INFORMATION TECHNOLOGY FOR RECYCLABLE MATERIAL COLLECTORS: THE ROLE OF SOFTWARE FOR REGISTRATION AND CONTROL OF DISTRIBUTED PRODUCTION
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th1025021612
Silva, Hudson1
Lima, Francisco2
Resumo: Nos meandros urbanos, entre os resíduos deixados pela sociedade, existem trabalhadores invisíveis que trabalham para dar um novo propósito aos objetos descartados: os catadores de materiais recicláveis. Em meio às pilhas de resíduos, esses agentes sociais desempenham um papel fundamental na sustentabilidade ambiental; tais agentes resgatam materiais que seriam destinados a aterros sanitários e reintegra-os ao ciclo produtivo. No entanto, enquanto o mundo avança nas questões tecnológicas, os catadores muitas das vezes são deixados à margem desse progresso, enfrentando condições desafiadoras em sua busca diária por sustento. Este trabalho apresenta funcionalidades que a tecnologia de informação traz para os catadores de materiais recicláveis, analisando o desenvolvimento de um aplicativo móvel, que os conecta em uma rede ampla de cooperativas de reciclagem, catadores autônomos e geradores, aumentando a eficiência e controle das atividades nesse sistema de produção distribuída no espaço e entre atores sociais diferentes.
Palavras-chave: Aplicativo. Tecnologia. Catadores de Materiais Recicláveis. Ferramentas e software.
Abstract: In urban meanders, among the waste left by society, there are invisible workers who work to give discarded objects a new purpose: recyclable material collectors. Amid the piles of waste, these social agents play a fundamental role in environmental sustainability; these agents rescued materials that would have been destined for landfills and reintegration into the production cycle. However, while the world advances in technological matters, collectors are often left on the sidelines of this progress, facing challenging conditions in their daily search for sustenance. This work aims to show functionalities that information technology presents to collectors of recyclable materials, analyzing the development of a mobile application, which connects them to a wide network of resources, collectors and generators, as well as other devices and software that increase efficiency. and control of activities in cooperatives and street work by collectors of recyclable materials.
Keywords: Application. Technology. Recyclable Material Collectors. Tools and software.
introdução
A pesquisa que deu origem a este artigo explora como a tecnologia pode ser uma aliada importante para os catadores de materiais recicláveis, submetidos a uma dura competição global, sem ter o acesso aos recursos materiais, financeiros e organizacionais das grandes empresas das cadeias de reciclagem. O objetivo é ajudá-los a desempenhar um papel ainda mais significativo na construção de um futuro sustentável com o desenvolvimento colaborativo de uma ferramenta, software aplicativo e soluções web, para apoiar relações que começam a ser criadas entre cooperativas e catadores de rua, passando de um sistema de produção centralizado em galpões de triagem a um sistema distribuído entre atores dispersos na cidade. O objetivo central deste estudo é entender e responder a seguinte questão: É possível conceber tecnologias adequadas à realidade das cooperativas e dos catadores e catadoras? Neste artigo, esta questão geral é tratada mais especificamente no uso de um aplicativo para gestão de compras avulsas de material. Esta tecnologia pode potencializar a cooperação interna e externa, por exemplo com os catadores de rua, o que denominamos de “cooperação ampliada” (Gonçalves 2023). A partir dessas indagações, examinaremos as possíveis barreiras que impediriam catadores de acessar essas inovações; de igual modo, discutiremos maneiras de superá-las, de forma que a solução tecnológica discutida seja uma resposta às demandas dos catadores. A integração da tecnologia à rotina de trabalho dos catadores de materiais recicláveis emerge como uma oportunidade não apenas de otimizar suas operações, mas também de desenvolver sua inclusão social e econômica. Das soluções simples às mais avançadas, a tecnologia pode oferecer ferramentas que podem capacitar esses trabalhadores, tornando seu trabalho mais eficiente, seguro e valorizado. Neste artigo, exploraremos como a tecnologia de informação pode ser aliada dos catadores de materiais recicláveis, analisando especificamente seu impacto na cooperação ampliada entre cooperativas e catadores de rua.
A demanda
Os registros de controle de produção dos materiais reciclados, em mais de uma dezena de organizações de catadores pesquisadas. A pesquisa envolveu 15 organizações de catadores, incluindo tanto cooperativas quanto associações, situadas nos estados de Minas Gerais e São Paulo. As organizações selecionadas refletem a diversidade do setor, com diferentes tamanhos, estruturas e formas de inserção nos sistemas de gestão de resíduos sólidos urbanos (RSU) dos diferentes municípios. Em Minas Gerais e São Paulo, as cooperativas se destacam pela integração de catadores autônomos nos galpões das organizações de catadores.
A pesquisa revelou não apenas as dificuldades enfrentadas, mas como ocorrem o processo de registro manual, informatizado ou híbrido. Um percentual muito baixo das organizações de catadores, utilizam sistemas informatizados como softwares e aplicativos que lhes permitem apoiar o trabalho. Das 15 organizações analisadas nesta pesquisa, apenas duas organizações responderam que usam algum sistema para registro e controle de materiais. Do total das 15 cooperativas e associações que participaram da pesquisa, 4 (quatro) amostras foram observadas e acompanhadas de perto em campo. Quais os pros e contras em adotar um sistema para o controle de produção? As cooperativas e associações de catadores podem funcionar sem realizar formalmente esses registros do controle de produção? Há perda de confiabilidade dos dados com as anotações diversas sem o apoio de ferramentas tecnológicas? Por que sistemas existentes são pouco utilizados pelos catadores? As metodologias de desenvolvimento de software atuais dão conta de atender as demandas próprias desses trabalhadores? Nesse cenário acreditamos que a participação dos catadores e catadoras no processo de desenvolvimento das funcionalidades tecnológicas é importante para superar algumas barreiras. Soluções prontas, produzidas pelos experts em tecnologia, na maioria das vezes tendem a perder a utilidade e cair em desuso. Conforme destacam (LIMA e SOUZA 2016, p.26 ).
