THE MEETING OF KNOWLEDGE: THE INTEGRATION OF MODERN SCIENCE WITH INDIGENOUS TRADITIONAL KNOWLEDGE IN MEDICINE
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102502181225
Brenda Uchoa Ramos¹
Susy Mota Nascimento Sampaio²
Maria Elma Uchoa Ramos³
Olívia dos Santos Simoes⁴
Alexandre Maslinkiewicz⁵
Hélder Ferreira da Silva⁶
Priscila Silva de Brito⁷
Resumo
Resumo: Este estudo teve como objetivo examinar a interação entre a medicina moderna e os saberes tradicionais indígenas, especialmente no uso de plantas medicinais e práticas holísticas de saúde. Historicamente, os saberes indígenas foram deslegitimados pelo modelo racionalista e econômico dominante, mas, nos dias atuais, há um movimento crescente de valorização dessas práticas. A filosofia do “Bem Viver”, que enfatiza a harmonia entre ser humano, natureza e sociedade, oferece uma base para integrar esses saberes à medicina contemporânea, contribuindo para uma sociedade mais justa, sustentável e respeitosa com os conhecimentos ancestrais. Embora a medicina tradicional indígena tenha demonstrado benefícios claros, como o uso de plantas medicinais para o cuidado da saúde, a medicina convencional ainda predomina e marginaliza as terapias alternativas. A documentação e a sistematização dos saberes indígenas sobre plantas medicinais são fundamentais para sua inclusão no currículo escolar, o que garantiria a preservação e transmissão desses conhecimentos às novas gerações. Além disso, essa integração ajudaria a fortalecer a saúde comunitária, especialmente nas regiões amazônicas, ao incorporar práticas tradicionais em uma abordagem de cuidado mais ampla. O estudo também ressaltou a importância de continuar a pesquisa sobre os saberes ancestrais e de incluir essas práticas nas políticas públicas de saúde. O reconhecimento das terapias indígenas nas políticas de saúde, como a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, é essencial para garantir que essas abordagens sejam valorizadas e incorporadas ao sistema de saúde. Reformas nas políticas de saúde pública devem garantir que as comunidades indígenas tenham acesso a cuidados que respeitem suas tradições, promovendo um modelo de saúde mais inclusivo e sustentável.
Palavras-chave: Saberes Tradicionais; Medicina Indígena; Bem Viver; Políticas Públicas de Saúde.
1 INTRODUÇÃO
A partir da década de 1970, começou a crescer o interesse de organismos internacionais pelas práticas medicinais tradicionais, as quais, com o impacto da globalização, se tornaram amplamente populares no âmbito da saúde humana. Nas últimas décadas, esse crescente interesse mundial pelos conhecimentos e práticas tradicionais gerou debates públicos que, em muitos casos, culminaram na implementação de políticas públicas. Um exemplo disso é a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos no Brasil, que representa uma formalização do saber tradicional e popular, ao mesmo tempo em que promove a valorização da biodiversidade nacional e apoia o desenvolvimento da indústria farmacêutica local (CASTRO, 2019).
Os indígenas lidam com suas enfermidades principalmente por meio de redes familiares e comunitárias, nas quais os conhecimentos e práticas de cuidados tradicionais com a saúde estão amplamente disseminados. Nesse contexto, os cuidados iniciais para a recuperação do paciente são oferecidos, e é nesse momento que se decide se será necessário buscar tratamento especializado ou não. Assim, fortalecer os laços de cuidado e ancestralidade também envolve desmistificar e ampliar o acesso à saúde para essa população (GONÇALVES, 2020).
As plantas medicinais sempre desempenharam um papel fundamental como principal recurso terapêutico no passado para o tratamento da população. Através do conhecimento popular e seu uso contínuo, surgiram medicamentos empregados na medicina tradicional, como os salicilatos e digitálicos. Com o avanço da ciência e da tecnologia, o valor terapêutico das plantas medicinais tem sido investigado e validado pela pesquisa científica, resultando em uma crescente recomendação de seu uso por profissionais de saúde. Além disso, com o progresso tecnológico e o crescente interesse em validar os saberes da medicina popular, as plantas medicinais têm sido cada vez mais estudadas para confirmar seu potencial terapêutico (NASCIMENTO, 2023).
