REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202502031602
Karine Keila de Sousa Vieira Sampaio
Fernanda Póvoas dos Anjos
Ana Costa de Oliveira
Alexia Adriane Santiago Abdon
Ludimila Silva Castro Marçal
Maria Beatriz Lessa Seixas
Jorge Luiz Dutra Júnior
Priscila Xavier de Araújo
Anderson Bentes de Lima
Resumo: A demanda por cuidados domiciliares tem aumentado, destacando a importância das tecnologias para monitoramento remoto, especialmente para pacientes traqueostomizados. Objetivo: Identificar e analisar as ferramentas virtuais para monitoramento digital de pacientes traqueostomizados, destacando suas aplicações clínicas e limitações. Métodos: Foi realizada uma Revisão Integrativa de Literatura com busca sistematizada nas bases de dados PubMed, SciELO e BVS. Os estudos selecionados foram analisados criticamente para fornecer uma compreensão abrangente das tecnologias disponíveis. Resultados: O estudo revela que ferramentas como aplicativos móveis, dispositivos vestíveis e sistemas de telemonitoramento têm demonstrado eficácia na monitorização de parâmetros respiratórios e na capacitação de cuidadores. A utilização de tecnologias como a Internet of Things (IoT) e a Ambient Assisted Living (AAL) facilita o acompanhamento remoto dos pacientes. Além disso, programas educativos, como o “Trach Me Home”, têm sido fundamentais no suporte e treinamento dos cuidadores, promovendo segurança e autonomia no cuidado domiciliar. Conclusão: Observou-se que a utilização de ferramentas digitais no cuidado de pacientes traqueostomizados melhora a qualidade do atendimento, facilita o monitoramento e otimiza a comunicação entre pacientes, cuidadores e profissionais de saúde. Contudo, desafios como barreiras tecnológicas, econômicas e de alfabetização digital ainda precisam ser superados para garantir acesso equitativo a essas inovações.
Palavras chave: Traqueostomia, Dispositivos, Assistência domiciliar
Introdução
A Traqueostomia (TQT) consiste em um procedimento cirúrgico no qual é realizado uma incisão na membrana, entre o segundo e terceiro anel traqueal, a fim de criar uma via aérea artificial e favorecer a respiração, além de facilitar a higienização das vias aéreas (SANTA-CRUZ et al, 2020). Esse procedimento possui diversas técnicas, as quais vem se aprimorando no decorrer da história, atualmente, é realizado por duas formas de abordagem, sendo elas: percutânea e cirúrgica (MAIA et al, 2022).
A TQT percutânea pode ser guiada por broncoscopia (TPB) ou por ultrassom (TPU), sendo a TPU a mais utilizada nos períodos de pandemia da Covid-19 devido às vantagens logísticas e de custos, por não necessitar de um técnico específico em broncoscopia. Essa abordagem inclui, inicialmente, a avaliação anatômica da região cervical para excluir a presença de vasos na linha média da punção e, também, verificar se o paciente não apresenta contraindicações ao procedimento, como a presença de tumores cervicais, distância cricofurcular menor que 1,5 a 2 cm, limitação da hiperextensão cervical, dentre outros (MENEGOZZO et al, 2022). A Traqueostomia percutânea dilacional (TP) é uma das abordagens mais utilizadas em Unidades de Terapia Intensiva, resguardando a abordagem cirúrgica para pacientes com contraindicações à anterior, assim como apresentado no estudo de coorte de Bustamante et al (2024) em que dentre os pacientes submetidos à ventilação mecânica, 79,09% foi realizado a TP e 70% do total não apresentou complicações relacionadas à intervenção.
O procedimento apresenta sérios riscos de complicações, de forma que a TQT realizada em situações de emergência apresenta 20% de risco, frente a 0,05% caso seja realizado de maneira eletiva (LUBIANCA NETO et al, 2022). A incidência de complicações advindas da traqueostomia varia de 0% a 90% dos casos, com uma média de cerca de 40% (NETO et al, 2022).
As complicações advindas dessa intervenção podem ser divididas em: imediata, breve e tardia, sendo as últimas relacionadas ao momento pós-cirúrgico. Dentre as complicações, tem-se a hemorragia durante o ato cirúrgico, sangramento pós-operatório, decanulação acidental, pneumotórax, enfisema subcutâneo, estenose das vias aéreas, infecção, fístula traqueocutânea, entre outros (SILVA et al, 2024).
