FAUNISTIC SURVEY OF PHLEBOTOMINES (DIPTERA: PSYCHODIDAE) IN THE CITY OF MACEIÓ, ALAGOAS, BRAZIL, IN 2021
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202502161926
Micaele Alves da Silva1
Rebeca Emanuela de Almeida Silva1
Müller Ribeiro Andrade2
Resumo
Flebotomíneos são dípteros hematófagos de grande relevância para a saúde pública, pois suas fêmeas são vetores das leishmanioses, importantes antropozoonoses. A diversidade da fauna flebotomínica é influenciada por fatores ambientais, geográficos e ecológicos. Maceió, capital de Alagoas, é considerada área endêmica para leishmaniose, mas estudos sobre a ocorrência e a distribuição das espécies de flebotomíneos ainda são escassos. Este estudo teve como objetivo analisar a composição da fauna de flebotomíneos em Maceió, Alagoas, no ano de 2021. Realizou-se uma análise retrospectiva descritiva com dados fornecidos pela Unidade de Vigilância e Zoonoses de Maceió, em 2021. Foram utilizadas armadilhas luminosas do tipo CDC, resultando na coleta e identificação de 375 espécimes em 10 bairros. Quatro espécies distintas foram identificadas: Lutzomyia longipalpis (96%; 360/375 exemplares) foi a mais prevalente, seguida por Nyssomyia whitmani (1,33%; 5/375), Evandromyia sallesi (1,07%; 4/375) e Evandromyia evandroi (0,27%; 1/375). Não foi possível identificar 1,33% (5/375) dos espécimes capturados. Os resultados evidenciam uma maior frequência de L. longipalpis, espécie de importância crucial na transmissão da leishmaniose, destacando a necessidade de monitoramento contínuo e adoção de estratégias de prevenção e controle.
Palavras-chave: Vetor. Leishmaniose. Entomologia.
1 INTRODUÇÃO
Os flebotomíneos pertencem à ordem Diptera, família Psychodidae, subfamília Phlebotominae, sendo pequenos insetos que medem entre 3 e 5 mm de comprimento. Popularmente conhecidos como mosquito-palha, tatuquira e birigui, esses insetos são amplamente distribuídos e adaptados a diversos ambientes, incluindo áreas silvestres (solo e folhas caídas), domicílios (fendas em paredes e pisos) e áreas peridomésticas (galinheiros e pocilgas). Eles preferem ambientes úmidos, protegidos da luz solar direta e de ventos fortes, apresentando um ciclo biológico holometábolo (RÊGO, 2013; MENDONÇA, 2022).
As fêmeas hematófagas dos flebotomíneos atuam como vetores de protozoários do gênero Leishmania, responsáveis por causar as leishmanioses, doenças classificadas como antropozoonoses e como enfermidades tropicais negligenciadas (BRASIL, 2022). No Brasil, as leishmanioses visceral e cutânea constituem graves problemas de saúde pública (BENCHIMOL, GUALANDI E BARRETO, 2019).
A expansão geográfica dos vetores, impulsionada por fatores climáticos, tem contribuído para o aumento da transmissão das diferentes formas de leishmaniose (MENDES, COELHO E FÉRES, 2016). Embora outras espécies também possam estar envolvidas, o principal vetor da leishmaniose visceral (LV) no Brasil é Lutzomyia longipalpis, que apresenta elevada abundância nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste (THIES et al., 2023; GONTIJO E MELO, 2004).
No estado de Alagoas, a fauna de flebotomíneos permanece pouco documentada, com lacunas significativas no conhecimento sobre a distribuição e ecologia dessas espécies, conforme apontado por Andrade Filho e Brasil (2009). Essa deficiência é ainda mais evidente na capital Maceió, a região mais desenvolvida e populosa do estado. Investigar a composição populacional dos flebotomíneos em Maceió é crucial para compreender sua biologia e dada a relevância epidemiológica (SARAIVA, LOPES E OLIVEIRA, 2006).