A fusão dos conhecimentos da medicina moderna com os saberes tradicionais indígenas levanta debates sobre a valorização e a aplicação de ambos no cuidado à saúde. Enquanto a medicina moderna se fundamenta em evidências científicas e avanços tecnológicos, os saberes indígenas, frequentemente marginalizados, envolvem práticas curativas baseadas em um entendimento profundo da natureza e da espiritualidade. A resistência à integração dessas abordagens é impulsionada pela visão predominante de que os conhecimentos tradicionais não têm respaldo científico. Contudo, a questão reside em como superar as barreiras culturais e epistemológicas, respeitando as práticas indígenas e, ao mesmo tempo, incorporando-as de forma que beneficie a saúde coletiva, sem distorções ou apropriações indevidas. O debate sobre essa integração busca equilibrar o respeito pelos saberes ancestrais e as inovações da medicina moderna.
Este estudo tem como objetivo investigar a fusão dos conhecimentos da ciência moderna com as práticas tradicionais indígenas na medicina, explorando como essa integração pode enriquecer as abordagens de cuidado à saúde, promovendo o respeito e a valorização das culturas e saberes ancestrais. Também visa analisar os obstáculos e as oportunidades que surgem dessa conexão, especialmente no que se refere ao atendimento à saúde das comunidades indígenas e à melhoria dos serviços de saúde pública.
2 A Medicina Tradicional Indígena
A medicina tradicional consiste em um conjunto de práticas de saúde, crenças e conhecimentos que utilizam recursos naturais, como plantas, animais ou minerais, além de terapias espirituais e técnicas manuais, com o objetivo de preservar a saúde individual e coletiva, sendo especialmente prevalente nas comunidades indígenas. Já a medicina científica, ou alopática, é a abordagem convencionalmente reconhecida e adotada pelo sistema de saúde oficial (INÁCIO, 2018).
Desde os primeiros tempos, o ser humano tem enfrentado desafios relacionados à saúde e, ao longo da história, recorreu aos recursos oferecidos pela natureza ou pela sociedade para encontrar soluções para esses problemas. A Medicina Tradicional sempre esteve intrinsecamente ligada à vida das pessoas e das comunidades (JOZANE, 2020).
No Brasil, a assistência à saúde das populações indígenas, historicamente marginalizadas, tem uma trajetória marcada por ações e serviços, na maioria das vezes, desiguais e desrespeitosos em relação à cultura desses povos. Foi somente a partir dos séculos XVIII e XIX, com a influência dos pensadores iluministas, que os conceitos de igualdade, fraternidade e liberdade começaram a ganhar destaque por toda a América, incluindo o Brasil. A partir desse período, iniciaram-se os processos em favor da independência, e algumas políticas públicas que visavam beneficiar grupos sociais excluídos começaram a ser implementadas (GONÇALVES, 2020).
No cotidiano do caboclo amazônico, a prática de benzedor/puxador foi mesclada às práticas religiosas cristãs, funcionando como uma estratégia de resistência dos saberes ancestrais frente às imposições da civilização ocidental, em grande parte impulsionadas pela parceria entre o Estado e a Igreja. Este estudo preliminar, sem grandes pretensões, busca evidenciar que a pajelança cabocla também é realizada nas cidades, e que a Feira da Manaus Moderna se configura como um espaço público onde práticas curativas, envolvendo corpo, mente e espírito, são realizadas para aqueles que buscam ser benzidos ou puxados (CASTRO, 2019).
Os povos indígenas adotam duas práticas principais no cuidado com a saúde: o Bahsese e o uso de plantas medicinais. O Bahsese é um conjunto de “benzimentos” realizados por pajés, que são especialistas indígenas, e visa curar doenças por meio de fórmulas metaquímicas. Essas práticas incluem o wetidarese para prevenção, o bahsekamotase para proteção e o doatisebahsese para o tratamento de enfermidades. Além disso, os indígenas têm um profundo conhecimento sobre as plantas medicinais, utilizando diversas ervas e plantas para tratar doenças, prevenir enfermidades e até alcançar objetivos específicos, como caçar ou conquistar alguém. A floresta, para eles, é uma fonte rica de remédios naturais essenciais para o bem-estar (SCHWEICKARDT, 2023).