De modo geral, a participação popular em questões científicas e escolhas tecnológicas está na ordem do dia e é amplamente discutida após a perda de legitimidade da tecnocracia e do poder absoluto dos experts” (ver, em especial, Giddens, 1991; Elliot & Cross, 1980; Collins & Evans, 2010; Bijker, Bal e Hendriks, 2009; Downey, 2009; Callon, Lascoumes e Barthe, 2001).
Aplicativos móveis, softwares com tecnologia web e diversas outras aplicações podem ser desenvolvidos para ajudar os catadores a localizarem pontos de coleta, identificar materiais de maior valor, calcular estimativas de preços, dar transparência na remuneração dos cooperados/associados e até mesmo se conectar diretamente com compradores. Além disso, softwares de gestão podem auxiliar na organização das atividades de coleta, na otimização de rotas e na administração financeira, proporcionando aos catadores mais controle sobre seus negócios e aumentando sua lucratividade. No entanto, é importante reconhecer a dificuldade de acesso dos catadores a aparelhos celulares, smartphones e computadores além da carência de habilidades digitais, o que pode criar disparidades no acesso aos benefícios potenciais da tecnologia. Portanto, é necessário um esforço conjunto dos pesquisadores, programadores, engenheiros de softwares, organizações não governamentais e de pesquisas para buscar resolver ou minimizar o problema da gestão da produção dos materiais recicláveis nas organizações de catadores. Acreditamos que a informatização nas cooperativas e associações de catadores, bem como para os catadores individuais não vinculados as cooperativas e associações, poderá trazer maior transparência nos pagamentos das remunerações dos catadores e catadoras. Contudo, para que os profissionais da reciclagem possam se beneficiar usando a tecnologia como ferramenta, é necessário que participem do processo de desenvolvimento da tecnologia, como será mostrado no caso discutido neste artigo. Afinal quem conhece o trabalho e como as atividades são desenvolvidas são os catadores e catadoras, o que não pode ser desconsiderado no desenvolvimento de uma tecnologia apropriada e apropriável, isto é, que seja de fácil utilização.
Durante o processo de construção da ferramenta que será apresentada neste artigo, utilizamos como embasamento teórico o Design de interação (ROGERS, PREECE SHARP, 2005), que é uma metodologia centrada nos usuários. Essa abordagem permite o desenvolvimento de produtos interativos que fornecem suporte às atividades cotidianas dos catadores e catadoras de materiais recicláveis e auxiliam eficazmente a realização do trabalho.
DESENVOLVIMENTO (FUNDAMENTAÇÃO TEORICA)
Abordagem centrada no usuário para o Design de interação
Estudar as pessoas em seus ambientes “naturais”, em seu local de trabalho e na via cotidiana, pode nos proporcionar inspirações para o projeto, que outras técnicas de coleta de dados não possibilitam. Um método particular empregado com bastante êxito para a observação natural nas ciências sociais é a etnografia. No passado, os desenvolvedores conversavam com gerentes ou “usuários-cobaia”, isto é, com pessoas que atuavam como usuários para, assim, informar os requisitos. A melhor maneira encontrada e adotada nesta pesquisa para assegurar que o desenvolvimento esteja levando as atividades dos usuários em conta foi envolver usuários reais durante o desenvolvimento da ferramenta. Dessa forma, o analista pode obter um melhor entendimento das necessidades e dos objetivos dos usuários, o que pode levar a um produto mais adequado e com mais confiabilidade no uso. No entanto, dois outros aspectos que não têm nada a ver com funcionalidade são igualmente importantes, caso se pretenda que o produto seja realmente útil e utilizado: o gerenciamento da expectativa.
O gerenciamento de expectativa é o processo de certificar-se que as visões do usuário e suas expectativas com relação ao novo produto sejam realistas. O propósito do gerenciamento da expectativa consiste em assegurar que não haja surpresas para os usuários quando o produto chegar em suas mãos. (ROGERS et al., 2005, p.36)
Uma segunda razão para a participação dos usuários é o processo prático de apropriação, que permite passar de puros artefatos técnicos a instrumentos adequados aos processos operacionais conhecidos e que auxiliam as atividades dos catadores[1].
Do que se trata design de interação
O design de interação é uma atividade prática e criativa, cujo objetivo final consiste no desenvolvimento de um produto que ajude os usuários a atingirem suas metas. No entanto ao iniciar o desenvolvimento do produto conforme Rogers, Preece e Sharp (2005), deve-se dispor de algum entendimento acerca do que se quer dele. Mas de onde vêm esses requisitos? Com quem nos informamos a respeito deles? Subjacente a um bom design de interação está a filosofia do design centrado nos usuários, isto é, uma filosofia que consiste em envolvê-los no processo de desenvolvimento do produto. Mas quem são os usuários? Será que terão conhecimento do que querem e do que precisam, caso lhes seja perguntado?
Em se tratando de um produto novo como é o caso do aplicativo proposto, provavelmente eles, os catadores e catadoras de materiais recicláveis, não estão aptos a enxergar o que é possível desenvolver. O mesmo vale, de modo geral, para usuários que começam a utilizar produtos inovadores. Assim sendo, de onde surgem essas ideias criativas que se revelam adequadas aos usuários? A metodologia design de interação, responde algumas dessas indagações.
