ESCOLARIZAÇÃO DO IDOSO DIANTE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202504061918


Cintia N. Madeira Sanchez
Rodrigo Guedes Boer
Tatiana Mascarenhas Nasser Aragone


RESUMO

O presente estudo teve por objetivo apontar de que modo o direito do idoso à educação pode corroborar com a diminuição da desigualdade e com a melhora da qualidade de vida do indivíduo durante seu processo de envelhecimento. Articulou-se um paralelo entre as leis que asseguram os direitos do idoso com as políticas públicas existentes para atender tal demanda. De acordo com a análise da literatura consultada, conclui-se que o Brasil precisa repensar as políticas públicas de educação para o idoso de modo que esta seja acessível e promovendo sua emancipação e independência.

Palavras-chave: Direitos Humanos, Estatuto do Idoso, Educação de Jovens e Adultos

INTRODUÇÃO

Envelhecer é um processo biológico atribuído a todos os seres vivos podendo indicar a velhice a partir de uma certa idade que o indivíduo atinge ou quando deixa o mercado de trabalho para iniciar sua aposentadoria (OLIVEIRA e SANTOS, 2009).

Entretanto, tais considerações podem variar ao longo da história, pois o indivíduo considerado velho na Roma Antiga, aos 30 anos, na África de hoje tem-se o idoso aos 45 anos, enquanto que no Japão aos 85 anos (BRACIALI, 2009), podendo-se observar distintas expectativas de vida. Além disso, os modos e a qualidade com o qual esse processo acontece é distinto em várias culturas e países.

Segundo o Braga et al (2008) e Lemos (2013), políticas públicas são ações governamentais que devem assegurar o bem estar em diversas esferas do indivíduo enquanto cidadão. Estas se diferem de políticas governamentais por olhar não somente para o indivíduo, mas também para os interesses estatais (FARAH, 2016). Uma política pública para o idoso é importante porque tem o intuito de assegurar seus direitos adquiridos, bem como, boas condições de vivência (BRAGA et al, 2008).

O crescimento da população idosa é um fator preocupante no mundo todo. Um estudo realizado pela Global AgeWatch1 com a finalidade de avaliar a qualidade de vida de 96 países, obteve-se de dados do Brasil em 2015, a indicação que a população idosa estava em torno de 24, 4 milhões de pessoas acima de 60 anos neste período, sendo 11,7 % da população geral, em 2030 a porcentagem estará por volta de 18, 8% e em 2050 entorno de 29,3%.

Segundo este mesmo estudo, o Brasil se encontra em 56° lugar em qualidade de vida do idoso, aonde nos quesitos Segurança e Renda possui valor de 81.5 de 100, devido a possuir um programa social que permite que o idoso tenha uma renda ao se aposentar. No quesito Estado de Saúde apresenta 57.4 de 100, indicando que o trato da saúde do idoso ainda está longe de ser a ideal. No quesito Capacidade apresenta 29.9 de 100, aonde pequena parcela desta população possui pouco acesso empregatício para com o idoso, bem como, aponta o nível educacional sendo baixo, e no quesito de Sociedade e Ambiente Propícios apresenta 54.6 de 100, se referindo a satisfação com o transporte público, sentimento de segurança na região qual reside e se o idoso se sente seguro em relação aos familiares com os quais vive.

Partindo destes dados, se faz necessária mudanças nas ações que amparam o idoso, embora se pense em medidas de fazer a vida do idoso com maior qualidade há vários anos, entretanto, o que foi feito até hoje não se mostrou eficaz diante da demanda existente. (VERAS e OLIVEIRA, 2018). Neste sentido, em 2003, o Estatuto do Idoso foi criado a fim de, a partir das leis estabelecidas, criar mecanismos que propiciem ao idoso uma vida segura e independente, com direitos assegurados a saúde, moradia, alimentação, lazer, trabalho, cultura e educação (JUSTO e ROZENDO, 2010).

A criação do Estatuto do Idoso está em conformidade com os direitos existentes no Código Civil (BRASIL, 2002) e na Declaração dos Direitos Humanos (ONU, 1948). O Estatuto pretendeu contemplar o idoso como prioridade em alguns casos previstos em lei, devido a sua vulnerabilidade e necessidade de assistência que tem crescido cada vez mais por conta dos estereótipos atribuídos a velhice que fomentam o preconceito contra essa parcela da população, contribuindo com a violência, abuso e descaso para com os idosos (SCHNEIDER e IRAGAY, 2008).

