença de Alzheimer (DA) envolvem uma série de mecanismos moleculares que interagem entre si. Essas adaptações bioquímicas podem modular positivamente a plasticidade sináptica, reduzir processos neuroinflamatórios, melhorar a função mitocondrial e estimular a neurogênese, contribuindo para a manutenção da função cognitiva. 

5.1 Aumento de Neurotrofinas 

Um dos principais mecanismos é o aumento da expressão do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), proteína essencial para a sobrevivência e plasticidade dos neurônios. O BDNF ativa receptores da família TrkB, promovendo o fortalecimento sináptico, a neurogênese e a diferenciação celular, especialmente no hipocampo (COTMAN; BERCHTOLD, 2002). Estudos demonstram que o exercício físico regular aumenta a expressão de BDNF tanto em modelos animais quanto em humanos, sendo esse efeito crucial na modulação da memória e aprendizagem (VOSS et al., 2013). 

5.2 Redução da Inflamação e Estresse Oxidativo 

O exercício físico modula a resposta inflamatória por meio da redução de citocinas pró-inflamatórias (IL-1β, TNF-α, IL-6) e do aumento de citocinas anti-inflamatórias, como IL-10 (WOODS et al., 2012). Esse perfil anti-inflamatório contribui para a preservação da integridade sináptica e inibe a neurodegeneração induzida por processos crônicos. Paralelamente, a atividade física reduz a produção de espécies reativas de oxigênio (ROS) e melhora o sistema antioxidante endógeno, protegendo as células neuronais contra o estresse oxidativo (RADAK et al., 2007). 

5.3 Estímulo à Biogênese Mitocondrial 

Outro aspecto fundamental é o estímulo à biogênese mitocondrial, promovido por vias como a PGC-1α (peroxisome proliferator-activated receptor gamma coactivator 1alpha) e SIRT1 (sirtuína 1), reguladoras da homeostase energética celular. O exercício aumenta a expressão desses fatores, favorecendo o aumento do número e da eficiência das mitocôndrias, o que é particularmente relevante na DA, doença marcada por falência bioenergética (SCARPULLA, 2011; MAZZUCCA et al., 2021). 

5.4 Ativação da Autofagia 

A autofagia é um processo fundamental para a remoção de agregados proteicos tóxicos, como o beta-amiloide e a tau hiperfosforilada. Evidências indicam que o exercício físico ativa vias de sinalização relacionadas à autofagia, como AMPK-mTOR, promovendo a degradação de proteínas mal conformadas e contribuindo para a homeostase proteica no cérebro (HE et al., 2012; TAMMINEN et al., 2020). 

5.5 Melhora da Perfusão Cerebral e Neurogênese 

Além dos mecanismos celulares e moleculares, o exercício físico promove angiogênese, aumento do fluxo sanguíneo cerebral e neurogênese, especialmente em áreas críticas como o hipocampo e o córtex pré-frontal. A melhora da perfusão cerebral favorece o aporte de oxigênio e nutrientes, potencializando a sobrevivência neuronal, a atividade sináptica e o nascimento de novos neurônios — um processo essencial para a plasticidade cerebral e a memória (PEREIRA et al., 2007; ERICKSON et al., 2011). 

6. LIMITAÇÕES DOS ESTUDOS ATUAIS 

Apesar das evidências promissoras sobre os efeitos benéficos do exercício físico na Doença de Alzheimer (DA), os estudos disponíveis apresentam uma série de limitações metodológicas e conceituais que dificultam a generalização dos resultados e a formulação de diretrizes clínicas baseadas em evidências sólidas. 

6.1 Heterogeneidade dos Protocolos de Exercício 

Uma das principais limitações refere-se à grande variabilidade nos protocolos de intervenção utilizados. Estudos diferem em relação ao tipo de exercício (aeróbico, resistido ou multicomponente), intensidade, frequência, duração das sessões e tempo total da intervenção. Essa heterogeneidade impede comparações diretas e dificulta a identificação da “dose-resposta” ideal para populações com DA (FORBES et al., 2015). 

6.2 Diferenças nos Perfis dos Participantes 

As amostras utilizadas nos estudos variam amplamente quanto à idade, sexo, nível de escolaridade, estado cognitivo basal, comorbidades e estágio da doença. Além disso, muitos ensaios incluem indivíduos com comprometimento cognitivo leve (MCI) e não pacientes com diagnóstico clínico confirmado de DA, o que pode afetar a interpretação dos efeitos do exercício especificamente sobre a patologia da doença (GROOT et al., 2016). 

6.3 Dificuldades de Adesão e Controle de Variáveis 

Em populações idosas e com demência, manter a adesão a programas de exercício físico pode ser desafiador. Fatores como limitações físicas, sintomas comportamentais, apoio familiar e acesso a ambientes seguros interferem diretamente na continuidade e na eficácia das intervenções (SILVA et al., 2019). Além disso, poucos estudos controlam adequadamente variáveis como alimentação, medicações, engajamento social e outros fatores que podem influenciar os resultados cognitivos e funcionais. 

6.4 Ausência de Biomarcadores Padronizados 

Embora alguns estudos já tenham incluído medidas de biomarcadores, como BDNF, cortisol, beta-amiloide ou tau no líquido cefalorraquidiano, ainda não há padronização quanto aos métodos de coleta, análise e interpretação desses dados. A ausência de consenso dificulta a validação de mecanismos fisiológicos propostos e limita a aplicação clínica dos achados (LÖVDÉN et al., 2020). 

6.5 Curta Duração e Seguimento Limitado 

Muitos estudos apresentam curta duração (entre 3 e 6 meses) e não realizam acompanhamento longitudinal após o fim da intervenção. Assim, é difícil determinar se os efeitos benéficos observados são sustentáveis a longo prazo ou se requerem manutenção contínua da atividade física (BLUMENTHAL et al., 2019). 

Essas limitações evidenciam a necessidade de ensaios clínicos mais robustos, com amostras maiores, seguimento prolongado, intervenções bem delineadas e inclusão de desfechos clínicos e biológicos padronizados. Tais avanços são fundamentais para consolidar o exercício físico como parte integrante das estratégias terapêuticas para a DA. 

7. PERSPECTIVAS FUTURAS E RECOMENDAÇÕES 

À luz das evidências disponíveis, torna-se evidente o potencial do exercício físico como uma intervenção adjuvante na prevenção e no manejo da Doença de Alzheimer (DA). No entanto, para que essa abordagem seja incorporada de forma efetiva nas diretrizes clínicas, é necessário avançar em diversas frentes de pesquisa e formulação de políticas públicas. 

7.1 Ensaios Clínicos Robustos e Longitudinais 

Futuros estudos devem priorizar ensaios clínicos randomizados com amostras maiores, protocolos de exercício padronizados e seguimento prolongado, permitindo avaliar os efeitos sustentados da intervenção. A inclusão de medidas multimodais, como neuroimagem funcional, biomarcadores no sangue ou líquor e avaliações neuropsicológicas detalhadas, é essencial para compreender os mecanismos de ação e os benefícios a longo prazo (LÖVDÉN et al., 2020; BARNES et al., 2013). 

7.2 Personalização das Intervenções 

Considerando a heterogeneidade dos pacientes com DA, estratégias personalizadas que considerem o estágio da doença, condições clínicas associadas, preferências individuais e limitações físicas devem ser desenvolvidas. A prescrição de exercício deve ser adaptada à realidade funcional do paciente, com monitoramento multidisciplinar, envolvendo educadores físicos, fisioterapeutas, neurologistas e cuidadores (LAMB et al., 2018). 

7.3 Integração com Outras Abordagens Terapêuticas 

Programas que combinem exercício físico com outras intervenções, como dieta equilibrada, estimulação cognitiva, terapia ocupacional e manejo farmacológico adequado, podem apresentar efeitos sinérgicos na preservação da cognição e na melhora da qualidade de vida (NGANDU et al., 2015). O modelo multimodal deve ser incentivado, sobretudo em centros de reabilitação cognitiva. 

7.4 Educação, Acesso e Políticas Públicas 

É fundamental ampliar o acesso da população idosa a espaços seguros e orientados para a prática de atividade física, especialmente em países em desenvolvimento. Campanhas educativas voltadas para cuidadores, profissionais de saúde e a população em geral podem contribuir para maior adesão a programas de exercício como parte do cuidado cotidiano (WHO, 2019). 

Adicionalmente, a inclusão de diretrizes baseadas em evidências em políticas de saúde pública pode favorecer o financiamento de programas comunitários, com impacto positivo na prevenção da DA e na redução da carga econômica associada à demência. 

8. CONCLUSÃO 

A Doença de Alzheimer representa um dos maiores desafios da medicina contemporânea, especialmente diante do envelhecimento populacional e da limitação das terapias farmacológicas disponíveis. Nesse contexto, o exercício físico surge como uma estratégia terapêutica não invasiva, segura, acessível e com efeitos abrangentes sobre os múltiplos domínios afetados pela doença. 

Os dados revisados indicam que a prática regular de atividade física é capaz de modular positivamente os mecanismos fisiopatológicos da DA, atuando sobre a inflamação, o estresse oxidativo, a função mitocondrial, a neurogênese e a plasticidade sináptica. Tais efeitos são mediadores potenciais da melhora cognitiva observada em estudos pré-clínicos e clínicos, além de impactarem de forma favorável a funcionalidade e a qualidade de vida dos indivíduos. 

Apesar dos avanços, há necessidade de padronização dos protocolos de exercício, personalização das intervenções, ampliação dos estudos longitudinais e integração com outras abordagens terapêuticas. As perspectivas futuras apontam para a consolidação do exercício físico como parte essencial de programas multidisciplinares de prevenção e tratamento da DA. 

Assim, promover a atividade física ao longo do curso da vida não apenas contribui para a saúde cerebral, mas também representa um investimento estratégico para a redução da carga global da demência. 

REFERÊNCIAS  

ADLARD, P. A. et al. Voluntary exercise decreases amyloid load in a transgenic model of Alzheimer’s disease. The Journal of Neuroscience, v. 25, n. 17, p. 4217–4221, 2005. BAKER, L. D. et al. Effects of aerobic exercise on mild cognitive impairment: a controlled trial. Archives of Neurology, v. 67, n. 1, p. 71–79, 2010. 

BARNES, D. E. et al. The mental activity and exercise (MAX) trial: a randomized controlled trial to enhance cognitive function in older adults. JAMA Internal Medicine, v. 173, n. 9, p. 797–804, 2013. 

BLUMENTHAL, J. A. et al. Exercise and pharmacotherapy in the treatment of major depressive disorder. Psychosomatic Medicine, v. 81, n. 3, p. 295–305, 2019. 

BRION, J. P. Neurofibrillary tangles and Alzheimer’s disease. European Neurology, v. 40, n. 3, p. 130–140, 1998. 

BUEE, L. et al. Tau protein isoforms, phosphorylation and role in neurodegenerative disorders. Brain Research Reviews, v. 33, n. 1, p. 95–130, 2000. 

CASSILHAS, R. C. et al. Resistance exercise induces protective effects on cognition function in aging rats. Neurobiology of Aging, v. 28, n. 4, p. 634–640, 2007. 

CHO, J. et al. Effects of treadmill exercise on PI3K/AKT/GSK-3β signaling in rats with amyloid beta-induced Alzheimer’s disease. Neuroscience Letters, v. 591, p. 122–127, 2015. 

COLCOMBE, S. J. et al. Aerobic exercise training increases brain volume in aging humans. The Journals of Gerontology: Series A, v. 61, n. 11, p. 1166–1170, 2006.

COTMAN, C. W.; BERCHTOLD, N. C. Exercise: a behavioral intervention to enhance brain health and plasticity. Trends in Neurosciences, v. 25, n. 6, p. 295–301, 2002.

ERICKSON, K. I. et al. Exercise training increases size of hippocampus and improves memory. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 108, n. 7, p. 3017–3022, 2011. 

FORBES, D. et al. Exercise programs for people with dementia. Cochrane Database of Systematic Reviews, v. 4, CD006489, 2015. 

GHEZALY, S. et al. Multicomponent exercise interventions for older adults with cognitive impairment: A systematic review. Archives of Gerontology and Geriatrics, v. 83, p. 196–204, 2019. 

GROOT, C. et al. Effects of physical activity on cognitive function in patients with dementia: a meta-analysis. Ageing Research Reviews, v. 25, p. 13–23, 2016.

HARDY, J.; SELKOE, D. J. The amyloid hypothesis of Alzheimer’s disease: progress and problems on the road to therapeutics. Science, v. 297, n. 5580, p. 353–356, 2002. HE, C. et al. Exercise-induced BCL2-regulated autophagy is required for muscle glucose homeostasis. Nature, v. 481, n. 7382, p. 511–515, 2012. 

HENRIKSSON, R.; CHENG, W. The role of mitochondria in Alzheimer’s disease. Journal of Neurology and Neuroscience, v. 12, n. 2, 2021. 

HENRY, C. J. et al. Inflammation and aging: changes in the immune response with age. Nature Reviews Immunology, v. 9, n. 5, p. 316–326, 2009. 

HILLMAN, C. H.; ERICKSON, K. I.; KRAMER, A. F. Be smart, exercise your heart: exercise effects on brain and cognition. Nature Reviews Neuroscience, v. 9, n. 1, p. 58– 65, 2008. 

INTLEKOFER, K. A.; COTMAN, C. W. Exercise counteracts declining hippocampal function in aging and Alzheimer’s disease. Neurobiology of Disease, v. 57, p. 47–55, 2013. 

KOHMAN, R. A. et al. Neurogenesis, inflammation and behavior. Brain, Behavior, and Immunity, v. 24, n. 5, p. 693–700, 2010. 

LAMB, S. E. et al. Dementia and physical activity (DAPA) trial of moderate to high intensity exercise training for people with dementia: randomised controlled trial. BMJ, v. 361, k1675, 2018. 

LÖVDÉN, M. et al. Physical activity and brain integrity in older adults: the Cardiovascular Health Study. Neurology, v. 95, n. 12, p. e1612–e1623, 2020.

MAZZUCCA, S. et al. Physical exercise and mitochondrial function in aging and neurodegenerative diseases. Frontiers in Neuroscience, v. 15, p. 660504, 2021.

MCKHANN, G. M. et al. The diagnosis of dementia due to Alzheimer’s disease: recommendations from the National Institute on Aging-Alzheimer’s Association workgroups. Alzheimer’s & Dementia, v. 7, n. 3, p. 263–269, 2011. 

MORRISON, J. H.; BAXTER, M. G. The ageing cortical synapse: hallmarks and implications for cognitive decline. Nature Reviews Neuroscience, v. 13, n. 4, p. 240– 250, 2012. 

NGANDU, T. et al. A 2-year multidomain intervention of diet, exercise, cognitive training, and vascular risk monitoring versus control to prevent cognitive decline in atrisk elderly people (FINGER): a randomised controlled trial. The Lancet, v. 385, n. 9984, p. 2255–2263, 2015. 

PEREIRA, A. C. et al. An in vivo correlate of exercise-induced neurogenesis in the adult dentate gyrus. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 104, n. 13, p. 5638–5643, 2007. 

RADAK, Z. et al. Exercise and hormesis: oxidative stress-related adaptation through exercise. Free Radical Biology and Medicine, v. 42, n. 2, p. 90–96, 2007. 

SCARPULLA, R. C. Metabolic control of mitochondrial biogenesis through the PGC-1 family regulatory network. Biochimica et Biophysica Acta – Molecular Cell Research, v. 1813, n. 7, p. 1269–1278, 2011. 

SELKOE, D. J.; HARDY, J. The amyloid hypothesis of Alzheimer’s disease at 25 years. EMBO Molecular Medicine, v. 8, n. 6, p. 595–608, 2016. 

SILVA, F. C. et al. Barreiras e facilitadores para a prática de atividade física em idosos com demência: revisão sistemática. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, v. 22, n. 5, p. e190068, 2019. 

SQUITIERI, F.; PETRUCCI, S.; RIGGIO, M. Mitochondrial dysfunction in neurodegenerative diseases: the lesson from Huntington’s disease. Brain Research Bulletin, v. 80, n. 4-5, p. 197–203, 2010. 

TAMMINEN, N. et al. The effects of physical exercise on brain-derived neurotrophic factor and neurodegeneration in Alzheimer’s disease: a systematic review. Journal of Alzheimer’s Disease, v. 75, n. 3, p. 751–768, 2020. 

TOLLESON, S. et al. Effects of physical activity on neuropsychiatric symptoms in Alzheimer’s disease: a systematic review. The American Journal of Geriatric Psychiatry, v. 29, n. 6, p. 556–570, 2021. 

VOSS, M. W. et al. Exercise, brain, and cognition across the life span. Journal of Applied Physiology, v. 111, n. 5, p. 1505–1513, 2013. 

WHO – WORLD HEALTH ORGANIZATION. Dementia. Geneva: WHO, 2021. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/dementia. Acesso em: 25 mar. 2025. 

WHO – WORLD HEALTH ORGANIZATION. Risk reduction of cognitive decline and dementia: WHO guidelines. Geneva: WHO, 2019. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/risk-reduction-of-cognitive-decline-anddementia. Acesso em: 25 mar. 2025.

YAN, J. J. et al. Treadmill exercise prevents decline of hippocampal neurogenesis and memory function in APP/PS1 transgenic mice. Neuroscience Research, v. 77, n. 3, p. 99–109, 2013.


1Instituto Nacional do Câncer (INCA).
2Instituto de Educação Médica (IDOMED).
3Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Autor Correspondente: Dr. Luan Diniz: luan@icb.ufrj.br Instituto de Ciências Biomédicas Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde, Bloco F, 2º andar, sala 26, Ilha do Fundão 21941-902 – Rio de Janeiro, RJ, BRASIL