Um modelo de ciclo de vida simples para o design de interação
Design de interação relaciona com a Figura 1. Esse modelo incorpora a iteração e encoraja o foco centrado no usuário. Mesmo que as saídas de cada atividade não sejam especificadas no modelo, a descrição do estabelecimento de requisitos inclui a necessidade de se identificarem critérios específicos de usabilidade.
O modelo não deve ser entendido como prescritivo; isto é, não se está sugerindo ser este o modo como todos os produtos interativos são ou deveriam ser desenvolvidos, como se fosse uma metodologia padrão. Ele é baseado em nossas leituras acerca do design de interação e em informações que coletamos durante as pesquisas em campo nas cooperativas de materiais recicláveis e no trabalho dos catadores e catadoras autônomos. Contudo, a observação e o desenvolvimento possuem raízes nos modelos de engenharia de software e nos ciclos de vida da IHC (Interface Homem Computador) descritos a seguir.
A maioria dos projetos inicia com a identificação de necessidades e requisitos. O projeto pode ter surgido por conta de alguma avaliação feita, mas o início do ciclo de vida do produto novo (ou modificado) se dá nesse ponto. A partir de tal atividade, alguns designs, alternativos são gerados numa tentativa de irem ao encontro de necessidades e requisitos identificados. Então, as versões interativas dos designs são desenvolvidas e avaliadas pelos usuários, no nosso caso, os catadores e catadores de materiais recicláveis. Com base no feedback das avaliações, há a possibilidade de a equipe precisar retornar e identificar necessidades ou refinar os requisitos, ou então passar diretamente para o redesign. Há também a possibilidade de mais de uma alternativa de design seguir esse ciclo iterativo em paralelo com outros, ou de apenas uma alternativa por vez ser considerada.
Está implícito, nesse ciclo, que o produto irá emergir da evolução de uma ideia inicial bruta até o seu produto acabado. A maneira como essa evolução ocorre exatamente pode variar de projeto para projeto. O único fator que limita o número de vezes desse ciclo são os recursos disponíveis; no entanto, seja qual for o número de vezes, o desenvolvimento termina com uma atividade de avaliação que assegura que o produto respeita os critérios de usabilidade prescritos.
Figura 1. Um modelo simples de design de interação.
Fonte: ROGERS et. al. 2006 p.206
O que estamos tentando alcançar com esta atividade de design?
São dois os objetivos. O primeiro consiste em entender o máximo possível os processos de trabalho e como os catadores se organizam para a executar as atividades, de forma que o sistema em desenvolvimento possa fornecer-lhes suporte efetivo na realização de suas atividades. No caso concreto, o objetivo é o controle da produção dos materiais recicláveis. Esta etapa consiste na “identificação de necessidades”, cuja má qualidade pode comprometer todo o resultado. A partir daí, nosso segundo objetivo consiste em produzir, a partir das necessidades identificadas, um conjunto de requisitos estáveis que formem uma base para se pensar o design. Isso não é necessariamente um documento nem um conjunto de prescrições rígidas, mas é o entendimento a partir do que foi observado em campo. Neste contexto o pesquisador precisa estar certo de que os requisitos não se alterarão radicalmente durante o tempo de se realizar o design e de se ter o feedback dos usuários em relação a essas ideias iniciais. Como o objetivo final é produzir esse conjunto de requisitos, algumas vezes iremos nos referir a isso como atividade de estabelecimento de requisitos sempre a partir das ideias que emergiram do campo.
METODOLOGIA
A metodologia adotada seguirá três fases distintas. Na primeira fase, o foco será a descrição do processo de controle dos materiais recicláveis. Segundo, serão utilizados instrumentos como rodas de conversa, análise documental, entrevistas focais e questionários para embasar o diagnóstico participativo. A análise dos dados será discutida com os cooperados/associados, estimulando a capacidade crítica e analítica do grupo. Com base no diagnóstico, será elaborado e validado um plano de desenvolvimento baseado nos requisitos levantados. A terceira fase será a formação e capacitação na ferramenta desenvolvida considerando as expectativas, conhecimentos e habilidades dos catadores em TI. Nesse momento, o sistema recebe o feedback e as críticas dos usuários em situações reais de utilização, revelando detalhes e disfunções que não puderam ser identificadas e corrigidas anteriormente. Isso não é uma deficiência do processo projetual, mas uma condição necessária dado que o projeto não se interrompe quando de constrói um artefato, mas o projeto continua no uso (DUARTE et al., 2008; ABRAÇADO et al., 2021). E a fase de início das operações (start up) ou da utilização em situações reais é sempre rica de ensinamentos (CASTRO et al., 2012).
Foram incluídos na pesquisa catadores e catadoras filiados a 4 (quatro) cooperativas de materiais recicláveis estabelecidas em Minas Gerais e 2 (duas) em São Paulo. De 184 integrantes das seis cooperativas selecionadas, foram selecionadas uma amostragem de aproximadamente 11% (n=20 organizações) que se propuseram a participar da pesquisa (Quadro 1). Foram selecionadas as cooperativas/associações que possuíam contrato com a Associação que representa os catadores a nível nacional participantes de uma plataforma de logística reversa ou com uma ONG com sede na cidade de São Paulo dedicada a apoiar a causa dos catadores.
Quadro 1. Quantidade de participantes entrevistados para este estudo por organização.