O cuidado em pacientes com estomias respiratórias representa um desafio tanto para a equipe hospitalar como para os familiares (SOUZA et al, 2024). A desospitalização inclui a alta hospitalar de forma segura e responsável, sendo necessário um planejamento detalhado envolvendo educação em saúde para familiares e cuidadores frente a essa estomia respiratória. Assim, os cuidados da equipe de enfermagem relacionados a TQT precisam ser compartilhados e ensinados aos cuidadores e familiares, tendo em vista a necessidade de orientação e capacitação a fim de garantir uma assistência adequada (BOSSA et al, 2019).
As Tecnologias Cuidativo-Educacionais (TCE) consistem em uma ferramenta de educação com o fito de contribuir com a capacitação individual e, principalmente, familiar relacionado ao cuidado do paciente, a fim de trazer autonomia e empoderamento (NIETSCHE et al, 2024). As TCE abrangem uma série de intervenções, dentre elas, as rodas de conversa, simulações, elaboração de cartilhas e protocolos são atividades descritas em uma revisão integrativa, a qual relata que essas atividades foram formuladas para auxiliar a compreensão dos cuidadores e familiares acerca do cuidado ao paciente com traqueostomia (TRES et al, 2022). O ensino voltado ao manejo da TQT de forma geral, como a monitorização da pressão do cuff, a forma de limpar, aspirar, a identificação de complicações e o posicionamento individual frente a situações de emergência são fundamentais para a prevenção de complicações (FARIAS et al, 2024).
Assim, esse estudo tem como objetivo identificar e analisar as principais tecnologias utilizadas para o monitoramento e avaliação de pacientes traqueostomizados no ambiente domiciliar, reunindo evidências acerca das ferramentas digitais e Tecnologias Cuidativo-Educacionais (TCE) que auxiliam cuidadores e familiares na assistência segura e eficaz a esses pacientes, contribuindo para a desospitalização e a prevenção de complicações.
Métodos
Foi realizada uma Revisão Integrativa de Literatura, por meio da qual é possível identificar, analisar e reunir pesquisas sobre um mesmo assunto, de modo a sintetizar o conhecimento acerca da temática escolhida. É constituída por 6 passos: elaboração da pergunta norteadora, busca ou amostragem na literatura, coleta de dados, análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação da revisão integrativa. (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).
Dessa forma, buscou-se identificar e analisar as ferramentas virtuais disponíveis para a monitorização digital, com foco naquelas aplicáveis ao cuidado de pacientes traqueostomizados.
Para isso, foi realizada uma busca sistematizada nas principais bases de dados científicas (PubMed, SciELO e BVS), utilizando Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) junto aos operadores booleanos “AND” e “OR”. Dessa maneira, realizou-se a seguinte estratégia de busca nas bases de dados anteriormente mencionadas: “Traqueostomia” (OR) “Tracheostomy Care” (AND) “Dispositivos” (AND) “Assistência Domiciliar”. Foram utilizados como critérios de inclusão artigos indexados nas bases de dados “Pubmed”, “SciElo” e “BVS”, publicados nos últimos 5 anos (2020-2025).
Os estudos selecionados foram analisados de forma crítica, com o objetivo de oferecer uma compreensão abrangente das tecnologias disponíveis, destacando suas aplicações na prática clínica e suas possíveis limitações.
Resultados e discussão
Ferramentas para monitorização e registro de dados no cuidado domiciliar
A demanda por cuidado domiciliar tem aumentado nas últimas décadas, trazendo inúmeras vantagens, especialmente a redução de gastos públicos em saúde, sem comprometer a qualidade da assistência, que se aproxima da hospitalar (ALMANSOUR, 2024). Além disso, segundo o mesmo autor, a telessaúde e outras formas de monitoramento remoto têm superado barreiras na prestação de cuidados, facilitando o contato entre médicos e pacientes. Dessa forma, a atenção domiciliar tem como principais objetivos evitar a readmissão hospitalar, reduzir taxas de mortalidade e garantir a continuidade do cuidado em um ambiente familiar e estruturado.
No contexto dos pacientes que necessitam de ventilação mecânica prolongada, Almansour (2024) destaca que a taxa de mortalidade está diretamente associada a infecções adquiridas tanto durante a internação quanto no domicílio. Por essa razão, é essencial que os cuidadores sigam critérios rigorosos para minimizar esses riscos. O estudo também aponta que a maioria dos pacientes sob ventilação domiciliar apresenta readmissão hospitalar devido a pneumonia por Pseudomonas aeruginosa e que dispositivos de longa permanência, como a traqueostomia, representam um fator de risco significativo para essas infecções.