Apesar de existirem leis que preveem que os idosos tenham seus direitos assegurados, muitos idosos desconhecem seus direitos e assim, são constantemente desrespeitados (SANCHES et al, 2008). Sendo assim, entende-se que a educação é um meio com o qual o indivíduo ao longo de sua vida ao desfrutar de uma educação de nível elevado pode se preparar para ter uma velhice com qualidade e assim, ter os seus direitos assegurados (SILVA, 2015).

Entretanto, quando isso não ocorre, a lei prevê que o idoso tenha acesso a educação, de modo que possa se tornar um indivíduo inserido em sua comunidade, e assim deixar de estar a margem da sociedade, o que ocorre muitas vezes devido a violência que muitos idosos enfrentam na velhice, sendo abandonados sem nenhuma perspectiva de qualidade vida (MARI et al, 2016).

Partindo desta premissa, este estudo tem por objetivo frisar a importância da educação para a idoso, seja em seu processo de envelhecimento, ou quando já chegou a “melhor idade”, apontando as leis que corroboram com a seguridade de seus direitos e como o não cumprimento dessas leis acarretam na privação do exercício desta população enquanto cidadã e colaboradora ativa na sociedade na qual vivemos.

DIREITOS DOS IDOSOS

Atualmente a expectativa de vida das pessoas vem crescendo em diversos países, tal crescimento está associado aos avanços da ciência que refletem no desenvolvimento da medicina, tanto em procedimentos médicos como na criação de medicamentos que contribuem com a longevidade da população (CAMPOLINA et al, 2013),sendo assim, é necessário refletir sobre o modo que a população está atingindo a terceira idade.

Ao longo da história diversas culturas trataram a velhice sob diversos aspectos, indo desde a sua determinação cronológica, quando em alguns lugares o indivíduo é considerado idoso aos 60 anos, como no Brasil, e em outros aos 45 anos, como ocorre em alguns países do continente africano (BRACIALI, 2009).Além disso, a velhice também é associada a incapacidade física, mental e financeira, o que corrobora muitas vezes com o preconceito para com as pessoas idosas(SANCHES et al, 2008). Desta forma entende-se que a visão que se tem do envelhecer está associada a questões não apenas culturais, mas sociais, econômicas e políticas.

Os contextos na qual o processo de envelhecimento estão inseridos possuem uma grande influência na forma que os idosos serão tratados, podendo enaltecer o idoso, o tendo como pessoa sábia, merecedora de respeito, de cuidado e atenção, assim como, alguém que deve ser excluído, e ainda, como alguém que não tem mais com o que contribuir com a sociedade na qual está incorporado e assim, é deixado a margem dessa sociedade (OLIVEIRA e SANTOS, 2009).

Sendo assim, o Direito do Idoso foi criado por meio do Estatuto do Idoso com a finalidade de assegurar que a população idosa seja assistida devido a sua condição de vulnerabilidade garantindo que esta população consiga apoio jurídico quando sua dignidade e autonomia não estão asseguradas (JUSTO e ROZENDO, 2010) pensando o idoso como um indivíduo com idade igual ou superior a 60 anos.

Além da velhice cronológica, tem-se a velhice biológica, relacionada a vivência do indivíduo, a velhice burocrática, relacionada a legislação vigente e a velhice psicológica, relacionada com o modo como o indivíduo se sente e como a sociedade o vê (SCHNEIDER e IRIGARAY, 2008). Tais aspectos da velhice estão atribuídos a dignidade humana, aonde se reconhece seus direitos a integridade física e mental, além de liberdade e autonomia (MERCADANTE, 1998).

Tal dignidade deve estar assegurada como indica o Estatuto do Idoso, Artigo 2º

O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. (BRASIL, 2003, p.1).

Deste modo, entende-se que o idoso deve ser visto como um indivíduo de qualquer outra faixa etária, com sua dignidade humana assegurada no tocante as integridades físicas, psíquicas e intelectuais garantindo a sua autonomia e seu direito de ir e vir, bem como o seu desenvolvimento enquanto pessoa (JUSTO e ROZENDO, 2008). Este desenvolvimento pode ser atribuído aos cuidados com a saúde do idoso, condições adequadas de moradia, alimentação, laser, cultura e educação (VERAS e OLIVEIRA, 2018).