De acordo com Lima (2017), a abordagem indígena sobre doença e saúde ultrapassa a dimensão biológica. Ela envolve também aspectos cosmopolíticos que influenciam o cuidado com a saúde. Dessa forma, a visão de saúde não se restringe ao biológico, mas envolve uma rede de relações entre o indivíduo, outros seres, os waimahsã, animais, especialistas, familiares e outras pessoas.
Com as mudanças sociais e históricas na formação da sociedade brasileira, e a promoção da “aculturação” da medicina local segundo as novas abordagens da medicina europeia, estabeleceu-se a medicina científica, diferenciando-se da medicina popular. Esse modelo biomédico, centrado em um saber clínico, racional, experimental e hospitalocêntrico, que divide corpo e mente, foi ganhando força. Ele sustenta o paradigma da produção de saúde, sendo orientado por interesses mercadológicos que impactam e limitam a autonomia e a preservação dos saberes dos povos indígenas (FERNANDES, 2024).
2.1 A Ciência Moderna e a Integração com Práticas Tradicionais na Medicina
A medicina tradicional envolve a combinação de conhecimentos empíricos e práticas que perduram por séculos, aplicadas no diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças, sendo baseadas nas crenças e vivências de diversas culturas nativas (GOMES, 2023).
O diálogo entre diferentes abordagens é crucial tanto para o equilíbrio sociocultural das comunidades quanto para o avanço da medicina respaldada pela ciência. Ao longo da trajetória humana, as questões relacionadas ao corpo sempre foram buscadas, levando em consideração o contexto temporal e geográfico, resultando em diversos níveis de entendimento e eficácia. A medicina científica, embora tenha realizado suas próprias experimentações, em muitos casos, incorporou os saberes tradicionais e os conhecimentos populares em suas práticas (MORAIS, 2023).
Para Nink (2023), as crenças populares e os recursos não convencionais, empregados no tratamento de questões de saúde, são vistos pela população como elementos intimamente relacionados aos aspectos socioculturais. Dessa forma, devem ser reconhecidos como fatores importantes ao avaliar o indivíduo de forma integral, levando em conta seu pertencimento a um processo histórico.
As práticas tradicionais de cura que persistem ao longo das gerações, mesmo com o progresso da medicina científica, representam um reflexo adaptado à realidade contemporânea das práticas do passado. Elas mantêm princípios comuns, como o uso empírico de remédios feitos a partir de recursos naturais, a realização de rituais específicos e a mediação de forças ou energias, que são interpretadas de formas variadas, dependendo do tipo de prática e do contexto histórico, para promover as curas (GEWEHR, 2017).
De acordo com Langdon e Wiik (2010), “os sistemas médicos de cuidados à saúde, assim como as respostas dadas às doenças, são construções culturais, adaptadas aos grupos e às realidades sociais que os geram”. Assim, as práticas de cuidado indígenas se configuram como sistemas simbólicos, que não são imutáveis ou homogêneos. Esses sistemas são compostos por significados que estão enraizados em estruturas específicas de instituições e padrões de interações entre as pessoas. Os indivíduos, enquanto seres conscientes desses sistemas simbólicos, percebem e interagem com o mundo ao seu redor.
As transformações atuais no setor de saúde e a evolução das abordagens ensino indicam a importância de promover o desenvolvimento de habilidades profissionais em contextos de aprendizado prático, estreitamente conectados aos ambientes nos quais o trabalho será realizado (FERLA, 2021).