O avanço das tecnologias em saúde, especialmente no campo da inteligência artificial (IA), tem se consolidado globalmente como uma ferramenta promissora para melhorar a qualidade e a expectativa de vida dos pacientes. Novos modelos organizacionais e soluções tecnológicas permitem o compartilhamento de informações clínicas entre todos os envolvidos no tratamento, incluindo médicos, enfermeiros, cuidadores e instituições de saúde (CINGOLANI et al., 2023). A proposta é integrar esses dados em um sistema operacional abrangente, promovendo uma abordagem coordenada e eficiente no acompanhamento dos pacientes.
O desenvolvimento de portais para registro e entrega de dados de saúde, aliados ao uso de dispositivos implantáveis, vestíveis e móveis, tem reduzido a barreira entre medicina e vida cotidiana. A possibilidade de armazenamento em nuvem e a utilização de big data permitem que profissionais de saúde realizem previsões e avaliações individualizadas, baseadas no grande volume de informações coletadas. A tecnologia de Monitoramento Remoto de Pacientes (MRP), que envolve dispositivos médicos e aplicativos móveis, possibilita a coleta e análise de dados de saúde em tempo real, fornecendo feedback contínuo aos pacientes e alertas para as equipes médicas. Com os avanços nos sensores e a popularização dos dispositivos móveis, a adesão dos pacientes tem se tornado mais fácil, facilitando consultas por telemedicina, monitoramento da adesão à medicação e acesso a conteúdos educacionais (COFFEY et al., 2022).
Uma das vantagens das soluções tecnológicas disponíveis é a independência em relação a fornecedores específicos e a adaptabilidade a diferentes cenários clínicos. Essa flexibilidade permite a personalização do atendimento conforme as condições de saúde dos pacientes e o nível de suporte tecnológico necessário, garantindo um monitoramento remoto mais eficaz (COFFEY et al., 2022).
Entre as principais ferramentas identificadas, destacam-se aplicativos móveis e plataformas digitais que monitoram parâmetros respiratórios, como frequência respiratória, saturação de oxigênio e volume expiratório, além de registrarem os cuidados diários necessários. Essas tecnologias oferecem suporte tanto para cuidadores quanto para profissionais de saúde, permitindo um acompanhamento estruturado e acessível da evolução do paciente. Dentre as inovações, a Internet of Things (IoT) e a Ambient Assisted Living (AAL) se destacam por possibilitar o monitoramento remoto de diversos aspectos da saúde do paciente (WANG et al., 2021).
Dispositivos tecnológicos integrados têm se mostrado eficazes no monitoramento remoto e na conectividade direta com os sistemas de saúde, possibilitando o compartilhamento de dados clínicos em tempo real. Isso permite intervenções rápidas em caso de alterações no quadro do paciente, otimizando a assistência e reduzindo riscos (WANG et al., 2021). No entanto, a literatura nacional e internacional ainda apresenta poucas referências sobre ferramentas específicas para o monitoramento de pacientes traqueostomizados. Um exemplo de tecnologia que pode ser utilizada nesse contexto é o TytoHome™, um dispositivo móvel que captura e transmite imagens de ouvido, pele e garganta, além de realizar ausculta cardíaca e pulmonar e medir a frequência cardíaca. Essa tecnologia facilita a realização do exame físico à distância, auxiliando na avaliação clínica pelo médico responsável (NOTARIO, 2019).
Ferramentas para Educação e Suporte aos Cuidadores
Além dessas iniciativas, Sepucha (2024) descreve o uso do programa “Trach Me Home”, um programa intra-hospitalar que inclui a educação de cuidadores e o treinamento de habilidades, além do gerenciamento de casos, como a disponibilização de equipamentos essenciais para o cuidado eficaz, fornecimento de suprimentos e programação de visitas de acompanhamento por profissionais de saúde. O artigo também cita práticas como a educação do cuidador com o time de enfermagem por meio de plataformas de vídeo chamadas ao vivo, tanto para fins de educação em saúde quanto para suporte social. Além disso, Sepucha discorre sobre o programa “Trach Plus”, um site que oferece apoio técnico e social aos cuidadores.