Tais direitos atribuídos ao indivíduo em qualquer fase de sua existência corrobora com a diminuição da desigualdade social, e assim com a promoção de uma vida plena e colaboradora com a sociedade na qual a pessoa está inserida (CORREA et al, 2010), e uma vez que o indivíduo tem seus direitos assegurados, o seu processo de envelhecimento também estará, e por consequência a sua proteção nessa fase da vida estará resguardada pela Lei.

Assim sendo, a Lei permite que o idoso se iguale com as demais pessoas de sua comunidade, garantindo seus direitos e o protegendo de situações que aumentam sua vulnerabilidade em âmbitos públicos ou privados , pois  a sua condição de maior exposição devido a velhice, o idoso requer uma proteção diferenciada, uma proteção que justifique o resguardo do seu exercício aos direitos fundamentais como ser humano (FEAL, 2016).

Entretanto, é importante salientar que o Estatuto do Idoso deve amparar os idosos não apenas na sua autonomia, mas também aqueles que não possuem condições de realizar decisões por si próprios, uma vez que pode ocorrer casos nos quais o idosos não tem pleno discernimento de suas ações (GONÇALVES, 2019).

É importante reconhecermos que o envelhecimento é um processo inerente de qualquer ser vivo, ou seja, uma fase natural que acomete a todos nós fazendo parte do desenvolvimento humano (OLIVEIRA e SANTOS, 2009) de modo que não há como prever que o indivíduo se tornará alguém dependente exatamente quando completar 60 anos.

Pode-se verificar através do Código Civil de 2002 que não há indicadores da incapacidade do individuo ao atingir a velhice legalmente, a incapacidade é atribuída aos indivíduos menores de 16 anos, como disposto no Artigo 3° da Lei de número 10.406, de 10 de janeiro de 2002[2]. Partindo da Lei que determina que alguém legalmente teria uma idade já determinada, quando a incapacidade se atribui a alguém mais velho deve constar de outros elementos que a comprovem.

Estes elementos são apontados no Artigo 4°

I – Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II – Os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

II – Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

IV – Os pródigos. (BRASIL, 2002, p.1).

Sendo assim, no tocante a incapacidade dos idosos, estas dizem respeito ao comprometimento das faculdades intelectivas de modo que caso isso ocorra o idoso deva estar amparado, ressaltando que uma vez que o idoso não possua incapacidade intelectiva, mas física, isso pode não estar inserido legalmente como fator incapacitante de atribuições a vida social (ALENCAR, 2002).

As atribuições da vida social não se restringem a uma determinada idade, ou seja, as pessoas com idade superior a 60 anos são capazes de exercer suas atividades, o envelhecimento não significa a incapacitação do indivíduo (ALMEIDA e LOURENÇO, 2009; FERREIRA et al, 2010). Inclusive quando se trata da prodigalidade, pois o idoso tem o direito de usufruir do patrimônio que construiu ao longo da vida, dispondo deste patrimônio da maneira que julgar adequada (BRASIL, 2003).

Assim sendo, a velhice não incapacita o idoso de desejar e desenvolver novos projetos de vida, pois entende-se que independente da idade, o envelhecer é um processo contínuo de amadurecimento e de aquisição de conhecimento e sabedoria. Em muitos casos quando o indivíduo é impedido de realizar seus projetos enquanto jovem, ele adia para quando chega a idade mais avançada, como acontece quando este indivíduo não teve oportunidade de concluir uma educação formal (LAFFIN, 2012).

Pensando em oportunizar a educação para a população idosa, este direito também foi inserido no Estatuto do Idoso, Lei de número 10.741, de 1º de outubro de 2003, Capítulo V

Art. 20. O idoso tem direito a educação, cultura, esporte, lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua peculiar condição de idade.

Art. 21. O Poder Público criará oportunidades de acesso do idoso à educação, adequando currículos, metodologias e material didático aos programas educacionais a ele destinados.