Código da Organização | Número de Participante | Tipo de Organização | Estado | Total de Associados/Cooperados |
1 | 5 | Cooperativa | MG | 28 |
2 | 4 | Cooperativa | SP | 40 |
3 | 3 | Cooperativa | SP | 35 |
4 | 3 | Cooperativa | MG | 32 |
5 | 3 | Associação | MG | 21 |
6 | 2 | Associação | MG | 28 |
Total | 20 | 184 | ||
Fonte: Elaborado pelos autores |
Apesar desta pesquisa ter representado em Minas gerais e São Paulo um número de 184 catadores que tiveram conhecimento desta pesquisa. Cerca de 20 (vinte) catadores participam ativamente do processo de desenvolvimento do software com envolvimento direto nas decisões e requisitos do software.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Controle de Produção de Materiais Recicláveis em uma organização de Catadores
A cooperativa atua promovendo a coleta seletiva no município de Belo Horizonte, aliada ao reaproveitamento de materiais, economia de matéria-prima, inclusão social com a geração de renda e preservação ambiental por meio da reciclagem. Em conversa informal, durante uma das visitas à sede da Coopesol-Leste, perguntei à presidenta da cooperativa como são realizados os controles de produção do material.
Essa pergunta, aparentemente simples, nasce da inquietação desta pesquisa que busca compreender como são realizados os controles de produção da cooperativa e se esses ocorrem por meio de registros manuais, informatizados ou híbridos. Isso corrobora com o que diz Fraga e Vasconcellos (2020) sobre o engenheiro/a ter o papel de mediar diagnósticos participativos para elencar quais seriam os principais problemas tecnológicos enfrentados pelos grupos populares e, a partir disso, buscar soluções para esses problemas e conceber tecnologias sociais adequadas para a realidade com esses grupos e não para esses grupos.
A presidenta descreve a organização do trabalho na cooperativa e afirma que os registros da produção são realizados de forma manual, mas relata que uma parte do controle é informatizada através de planilhas no aplicativo Microsoft Excel.
Os materiais ao chegarem na cooperativa são alocados no silo (local de armazenagem) os materiais saem do silo diretamente para a esteira de triagem conforme mostrado na figura 02.
Figura 02 -Processo de triagem na Coopesolleste.
Fonte: Acervo dos autores
Durante o processo de triagem o material é separado e armazenado em bags (são os sacos brancos que ficam ao lado da esteira), após o processo de triagem os materiais seguem para a balança para serem pesados. Nesse momento uma cooperada anota manualmente em um caderno os seguintes dados: peso do fardo(bag), tipo de material, nome do cooperado(a) ou dos cooperados que trabalharam no processo de triagem.
Os registros anotados no caderno são utilizados para o pagamento aos cooperados e cooperadas que trabalharam no processo de triagem. Esta pesquisa foi desenvolvida ao longo dos últimos 3 anos, acompanhando o trabalho dos catadores e das catadoras de materiais recicláveis em diversas cooperativas em especial nas cooperativas em dois estados do Brasil. minas gerais e São Paulo. em minas gerais de forma mais próxima.
A Figura 3 ilustra a forma de registro, das anotações e o controle de produção dos cooperados. em resumo é o resultado trabalho do diário no galpão de triagem. São estes números registrados no momento da pesagem que irão servir para calcular o salário dos trabalhadores. Os dados de produção mensal da cooperativa, multiplicado pelo valor de venda de cada tipo de material. É possível observar as quantidade somadas e multiplicada pelo valor de cada material o valor obtido por cada tipo de material. Os valores obtidos na venda de cada tipo de material somado, chegou se o valor de R$ 34.875,80 (Trinta e quatro mil Oitocentos e Setenta e Cinco reais e Oitenta centavos). Valor arrecadado pela cooperativa, para ser dividido entre os 25 cooperados.
A ferramenta informática desenvolvida
O desenvolvimento da funcionalidade “Anotar Vendas” no aplicativo Cataki começou em meados de 2020. Naquela época, a equipe de desenvolvimento precisava entender se o software, criado para conectar geradores de recicláveis a catadores, estava sendo utilizado e identificar possíveis melhorias. Dessa necessidade surgiu a ideia de criar um grupo de WhatsApp com todos os catadores cadastrados no aplicativo, com o objetivo de coletar informações sobre o uso do aplicativo e suas funcionalidades.
Conforme Preece et al. (2005), a coleta de dados tem o propósito de reunir informações suficientes, relevantes e apropriadas, para que se possa estabelecer um conjunto de requisitos estável. Mesmo que haja um conjunto de requisitos iniciais, é necessário que a coleta de dados amplie, esclareça e confirme esses requisitos. Nesse contexto, era preciso obter dados sobre as tarefas realizadas pelos usuários no aplicativo e verificar se ele atendia às suas necessidades, além de identificar o contexto e as razões das tarefas realizadas. Para exemplificar a identificação das necessidades a partir da perspectiva dos usuários, é importante destacar como ocorreu o processo de interação entre o analista e o usuário durante a implantação da funcionalidade “Anotar Vendas”.
A pesquisa de campo foi realizada em uma cooperativa na cidade de Belo Horizonte. A presidente da cooperativa expressou interesse em informatizar um dos fluxos de trabalho. Existem outras atividades, como triagem, pesagem e coleta de material, que são fluxos e processos de trabalho diferentes. Decidimos analisar esses processos de trabalho e informatizá-los em um segundo momento. Mas por que foi escolhido esse fluxo de trabalho primeiro? Os catadores da cooperativa relataram o seguinte:
“Temos catadores que não são cooperados e não trabalham diariamente na cooperativa. Seria interessante ter um sistema informatizado para controlar a compra dos materiais. O sistema tem que ser de fácil acesso tanto para os catadores cooperados quanto para os catadores autônomos, para que possam acessar o histórico das vendas. Além disso, o sistema ajudaria a agilizar o processo de pesagem e registro dos materiais.” (catador cooperado)
O trabalho inclui um grupo de oito catadores individuais não cooperados que coletam materiais nas ruas de Belo Horizonte e vendem para a cooperativa aos sábados.