No mesmo sentido, visando garantir a segurança do paciente traqueostomizado por meio da informação e do treinamento de seus cuidadores, existem diversos materiais disponíveis. Um exemplo é o Manual de Orientação para o Cuidador do Paciente com Traqueostomia, do Hospital Pequeno Príncipe, um material didático de fácil compreensão que aborda desde a troca dos dispositivos até medidas de prevenção de quedas. Ademais, a Prefeitura de Porto Alegre disponibiliza uma cartilha que inclui orientações sobre os cuidados com a traqueostomia, além de um guia para a aspiração de vias aéreas em domicílio, procedimento essencial que os cuidadores devem saber realizar. Outra fonte de informação relevante é o site da Associação Brasileira de Estomaterapia, que oferece guias práticos sobre cuidados necessários com esses pacientes, abordando desde a higiene pessoal até as especificidades da estomia.
Além dos recursos educativos, plataformas de apoio emocional e social, como a Family Reflections, promovem o compartilhamento de experiências e desafios entre famílias que cuidam de pacientes em ventilação invasiva domiciliar (VO, 2023). Essas iniciativas são fundamentais, pois a literatura internacional ainda carece de estudos sobre a eficácia de ferramentas para pacientes traqueostomizados e seus cuidadores, tanto no monitoramento clínico quanto no suporte à capacitação.
Ferramentas virtuais utilizadas no cuidado de pacientes traqueostomizados e impacto no desfecho clínico, qualidade de vida e autonomia dos pacientes e cuidadores
Dado o impacto complexo da traqueostomia na vida dos pacientes, é evidente que esses indivíduos precisam desenvolver diversas habilidades para o manejo adequado do dispositivo. Nesse sentido, proporcionar um acompanhamento adequado ao paciente traqueostomizado favorece sua aceitação e motivação para o autocuidado, permitindo que ele adquira maior domínio sobre o próprio corpo, faça ajustes psicológicos e melhore seu autocontrole. Como resultado, há um aumento na autoconfiança e na autoestima (Weidlich; Pfeiffer; Kugler, 2023).
Para garantir essa adaptação, o processo de ensino deve ser estruturado como uma intervenção fundamental na prevenção de complicações. A utilização de orientações padronizadas, protocolos de educação para cuidadores, planos de cuidados específicos para pacientes traqueostomizados e atividades de ensino no pré-operatório, além do treinamento de pacientes e familiares, pode contribuir para uma transição mais segura do ambiente hospitalar para o domicílio (Da Costa et al., 2020).
Entretanto, a mudança do hospital para casa representa um período desafiador tanto para os pacientes quanto para seus cuidadores. Estudos anteriores identificaram sentimentos de estresse, medo e isolamento associados à inexperiência diante dessa nova realidade (Pitzer; Flores, 2022).
Nesse contexto, os avanços tecnológicos têm proporcionado ferramentas inovadoras para o cuidado de pacientes traqueostomizados, aumentando a eficiência e a qualidade do atendimento. Plataformas virtuais, como aplicativos móveis, dispositivos conectados e sistemas de telemonitoramento, vêm sendo amplamente implementados para monitorar parâmetros clínicos, orientar cuidados e otimizar a comunicação entre pacientes, cuidadores e profissionais de saúde. Segundo Silva et al. (2021), esses recursos podem reduzir internações hospitalares e prevenir complicações relacionadas ao manejo inadequado, impactando positivamente os desfechos clínicos.
Além dos benefícios clínicos, as ferramentas digitais também promovem maior conforto e segurança para os pacientes, facilitando o acesso a informações e suporte contínuo. De acordo com Carvalho et al. (2023), a comunicação direta entre cuidadores e profissionais de saúde por meio de plataformas digitais reduz o estresse associado ao manejo das condições respiratórias, proporcionando uma experiência mais positiva no dia a dia. Essa melhoria se reflete especialmente na diminuição da sobrecarga emocional dos cuidadores e no fortalecimento da confiança na gestão dos cuidados.
Outro aspecto relevante é a capacitação dos cuidadores, que pode ser aprimorada por meio de aplicativos de educação em saúde. Conforme apontado por Almeida e Costa (2020), esses aplicativos oferecem conteúdos interativos sobre temas essenciais, como a higienização da traqueostomia e a identificação de sinais de alerta. Desenvolvidos com base em evidências científicas, esses recursos não apenas capacitam os cuidadores, mas também reduzem erros no manejo diário e aumentam a segurança no ambiente domiciliar.