Neste contexto, o presente estudo teve como objetivo analisar a composição da fauna de flebotomíneos em Maceió, Alagoas, no ano de 2021, buscando fornecer dados atualizados para subsidiar estratégias de vigilância e controle das leishmanioses na região.
2 METODOLOGIA
O estudo foi conduzido por meio de uma análise transversal retrospectiva dos flebotomíneos capturados em 2021, com base nas pesquisas entomológicas realizadas no município de Maceió, Alagoas, por meio da Unidade de Vigilância em Zoonoses (UVZ). Para as análises entomológicas e captura dos flebotomíneos, foram utilizadas armadilhas luminosas do tipo Center for Disease Control (CDC), conforme os protocolos descritos por Osmari (2023) e as orientações do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016). Em 2021, as armadilhas foram distribuídas em dez bairros e instaladas em locais peridomiciliares de residências que residiam cães reagentes na investigação sorológica para infecção por Leishmania sp. ou em regiões com casos confirmados de leishmaniose em humanos. A coleta ocorreu no período crepuscular, entre 17h e 18h, por três dias consecutivos, repetindo-se os locais de instalação.
Após a coleta, os insetos foram encaminhados para o Laboratório de Entomologia da UVZ, onde os técnicos separavam os insetos capturados e identificavam os flebotomíneos, com o auxílio das chaves dicotômicas de Young e Duncan (1994) e Galati (2003).
Os dados obtidos foram organizados em planilhas no Microsoft Excel para análise descritiva. Foram avaliadas variáveis como bairro, quantidade de flebotomíneos, espécie, sexo e mês, utilizando o Sistema de Dados da Unidade de Vigilância e Zoonoses de Maceió.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A análise dos dados acerca da distribuição de flebotomíneos no município de Maceió, Alagoas, em 2021, amostrou 375 flebotomíneos, sendo 56% (210/375) machos e 44% (165/375) fêmeas. Destes, 1,33% (5) não tiveram sua espécie identificada. Foram identificadas quatro espécies de flebotomíneos distintas, sendo a mais frequente Lutzomyia longipalpis, seguida por Nyssomyia whitmani, Evandromyia sallesi e Evandromyia evandroi. A tabela 1 descreve a espécie, frequência de espécies por sexo e por ano dos flebotomíneos coletados.
Tabela 1 – Composição faunística e quantificação por sexo dos flebotomíneos coletados em Maceió, Alagoas, em 2021.
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Em 2021, o levantamento faunístico de flebotomíneos realizado no município de Maceió, Alagoas, identificou uma alta frequência da espécie Lutzomyia longipalpis, amplamente reconhecida como o principal vetor da Leishmania infantum chagasi, agente etiológico da leishmaniose visceral. Essa doença é de grande relevância epidemiológica, especialmente no Brasil e em outras regiões endêmicas da América Latina, onde a transmissão entre o vetor e os hospedeiros, como cães, facilita a disseminação do parasita (ANDRADE BARATA et al., 2005; SILVA et al., 2019; MIKERY-PACHECO et al., 2023).
Estudos realizados em outras áreas endêmicas do Nordeste reforçam esses achados. Por exemplo, Marques (2019) observou que L. longipalpis foi a espécie mais prevalente no município de Caruaru, Pernambuco, entre janeiro de 2018 e junho de 2019, confirmando a adaptação da espécie a diferentes tipos de ambientes, incluindo áreas urbanas e periurbanas, que são frequentemente associadas a um maior risco de transmissão da doença.
A espécie Nyssomyia whitmani desempenha papel na epidemiologia da leishmaniose tegumentar (DA COSTA, CORDEIRO E RANGEL, 2018; SANTINI et al., 2018). Apresenta forte preferência por locais com vegetação densa, como matas ciliares e áreas periféricas, onde a interação entre humanos e vetores é mais intensa, possuindo capacidade de adaptar-se a diferentes ecossistemas tornando sua monitoração e controle um desafio (TEODORO et al., 2003).