“Os catadores autônomos trabalham no centro de Belo Horizonte, mais precisamente na região hospitalar. As coletas ocorrem todos os dias da semana. Os oito catadores fazem parte de um coletivo organizado chamado “Maladezas”. O grupo possui um espaço cedido pela prefeitura de Belo Horizonte, que serve como ponto de apoio para guardar os materiais coletados durante a semana. No sábado, o caminhão da cooperativa passa por dois pontos diferentes onde o grupo armazena os materiais recolhidos. Os materiais são coletados pelo caminhão no espaço cedido pela prefeitura e em uma praça localizada na região hospitalar, onde os catadores armazenam parte do material coletado.” (catadora cooperada)
Observe que o fluxo de trabalho descrito acima é realizado antes de o material chegar à cooperativa. Existem também controles de despesas com combustível, controle de rotas do caminhão, entre outros. Essas atividades não serão exploradas nesta fase do estudo, mas a cooperativa considera importante que sejam mapeadas e informatizadas no futuro.
“Quando o material chega à cooperativa, é descarregado em um local específico, separado dos materiais da coleta seletiva e de outros materiais já existentes na cooperativa. O processo de separação é realizado por tipo de material, como papelão, plásticos, metais etc. O grupo de catadores ‘Maladezas’ coleta durante toda a semana nas ruas de Belo Horizonte. Eu, como cooperada, ou outro catador ou catadora cooperado(a), sempre ficamos responsáveis por receber e realizar a pesagem na cooperativa. O processo de pesagem dos materiais é sempre acompanhado por dois ou três catadores autônomos do grupo ‘Maladezas’. Após a pesagem, são registrados os seguintes dados: tipo, peso, data e valor dos materiais. Seria interessante que o sistema registrasse e calculasse automaticamente o valor que o catador deve receber. É importante que tanto os catadores cooperados quanto os não cooperados tenham acesso aos dados registrados. Atualmente, realizamos o processo de pesagem e anotamos os cálculos em cadernos.” (catadora cooperada)
Figura 03 – Caderno de registros de pesagem
Fonte: Acervo dos autores
De acordo com as informações fornecidas pela catadora cooperada, decidimos acompanhar o processo de pesagem durante um período de quatro meses em campo. As informações compartilhadas pela catadora e a observação do processo de registro dos materiais permitiram criar a primeira versão da funcionalidade chamada “Anotar Vendas.”
Análise das telas funcionalidade “Anotar Vendas”
Após disponibilizar a versão atualizada do aplicativo, foi realizada a validação do sistema com a equipe da cooperativa em Belo Horizonte – MG. A catadora foi orientada a fazer o download e instalar a nova versão do aplicativo, que está disponível na Google Play Store desde as primeiras versões. O objetivo era verificar se a nova versão melhoraria o processo de registro de compra dos materiais dos catadores autônomos do grupo “Maladezas”.
A catadora iniciou os testes inserindo os dados referentes a um fardo de papelão. Ela digitou o valor unitário do material, enquanto o catador do grupo “Maladezas” colocava o fardo de papelão na balança. A balança exibiu o peso em kg no display. A catadora então digitou o valor no aplicativo do celular e disse ao catador:
“Pode colocar o próximo fardo na balança.”
O catador retirou o fardo já pesado e adicionou um novo fardo. Os dados referentes ao valor e ao peso do material ficaram salvos na tela do aplicativo. A catadora então olhou novamente para a balança, verificou o peso do material e digitou apenas o peso adicional do novo fardo de papelão. Nesse momento, a catadora informou ao analista que estava acompanhando os trabalhos.
“Agora está bem mais rápido e prático; é só digitar o peso adicional e o aplicativo já vai somando. Antes, era demorado voltar à tela inicial e digitar tudo novamente.”.
Observamos, com base no acompanhamento em campo e no relato da catadora, que a atualização da versão do aplicativo adaptou-se melhor ao processo de trabalho na cooperativa. Contudo conforme (NORMAN, 2006) senti a necessidade de um bom modelo conceitual que nos permitisse prever os efeitos das ações do desenvolvimento. Sem um bom modelo conceitual operamos às cegas; fazemos as operações como nos dizem para fazê-las; não podemos avaliar plenamente por quê, os efeitos que esperar ou o que fazer se as coisas derem errado. Enquanto as coisas funcionam apropriadamente, podemos nos virar. Contudo, quando elas não dão certo ou quando nos deparamos com uma situação nova, precisamos ter um conhecimento mais profundo de seu funcionamento, necessitamos de um bom modelo.
O processo de compra e venda de materiais ocorre dezenas de vezes ao dia em diferentes locais em qualquer cidade do Brasil. Para realizar a transação comercial, um catador ou uma catadora apenas precisa levar o material a um ponto de venda que compre aquele tipo de material. O material geralmente é pesado, e os locais de compra costumam precificar o material por kg (quilograma) e por tipo. O valor por kg é multiplicado pelo peso do material para determinar o valor que deve ser pago ao catador, proprietário do material.
Com base no processo de compra e venda descrito, a ideia por trás da funcionalidade “Anotar Venda” é atender à necessidade de registro e controle dos catadores. No entanto, a ferramenta também pode ser utilizada por pontos de venda, associações, cooperativas e outras organizações que precisam registrar e controlar materiais recicláveis.