Além da capacitação técnica, a interação contínua e o suporte emocional são fundamentais para garantir autonomia e qualidade de vida aos cuidadores. Ferramentas que oferecem treinamentos virtuais e apoio psicológico auxiliam na redução do esgotamento, tornando o cuidado mais sustentável. Souza et al. (2021) sugerem que a educação e o suporte contínuos impactam diretamente os desfechos clínicos, melhorando a saúde geral dos pacientes e reduzindo complicações evitáveis.
Limitações tecnológicas, barreiras econômicas e de alfabetização digital
Embora as ferramentas digitais tenham revolucionado o cuidado de pacientes traqueostomizados, diversos desafios ainda limitam sua implementação efetiva, especialmente entre populações vulneráveis. Entre essas barreiras, questões tecnológicas, econômicas e de alfabetização digital comprometem o acesso equitativo a essas soluções, exigindo estratégias específicas para superá-las. Martins, Souza e Lima (2023) destacam que a falta de acesso a dispositivos adequados, como smartphones e computadores, é uma realidade para muitas famílias de baixa renda, dificultando o uso de aplicativos e plataformas virtuais de saúde.
Para que essas tecnologias atinjam seu pleno potencial, é imprescindível enfrentar desafios como a inclusão digital das populações mais vulneráveis e a adequação cultural dos conteúdos oferecidos. Silva e Andrade (2022) apontam que a acessibilidade é um fator crucial para garantir que as inovações beneficiem todos os usuários, independentemente de suas condições socioeconômicas.
Ademais, a infraestrutura tecnológica insuficiente em algumas regiões, como a instabilidade na conexão de internet, também se configura como um obstáculo significativo. Araújo, Ferreira e Santos (2021) destacam que, em áreas rurais ou periféricas, as redes de internet frequentemente não suportam o funcionamento adequado de aplicativos de telemonitoramento ou videoconferências, comprometendo a continuidade do cuidado.
Além disso, a barreira econômica também é um fator determinante. A aquisição de dispositivos modernos e o custo de planos de internet de qualidade são inacessíveis para muitas famílias, especialmente em países em desenvolvimento. Ribeiro, Nascimento e Alves (2020) apontam que o elevado custo dessas tecnologias contribui para a exclusão digital, perpetuando desigualdades no acesso à saúde.
Outro desafio relevante é a alfabetização digital, que afeta tanto os pacientes quanto os cuidadores. De acordo com Pereira e Gomes (2022), muitos usuários não possuem habilidades básicas para operar aplicativos de saúde ou interpretar dados fornecidos pelas plataformas, o que limita o impacto positivo dessas tecnologias no cuidado cotidiano.
Além disso, fatores culturais também desempenham um papel significativo na adesão às ferramentas digitais. Santos, Silva e Lopes (2021) relatam que algumas populações resistem ao uso de tecnologias devido a crenças ou falta de confiança nos sistemas digitais. Essa resistência pode ser superada com ações de sensibilização e programas educativos, visando aumentar a confiança e a familiaridade com as ferramentas.
Outro ponto importante é a capacitação inadequada de profissionais de saúde para orientar pacientes e cuidadores no uso dessas tecnologias. Lima et al. (2023) argumentam que a falta de treinamento específico sobre as tecnologias de saúde resulta em dificuldades para promover o uso eficaz dos recursos digitais, comprometendo a qualidade do atendimento.
Ademais, a vulnerabilidade dos dados pessoais e a falta de legislações robustas sobre privacidade digital são preocupações crescentes. Oliveira e Fernandes (2022) enfatizam que muitos usuários relutam em adotar ferramentas virtuais devido ao receio da exposição de informações sensíveis, o que reforça a necessidade de políticas públicas que garantam a segurança digital.
Para mitigar essas limitações, são necessárias estratégias que envolvam investimentos em infraestrutura tecnológica, subsídios para a aquisição de dispositivos, programas de alfabetização digital e o desenvolvimento de aplicativos mais intuitivos e acessíveis. Silva et al. (2023) sugerem que políticas públicas voltadas à inclusão digital são essenciais para reduzir as desigualdades no acesso às tecnologias de saúde.
Por fim, é fundamental promover iniciativas colaborativas entre governo, setor privado e sociedade civil para ampliar a acessibilidade às ferramentas digitais. Abreu e Castro (2023) propõem que parcerias entre essas entidades podem garantir recursos e suporte técnico às populações mais necessitadas, transformando o panorama do cuidado digital em saúde.
