REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202504091728
Camila Gomes Saldanha; Clautennys Liane Santos Lopes; Emily Lorrane Guimarães Castro; Joaquim Valério da Silva Neto; Yara Nadria de Brito Costa; Orientador(a): Prof.Esp. Clidenor Uchôa Prado Paz; Orientador(a): Prof. Ms. Carlos Antonio da Luz Filho.
RESUMO: INTRODUÇÃO: A dor é uma experiência sensorial e emocional complexa, e a dor lombar crônica se destaca como uma de suas manifestações mais comuns, afetando significativamente a capacidade funcional e a participação no trabalho em níveis nacionais e internacionais. No âmbito da fisioterapia, a terapia cognitiva funcional (CFT) surge como uma abordagem terapêutica promissora para o manejo e a melhoria da qualidade de vida de indivíduos que sofrem com dor lombar crônica. OBJETIVO: Realizar uma revisão integrativa da literatura científica para sintetizar as evidências disponíveis sobre os efeitos da terapia cognitiva funcional no tratamento da dor lombar crônica inespecífica. MÉTODO: A estratégia de busca para a seleção dos artigos, em inglês e português, consiste na combinação dos termos “Lower back pain” AND “Chronic” OR “Nonspecific” AND “Cognitive Functional Therapy” nas bases de dados PubMed, Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e ScienceDirect.RESULTADOS: Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, foram selecionados 7 artigos publicados entre 2020 e 2025, a partir de um total inicial de 43. DISCUSSÃO: Uma análise dos 7 estudos incluídos nesta revisão revelou que a terapia cognitiva funcional é eficaz no tratamento da dor lombar crônica inespecífica, promovendo uma redução significativa da incapacidade funcional e melhorias nos níveis de medo e ansiedade associados à condição. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Os resultados desta revisão integrativa destacam a importância da terapia cognitiva funcional e seus benefícios na otimização da funcionalidade em pacientes com dor lombar crônica inespecífica, especialmente quando comparados a outras intervenções terapêuticas. No entanto, sublinha-se a necessidade de investigações futuras para aprofundar o conhecimento e consolidar as evidências sobre a aplicação do CFT nesse contexto.
Palavras chaves: Dor, lombar, crônica, Terapia cognitiva comportamental.
INTRODUÇÃO
A Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) descreve a dor como uma experiência sensorial e emocional desagradável relacionada ou semelhante àquela associada a dano tecidual real ou potencial (Raja, 2020). Embora não ocorra um tempo claro de quando a dor aguda se torna crônica, é normalmente aceitável que a dor que persiste acima do período de cicatrização esperado de 3 meses de acordo com a Classificação Internacional de Doenças seja considerada patológica (Treede, 2019).
Clauw (2019), destaca que os fatores predisponentes e as consequências da dor crônica são bem conhecidos, mas o outro lado é que fatores que promovem resiliência, como a rede de apoio emocional e boa saúde, podem promover a cura e reduzir a cronificação da dor. Ao enfrentar a dor crônica como uma doença, os pacientes e os profissionais da saúde podem mudar as suas expectativas de erradicação do problema para controlá-lo (isto é, reparação funcional e emocional).
Dentre os vários tipos de dor crônica que podem acometer o corpo humano podemos citar a dor lombar (DL) sendo uma das principais queixas, que pode ser originada por fatores como inflamação, degeneração ou lesão. A sensibilização central e as mudanças sistêmicas tornaram-se fatores patológicos importantes para a persistência e agravamento da DL (Ohtori, 2015). Essa dor relaciona-se à dor anatomicamente localizada entre as margens da 12ª costela e as pregas glúteas, com ou sem ciática (Knezevic, 2021), sendo classificada globalmente como a principal causa de incapacidade que aparece durante a adolescência, crescendo para a idade adulta (Vos, 2010).