[…] Art. 25.  As instituições de educação superior ofertarão às pessoas idosas, na perspectiva da educação ao longo da vida, cursos e programas de extensão, presenciais ou a distância, constituídos por atividades formais e não formais. (BRASIL, 2003, pp. 4-5).

Sendo assim, o direito ao acesso à educação não se extingue quando o indivíduo apresenta distorção de idade-série, enquanto jovem, na velhice ele ainda tem este direito, bem como a métodos, ferramentas e práticas que oportunizem o seu aprendizado.

ENSINO DE JOVENS E ADULTOS PARA IDOSOS

A Declaração Universal dos Direitos Humanos constituída em 1948 prevê que toda e qualquer pessoa tem direito ao acesso à educação (Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948), entretanto, apesar de existir a oferta de educação para a população, nem todos conseguem ter acesso a ela na idade própria.  (MENDES, 2016).

Tendo em vista esta realidade, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9.394/96) prevê a oferta de cursos que correspondam as necessidades de pessoas que possuem distorção-série, ou seja, que na idade prevista para cursar o ensino formal correspondente a sua idade, não puderam exercer este direito, sendo ofertado cursos que visam sanar este atraso em sua educação (SERRA e FURTADO, 2016).

A universalização dos direitos sociais prevendo o direito à educação em conjunto com outros também importantes para o bom desenvolvimento do ser humano foi concebido no Brasil através da Constituição de 1988, indo na contramão do que se entendia sobre educação na ditadura militar (RIBEIRO, 1993; PILETTI, 1995; TEIXEIRA, 2015).

Devido ao grande número de crianças e jovens que abandonam os estudos, a Educação de Jovens e Adultos (EJA) acaba sendo uma ação com a finalidade de dívida social com esta população, tendo em vista que o abandono é devido a grande desigualdade social que existe no país, sendo apontado como um dos principais fatores de abandono a necessidade de contribuir financeiramente no sustento familiar (BRASIL, 2014).

Embora o direito a educação esteja previsto em diversos documentos oficiais (ONU, 1948; BRASIL, 1996; BRASIL, 2002; BRASIL, 2003) muitas vezes na prática este direito não está assegurado dentro da sala de aula, uma vez que nem sempre esta modalidade de ensino assegura equidade de oportunidades e direitos (SERRA e FURTADO, 2016).

Assegurar essa equidade corrobora com os quatro pilares da aprendizagem, aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver, de modo a contribuir com a emancipação e o desenvolvimento do indivíduo enquanto cidadão do mundo (SOUZA e LUFT, 2018).

Entretanto, apesar do respaldo legal, pouco se tem feito para que políticas específicas para a educação de jovens e adultos, principalmente de idosos, atendam a demanda existente, acreditando que este descaso esteja relacionado aos estereótipos atribuídos a velhice, carregando consigo preconceito, tabus e estigmas (SERRA e FURTADO, 2016; VIEIRA e LIMA, 2015).

É necessário repensar a Educação Básica para que esta oportunize o aprender ao longo da vida do indivíduo, independente de sua idade, promovendo a descoberta e a construção de saberes que contemplem suas experiências, as respeitando e as utilizando como ponto de partida para tal descoberta e construção (FREIRE, 2015; SERRA e FURTADO, 2016; CARVALHO, 1998). Tendo em vista as dificuldades que a velhice carrega, a educação voltada para o idoso é ainda mais urgente, devendo ser atribuída de acordo com o Estatuto do Idoso, aonde tem-se para o Artigo 21

 § 1o Os cursos especiais para idosos incluirão conteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demais avanços tecnológicos, para sua integração à vida moderna.

 § 2o Os idosos participarão das comemorações de caráter cívico ou cultural, para transmissão de conhecimentos e vivências às demais gerações, no sentido da preservação da memória e da identidade culturais.

E nos demais Artigos

Art. 22. Nos currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal serão inseridos conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, ao respeito e à valorização do idoso, de forma a eliminar o preconceito e a produzir conhecimentos sobre a matéria.

Art. 23. A participação dos idosos em atividades culturais e de lazer será proporcionada mediante descontos de pelo menos 50% (cinquenta por cento) nos ingressos para eventos artísticos, culturais, esportivos e de lazer, bem como o acesso preferencial aos respectivos locais.

