SÍNDROME DO MIOCÁRDIO NÃO COMPACTADO E SUAS REPERCUSSÕES ANESTÉSICAS EM CIRURGIAS NÃO-CARDÍACAS: UMA REVISÃO DE LITERATURA

NONCOMPACTION MYOCARDIUM SYNDROME AND ITS ANESTHETIC REPERCUSSIONS IN NONCARDIAC SURGERIES: A LITERATURE REVIEW

SÍNDROME DE MIOCARDIO NO COMPACTADO Y SUS REPERCUSIONES ANESTÉSICAS EN CIRUGÍAS NO CARDÍACAS: UNA REVISIÓN DE LA LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202502212127


Laura de Lima Crivellaro1
Karolynne Myrelly Oliveira Bezerra de Figueiredo Saboia2


RESUMO

Objetivo: Descrever as estratégias anestésicas empregadas em pacientes com miocárdio não compactado, considerando que esses casos apresentam um desafio significativo devido à complexidade do manejo cardiovascular. Manter a estabilidade hemodinâmica durante cirurgias não cardíacas é crucial para prevenir complicações graves. Revisão Bibliográfica: O manejo anestésico de pacientes com síndrome do miocárdio não compactado é um desafio considerável. Nessas circunstâncias, é imperativo um controle rigoroso da hemodinâmica para proteger órgãos vitais, como o cérebro, exigindo monitorização e planejamento anestésico detalhado. Dessa forma, é possível reduzir riscos e garantir a estabilidade hemodinâmica e metabólica do paciente. A síndrome tem sido diagnosticada com mais frequência devido ao avanço dos exames de imagem que realizam o diagnóstico. Considerações finais: O manejo anestésico criterioso, com suporte hemodinâmico e monitorização rigorosa, é fundamental para a recuperação segura do paciente com comorbidades cardíacas. O planejamento adequado e a intervenção precoce podem garantir a estabilidade clínica e o desfecho favorável em cirurgias não cardíacas.

Palavras-chave: Anestesia Geral, Idoso, Cardiomiopatias, Choque Cardiogênico

ABSTRACT

Objective: To describe the anesthetic strategies employed in patients with noncompaction myocardium, considering that these cases present a significant challenge due to the complexity of cardiovascular management. Maintaining hemodynamic stability during noncardiac surgeries is crucial to prevent serious complications. Literature Review: The anesthetic management of patients with noncompaction myocardium syndrome is a considerable challenge. In these circumstances, strict control of hemodynamics is imperative to protect vital organs, such as the brain, requiring monitoring and detailed anesthetic planning. In this way, it is possible to reduce risks and ensure the hemodynamic and metabolic stability of the patient. The syndrome has been diagnosed more frequently due to advances in imaging tests that perform the diagnosis. Final considerations: Careful anesthetic management,with hemodynamic support and strict monitoring, is essential for the safe recovery of patients with cardiac comorbidities. Adequate planning and early intervention can ensure clinical stability and a favorable outcome in noncardiac surgeries.

Keywords: General Anesthesia, Elderly, Cardiomyopathies, Cardiogenic Shock

RESUMEN

Objetivo: Describir las estrategias anestésicas empleadas en pacientes con no compactación del miocardio, considerando que estos casos presentan un desafío importante debido a la complejidad del manejo cardiovascular. Mantener la estabilidad hemodinámica durante la cirugía no cardíaca es crucial para prevenir complicaciones graves. Revisión de la literatura: El manejo anestésico de los pacientes con síndrome no compactado es un desafío considerable. En estas circunstancias, es imprescindible un control estricto de la hemodinámica para proteger órganos vitales, como el cerebro, lo que requiere una planificación y una monitorización anestésica detalladas. De esta forma es posible reducir riesgos y garantizar la estabilidad hemodinámica y metabólica del paciente. El síndrome se ha diagnosticado con mayor frecuencia debido a los avances en las pruebas de imagen que permiten realizar el diagnóstico. Consideraciones finales: El manejo anestésico cuidadoso, con soporte hemodinámico y monitorización rigurosa, es esencial para la recuperación segura de los pacientes con comorbilidades cardíacas. Una planificación adecuada y una intervención temprana pueden garantizar la estabilidad clínica y un resultado favorable en cirugías no cardíacas.