A dor lombar crônica (DLC) é geralmente descrita como uma experiência sensorial desagradável, atualmente é a principal causa de incapacidade com um significativo impacto social e econômico em todo o mundo. Há fortes evidências de que a dor lombar crônica está associada com uma complexa interação de fatores biopsicossociais (Castro,2022). Segundo algumas pesquisas entre 80% a 90% dos pacientes com DL queixam-se de dor lombar inespecífica. No entanto, como os fatores patológicos ou causadores de dor subjacentes ainda não foram determinados, o desenvolvimento de terapias eficazes é limitado (Vlaeyen,2018).
Ademais é importante considerar a influência dos fatores comportamentais. Logo uma interpretação mal compreendida em relação a dor como sinal de dano físico muitas vezes leva a comportamentos de medo, ansiedade e evitação em realizar os movimentos que, por sua vez provocam um ciclo vicioso de proteção, incapacidade e intensificação da dor (Vlaeyen JWS, 2012). Um modelo que realiza essa abordagem é o modelo biopsicossocial em que presume a dor e a incapacidade como interações multifatoriais e dinâmicas entre os fatores biológicos, psicológicos e sociais que se influenciam reciprocamente (Meints, 2018).
Uma abordagem eficaz que integra esse modelo é a Terapia Funcional Cognitiva (CFT), que surgiu da combinação de psicologia comportamental e neurociência dentro da prática fisioterapêutica, focada na natureza multidimensional da dor lombar (O’Keeffe, 2015; O’Sullivan, 2018). Sendo uma abordagem inovadora que tem mostrado boas soluções no tratamento da dor lombar crônica inespecífica, combinando a reeducação dos padrões de movimento com intervenções cognitivas e comportamentais, visando modificar crenças e comportamentos disfuncionais associadas à dor (O’Sullivan, 2018).
Estudos apontam que a CFT é eficaz na redução da incapacidade funcional, aprimorando a qualidade de vida e aliviando sintomas psicológicos, como a ansiedade e depressão, com efeitos duradouros, tornando-se superior em alguns casos às terapias convencionais, como exercícios manuais e educação sobre dor (Vibe, 2013). A técnica também emprega a exposição gradual aos movimentos, com controle de feedback visual e tátil, possibilitando ao paciente retomar atividades sem dor e medo (Carneiro, 2015).
A importância deste estudo reside na necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a eficácia das diferentes abordagens e suas implicações para o tratamento da dor lombar crônica inespecífica com o objetivo de apresentar o impacto de uma intervenção biopsicossocial, especificamente, a Terapia Cognitiva Funcional no tratamento da DLI através da análise crítica das técnicas disponíveis e da avaliação dos resultados clínicos disponíveis na literatura.
MÉTODO
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura. Logo, o levantamento dos artigos para formar esta revisão ocorreu por meio das bases de dados da PubMed, Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), ScienceDirect. Além do que, desenvolveu-se as combinações dos descritores e termos alternativos associados aos operadores booleanos AND e OR, que proporcionaram obter maior propriedade no levantamento bibliográfico. Dessa forma, estruturou-se a seguinte estratégia de busca para os artigos em inglês/português: (Lower back pain) AND (Chronicle) OR (Nonspecific) AND (Cognitive functional therapy).
Nesse sentido, os critérios de inclusão adotados para a seleção dos artigos foram os seguintes: artigos primários, disponíveis na íntegra, publicados no recorte temporal de 2020 a 2025, e que estejam nos idiomas: português e inglês. Os critérios utilizados para exclusão foram: estudos que não respondessem à questão norteadora e estudos de revisão narrativa de literatura/revisão tradicional. Além do mais, destaca-se que os artigos duplicados foram contabilizados somente uma vez.
RESULTADOS
Foram selecionados 43 artigos, dos quais, após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão previamente prevista, 7 foram escolhidos. Em seguida, foi realizado leitura detalhada dos artigos selecionados para aprimorar o desenvolvimento da pesquisa. Na etapa seguinte, elaboramos um esquema de trabalho e iniciamos a redação. Esta pesquisa proporcionou contribuições e conhecimentos valiosos sobre o tema em questão.
A análise dos artigos selecionados, foi realizada dentro do escopo desta revisão integrativa. Os dados correspondentes ao período analisado estão apresentados no quadro 1, que inclui os seguintes itens: autores, ano de publicação, características da amostra, tipo de intervenção, principais variáveis encontradas e resultados obtidos.