Análise dos Resultados: utilização do aplicativo em situações reais
Este trabalho teve como objetivo analisar a atividade de registro da produção de catadores e catadoras de materiais recicláveis. Observou-se que a coleta de dados sobre produção e reciclagem é fundamental para a gestão dos resíduos nas cooperativas e também para os catadores autônomos não associados. É nesse contexto que a funcionalidade desenvolvida, chamada “Anotar Vendas”, atua. Ela registra de forma simples a produção dos materiais triados nos galpões é útil para catadores autônomos, que podem registrar suas vendas no aplicativo.
O teste com usuários é mais adequado para determinar protótipos e sistemas funcionando. Embora a meta de um teste possa ser ampla, tal como determinar quão usável é um produto, são necessárias questões mais especificas para focar o estudo, tais como: Os usuários podem completar uma determinada tarefa dentro de um certo período, ou encontrar um determinado item ou encontrar a resposta para uma questão”. (Rogers, et. al… 2005, p.461)
A funcionalidade “Anotar Vendas” também foi testada durante a operação do Carnaval no projeto ReciclaBelô, na cidade de Belo Horizonte. O Projeto ReciclaBelô é uma parceria que envolve o Ministério Público de Minas Gerais, a Prefeitura de Belo Horizonte, o Governo do Estado de Minas Gerais e as cooperativas Coopesolleste, Coopersoli e Asmare. O projeto possibilitou a criação de três tendas em locais estratégicos com maior concentração de foliões na cidade. Durante os quatro dias de Carnaval, participaram do projeto 300 catadores cadastrados, distribuídos nas três centrais (tendas) montadas para triagem, armazenagem, embalagem e registro dos materiais reciclados.
Todos os 300 catadores e catadoras cadastrados para trabalhar no projeto recebiam diárias no valor de R$150,00 (cento e cinquenta reais) por dia. A diária era paga aos profissionais que atingissem a meta de coletar 25 kg de materiais recicláveis por dia.
Neste contexto, o uso da ferramenta permitiu auxiliar no registro da contabilidade de materiais para cada catador, além de monitorar a produção total e a quantidade de material reciclado durante o evento. O aplicativo foi disponibilizado para cadastrar todos os catadores envolvidos no projeto. Durante os quatro dias de funcionamento do projeto, o aplicativo foi utilizado experimentalmente na central de triagem (tenda) montada no bairro Santa Tereza, em Belo Horizonte, que foi gerenciada pela cooperativa Coopesolleste.
Uma funcionária da cooperativa foi designada para operar o aplicativo, registrar os materiais, identificar o catador responsável e registrar as quantidades na funcionalidade “Anotar Vendas”. A operação foi acompanhada pelo analista/pesquisador durante três dias do evento. Foi constatado que as funcionalidades do aplicativo foram usadas de forma completa, incluindo o cadastro de catadores, o registro dos tipos de materiais coletados e suas quantidades, e a atribuição de cada coleta ao respectivo catador.
Figura 7. Uso do aplicativo para registro dos materiais coletados durante o Carnaval 2024. Projeto ReciclaBelô.
Fonte: Acervo do autor
Observamos problemas na identificação e no registro de catadores não cadastrados previamente no aplicativo durante o evento. Esse fato atrasou alguns registros de materiais. Alguns catadores não sabiam o número do CPF e não estavam com documentos no momento da entrega dos materiais na central de triagem, o que impediu o cadastro no aplicativo e a continuidade do processo informatizado. A solução temporária encontrada foi registrar as informações em um caderno à parte. Pretende-se analisar na segunda fase deste estudo e em conjunto com a equipe da cooperativa, a tela de cadastro, assim como foi feito com a funcionalidade de compra. O objetivo é verificar com a equipe da cooperativa a melhor solução e desenvolver uma nova interface de cadastro conforme foi feito na funcionalidade “anotar vendas”.
O Trabalho dos Catadores de Materiais Recicláveis na Virada Cultural de Belo Horizonte e o Uso do Aplicativo Cataki
A Virada Cultural de Belo Horizonte, realizada anualmente, é um evento que atrai milhares de pessoas para o centro da cidade e gera uma quantidade significativa de resíduos. Em 2024, a gestão desses resíduos contou com a participação de catadores de materiais recicláveis, viabilizando a coleta e destinação correta dos resíduos gerados. Esses profissionais desempenham um papel essencial na sustentabilidade do evento, garantindo que uma grande quantidade de materiais seja reciclada em vez de descartada inadequadamente.
Neste ano, a organização da Virada Cultural tentou implementar o uso do aplicativo Cataki para melhorar o cadastro e o controle da produção dos catadores. O Cataki é uma plataforma digital criada para conectar catadores de materiais recicláveis com cidadãos e empresas que desejam descartar corretamente seus resíduos. Para eventos como a Virada Cultural, o aplicativo foi escolhido como ferramenta para registro e acompanhamento do trabalho dos catadores, permitindo que se tenha maior controle sobre a produção e, consequentemente, uma organização mais eficiente.
Dificuldades no Cadastro e Controle de Produção
Embora o uso do Cataki tenha sido planejado para facilitar o gerenciamento dos catadores e do material reciclado, a implementação durante a Virada Cultural de 2024 enfrentou diversos desafios. A equipe da organização agendou um dia específico para realizar o cadastro antecipado dos catadores no aplicativo, com a expectativa de registrar 70 catadores. Apenas cinco catadores compareceram no dia marcado para o evento, um número muito inferior ao previsto. Esse baixo comparativo pode estar relacionado à distância do local do evento, já que muitos catadores não têm recursos para arcar com o transporte. Além disso, uma divulgação com apenas três dias de antecedência provavelmente não foi suficiente para que todos se organizassem para comparecer.