Palabras clave: Anestesia general, Ancianos, Miocardiopatías, Shock cardiogénico

INTRODUÇÃO

A cardiomiopatia não compactada (NCC) é uma condição controversa marcada por trabeculações proeminentes e recessos profundos no ventrículo esquerdo, resultantes de um desenvolvimento incompleto do miocárdio durante a embriogênese. A etiologia exata ainda é discutida, mas fatores genéticos são considerados significativos. A NCC está associada a um aumento do risco de arritmias, insuficiência cardíaca e eventos tromboembólicos (Lorca; Rozado; Martín, 2018; Sharma et al., 2020).

Embora seja uma condição incomum, o aumento da conscientização e as melhorias nas ferramentas de diagnóstico, como ecocardiografia de alta resolução e ressonância magnética cardíaca, têm elevado o número de casos relatados, destacando a necessidade de uma compreensão completa dessa cardiomiopatia e de seu manejo anestésico no perioperatório (Sharma et al., 2020).

O choque cardiogênico (CC) é um estado de débito cardíaco inadequado, que leva à hipoperfusão tecidual, congestão pulmonar e venosa, além de, frequentemente, causar disfunção multissistêmica. Trata-se de uma síndrome heterogênea, com causas variadas, perfis hemodinâmicos diversos e apresentações clínicas que podem diferir amplamente entre os casos. Embora tenham ocorrido avanços significativos nos tratamentos disponíveis, as taxas de mortalidade associadas ao CC permanecem extremamente altas, variando de 30% a 60% (Jentzer et al., 2023; Alkhunaizi et al., 2024). Quando ocorre no contexto peri ou intraoperatório, fatores como o próprio procedimento cirúrgico, a anestesia e as alterações fisiológicas pós-operatórias podem impactar negativamente os desfechos do paciente (Masud et al., 2020).

A justificativa para a realização deste estudo baseia-se na complexidade e raridade do manejo perioperatório de pacientes diagnosticados com NCC. Entende-se que nesses pacientes os riscos são exacerbados devido à diminuição da reserva funcional cardíaca, que podem impactar a resposta ao tratamento e aumentar as complicações durante e após o procedimento cirúrgico.

Dada a escassez de literatura específica sobre o manejo perioperatório em pacientes com NCC, este estudo contribui para o avanço do conhecimento sobre as melhores práticas de controle hemodinâmico, administração de fluidos e suporte anestésico, auxiliando na criação de protocolos mais seguros e eficazes para essa população. Além disso, ao destacar as particularidades e desafios enfrentados por anestesiologistas e equipe cirúrgica, o estudo busca evidenciar a importância de um preparo cuidadoso e de um monitoramento intensivo, favorecendo um cuidado individualizado e aprimorando os desfechos clínicos dos pacientes com NCC.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Os desafios anestésicos em pacientes com cardiomiopatia não compactada são complexos devido à natureza rara e variável da doença, que pode se apresentar desde a ausência de sintomas até insuficiência cardíaca, arritmias e morte súbita cardíaca (Sharma et al., 2020). O miocárdio não compactado é uma miocardiopatia caracterizada por trabeculações ventriculares excessivas e pode predispor a disfunção ventricular e arritmias malignas (Wan et al., 2024).

Durante os estágios iniciais do desenvolvimento embrionário, o miocárdio se desenvolve e forma trabéculas interligadas separadas por espaços intertrabeculares. Essa estruturação gera um aumento da área de superfície e aprimora a nutrição miocárdica através da difusão nesse período no qual a circulação coronária ainda está sendo estabelecida. No período entre a quinta e a oitava semana de vida intrauterina, o desenvolvimento da circulação coronariana é concretizado. Concomitantemente, ocorre uma compactação das trabéculas miocárdicas que se inicia no epicárdio em direção ao endocárdio. No coração adulto, apenas permaneceriam algumas trabeculações, em especial no ventrículo direito. Logo, o portador da síndrome apresenta uma falha no desenvolvimento do miocárdio embrionário.  Diversos fatores estão associados a fisiopatologia desse fenótipo e aproximadamente um terço dos casos, apresenta uma variante patogênica relacionada, sendo a maioria de herança autossômica dominante. Os genes envolvidos mais comumente são TTN, MYH7, ACTC1 e MYBPC3. Em relação ao risco ampliado de morte súbita cardíaca, as variantes nos genes LMNA e RBM20 estão mais associadas. (Lorca; Rozado; Martín, 2018; Sharma et al., 2020).

No eletrocardiograma (ECG), podem ser encontrados atrasos na condução intraventricular, bloqueios de ramo, alterações do segmento ST, inversão da onda T e prolongamento do QT. Não existe nenhum padrão de ECG específico para a síndrome do miocárdio não compactado e em alguns casos o ECG é normal.  (Lorca; Rozado; Martín, 2018; Sharma et al., 2020).

A primeira descrição ecocardiográfica de NCC ocorreu em 1984 por Engberding e Bender. Posteriormente, Chin et al. realizaram a análise de uma série com 8 casos diagnosticados por critérios ecocardiográficos. O ecocardiograma transtorácico foi um dos primeiros exames para o diagnóstico com  diferentes critérios utilizados ao longo da história. Assim, baseado na primeira descrição de Chin et al., uma relação entre a camada compactada e o miocárdio total menor que 0,5 (razão x/y <0,5) indica não compactação, sendo essas imagens visualizadas na projeção eixo curto paraesternal e na fase diastólica final do ciclo cardíaco. (Lorca; Rozado; Martín, 2018; Sharma et al., 2020).

A ressonância cardíaca quantifica corretamente a função ventricular, realizando uma caracterização tecidual, além de avaliar e quantificar o tecido fibrótico, contribuindo ainda para consolidação do prognóstico. A condição arritmogênica desses pacientes associada às trabeculações gera ainda aumento de eventos tromboembólicos, então a ressonância também contribui para descartar a presença de trombos. Devido a uma ampla variedade de cardiomiopatias, esse exame de imagem auxilia no diagnóstico diferencial com miocardiopatia hipertrófica e a presença de fenótipos mistos não facilmente diagnosticados por ecocardiografia. Também facilita o estudo de outras anomalias associados, bem como a função e morfologia do ventrículo direito. Finalmente, a tomografia computadorizada cardíaca é útil para a avaliação anatômica e funcional de ambos os ventrículos, e também permite o estudo das artérias coronárias. No entanto, o emprego a radiação e a ausência de caracterização do tecido são limitações que devem ser levadas em consideração. (Sharma et al., 2020).

Em virtude da ampla variedade de apresentação da síndrome do miocárdio não compactado, não há diretrizes específicas para o seu manejo clínico. A avaliação é composta por exames como ecocardiograma, holter, teste de esforço e testes genéticos. O tratamento envolve o manejo das possíveis complicações advindas da doença, como arritmias, insuficiência cardíaca e eventos tromboembólicos. A anticoagulação deve ser considerada em pacientes com disfunção sistólica e arritmias associadas, principalmente fibrilação atrial. A implementação de desfibriladores automáticos deve ser instituída em pacientes com síncopes, arritmias ventriculares ou insuficiência ventricular esquerda grave, visando prevenção de morte súbita. (Sharma et al., 2020).

Nos pacientes com distúrbios de condução e arritmias mais frequentes a técnica de ablação pode ser aventada e o procedimento pode ainda ser necessário na superfície epicárdica, além da abordagem endocárdica habitualmente utilizada, uma vez que áreas geradoras de arritmia podem estar no miocárdio fibrótico de regiões trabeculadas ou não. (Lorca; Rozado; Martín, 2018; Sharma et al., 2020).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O manejo anestésico de pacientes com miocárdio não compactado exige um planejamento cuidadoso e uma abordagem multidisciplinar, considerando os riscos de instabilidade hemodinâmica perioperatória. A eficácia das estratégias adotadas, evidencia que a combinação de um planejamento anestésico detalhado, monitorização constante e intervenção farmacológica apropriada são fundamentais para garantir melhores desfechos. Logo, torna-se evidente a necessidade de atenção especial e planejamento personalizado em pacientes com doenças cardíacas estruturais, a fim de minimizar riscos e otimizar os resultados clínicos.

REFERÊNCIAS

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1Universidade Católica de Brasília (UCB) , Brasília – DF.
E-mail:crivellarolimalaura@gmail.com

2Universidade Potiguar (UNP), Natal – RN. karolfigueiredosaboia@gmail.com