Recomendações baseadas em evidências para o uso dessas ferramentas
Estudos recentes apontam que a implementação de tecnologias para o cuidado de pacientes traqueostomizados deve priorizar a integração com práticas clínicas convencionais e o treinamento adequado dos profissionais de saúde. É essencial que as plataformas digitais sejam projetadas para atender às necessidades específicas de pacientes e cuidadores. Ferramentas com interfaces simples, tutoriais interativos e suporte técnico contínuo podem melhorar significativamente a experiência do usuário (Mendes, Santos & Figueiredo, 2022).
Para usuários com baixa alfabetização digital ou pouca familiaridade com tecnologia, interfaces complexas podem ser um fator de exclusão. Lima et al. (2023) afirmam que a simplicidade no design das ferramentas é crucial para garantir a inclusão de populações vulneráveis, permitindo que até mesmo aqueles com pouca experiência tecnológica acessem informações críticas e utilizem os recursos disponíveis de maneira eficaz.
Além disso, interfaces simples ajudam a reduzir erros no uso de aplicativos, como interpretações equivocadas de alertas ou informações. Oliveira e Castro (2022) destacam que interfaces intuitivas minimizam equívocos e promovem maior confiança no uso das tecnologias digitais, especialmente entre cuidadores. Quando os aplicativos são simples, os cuidadores relatam maior autonomia no manejo da rotina de cuidados.
A acessibilidade das ferramentas virtuais também deve ser garantida por políticas públicas que promovam a inclusão digital. Segundo Lima et al. (2023), iniciativas governamentais que subsidiam dispositivos e o acesso à internet em comunidades de baixa renda ampliam o impacto positivo dessas tecnologias na saúde. A tradução de conteúdo para diferentes idiomas e dialetos, além da adaptação cultural, são estratégias recomendadas para aumentar a adesão às ferramentas.
Outra recomendação importante é que as ferramentas digitais sejam acompanhadas de protocolos padronizados para a coleta e armazenamento de dados sensíveis, garantindo a privacidade e segurança das informações. Oliveira e Castro (2022) destacam que a conformidade com legislações como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil é fundamental para construir a confiança de pacientes e cuidadores no uso dessas tecnologias.
Papel do profissional de saúde na capacitação de cuidadores para uso eficiente dessas tecnologias
No contexto da saúde, a introdução de recursos tecnológicos permite melhorar a acessibilidade e a qualidade dos cuidados. Esses recursos são facilitadores no apoio à prestação de cuidados ao paciente, especialmente na autogestão da doença, e no auxílio aos familiares cuidadores na assistência a pessoas em situação de dependência (Landeiro, Fernandes & Sousa, 2021).
O cuidado de pacientes traqueostomizados exige uma abordagem multidisciplinar e uma capacitação adequada dos cuidadores para garantir a segurança e o bem-estar desses indivíduos. Nesse contexto, o papel dos profissionais de saúde é essencial, já que são responsáveis por instruir os cuidadores sobre o manuseio correto das tecnologias relacionadas à traqueostomia, como cânulas, aspiradores de secreção e dispositivos de umidificação. O objetivo da capacitação é não apenas ensinar o uso desses dispositivos, mas também garantir que sejam empregados de forma eficaz e segura (Silva, Ferreira & Mendonça, 2020).
Entre as principais responsabilidades do profissional de saúde está a orientação sobre a manutenção da traqueostomia. Isso envolve instruções detalhadas sobre a limpeza da cânula, a troca de curativos e práticas para prevenir infecções no local da traqueostomia. Segundo Almeida e Costa (2020), essas medidas são cruciais para evitar complicações que possam comprometer a saúde do paciente. Além disso, os profissionais devem ensinar técnicas corretas para o manejo de secreções, como o uso de aspiradores, que ajudam a manter as vias respiratórias desobstruídas e promovem uma melhor oxigenação.
Outro aspecto essencial é a capacitação para o uso de equipamentos auxiliares. Dispositivos como nebulizadores e sistemas de umidificação são frequentemente utilizados no cuidado de pacientes traqueostomizados, e seu uso inadequado pode trazer riscos. Nesse sentido, os profissionais de saúde devem garantir que os cuidadores compreendam o funcionamento desses equipamentos e saibam ajustá-los às necessidades específicas do paciente (Souza & Pereira, 2021). Também é necessário orientar os cuidadores sobre como identificar sinais de complicações, como infecções, deslocamentos da cânula ou obstruções, além de fornecer diretrizes sobre ações emergenciais.