Para Araújo (2021), a produção de saúde nos dias de hoje envolve uma combinação de saberes e tecnologias de várias origens. Com o crescimento e a predominância dos saberes biomédicos, outras formas de entendimento, conhecimentos e práticas de saúde, que existem há muito tempo antes da biomedicina, foram sendo marginalizadas, consolidando a ideia de que a saúde está ligada ao corpo biológico, direcionando os cuidados majoritariamente para essa esfera. Contudo, existem diversas maneiras de perceber e entender a saúde, seja na sua racionalidade ou pela integração dos saberes tradicionais e ancestrais. Essa convivência, porém, é muitas vezes limitada por políticas que hierarquizam os saberes e práticas, desconsiderando ou até eliminando aquelas que não correspondem à visão vigente, como ocorre com os saberes da medicina tradicional indígena.
3 METODOLOGIA
De acordo com Morosini (2015), a produção científica não se limita ao pesquisador responsável por sua elaboração, mas também é moldada pela instituição à qual ele pertence, pelo país em que reside e pela sua interação com a perspectiva global. Em outras palavras, a produção científica está inserida em um contexto maior, que inclui as normas e diretrizes que regem sua composição.
Na análise documental realizada por Borges (2020), esta é definida como um conjunto de operações planejadas para representar o conteúdo de um documento de maneira diferente da original, facilitando sua consulta e uso posterior. Prodanov (2013) destaca que, na pesquisa bibliográfica, os pesquisadores têm acesso a todo o material escrito relacionado ao tema do estudo, e é crucial que verifiquem a autenticidade dos dados coletados, identificando possíveis inconsistências ou contradições nos trabalhos analisados.
Kohls (2021) enfatiza que a redação de uma bibliografia sistemática deve envolver uma leitura atenta e flutuante das obras que a compõem. Nesse processo, os resumos das publicações devem ser lidos para garantir que estão alinhados aos objetivos do estudo. Caso alguma obra se mostre inconsistente com os objetivos do trabalho, ela deve ser excluída da bibliografia.
O estudo em questão foi baseado em uma revisão bibliográfica com abordagem qualitativa e de caráter descritivo, visando investigar a fusão dos conhecimentos da ciência moderna com as práticas tradicionais indígenas na medicina. Gil (2016) aponta que a coleta de dados foi realizada a partir de diversas fontes de evidência, incluindo entrevistas e observação participante, para explorar pontos de interesse relevantes ao tema. Documentos que se alinhassem aos objetivos da pesquisa foram incluídos, enquanto materiais que apresentavam inconsistências ou não atendiam aos critérios de autenticidade foram excluídos. A análise envolveu dados coletados em bases como PUBMED, SCIELO e LILACS, dentro do período de 2020 a 2024, seguindo os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Após a análise inicial de 77 estudos, 7 foram selecionados com base nos critérios de inclusão e exclusão definidos. A pesquisa destacou a importância da integração entre os saberes tradicionais indígenas e a medicina moderna, evidenciando que, embora os saberes ancestrais tenham sido historicamente deslegitimados, há um movimento crescente para valorizá-los e recuperá-los. As principais contribuições dos saberes indígenas identificadas incluem o uso de plantas medicinais, rituais de cura e práticas holísticas, que se mostram eficazes no cuidado à saúde, especialmente nas populações que mantêm essas tradições vivas.