Para eventos futuros, a organização pode considerar algumas mudanças importantes. Uma delas seria realizada o cadastro dos catadores no próprio local, algumas horas antes do início, evitando assim o custo adicional com transporte e aumentando a participação. Além disso, é essencial que a divulgação seja feita com maior antecedência, permitindo que os catadores se planejem melhor. Estas medidas podem garantir maior adesão e uma organização mais eficaz.
No dia do evento, compareceram mais de 100 catadores, gerando uma situação caótica. Com o número de catadores muito maior do que o esperado e a falta de tempo e equipe suficiente para o cadastramento, formou uma longa fila. Como consequência, muitos dos catadores que chegaram no dia do evento não puderam ser cadastrados no Cataki.
A solução encontrada foi cadastrar alguns catadores no aplicativo e fazer o registro manual de outros. Durante o evento, o uso do aplicativo para controle da produção mostrou-se inviável devido ao fato de uma grande parte dos catadores não ter sido cadastrada no sistema. Sem o registro de todos os participantes, tornou-se impossível monitorar de forma ágil o volume de material reciclado. Um dos principais objetivos do uso do aplicativo durante o evento era justamente dar rapidez nos registros dos materiais coletados, permitindo individualizar a contagem e a soma dos materiais entregues por cada catador. Além disso, o sistema deveria possibilitar maior agilidade no pagamento dos salários dos catadores, no controle de metas e no pagamento das diárias.
No entanto, como muitos catadores precisaram ser registrados manualmente, esse processo acabou sendo realizado por meio de anotações em papel, o que exigiu mais tempo do que o inicialmente planejado. Este fato gerou retrabalho após o evento, para organizar os dados e realizar a prestação de contas dos recursos financeiros do evento. O aplicativo, quando utilizado, já é capaz de gerar automaticamente a soma dos valores dos materiais coletados, organizados por dia, por catador e por tipo de material, além de registrar a soma total. A utilização do aplicativo, poderia ter eliminado a necessidade de cálculos manuais e agilizado o processo, desde o registro até o pagamento, se todos os catadores estivessem registrados no sistema desde o início, facilitando também a geração de relatórios de resultados destinados aos gestores municipais, mídias e apoiadores.
Lições Aprendidas e Próximos Passos
Apesar das dificuldades enfrentadas, o evento foi importante para identificar os pontos a serem melhorados na organização e uso do aplicativo em futuros eventos. A equipe da cooperativa e da organização da Virada Cultural conseguiu documentar os problemas ocorridos com o Cataki, que servirão como base para correções e ajustes. Algumas lições importantes incluem:
- A necessidade de uma equipe maior para realizar o cadastro dos catadores no dia do evento.
- A importância de garantir maior adesão antecipada ao sistema com procedimentos que facilitem a acessibilidade dos catadores autônomos, oferecendo oportunidade de realizar cadastro prévio no mesmo dia e local do evento, divulgação da data do evento nos locais de trabalho dos catadores, oferecer alimentação à equipe de catadores durante o processo de cadastro no local do evento, realizando-o de preferência duas horas antes do início.
A evolução das funcionalidades do aplicativo, são importantes para garantir que as demandas de eventos em grande escala, como a Virada Cultural seja atendida de forma eficiente pelos catadores. Um dos principais pontos de melhoria observado é a criação de um QRCODE que será gerado automaticamente após o cadastro do catador em forma de crachá, permitindo agilizar a identificação do catador quando necessário que ao abordar essas questões, será possível utilizar a tecnologia de forma mais eficiente e garantir que os catadores de materiais recicláveis possam realizar seu trabalho de maneira organizada. É aqui que o modelo de “produção distribuída”, que opera em ecossistemas urbanos abertos complexos, se torna um conceito orientador para a concepção de sistemas informatizados integradores (MANZINI, 2017, 2023 e 2024). Sistemas informatizados que funcionam bem em organizações fechadas, como empresas, não são apropriados para operar em espaços abertos da cidade. No entanto, não se trata apenas de projetar sistemas e interfaces para grandes públicos, como caixas de banco automáticos, sites de compra ou urnas de votação eletrônicas, mas também fazer esses artefatos funcionarem em situações particulares, como um grande evento. Não apenas os catadores de materiais constituem um público com características particulares (falta de documentos, como CPF, ou falta de tempo e dinheiro para comparecer a uma reunião de pré-cadastramento), como as situações particulares exigem adequações dos sistemas informatizados e de seu uso. O aplicativo utilizado busca trabalhar com esse público específico, ela precisa se adaptar às suas realidades e necessidades. Isso envolve flexibilizar processos, simplificar critérios e considerar soluções que funcionam em situações de baixa conectividade ou com pouca infraestrutura tecnológica disponível.
Benefícios a Longo Prazo da Adoção de Tecnologias
Apesar dos desafios, os benefícios de longo prazo da adoção de tecnologias de informação no trabalho dos catadores e cooperativas parecem ser promissores. Além de aumentar a eficiência operacional, o uso de softwares pode contribuir para:
- A valorização do trabalho dos catadores: A formalização do trabalho, por meio de dados precisos, permite que o trabalho dos catadores seja mais reconhecido pela sociedade e pelos órgãos públicos.
- Sustentabilidade: O controle mais rigoroso da produção pode levar a uma maior quantidade de resíduos reciclados, contribuindo diretamente para a sustentabilidade urbana.