Dentro dessa perspectiva, o uso de ferramentas virtuais tem revolucionado o cuidado de pacientes traqueostomizados, tornando o processo mais acessível, eficiente e dinâmico. Com a crescente digitalização na área da saúde, tecnologias como aplicativos móveis, plataformas de videoconferência e recursos de e-learning têm permitido que os cuidadores adquiram habilidades técnicas e conhecimentos atualizados de maneira prática e personalizada (Silva, Ferreira & Mendonça, 2020).
Além disso, ferramentas virtuais podem ser utilizadas para o monitoramento e acompanhamento remoto de pacientes traqueostomizados. Aplicativos integrados a dispositivos de monitoramento permitem que cuidadores registrem dados como frequência respiratória, ocorrência de secreções e sinais de complicações. Essas informações podem ser compartilhadas diretamente com os profissionais de saúde, facilitando a tomada de decisão e a intervenção precoce (Souza & Pereira, 2021).
O papel dos profissionais de saúde vai além da instrução técnica. Ele envolve também o fortalecimento da autonomia do cuidador, a promoção de um cuidado humanizado e a criação de um ambiente seguro e acolhedor para o paciente traqueostomizado. A capacitação contínua, baseada em um relacionamento de confiança e apoio mútuo, é essencial para o sucesso do cuidado domiciliar. Portanto, a capacitação de cuidadores com o uso de ferramentas virtuais representa um avanço significativo no cuidado de pacientes traqueostomizados. Essas tecnologias não apenas democratizam o acesso ao conhecimento, mas também promovem uma abordagem centrada no paciente, integrando educação, suporte emocional e monitoramento de maneira eficiente e acessível (Almeida & Costa, 2020).
Considerações finais
Nesta revisão bibliográfica, identificou-se que aplicativos móveis e plataformas digitais se destacam como ferramentas tecnológicas fundamentais para o monitoramento e a avaliação de pacientes com traqueostomia em ambiente domiciliar. No entanto, sua implementação eficaz enfrenta desafios significativos, sendo a segurança dos dados, a capacitação de profissionais e a acessibilidade digital da população os principais entraves.
Além disso, observa-se uma lacuna na literatura, tanto nacional quanto internacional, quanto à eficácia e à aplicabilidade dessas tecnologias especificamente para pacientes traqueostomizados. Diante desse cenário, é essencial que tais barreiras sejam superadas, considerando o potencial dessas inovações para promover maior autonomia ao paciente e aprimorar a qualidade do cuidado prestado no ambiente domiciliar.
Referências
ABREU, M.; CASTRO, F. Parcerias público-privadas na inclusão digital: impacto na saúde pública. Revista de Políticas Digitais, v. 12, n. 2, p. 123-135, 2023.
ALMEIDA, R.; COSTA, M. Aplicativos móveis na educação em saúde: um estudo de caso. Revista de Tecnologia em Saúde, v. 9, n. 3, p. 45-58, 2020.
ALMANSOUR, Nura A. et al. Efficacy of home healthcare on the management of tracheostomy patients. Saudi Medical Journal, v. 45, n. 7, p. 724, 2024.
ARAÚJO, L.; FERREIRA, P.; SANTOS, J. Acesso à internet em regiões rurais: desafios para a saúde digital. Revista Brasileira de Inclusão Digital, v. 7, n. 1, p. 45-60, 2021.
BOSSA, P. M. d. A. et al. Desafios de familiares no cuidado domiciliar da criança em uso de cânula de traqueostomia. Revista Enfermagem UERJ, v. 27, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.12957/reuerj.2019.43335.
BUSTAMANTE, Pedro Fortes Osório et al. Traqueostomia percutânea guiada por ultrassom conduzida por intensivistas: um estudo de coorte de fase IV. Critical Care Science, v. 35, p. 402-410, 2024.
CARVALHO, T. et al. Plataformas digitais no cuidado respiratório: impacto na qualidade de vida. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 49, n. 1, p. 23-30, 2023.
CINGOLANI, Mariano et al. Artificial intelligence and digital medicine for integrated home care services in Italy: Opportunities and limits. Frontiers in Public Health, v. 10, 4 jan. 2023. DOI: https://doi.org/10.3389/fpubh.2022.1095001.
COFFEY, Jordan D et al. Development and implementation of a nurse-based remote patient monitoring program for ambulatory disease management. Frontiers in Digital Health, v. 4, 14 dez. 2022. DOI: https://doi.org/10.3389/fdgth.2022.1052408.
DA COSTA, Elaine Carininy Lopes et al. Cuidados para a prevenção de complicações em pacientes traqueostomizados. Rev Enferm UFPE online, v. 13, n.1, p.169-178, 2019. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/index.php/revistaenfermagem/article/view/238545/ 31148. Acesso em: 20 jan. 2025.