Auto/Ano | Título | Metodologia | Resultados | Conclusão |
(BACELAR, 2024) | A PRÁTICA NA MEDICINA TRADICIONAL INDÍGENA E A FILOSOFIA DO BEM VIVER NOS CUIDADOS EM SAÚDE: UM RECORTE NO BRASIL | Revisão | Esses saberes enfrentaram a deslegitimação de seus conhecimentos. O Bem Viver surge como contraponto ao modelo de desenvolvimento econômico mundial, do individualismo e racionalismo, para uma filosofia de vida de integração e socialização das relações eu-outro-ambiente, trazendo a recuperação de saberes tradicionais. | Apesar dos benefícios da medicina tradicional, a medicina hegemônica ainda ocupa o protagonismo como tratamento e busca pela “cura”. |
(SILVA, 2024) | USO DE PLANTAS MEDICINAIS POR POVOS MILENARES DA AMAZÔNIA – BRASIL (MUNDURUKU, KARAPÃNA, PUPỸKARY, TIKUNA E KOKAMA), GUINÉ BISSAU (FULAS, GABU) E MOÇAMBIQUE –TETE (DEMA E NYUNGWE): UMA PERSPECTIVA COMPARADA | Revisão | Podemos afirmar que as plantas medicinais documentadas podem integrar o currículo como conteúdo da área de ciências ancestrais, integrando materiais para uso didático pedagógico escolar pois se configura em saberes e fazeres práticos para manutenção da saúde. | Destacamos que é relevante continuar pesquisas na área que documentem o tema, mantendo viva a conexão ancestral com as plantas medicinais, saberes e fazeres milenares dos povos em geral, valorizando seu papel como fonte de cura e bem-estar. |
(GIMOVSKI, 2024) | TERRITÓRIOS DO SABER: A INTEGRAÇÃO DE SABERES ANCESTRAIS | Revisão | A discussão mais ampla sobre o reconhecimento da diversidade cultural e dos saberes tradicionais se revela como um elemento fundamental para a construção de uma sociedade mais justa, equitativa e sustentável, onde diferentes formas de conhecimento podem contribuir de maneira complementar para o bem-estar coletivo. | A integração do conhecimento tradicional, incluindo os saberes ancestrais, incentiva o reconhecimento desses conhecimentos como vitais para superar desafios ambientais contemporâneos, visando uma convivência mais equilibrada e respeitosa com a natureza. |
(VASCONCELOS, 2023) | REVALORIZAÇÃO DOS SABERES AMAZÔNICOS EM SAÚDE: EXPLORANDO NOVAS POSSIBILIDADES DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES (PICS) NO CONTEXTO DECOLONIAL | Revisão | A análise explorou as “Políticas Públicas em Saúde”, evidenciando a institucionalização de terapias alternativas e complementares. | Ressalta-se a importância de políticas públicas de saúde que não marginalizem determinados saberes e que reconheçam e valorizem os ricos conhecimentos medicinais e os cuidados com a saúde típicos da região amazônica. |
(MACIEL, 2023) | POLÍTICAS INDIGENISTAS NAS POLÍTICAS DA SAÚDE E DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: UM ESTUDO SOBRE AS LEGISLAÇÕES E A PERCEPÇÃO INDÍGENA | Empírica descritiva | Os resultados demonstram primeiramente, a urgência em se desenvolver novas epistemologias que sustentem teoricamente o impulso rumo à decolonialidade em diversas esferas amazônicas, especialmente quando se trata da saúde sob uma perspectiva não hegemônica. Em segundo lugar, é fundamental que as “Políticas Públicas em Saúde”, ao endossarem a incorporação das “Práticas Integrativas Complementares”, não marginalizem certas terapias, sobretudo os ricos saberes medicinais e cuidados com a saúde presentes na Amazônia. | Concluímos a necessidade de a necessidade de aprofundar ainda mais este estudo, reconhecendo sua relevância em termos de enriquecer o campo dos saberes tradicionais em saúde. |
(MARCONDES, 2021). | POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE INDÍGENA | Revisão | Foi possível perceber que apesar da intenção positiva de se criar uma política especial para os povos indígenas, há ainda muitos gargalos encontrados no caminho, como falhas organizacionais dos DSEIs, ineficiência do controle social proposto, o olhar cético para as práticas tradicionais. | Concluímos que há a necessidade de reformas e avaliações quantitativas e qualitativas da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, com o objetivo de reduzir essas falhas e implementar uma política mais eficiente. Para isso, demanda-se uma transformação na forma que o Estado e sociedade olham para os povos indígenas e a cultura tradicional, inserindo esses últimos no mundo acadêmico ou como profissionais de saúde dentro do subsistema indígena. |
(CASTRO, 2019). | SABERES TRADICIONAIS, BIODIVERSIDADE, PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES: O USO DE PLANTAS MEDICINAIS NO SUS1 | Revisão | Conforme resultados, a prática do uso das plantas medicinais é fortemente recomendada pelos organismos internacionais e a sua institucionalização através Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos valoriza sobremaneira os saberes tradicionais no cuidado à saúde adquiridos ao longo dos séculos. | O uso das plantas medicinais na atenção à saúde básica implica numa forma de tratamento médico diferenciado da medicina praticada atualmente, que se baseia amplamente em métodos cientificistas onde a tecnologia se sobressai à prática médica fundamentada na precaução e prevenção. |
Fonte: (Autor, 2025).
Para Ferreira (2013), os significados associados à medicina tradicional indígena são múltiplos e frequentemente revisados ou reformulados em contextos de diálogos concretos, o que confere a elas um caráter dinâmico e em constante transformação. Enquanto os discursos oficiais utilizam o poder de nomenclatura para definir as medicinas tradicionais, as perspectivas indígenas fazem referência a saberes e práticas de autocuidado que estão profundamente enraizados em contextos locais específicos. As políticas públicas são apropriadas e adaptadas pelos povos indígenas, adquirindo novos significados e impactando a reorganização sociocultural das práticas de cuidado à saúde.
Embora haja um otimismo em relação à integração das práticas alternativas de saúde como complementos aos tratamentos oferecidos pelo “Sistema de Saúde Brasileiro”, surge a questão: como tornar os saberes tradicionais amazônicos sobre saúde parte do sistema institucional, sem que as pessoas que os detêm se tornem invisíveis e sem que seus conhecimentos sejam desvalorizados ao serem oficialmente reconhecidos (VASCONCELOS, 2023).
Para Silva (2024), o emprego de plantas medicinais pelas comunidades dessas culturas vai além de um mero tratamento terapêutico, representando uma profunda manifestação cultural. Esse fenômeno evidencia a importância das normas, valores e práticas culturais na formação constante da identidade dos indivíduos dentro de seus grupos sociais.
De acordo com Maciel (2023), esses conhecimentos indígenas na área da saúde, reunidos, não estão em posição inferior nem superior ao conhecimento científico. Eles se encontram em um nível de horizontalidade, onde o diálogo intercultural e, especificamente, o intercâmbio entre as práticas medicinais, é essencial para a implementação de abordagens mais plurais no cuidado ao corpo.
Em síntese, a integração da medicina tradicional e a promoção do uso das plantas medicinais no sistema de saúde têm o potencial de transformar profundamente a saúde pública no Brasil. As políticas de saúde, ao valorizarem essas práticas, estarão não apenas preservando uma rica herança cultural, mas também oferecendo alternativas efetivas e complementares ao sistema de saúde vigente, contribuindo para uma sociedade mais justa, equilibrada e sustentável.
5 CONCLUSÃO
A análise realizada evidencia que, apesar da deslegitimação histórica dos saberes tradicionais, especialmente no campo da medicina indígena, há um movimento contemporâneo de valorização dessas práticas que se configura como uma resposta ao modelo de desenvolvimento dominante, caracterizado pelo individualismo e racionalismo. A filosofia do “Bem Viver”, que promove a integração das relações entre o ser humano, o outro e o ambiente, oferece um alicerce para a preservação desses saberes, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa, equitativa e sustentável.
Embora a medicina tradicional, com seu uso de plantas medicinais e abordagens holísticas, apresente benefícios comprovados, ela ainda enfrenta marginalização frente à medicina hegemônica, que segue predominando no tratamento e cuidado à saúde. A inclusão de saberes tradicionais no currículo escolar, por meio de disciplinas sobre “ciências ancestrais”, pode ajudar a preservar e transmitir esses conhecimentos, além de fornecer práticas úteis para a promoção da saúde, especialmente entre as novas gerações.
A continuidade das pesquisas que documentam as práticas ancestrais é fundamental para manter viva a conexão com os saberes indígenas, especialmente os relacionados às plantas medicinais. Para que esses saberes se integrem de forma plena às políticas públicas de saúde, é necessário que as abordagens tradicionais sejam reconhecidas e respeitadas, especialmente nas regiões amazônicas. A implementação de políticas inclusivas e a reformulação da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas são passos essenciais para garantir o acesso a cuidados de saúde que respeitem as culturas indígenas e promovam um modelo de saúde mais holístico e respeitador das diversidades culturais.
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