Quadro 1. Extração de dados dos artigos selecionados quanto aos autores, ano, característica da amostra, tipo de intervenção, principais variáveis analisadas e resultados.
AUTOR ES/ANO | TIPO DE ESTUDO | CARACTERÍSTIC AS DA AMOSTRA | TIPO DE INTERVENÇÃO | PRINCIPAIS VARIÁVEIS ANALISADAS | RESULTADOS | |
01. | Ussing K, 2020 | Caso controle | População: 39 pacientes receberam Terapia Funcional Cognitiva (CFT) e foram comparados a 185 pacientes do grupo de cuidados habituais. | CFT: educação sobre a dor, exposição gradual ao movimento e mudanças no estilo de vida. Grupo controle: fisioterapia convencional, medicação e possíveis encaminhamentos para reabilitação. | Avaliação da Incapacidade dor lombar e na perna, catastrofização, ansiedade, medo do movimento, depressão, qualidade de vida e satisfação com o tratamento. | Aos 6 meses, CFT reduziu incapacidade (RMDQ -20,7, p < 0.001) e melhorou dor, medo e ansiedade. Aos 12 meses, a dor e o medo se mantiveram melhores, com maior satisfação. |
02. | H.B. Vaegter et al. (2025) | Ensaio clínico randomizado. | 176 participantes (88 em cada grupo), pacientes com dor lombar crônica persistente. | Terapia Funcional Cognitiva (CFT) vs. Cuidados habituais. | Avaliação da Incapacidade intensidade da dor, catastrofização da dor, autoeficácia da dor, satisfação com o tratamento. | O grupo CFT+ teve maior melhora no ODI (≥8 pontos), redução do uso de analgésicos, maior satisfação com o tratamento. |
03 | Lira RM, 2024 | Ensaio clínico randomiza do e controlado . | Pacientes em um serviço de saúde pública primária. CFT – N:76 Grupo Sham – N:76 | CFT: foi administrada face a face, individualmente, pragmaticamente e em uma sala terapêutica privada. Grupo Sham: Foram realizados sessões individuais de conversa neutra+equipament o de fotobiomodulação desafinado (terapia a laser de baixa intensidade). | Avaliação da intensidade da dor e incapacidade. | O grupo CFT apresentou maiores melhorias na intensidade da dor e incapacidade. |
04 | Hancock M, 2024 | Análise secundári a do ensaio clínico randomiza do RESTORE | O ensaio foi conduzido em 20 clínicas de atenção primária na Austrália e incluiu 492. Tratamento usual (n = 164) com CFT (n = 164) e CFT mais biofeedback do sensor de movimento (n = 164) | Nos dois grupos de CFT será realizado uma abordagem flexível de raciocínio clínico para identificar movimentos, posturas, cognições relacionadas à dor, emoções e fatores de estilo de vida. No Tratamento usual, as opções de tratamento podem ser qualquer uma daquelas oferecidas pelos profissionais de saúde que o paciente normalmente escolheria consultar na comunidade. | Avaliação a Limitação de atividade, flexibilidade cognitiva, intensidade da dor, autoeficácia e catastrofização. | A CFT foi mais eficaz em relação a limitação de atividade. |
05 | Wernli K, 2022 | Estudo de método misto. | Desenho de caso único existente envolvendo 12 pessoas com LBP incapacitante. | Entrevistas foram conduzidas antes e depois de uma intervenção de Terapia Cognitivo Funcional liderada por fisioterapia de 12 semanas, e descobertas qualitativas destas foram integradas com medidas quantitativas individualizadas de movimento, postura, fatores psicológicos, dor e limitação de atividade. | Avaliação do movimento, postura, fatores psicológicos, dor e limitação de atividade. | Houve melhora ao longo do tempo com menos movimentos protetores e estratégias posturais, retornaram aos padrões automáticos, normais e destemido, esquecendo-se de sua LBP. |
06 | Nazary S, 2023 | Ensaio clínico randomiza do. | Foi designado aleatoriamente 91 pacientes com CNSLBP em grupos de tratamento CFT (n=45) e baseado em MSI (n=46). | Efeitos da interação entre tempo (linha de base vs. pós tratamento vs. acompanhamento de seis meses) e grupo (CFT vs. tratamento baseado em MSI) em cada medida. | Avaliação da Intensidade da dor, incapacidade, cinesiofobia e cinética da marcha. | O CFT mostrou superioridade sobre o tratamento baseado em MSI na redução da intensidade da dor, ODI e Cinesiofobia. O CFT também produziu maior melhora nos parâmetros VGRF, do que o MSI, exceto SPF. |