FARIAS, Nayara Nogueira et al. Cuidados com traqueostomia. Revista Científica da UNIFENAS, v. 6, n. 7, 2024.
LANDEIRO, Maria José; FERNANDES, Carla Sílvia; SOUSA, Maria Rui. Recursos tecnológicos como estratégias para o autocuidado. Autocuidado: Um Foco Central da Enfermagem, p. 99-110, 2021.
LIMA, C. et al. A Formação profissional e saúde digital: uma análise crítica. Cadernos de Saúde e Tecnologia, v. 14, n. 4, p. 78-90, 2023.
LUBIANCA NETO, José Faibes; CASTAGNO, Octavia Carvalhal; SCHUSTER, Artur Koerig. Complicações de traqueostomia em crianças: uma revisão sistemática. Brazilian Journal of Otorhinolaryngology, v. 88, p. 882-890, 2022.
MAIA, Eveline Lima et al. Mapeamento das técnicas cirúrgicas de traqueostomia e suas complicações: revisão de escopo. Conjecturas, v. 22, n. 8, p. 187-200, 2022.
MARTINS, F.; SOUZA, T.; LIMA, G. Exclusão digital e o impacto na saúde: uma revisão sistemática. Jornal de Saúde e Tecnologia, v. 19, n. 3, p. 234-250, 2023.
MENEGOZZO, Carlos Augusto Metidieri et al. Traqueostomia percutânea segura guiada por ultrassonografia em oito passos e cuidados necessários em pacientes com COVID-19. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, v. 49, p. e20223202, 2022.
NETO, J. et al. Complicações de traqueostomia em crianças: uma revisão sistemática. Brazilian Journal of Otorhinolaryngology, v. 88, n. 6, p. 882-890, 2022. Disponível em: https://www.bjorl.org/index.php?p=revista&tipo=pdf-simple&pii=S2530053922001481
NOTARIO, Patricia M. et al. Home-based telemedicine for children with medical complexity. Telemedicine and e-Health, v. 25, n. 11, p. 1123-1132, 2019.
PEQUENO PRÍNCIPE. Manual de orientação para pacientes com traqueostomia. 2024. Disponível em: https://pequenoprincipe.org.br/wp-content/uploads/2024/02/manual_orientacao_paci ente_com_traqueostomia.pdf. Acesso em: 27 jan. 2025.
PITZER, Monique Brito; FLORES, Paula Vanessa Peclat; DIAS, Ágatha Cappella. Dificuldades vivenciadas pelo paciente e cuidador no pós-operatório de traqueostomia. Revista Científica de Enfermagem, v. 12, n. 39, p. 76-86, 2022. DOI: <10.24276/rrecien2022.12.39.76-86>. Disponível em: https://www.recien.com.br/index.php/Recien/article/view/685. Acesso em: 20 jan. 2025.
PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Manual – Aspiração de vias aéreas no domicílio: Cuidador. Disponível em: https://prefeitura.poa.br/sites/default/files/usu_doc/hotsites/sms/bvaps-biblioteca-virtual-de-atencao-primaria-saude/Manual%20-%20Aspira%C3%A7%C3%A3o%20de% 20Vias%20%C3%81ereas%20no%20Domic%C3%ADlio%20-%20Cuidador.pdf. Acesso em: 27 jan. 2025.
SANTA-CRUZ, Fernando et al. Traqueostomia: condutas e técnica. Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac, p. 40-44, 2020.
SOUZA, J. C. M. DE; ANDRADE, J. V.; DÁZIO, E. M. R. Conhecimentos e habilidades do profissional enfermeiro no cuidado à pessoa com traqueostomia: revisão integrativa. Ciência ET Praxis, v. 19, n. 34, p. 113–135, 22 nov. 2024. DOI: https://10.36704/cipraxis.v19i34.8142.
SOUZA, M. T. DE; SILVA, M. D. DA; CARVALHO, R. DE. Integrative Review: What Is It? How to Do It? Einstein (São Paulo), v. 8, n. 1, p. 102–106, mar. 2010. DOI: https://doi.org/10.1590/S1679-45082010RW1134.
WANG, Ju et al. Unobtrusive Health Monitoring in Private Spaces: The Smart Home.Sensors, Basel, v. 21, n. 3, 28 jan. 2021. DOI: https://doi.org/10.3390/s21030864.