As espécies Evandromyia evandroi e Evandromyia sallesi, embora tenham sido identificadas com baixa frequência em nosso estudo, apresentam associação com a transmissão de Leishmania infantum chagasi, contudo, o papel na transmissão da leishmaniose visceral ainda necessita de mais investigações (SHERLOCK, 1996; SARAIVA et al., 2006).
Os dados obtidos evidenciam uma predominância de exemplares machos (210) em relação às fêmeas (165), um resultado que pode ser explicado por um comportamento reprodutivo inerente aos flebotomíneos, em que os machos acompanham as fêmeas durante seus deslocamentos para aumentar as chances de fertilização (DOMINGOS et al., 1998). Esse achado também é consistente com a literatura clássica, como descrito por Barretto (1943), que destacou a maior atração de machos pela luz das armadilhas do tipo CDC. A presença de uma fonte luminosa parece atuar como um fator atrativo diferencial para os machos. No entanto, a relação entre o tipo de armadilha utilizada e a captura diferenciada por sexo permanece indefinida, como apontado por Bastos et al. (2016), que questionam se essa tendência decorre exclusivamente do comportamento dos flebotomíneos ou da configuração das armadilhas. Esses achados reforçam a necessidade de investigações adicionais para entender os fatores que influenciam a captura seletiva de sexos e avaliar se outros métodos de captura poderiam oferecer uma estimativa mais equilibrada da população de flebotomíneos.
Embora não tenha sido o foco deste estudo, é amplamente reconhecido que a presença e a variação sazonal das populações de flebotomíneos estão diretamente relacionadas a fatores climáticos e ambientais específicos de cada região geográfica. Variáveis como temperatura, umidade relativa do ar e índice pluviométrico, assim como características ambientais, incluindo composição do solo, altitude, relevo e tipo de vegetação, influenciam diretamente a distribuição e dinâmica populacional desses vetores (BRASIL, 2014). Adicionalmente, é importante considerar que a pandemia de COVID-19 teve um impacto significativo sobre atividades de campo, incluindo programas de vigilância entomológica, interrompendo coletas de dados durante os anos de 2020 e 2021. Essa interrupção não apenas limitou a obtenção de informações contínuas, mas também pode ter contribuído para uma redução nas taxas de captura de flebotomíneos devido à menor frequência de monitoramento e à ausência de intervenções diretas nos locais de coleta. Esse contexto reforça a importância de estratégias adaptativas para a manutenção do monitoramento entomológico em situações de crise.
4 CONCLUSÃO
Os resultados obtidos permitiram a identificação e quantificação de espécies de flebotomíneos no município de Maceió, evidenciando sua relevância para os aspectos epidemiológicos relacionados à transmissão da leishmaniose. A presença dessas espécies em ambientes urbanos e periurbanos reforça a necessidade de um monitoramento contínuo, considerando-se a importância dos flebotomíneos como vetores de Leishmania sp. Diante da escassez de estudos na literatura sobre a fauna flebotomínica no estado de Alagoas, este trabalho apresenta uma contribuição significativa ao ampliar o conhecimento sobre a diversidade desses vetores na região.
A realização de pesquisas entomológicas é fundamental para o desenvolvimento de estratégias eficazes de vigilância e controle de leishmanioses, especialmente em áreas com risco elevado de transmissão. O monitoramento contínuo e a análise das espécies presentes possibilitam não apenas a identificação de vetores prioritários, mas também a compreensão dos fatores ambientais que favorecem sua proliferação e permanência. Com isso, estudos como este tornam-se ferramentas essenciais para subsidiar políticas públicas voltadas ao controle de zoonoses, contribuindo para a saúde coletiva ao reduzir a incidência de doenças transmitidas por vetores em áreas vulneráveis.
REFERÊNCIAS
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1 Discentes do Curso Superior de Farmácia do Instituto de Ciências Farmacêuticas, Campus A.C. Simões, e-mail: micaele.silva@icf.ufal.br, rebeca.silva@icf.ufal.br
2 Docente do Curso Superior do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde, Campus A.C. Simões, e-mail: muller.andrade@icbs.ufal.br