07 | Britt Lin, 2021 | Estudo clínico controlado randomiza do | Pacientes, entre (18-75 anos), com dor lombar inespecífica por um período de 6 meses.206 alocou para randomização, 106 para terapia cognitiva funcional e 100 exercícios e educação em grupo. | A terapia cognitiva funcional: Entrevista individual e exame físico. Educação e grupo: Intervenção sem entrevista educação em dor, exercícios e relaxamento. | Avaliação da diminuição e melhora da incapacidade funcional e redução na intensidade da dor lombar. | A (CFT) reduziu a incapacidade, mas não da intensidade da dor. |
DISCUSSÃO
A Terapia Cognitiva Funcional (CFT) tem se mostrado eficaz no tratamento da dor lombar crônica inespecífica. O estudo de Ussing et al. (2020) evidenciou uma redução significativa na incapacidade, além de melhorias na dor, medo e ansiedade, com efeitos que se mantiveram por até 12 meses. A personalização da abordagem da CFT foi um dos seus principais pontos fortes, embora o tamanho da amostra e o curto período de acompanhamento sugiram a necessidade de mais investigações.
O estudo de Vaegter et al. (2025) compararam um CFT aprimorada (CFT+) com um modelo interdisciplinar, mostrando melhorias no Índice de Incapacidade de Oswestry (ODI), redução do uso de analgésicos e maior satisfação dos pacientes. No entanto, a falta de detalhes sobre os componentes do CFT+ limita a replicação do protocolo e a generalização dos resultados. Para consolidar sua eficácia, são necessários estudos mais amplos e prolongados.
No estudo realizado por Lira (2024), foi demonstrada a eficácia da CFT, evidenciada por resultados clinicamente significativos na redução da intensidade da dor e na melhoria da incapacidade em comparação com um grupo placebo, após um programa de tratamento de 6 semanas voltado para pessoas com CLBP. O estudo revelou que o incentivo à realização de movimentos e atividades que costumavam ser evitados, aliado a um ambiente tranquilo e a uma compreensão mais clara do contexto da dor, pode levar a um maior envolvimento nas atividades diárias e a uma percepção reduzida de incapacidade.
Lira (2024) também apontou a dificuldade em comparar seus resultados com outros ensaios que avaliaram a CFT em relação a grupos de controle que utilizavam exercícios (Vibe, 2013; O’Keeffe, 2020; Castro, 2022). Embora este seja o primeiro ensaio randomizado e controlado por placebo a investigar a eficácia da CFT em pacientes com CLBP, os resultados obtidos incentivam a sua aplicação na prática clínica.
No ensaio clínico RESTORE, Hancock (2024) identificou benefícios significativos e duradouros da CFT em comparação com os cuidados habituais para pessoas com dor lombar crônica. O estudo enfatiza a importância de reconhecer características dos pacientes que podem estar associadas a uma resposta mais positiva à CFT, especialmente em indivíduos com alta limitação de atividade ou maior intensidade de dor, onde outras intervenções costumam ser menos eficazes.
Para investigar as diferentes respostas à CFT, foram selecionados moderadores potenciais, incluindo Limitação da atividade de base, Flexibilidade cognitiva, Intensidade da dor basal, Autoeficácia e Catastrofização, com um ponto de comparação primário de 13 semanas. Os resultados mostraram que a CFT é particularmente eficaz em pacientes com altos níveis de limitação de atividade basal, que frequentemente enfrentam desafios maiores e representam uma parte significativa do fardo da dor lombar (Hartvigsen J, 2018; Costa Lda C, 2009; Dunn KM, 2006).
Além disso, a CFT demonstrou manter sua eficácia mesmo em pacientes com níveis mais baixos de limitação de atividade, embora os efeitos sejam menos pronunciados. Para aqueles com alta flexibilidade cognitiva basal, os benefícios da CFT foram mais evidentes após 13 semanas, em comparação com indivíduos com baixa flexibilidade. Em contrapartida, ao que se pressupunha, a catastrofização basal e a autoeficácia não se mostraram preditores da resposta à CFT.
Esse contraste sugere que a CFT pode ser capaz de promover melhorias na limitação de atividade, independentemente da influência dessas variáveis psicológicas. Além disso, a intensidade da dor basal não se revelou um fator moderador da resposta à CFT, uma vez que pacientes com alta intensidade de dor apresentaram efeitos semelhantes aos de pacientes com dor menos intensa, mesmo que a dor severa seja frequentemente associada a um prognóstico menos favorável.
Essa observação é consistente com um estudo anterior que demonstrou que a CFT foi mais eficaz do que terapia manual e exercícios em pacientes com limitação de atividade basal relativamente baixa (Índice de Incapacidade de Oswestry de 21,3 em pacientes submetidos à CFT) e demonstrou que essa abordagem foi mais eficaz do que a terapia manual e os exercícios.
Assim, a CFT se mantém como uma intervenção baseada em evidências para pacientes com dor lombar crônica e baixos níveis de limitação de atividade. Além disso, a CFT foi considerada mais eficaz e significativamente mais econômica do que o atendimento multidisciplinar, que, por vezes, é tido como a intervenção ideal para esse grupo de pacientes altamente incapacitados (Kamper SJ, 2015; Vaegter HB, 2020).
Paralelamente, a identificação de moderadores do efeito do tratamento, também denominados subgrupos, tem sido uma prioridade no campo da dor lombar há mais de duas décadas (Costa LdCM, 2013). Entretanto, apesar dos esforços direcionados a essa questão, poucos estudos de alta qualidade foram conduzidos, e um número limitado de moderadores promissores foi identificado até o momento (Stanton TR, 2010; Saragiotto BT, 2017).
Uma meta-análise de dados de pacientes individuais que incluiu 27 estudos de intervenções de exercícios não descobriu que a limitação da atividade basal moderou o efeito das intervenções. Isso sugere que a descoberta de maiores efeitos naqueles com maiores limitações de atividade é específica para CFT (Hayden JA, 2020).
No estudo realizado por Wernli (2022), os achados evidenciaram como os participantes perceberam a interconexão entre movimento, postura e dor lombar (LBP). Durante as entrevistas iniciais, os participantes disseram que tanto o movimento quanto as posturas eram consideradas ameaças, o que os levava a adotar uma postura protetora em relação às suas costas lesionadas. Eles seguiram rigidamente as normas posturais tradicionais, resultando em um comportamento cauteloso.
Contudo, após o acompanhamento pós-intervenção com a CFT, houve uma mudança significativa na percepção dos participantes. Eles conseguiram ver o movimento e a postura como ferramentas de recuperação terapêutica, relatando uma sensação de maior segurança ao se movimentar e reconhecendo que poderiam aliviar sua dor ao adotar uma abordagem menos protetora. Apenas um participante indicou que não proporcionou mudanças significativas ou dificuldades em sua condição.
Essa transformação está em consonância com os objetivos da CFT, conforme destacado por O’Sullivan (2018), que propõe o uso de experimentos comportamentais para ensinar os indivíduos a não se protegerem durante atividades que provocam dor e que costumam ser temidas ou evitadas. O objetivo é promover a redução ou controle da dor e aumentar a autoeficácia dos participantes.
O estudo conduzido por Ahmad (2023) revelou que a CFT se mostrou mais eficaz do que o tratamento baseado em MSI na redução da dor, no tamanho do efeito, no ODI e na cinesiofobia ao longo de 8 semanas. No entanto, os efeitos positivos do tratamento não se mantiveram durante os acompanhamentos realizados após 6 meses e 1 ano (Castro J, 2022).
Além disso, Ahmad (2023) observou que nenhum dos grupos de tratamento relatou eventos adversos nas avaliações pré-teste e pós-teste. Apesar dessas descobertas promissórias, é importante ressaltar que os resultados ainda precisam ser validados com um número maior de pacientes. Nesse contexto, a abordagem da CFT destaca a relevância de desenvolver um tratamento centrado no paciente, priorizando aspectos cognitivo-comportamentais em vez de se limitarem apenas aos sinais e sintomas.
Com base no estudo de Øiestad (2021), que comparou a terapia cognitiva funcional (CFT) com exercícios e educação em grupo, ficou evidenciado que a CFT é mais eficaz para pacientes com dor lombar crônica. Os resultados da pesquisa mostraram uma melhora significativa nos sintomas relatados pelos participantes.
Ao comparar a CFT com outras abordagens terapêuticas, como a Modificação do Sistema de Movimento, observou-se que a CFT se destaca em aspectos como a recuperação funcional, a redução da cinesiofobia e a melhoria de parâmetros biomecânicos, o que reforça seu valor terapêutico. Contudo, a eficácia da CFT em relação à intensidade da dor apresenta variações entre os estudos, sugerindo que sua ação pode estar mais relacionada à recuperação da funcionalidade do que à modulação direta da dor.
Diante da complexidade da dor lombar crônica, a personalização da terapia se torna essencial. Em síntese, a CFT emerge como uma abordagem promissora, proporcionando benefícios tanto físicos quanto psicológicos. Para maximizar seu impacto, futuras pesquisas devem focar na otimização da aplicação da terapia e na sustentação de seus efeitos ao longo do tempo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que a Terapia Cognitiva Funcional demonstrou efeitos positivos na rea- bilitação de indivíduos com dor lombar crônica inespecífica, favorecendo a redução da dor, da incapacidade e melhorias na regulação emocional, como a diminuição do medo e da ansiedade. Logo, os estudos analisados apontam que os benefícios da intervenção se mantêm a longo prazo, com resultados sustentados em até um ano.
Além disso, a versão aprimorada (Terapia Cognitiva Funcional +) apresentou vanta- gens adicionais, como maior impacto na funcionalidade e menor necessidade de uso de analgésicos, evidenciando potencial incremento terapêutico dentro das práticas de reabili- tação. Por conseguinte, observou-se uma transição progressiva dos pacientes para pa- drões de movimento mais naturais e uma redução de estratégias posturais protetoras, re- fletindo um restabelecimento da confiança na própria mobilidade, impactando positiva- mente a funcionalidade e a qualidade de vida dos pacientes.
REFERÊNCIAS
Ahmad, S. N. S., Letafatkar, A., Brewer, B. W., & Sharifnezhad, A. (2023). Comparison of cognitive functional therapy and movement system impairment treatment in chronic low back pain patients: a randomized controlled trial. BMC musculoskeletal disorders, 24(1), 684.https://doi.org/10.1186/s12891-023-06815-x
Bergbom S, Boersma K, Overmeer T, Linton SJ. Relação entre catastrofização da dor, humor deprimido e resultados em tratamentos de fisioterapia. Revista Brasileira de Fisiologia 2011;91:754–764.
Carneiro JP, Campbell A, et al. Cognitive Functional Approach to Manage Low Back Pain in Male Adolescent Rowers: A Randomised Controlled Trial. British Journal of Sports Medicine. 2015;49(17):1125-1130.
Castro J, Correia L, de Sousa Donato B, Arruda B, Agulhari F, Pellegrini MJ, et al. Terapia funcional cognitiva comparada com exercícios de core e terapia manual em pacientes com dor lombar crônica: ensaio clínico randomizado. Dor. 2022;163(12):2430–7.
Clauw DJ, Essex MN, Pitman V, Jones KD. Reframing chronic pain as a disease, not a symptom: rationale and implications for pain management. Postgrad Med 2019; 131: 185–98.
Costa Lda C, Maher CG, McAuley JH, Hancock MJ, Herbert RD, Refshauge KM, et al. Prognóstico para pacientes com dor lombar crônica: estudo de coorte inicial. BMJ. 2009;339:b3829.
Costa LdCM, Koes BW, Pransky G, Borkan J, Maher CG, Smeets RJ. Prioridades de pesquisa em cuidados primários em dor lombar: uma atualização. Spine. 2013;38:148–156.
de Lira MR , Meziat-Filho N , Zuelli Martins Silva G , et al Eficácia da terapia cognitivo-funcional para intensidade da dor e incapacidade em pacientes com dor lombar crônica inespecífica: um ensaio clínico randomizado controlado por placebo British Journal of Sports Medicine Publicado online pela primeira vez: 06 de março de 2025. doi: 10.1136/bjsports-2024-109012
Dunn KM, Jordan K, Croft PR. Caracterizando o curso da dor lombar: uma doença latente análise de classe. Am J Epidemiol. 2006;163:754–761
Flink IK, Boersma K, Linton SJ. A catastrofização modera o efeito da exposição in vivo para pacientes com dor nas costas e medo relacionado à dor. Eur J Pain. 2010;14:887– 892.
Hancock M, Smith A, O’Sullivan P, Schütze R, Caneiro JP, Hartvigsen J, O’Sullivan K, McGregor A, Haines T, Vickery A, Campbell A, Kent P. Patients with worse disability respond best to cognitive functional therapy for chronic low back pain: a pre-planned secondary analysis of a randomised trial. J Physiother. 2024 Oct;70(4):294-301. doi: 10.1016/j.jphys.2024.08.005. Epub 2024 Sep 25. PMID: 39327170.
Hartvigsen J, Hancock MJ, Kongsted A, Louw Q, Ferreira ML, Genevay S, et al. O que é dor lombar e por que precisamos prestar atenção. Lancet. 2018;391(10137):2356– 2367. https://doi.org/ 10.1016/S0140-6736(18)30480-X 2. Foster NE, Anema JR, Cherkin D, Chou R, Cohen SP, Gross DP, et al. Prevenção e tratamento da dor lombar: evidências, desafios e direções promissoras. Lancet. 2018;391(10137):2368–2383.
Hayden JA, Wilson MN, Stewart S, Cartwright JL, Smith AO, Riley RD, et al. Modificadores do efeito do tratamento de exercícios em dor lombar persistente: uma meta-análise de dados de participantes individuais de 3514 participantes de 27 ensaios clínicos randomizados. Br J Sports Med. 2020;54:1277–1278.
Kamper SJ, Apeldoorn AT, Chiarotto A, Smeets RJ, Ostelo RW, Guzman J, et al. Reabilitação biopsicossocial multidisciplinar para dor lombar crônica: revisão sistemática e metaanálise Cochrane. BMJ. 2015;350:h444.
Knezevic, N.N., Candido, K.D., Vlaeyen, J.W.S., Van Zundert, J., Cohen, S.P., 2021. Low back pain. Lancet (London, England) 398 (10294), 78–92. https://doi.org/10.1016/s0140-6736(21)00733-9 (Jul 3).
Meints SM, Edwards RR. Evaluating psychosocial contributions to chronic pain outcomes. Prog Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry 2018; 87: 168–82.
Moore E, Thibault P, Adams H, Sullivan MJ. Catastrofização e medo relacionado à dor predizem falha em manter os ganhos do tratamento após a participação em um programa de reabilitação da dor. Pain Reports. 2016;1:e567.
Ohtori S, Inoue G, Miyagi M, Takahashi K. Patomecanismos da dor lombar discogênica em humanos e modelos animais. Spine J . 2015;15(6):1347–1355. doi: 10.1016/j.spinee.2013.07.490
O’Keeffe M, Purtill H, Kennedy N, O’Sullivan P, Dankaerts W, Tighe A, Allworthy L, Dolan L, Bargary N, O’Sullivan K. Individualised cognitive functional therapy compared with a combined exercise and pain education class for patientswith non-specific chronic lowback pain: study protocol for a multicentre randomised controlled trial. BMJ Open 2015;5:e007156.
O’Keeffe M, O’Sullivan P, Purtill H, et al. Terapia funcional cognitiva comparada com uma intervenção de exercícios e educação em grupo para dor lombar crônica um ensaio clínico randomizado multicêntrico (RCT). Br J Sports Med 2020;54:782–9.
O’Sullivan PB, Caneiro JP, O’Keeffe M, Smith A, Dankaerts W, Fersum K, O’Sullivan K. Cognitive functional therapy: an integrated behavioral approach for the targeted management of disabling low back pain. Phys Ther 2018;98:408–23.
Raja SN, Carr DB, Cohen M, et al. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain 2020; published online May 23. https://doi.org.10.1097/j.pain.0000000000001939.
Saragiotto BT, Maher CG, Hancock MJ, Koes BW. Subgrupos de pacientes com dor lombar inespecífica: esperança ou exagero? J Orthop Sports Phys Ther. 2017;47:44–48.
Stanton TR, Hancock MJ, Maher CG, Koes BW. Avaliação crítica de regras de predição clínica que visam otimizar a seleção de tratamento para condições musculoesqueléticas. Revista Brasileira de Fisiologia 2010;90:843–854.
Scott W, Wideman TH, Sullivan MJ. Pontuações clinicamente significativas na catastrofização da dor antes e depois da reabilitação multidisciplinar: um estudo prospectivo de indivíduos com dor subaguda após lesão por chicotada. Clin J Pain. 2014;30:183–190.
Treede RD, Rief W, Barke A, et al. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International. Classification of Diseases (ICD-11). Pain 2019; 160: 19–27.
USSING, Kasper et al. Cognitive Functional Therapy for People With Non-Specific Chronic Low Back Pain in a Specialist Setting: A Randomized Controlled Trial. Pain Medicine, v. 21, n. 10, p. 2061–2073, 2020. Disponível em: https://academic.oup.com/painmedicine/article/21/10/2061/5812927.
Vaegter HB, Ussing K, Johansen JV, Stegemejer I, Palsson TS, O’Sullivan P, et al. Melhorias na dor clínica e na sensibilidade experimental à dor após terapia funcional cognitiva em pacientes com dor lombar persistente grave. Pain Rep. 2020;5:e802.
VAEGTER, H. B. et al. Cognitive Functional Therapy Compared With an Interdisciplinary Pain Treatment Pathway for Severe Chronic Low Back Pain: The CONFeTTI Trial. Physical Therapy, v. 101, n.9, 2025. Disponível em: https://academic.oup.com/ptj/article-abstract/101/9/pzab132/6277052.
Vibe Fersum K, O’Sullivan P, Skouen JS, et al. Efficacy of Classification-Based Cognitive Functional Therapy in Patients With Non-Specific Chronic Low Back Pain: A Randomized Controlled Trial. European Journal of Pain. 2013;17(6):916-928.
Vlaeyen JWS, Linton SJ. Modelo de medo-evitação de dor musculoesquelética crônica: 12 anos depois. Pain 2012; 153: 1144–47.
Vlaeyen JWS, Maher CG, Wiech K, et al. Dor lombar. Nat Rev Dis Primers . 2018;4(1):53.
Vos T, Flaxman AD, Naghavi M et al.. Years lived with disability (YLDs) for 1160 sequelae of 289 diseases andinjuries 1990–2010: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2010. The Lancet. 2012; 380 :2163–2196. [PMCID: PMC6350784] [PubMed: 23245607]1
Wernli K, Smith A, Coll F, Campbell A, Kent P, O’Sullivan P. From protection to non-protection: A mixed methods study investigating movement, posture and recovery from disabling low back pain. Eur J Pain. 2022 Nov;26(10):2097-2119. doi: 10.1002/ejp.2022. Epub 2022 Sep 5. PMID: 35959703; PMCID: PMC9826080.
Øiestad BE. Critically appraised paper: Cognitive functional therapy reduced disability compared with group-based exercise and education for chronic low back pain [synopsis]. J Physiother. 2021 Apr;67(2):141. doi: 10.1016/j.jphys.2021.01.004. Epub 2021 Mar 17. PMID: 33744183.