Art. 24. Os meios de comunicação manterão espaços ou horários especiais voltados aos idosos, com finalidade informativa, educativa, artística e cultural, e ao público sobre o processo de envelhecimento.

Parágrafo único.  O poder público apoiará a criação de universidade aberta para as pessoas idosas e incentivará a publicação de livros e periódicos, de conteúdo e padrão editorial adequados ao idoso, que facilitem a leitura, considerada a natural redução da capacidade visual (BRASIL, 2003, pp. 4-5).

Aqui podemos resumir colocar só o mais importante

Nos Artigos 21, 22, 23, 24 e parágrafo único é possível observar que o Estatuto do Idoso procura ratificar o acesso do idoso à educação sob distintas maneiras, não somente em relação a conteúdo curricular e metodologias de ensino voltados para esse público, mas também meios que contribuam e facilitem este acesso, como isenção parcial ou total de cursos e/ou eventos que promovam a aquisição de saberes e capital cultural para esta parte da população.

A LDB também reforça que o acesso a educação deve ser facilitado e voltado para e toda e qualquer pessoa, como observado nos Artigos 4 e 5

VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;

[..] IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.

Art. 5º O acesso à educação básica obrigatória é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo (BRASIL, 1996, p.2).

Além disso, no Artigo 37 se enfatiza a educação voltada para jovens e adultos, como uma oportunidade para aqueles que não puderam frequentar a escola no período atribuído a idade-série

Art. 37.  A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria e constituirá instrumento para a educação e a aprendizagem ao longo da vida.

§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.

§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si (BRASIL, 1996, pp. 17-18).

Deste modo, é possível observar que a população que não teve acesso ou condições de cursar o ensino regular possui respaldo pela Lei para que o Estado promova condições de atender esta parcela da população de forma igualitária não apenas no contexto escolar, mas também fora dele, e assim corroborar com o desenvolvimento do indivíduo para que este seja ativo em sua comunidade.

A promoção de uma educação para todos, com qualidade e que tenha significado é extremamente relevante na atualidade, uma vez que, segundo Cortella (2014) “aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar” (p. 84). Ou seja, a educação nos prepara para que tenhamos uma vida com maior qualidade repleta de possibilidades.

Para Freire, a formação do indivíduo em qualquer tempo deve dialogar com o conceito de cidadania, pois

…qualquer que seja a situação em que alguns homens proíbam aos outros que sejam sujeitos de sua busca, se instaura como situação violenta. Não importam os meios usados para esta proibição. Fazê-los objetos é aliená-los de suas decisões, que são transferidas a outro ou a outros (2014, p. 104).

Em outros termos, a inserção social do indivíduo é intrínseca a sua posição como cidadão, e a educação faz parte deste processo. Quando ela lhe é negada, o indivíduo sofre tamanha violência que acaba por atribuir todas as suas escolhas de vida a outras pessoas, acabando muitas vezes deixando de realizar o seu livre-arbítrio. E ainda,

(…) aqueles ou aquelas entre nós que imaginarem que nada mais precisam aprender ou, pior ainda, não têm mais idade para aprender, estão se enclausurando dentro de um limite que desumaniza e, ao mesmo tempo, torna frágil a principal habilidade humana: a audácia de escapar daquilo que parece não ter saída. Afinal, do nascimento ao final da existência individual, aprendemos (e ensinamos) sem parar; o que caracteriza um ser humano é a capacidade de inventar, criar, inovar e isso é resultado do fato de não nascermos já prontos e acabados (CORTELLA, 2014, pp. 84-85).

Assim sendo, pode-se atribuir a ignorância ou falta de educação como um agravante da desigualdade social aonde o indivíduo que durante a sua vida consegue se inserir na sociedade na qual vive. Quando se trata do indivíduo idoso essa percepção é mais latente, ora quando ele teve a oportunidade de se educar ao longo de vida, de modo a delinear uma velhice mais segura e confortável, ou quando na velhice ele consegue dar continuidade ao seu aprendizado, propiciando meios de diminuir a sua vulnerabilidade (SERRA e FURTADO, 2016).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de envelhecimento passa por diversas fases, porém é de acordo com a cultura ou uma lei que a idade é determinada para que se saiba quando um indivíduo será considerado que está na etapa da velhice. Nesta fase é o momento da vida a qual o indivíduo deixa de trabalhar, chegando a aposentaria, podendo ou não deixar de contribuir para o mercado de trabalho.

Em ambos os processos, muitas vezes o indivíduo se depara com a velhice psicológica, quando ele atribui o seu envelhecimento a outros, mesmo que não se sinta parte deste processo. Entretanto, é necessário ressaltar que todos os seres vivos estão envelhecendo desde o seu nascimento, com a espécie humana não é diferente.

O que difere entre nossa espécie é o modo como a sociedade define este processo. Podendo exaltar o envelhecimento como algo bom, como um amadurecimento constante, no qual o indivíduo está acumulando conhecimento e saberes de modo que sua sabedoria e conhecimento ainda possa contribuir com a comunidade na qual está inserido.

Mas também pode-se considerar o envelhecimento como sinônimo de algo ruim, de que a vida não tem mais sentido ou utilidade. Que a velhice não tem beleza, que carrega consigo a incapacidade e a lentidão. Sob estas duas visões, valores e conceitos são criados e passados pela educação de pai pra filho, muitas vezes culminando em um ciclo preconceituoso que não termina.

O estereótipo e o mito da velhice apenas corroboram com a disseminação de preconceito e violência, espalhando inverdades acerca da velhice que apenas contribuem com o abandono dos familiares.

Pensando na proteção destes indivíduos, que construíram uma história, leis foram criadas para assegurar que eles não sofram mais violência. A violência que o idoso sofre não é apenas a violência física, mas também a violência psicológica, carregada de abusos que na maioria dos casos vem de seus próprios familiares. Com a imagem de que o idoso chegou em uma fase da vida que não consegue mais produzir e se torna um fardo para a família, ele acaba sendo vítima de abusos e violências que visam o seu afastamento do recinto aonde vive.

A desigualdade social é um fator que contribui imensamente para este quadro. O Brasil ocupar o 56° lugar não é mero acaso. Apesar de existirem leis que assistem a população idosa, é necessário ações afirmativas que corroborem com a independência e autonomia do idoso.

Uma das ações se relaciona com um sistema educacional que olhe com mais atenção para a Educação de Jovens e Adultos. Pois se a educação como um todo sofre por não possuir recursos adequados e investimento na formação continuada de professores, para a área de educação em EJA é ainda pior, pois carece de profissionais disponíveis para lecionar no período de maior frequência dos alunos que necessitam dessa demanda que é no período noturno, pois a maioria durante o dia exerce alguma função remunerada para manter seu sustento e de sua família.

Sendo assim, quando se aponta que a desigualdade social está diretamente relacionada com a falta ou o atraso dos estudos da população mais velha é devido ao abandono deste indivíduo quando se encontrava na idade adequada para cursar o ensino formal. Devido aos dados apresentados pelo UNICEF, pode-se observar que um lar aonde os pais não possuem um trabalho com remuneração que seja capaz de sustentar uma família, os filhos acabam deixando a escola para ingressar no mercado de trabalho precocemente com a finalidade de colaborar/contribuir com a renda familiar, e assim, o seu desenvolvimento intelectual acadêmico é comprometido.

Além disso, quando o indivíduo abandona os estudos precocemente, ele possui como tendência ser um indivíduo que não reconhece sua importância na sociedade, desconhecendo seus direitos, ficando a mercê de pessoas que absorvem toda sua força de trabalho em detrimento próprio, e quando, ao envelhecer, acaba sendo descartado, sem direitos, por nãos os reconhecer, vivendo a margem da sociedade.

Assim sendo, a valorização do sistema educacional possui grande importância para a sociedade no trato com a velhice. A educação de qualidade pode ofertar não apenas o conhecimento formal, mas também saberes que incluem o respeito e a prática de ações que fomentem o bem estar do idoso, iniciando com o tratamento dos idosos mais próximos do convívio do educando, e se estendendo ao entendimento do próprio processo de envelhecer.

Desta forma, é possível mudar a mentalidade das pessoas e assim quebrar com a barreira do preconceito, do mito e dos estigmas que a velhice carrega.


1https://www.helpage.org/global-agewatch/population-ageing-data/country-ageing-data/?country=Brazil. Acesso em: 15/05/2020.

2http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 15/06/2020.

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