- Acesso a políticas públicas: Com o registro detalhado da produção, cooperativas podem se inscrever em programas de incentivo à reciclagem e acessar recursos governamentais destinados à melhoria das condições de trabalho dos catadores.
CONCLUSÃO
Acredita-se que a interface desenvolvida, o layout e o design das telas, elaborados a partir da observação dos trabalhadores em campo, foram eficientes. O envolvimento dos usuários, no que chamamos de design participativo (Participatory Design), conforme destacado por Rogers et. al (2005), foi uma característica importante no processo. A ferramenta também permite a geração de relatórios de produtividade por catador, por período, por tipo de material ou por data específica. A ampliação desta pesquisa com os usuários faz parte do planejamento da equipe de desenvolvimento do aplicativo, que pretende avaliar a emissão e o uso dos relatórios implementados, bem como o grau de satisfação dos usuários após o evento.
A implementação de tecnologias da informação no setor de reciclagem, especialmente no trabalho dos catadores e cooperativas, pode representar um avanço significativo em termos de eficiência, organização e transparência. Em eventos como a Virada Cultural, Carnaval e outros eventos de grande porte, o uso dessas ferramentas torna-se ainda mais relevante, considerando o aumento expressivo da geração de resíduos.
Softwares/aplicativos para o registro e controle de produção pode permitir que os catadores tenham maior controle sobre sua produção, o que se espera é uma distribuição mais justa dos lucros, além de maior eficiência no processo de reciclagem. No entanto, para que a tecnologia seja amplamente adotada, é necessário superar desafios.
A experiência da Virada Cultural na cidade de Belo Horizonte em 2024 mostrou que, apesar das boas intenções e da utilidade do aplicativo Cataki, sua implementação exige um planejamento mais robusto e maior engajamento por parte dos catadores e da equipe de organização. A reciclagem em eventos de grande porte é um desafio, mas com as correções necessárias, o uso de tecnologias digitais pode ser um grande aliado na otimização do trabalho dos catadores e na sustentabilidade dos eventos futuros.
REFERÊNCIAS
ABRAÇADO, Mateus Pereira; DUARTE, Francisco José de Castro Moura; BÉGUIN, Pascal Daniel. Microprojetos em usos imprevisíveis: O caso da movimentação de cargas em plataformas offshore. Human Factors in Design, 2021, 10.19.
BÉGUIN, Pascal; RABARDEL, Pierre. Designing for instrument-mediated activity. Scandinavian journal of information systems, 2000, 12.1: 1.
CASTRO, Iara Sousa; DE PAULA ANTUNES LIMA, Francisco; DE CASTRO MOURA DUARTE, Francisco José. The start up as a phase of architectural design process. Work, 2012, 41. Supplement 1: 140-144.
FOLCHER, V. e RABARDEL, P. Homens, artefatos, atividades: perspectiva instrumental. In: Falzon (ed.). Ergonomia. São Paulo: Edgard Blucher, 2007, p. 207-222.
DUARTE, F., CONCEIÇÃO, C., CORDEIRO, C., & LIMA, F. (2008). A integração das necessidades de usuários e projetistas como fonte de inovação para o projeto. Laboreal, 4(Nº2).
LIMA, Francisco de Paula Antunes; SOUZA, Marcelo Alves, Bem público e interesses privados no tratamento do lixo urbano: o caso da parceria público-privada dos resíduos sólidos em Minas Gerais. In: PEREIRA, Bruna Cristina Jaqueto. & GOES, Fernanda Lira (orgs). Catadores de materiais recicláveis: um encontro nacional. Rio de Janeiro: Ipea, 2016. pp.337-357.
MANZINI, E. Design. Quando todos projetam. São Leopoldo: Unisinos. 2017
MANZINI, E. Políticas do cotidiano. São Paulo: Blucher, 2023.
MANZINI, E. Proximidade habitável. Ideias para uma cidade que cuida. São Paulo: Blucher, 2024.
MEDINA, M. A.; FERNANDES, J. L.; OLIVEIRA, A. C. Tecnologias sociais: um olhar para os catadores de materiais recicláveis. Anais do Congresso Internacional de Conhecimento e Inovação – CIKI, v. 1, n. 1, 2019.
NORMAN, Donald A. O Design do Dia-a-Dia. 1. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
ROGERS, Yvonne; PREECE, Jennifer; SHARP, Helen. Design de interação – além da interação homem-computador. – Porto Alegre: Bookman Companhia Editora LTDA, 2005.
SOUZA, Marcelo Alves de; et. al. Lixo zero: por uma rota tecnológica alinhada às diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos. (In): PEREIRA, Bruna Cristina Jaqueto. & GOES, Fernanda Lira (orgs). Catadores de materiais recicláveis: um encontro nacional. Rio de Janeiro: Ipea, 2016.pp. 377-406.
[1] Sobre a diferença entre “artefato” e “instrumento” e a transformação do primeiro no segundo no processo de apropriação pelos usuários, ver Folcher e Rabardel (2007). Neste artigo, o processo de apropriação não será analisado pelo desenvolvimento da atividade como faz esses autores, mas pela participação no processo de concepção, que não elimina o processo posterior de gênese instrumental (BÉGUIN; RABARDEL, 2000) pelos usuários, mas o torna mais eficaz o processo de apropriação durante o uso.
¹ hudsona@ufmg.br
UFMG, Escola de Engenharia, Departamento de Engenharia de Produção
Av. Presidente Antônio Carlos, 6627
CEP 31270-901 – Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil
² fpalima@ufmg.br
UFMG, Escola de Engenharia, Departamento de Engenharia de Produção
Av. Presidente Antônio Carlos, 6627
CEP 31270-901 – Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil