REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102501250801
Aline Brandão do Nascimento1
Carlos Eduardo Sousa Aguiar2
Eduarda Lopes dos Santos3
Kethelen Oliveira Silva4
Paulo Victor Santos Nascimento5
RESUMO
O presente artigo visa abordar as semelhanças e diferenças, no que diz respeito ao aspecto neuroanatômico e funcional, entre o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno do Espectro Autista (TEA), visto que ambos são classificados como transtornos do neurodesenvolvimento. Ora, para isso se utilizou uma metodologia de revisão integrativa de literatura, baseada em fontes de dados como PePSIC e SciELO, com os descritores: “TEA”, “TDAH”, “Neuroanatômicas”, “semelhanças” e “diferenças”. O TDAH se caracteriza por aspectos como desatenção, hiperatividade e impulsividade, o que acaba por influenciar as relações sociais e o aproveitamento acadêmico. Já, o TEA é marcado por alterações nos aspectos sociais, na comunicação e nos comportamentos restritos e repetitivos, além de demonstrar, também, disfunções no que tange às funções executivas e a inibição de respostas. Assim, ambos os transtornos compartilham alterações em áreas cerebrais como o córtex pré-frontal, que é responsável pela organização e planejamento, todavia diferem na apresentação da disfunção, já que no TEA o comprometimento assume uma função social e no TDAH se mostra por meio da desatenção e impulsividade. Por fim, o estudo conclui que, embora divergentes, tanto o TEA quanto o TDAH compartilham intersecções importantes no que diz respeito às áreas cerebrais afetadas. Assim sendo, intervenções multidisciplinares adaptadas às necessidades específicas são essenciais, além disto as semelhanças no córtex pré-frontal e na dopamina sugerem a necessidade de uma continuidade em detrimento a pesquisas nesse âmbito, para a elaboração de diagnósticos e tratamentos aprimorados para ambos os transtornos.
Palavras-chave: Transtorno; Autístico; Neurodesenvolvimento; Atenção; Hiperatividade.
ABSTRACT
The present article aims to address the similarities and differences, in terms of neuroanatomical and functional aspects, between Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD) and Autism Spectrum Disorder (ASD), given that both are classified as neurodevelopmental disorders. For this purpose, an integrative literature review methodology was used, based on data sources such as PePSIC and SciELO, with the keywords: “ASD,” “ADHD,” “Neuroanatomical,” “similarities,” and “differences.” ADHD is characterized by aspects such as inattention, hyperactivity, and impulsivity, which influence social relationships and academic performance. On the other hand, ASD is marked by alterations in social aspects, communication, and restricted and repetitive behaviors, in addition to also demonstrating dysfunctions related to executive functions and response inhibition. Thus, both disorders share alterations in brain areas such as the prefrontal cortex, which is responsible for organization and planning. However, they differ in the manifestation of dysfunction, as in ASD the impairment assumes a social function, while in ADHD it manifests through inattention and impulsivity. Finally, the study concludes that, although divergent, both ASD and ADHD share important intersections regarding the affected brain areas. Therefore, multidisciplinary interventions adapted to specific needs are essential. Additionally, the similarities in the prefrontal cortex and dopamine suggest the need for further research in this field to develop improved diagnostic and treatment strategies for both disorders.
Keywords: Autistic; Disorder; Neurodevelopmental; Attention; Hyperactivity.
1 INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) são classificados como Transtornos de Neurodesenvolvimento, os quais caracterizam-se por alterações que impactam diretamente o comportamento e o desenvolvimento cognitivo dos indivíduos. De acordo com dados divulgados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que a prevalência de autismo em âmbito global é equivalente a 1,5% da população, enquanto o TDAH afeta em torno de 5% a 8% da população. Ademais, no Brasil, estudos atuais enfatizam que a incidência desses transtornos está se expandindo progressivamente, o que reafirma a importância de estratégias interventivas e de investigações de cunho científico que auxiliem no entendimento mais aprimorado dessas condições e seus desdobramentos.
Perante esse contexto, é válido pontuar que, diante dos cenários tanto científico quanto clínico, o TDAH e o TEA são temas de destaque em investigações devido aos seus efeitos, que afetam amplamente o bem-estar social, escolar e, sobretudo, emocional dos sujeitos. Apesar de possuírem distinção em seu diagnóstico e sintomatologia, esses transtornos também apresentam sobreposições em aspectos neuropsicológicos e comportamentais, fatores que geram complicações tanto em seu diagnóstico diferencial quanto na efetivação de intervenções terapêuticas mais assertivas. Por exemplo, vale destacar que sintomas como impulsividade, déficit em habilidades de atenção e interações sociais são elementos que podem estar presentes em ambas as psicopatologias, mesmo que ocorram em intensidades e particularidades anatômicas diferentes.
Nesse sentido, o estudo propõe a investigação das nuances que perpassam as características discriminativas que diferenciam e aproximam o TEA e o TDAH no que se refere à esfera neuroanatômica. Além disso, abrange-se uma revisão bibliográfica por meio da seleção de artigos publicados entre os anos de 2010 e 2024, com o objetivo de proporcionar um panorama atual sobre a perspectiva científica relacionada aos transtornos. Assim, ressalta-se que essa abordagem será de grande valia para a consolidação de saberes aprofundados sobre as distinções e semelhanças entre o TEA e o TDAH.
Logo, o presente artigo estrutura-se sob uma ótica metodológica, com um aporte teórico baseado em uma revisão literária integrativa, enfatizando a análise de estudos que abordam os transtornos investigados. Com isso, espera-se que os resultados postulados possam contribuir para a ampliação dos conhecimentos sobre a temática, bem como para o manejo de práticas terapêuticas com maior assertividade, promovendo maior qualidade de vida e inclusão das pessoas impactadas por essas condições no âmbito social.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Funcionamento do tea
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é classificado como um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado principalmente por comprometimentos nas áreas de interação social, comunicação e comportamento, além de padrões restritos e repetitivos de ações e interesses. Esses déficits refletem diferenças significativas no desenvolvimento neurológico e no funcionamento comportamental, afetando a vida cotidiana dos indivíduos com TEA (Viana et al., 2023). Indivíduos com TEA apresentam comprometimentos em funções executivas como planejamento, controle inibitório e flexibilidade cognitiva. Esses déficits influenciam diretamente o comportamento, resultando em padrões repetitivos e dificuldades para lidar com mudanças. A rigidez cognitiva também prejudica a adaptação a novos contextos e a capacidade de realizar tarefas que exigem modulação comportamental, impactando a resposta adequada a diferentes estímulos no dia a dia (Cardoso & Pitanga, 2020).
Além das funções executivas, a Teoria da Mente também é afetada nos indivíduos com TEA. A Teoria da Mente refere-se à capacidade de compreender os pensamentos e sentimentos dos outros, algo que é prejudicado nas pessoas com autismo, especialmente em interações sociais mais complexas. Indivíduos com TEA nível 1, por exemplo, podem ter dificuldades em interpretar expressões faciais e compreender sutilezas da comunicação, o que impacta suas relações interpessoais (Makiyama et al., 2021).
Do ponto de vista comportamental, o TEA manifesta-se desde a primeira infância, com sinais como dificuldade na comunicação verbal e não verbal, problemas na interação social e uma forte aderência a rotinas e padrões repetitivos. Os primeiros sintomas podem surgir ainda no primeiro ano de vida, com sinais de atrasos no desenvolvimento da linguagem e ausência de comportamentos sociais básicos, como o contato visual e o sorriso social (Cardoso & Pitanga, 2020).
Ademais dos aspectos comportamentais e neurológicos clássicos do TEA, Temple Grandin oferece uma perspectiva única sobre o funcionamento do cérebro autista. Segundo Grandin (2013), o cérebro de indivíduos com TEA tem particularidades na forma como processa informações sensoriais e executa funções cognitivas. Ela destaca que a sensibilidade aumentada a estímulos visuais, auditivos e táteis é uma característica central do transtorno, influenciando significativamente o comportamento e as interações sociais. A autora ainda explora como essas diferenças neurobiológicas explicam as dificuldades na comunicação e nas habilidades sociais.
O reconhecimento das especificidades do TEA é essencial para o desenvolvimento de intervenções eficazes que promovam a inclusão e a qualidade de vida. Um estudo recente destaca que, embora diversas intervenções estejam disponíveis, a eficácia delas varia, e é crucial garantir que as estratégias adotadas sejam adequadas às necessidades individuais, respeitando as particularidades e potencialidades de cada pessoa com TEA (Araujo, Silva & Zanon, 2023).
2.2 Funcionamento do tdah
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um distúrbio comportamental com múltiplas causas, caracterizado por desatenção, desorganização, impulsividade e hiperatividade persistentes. Esses sintomas ocorrem em pelo menos dois contextos, como casa e escola, e afetam de forma significativa o convívio social e o desenvolvimento da pessoa (APA, 2014).
Indivíduos com TDAH enfrentam desafios significativos no ambiente escolar e social. Os sintomas de desatenção e impulsividade podem prejudicar a capacidade de manter amizades, levando a dificuldades interpessoais e ao isolamento social (Mattos, 2015). Além disso, a falta de foco e o comportamento desorganizado muitas vezes comprometem o desempenho acadêmico, resultando em baixo rendimento escolar.
A impulsividade refere-se à tendência de agir e reagir de maneira rápida e desorganizada, respondendo a estímulos externos ou internos sem considerar adequadamente as possíveis consequências. A desatenção, por sua vez, envolve uma deficiência nos processos psicológicos responsáveis por permitir ao indivíduo selecionar, filtrar e organizar informações de forma controlada e significativa (Dalgalarrondo, 2019).
Comportamentos como falta de atenção, esquecimento, irritabilidade e interrupção da fala alheia (Castro, 2018) tendem a prejudicar os relacionamentos interpessoais. Nesse sentido, Mattos (2015) ressalta que, em geral, a pessoa com TDAH carece de um “sinal de alerta” que indique a necessidade de parar, observar, ouvir e refletir antes de agir. O autor sugere o desenvolvimento do hábito de “pensar em voz alta”, ou seja, verbalizar pensamentos para incentivar a reflexão sobre as alternativas e suas consequências.
2.3 Semelhanças anatômicas e fisiológicas
No que se refere às semelhanças entre o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e o continuum autístico, alcunha proposta por Sella (2018), é fundamental destacar a disfunção associada ao córtex pré-frontal. Essa região cerebral desempenha funções essenciais relacionadas ao planejamento, controle de impulsos e tomada de decisões, e está intimamente relacionada às dificuldades de impulsividade e à inibição de respostas emocionais, ou seja, respostas biológicas a estímulos ambientais, observadas em ambos os transtornos.
Ademais, segundo Brun et al. (2009), crianças com transtorno do espectro do autismo (TEA) apresentam lobos cerebrais com proporções aumentadas. Essa constatação correlaciona-se com a afirmação de Silveira e Rodrigues (2021), que apontam para uma alteração no tamanho do lobo, embora caracterizando não um aumento de estatura, mas, sim, um volume reduzido.
Além disso, são perceptíveis alterações na função endócrina dos indivíduos, especialmente em relação à dopamina, que apresenta variações em ambos os transtornos. De acordo com Tortora (2016), a dopamina é crucial para a regulação endócrina, controle motor e emotividade. Este neurotransmissor desempenha um papel essencial na neuromodulação, uma vez que altera o funcionamento dos neurônios e melhora a comunicação nas vias neuronais por meio de estímulos localizados (USP, 2023). Assim, observam-se alterações dopaminérgicas em ambas as condições, manifestadas por modificações no corpo estriado, o que gera dificuldades relacionadas à atenção no TDAH (Silveira & Rodrigues, 2021) e compromete a regulação de humor e emoções, além de comportamentos repetitivos, que são funções mediadas pela dopamina e vigentes características do TEA.
Ainda, identificam-se problemas significativos na conectividade cerebral associada a esses transtornos. No caso do TEA, isso se deve a anomalias na poda neural, enquanto no TDAH as disfunções ocorrem em redes fronto-parietais e fronto-estriatais (Instituto Singular, 2021). Essas alterações cerebrais têm implicações diretas nas habilidades de processamento de informações, na interação social e em padrões comportamentais específicos (Clínica Team Care, s.d.). Anormalidades na conectividade entre o córtex pré-frontal e outras regiões corticais e subcorticais estão associadas a dificuldades no planejamento, organização e execução de tarefas (Cortese, 2021).
Assim, diante do exposto, torna-se evidente que tanto o TEA quanto o TDAH compartilham alterações neurológicas e funcionais que sugerem que, mesmo com suas diferenças, ambos partilham intersecções que explicam o surgimento de características semelhantes nos indivíduos.
2.4 Diferenças anatômicas e fisiólogicas
O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) está relacionado a um distúrbio neuroquímico cerebral (Dantas et al. 2024). De acordo com Couto et al. (2010), há duas causas mais abrangentes em se tratando do TDAH: uma relativa à carência funcional do lobo frontal, com ênfase no córtex cerebral, e a outra ligada a um déficit na funcionalidade de alguns neurotransmissores. Entre os neurotransmissores com déficit funcional estão a dopamina, a noradrenalina e a serotonina, que desempenham papéis cruciais na regulação da atenção, no controle dos impulsos e na motivação. A deficiência de dopamina e noradrenalina, em particular, está associada a dificuldades de foco e à impulsividade observadas nos indivíduos com TDAH. Com isso, o indivíduo demonstra grande dificuldade em focar e manter a atenção tanto em aspectos internos quanto em estímulos presentes no ambiente.
Além disso, pessoas com o referido transtorno também possuem alterações em suas funções executivas, ocasionando dificuldades na realização de atividades da vida diária, como a efetivação de um planejamento estruturado, ou seja, manter-se focado em comportamentos gradativos necessários à execução de uma tarefa (Borges e Albrecht, 2022).
De maneira análoga, Mattos (2020, p. 53) destaca que há evidências de diferenças na estrutura cerebral de indivíduos com TDAH. Entre essas distinções, é imperioso pontuar áreas como o núcleo accumbens (NAcc), que propicia o ajustamento das expressões emocionais motivacionais, e o cíngulo, que auxilia nas funções executivas.
Em contraste, Monteiro et al. (2021), mediante um compilado de pesquisas sobre a compreensão neurológica do indivíduo com transtorno do espectro autista (TEA), relatam que as pessoas com esse transtorno possuem grande comprometimento em interações sociais, habilidades de comunicação e linguagem, estereotipias de interesses, comportamentos e tarefas. Sendo assim, as áreas mais afetadas, segundo análise teórica dessa autora, são o hipocampo, o corpo caloso, os gânglios da base e as células de Purkinje, que apresentam diminuição quantitativa.
Outrossim, é importante frisar que indivíduos com autismo também apresentam evidências de que o processo de dilatação cerebral é uma das principais causas de prejuízos nos circuitos envolvidos com as nuances comunicativas (Santos et al. 2023). Ainda em conformidade com o proposto por esse autor, observam-se alterações no cerebelo, especialmente na diminuição do córtex cerebelar, estrutura que, além de estar associada à aprendizagem motora, relaciona-se a disfunções sensoriais.
Portanto, diante do exposto, é possível afirmar que tanto o TEA quanto o TDAH implicam em alterações significativas em regiões cerebrais, impactando diretamente na forma como os indivíduos processam informações e interagem com o meio social. Com isso, entender de forma precisa essas disfunções é essencial para a promoção de intervenções focadas nas demandas específicas de cada pessoa, considerando as manifestações comportamentais e os fundamentos neurobiológicos subjacentes.
3 METODOLOGIA
Foi utilizada a revisão integrativa como método de pesquisa, com o objetivo de analisar as diferenças neuroanatômicas e fisiológicas entre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). A princípio, foi elaborada uma questão norteadora que direcionou a busca de literatura relevante sobre o tema. Em seguida, realizou-se uma busca sistemática nas bases de dados PePSIC e SciELO (Scientific Electronic Library Online), utilizando os descritores “TEA”, “TDAH”, “Neuroanatômicas”, “semelhanças” e “diferenças”, sem restrição de datas para permitir uma análise ampla.
Após a busca, os estudos foram selecionados com base em critérios de inclusão e exclusão previamente definidos, que visavam garantir a relevância e qualidade das informações incluídas, esses sendo: Estudos que abordassem aspectos neuroanatômicos e fisiológicos relacionados ao TDAH e ao TEA, publicações disponíveis em português, inglês ou espanhol, e pesquisas que apresentassem resultados comparativos entre os transtornos. Em seguida, os artigos foram categorizados conforme as similaridades e distinções encontradas nos aspectos neuroanatômicos e fisiológicos dos transtornos. A análise envolveu uma avaliação crítica dos estudos, visando identificar padrões e discrepâncias entre as pesquisas, o que possibilitou a interpretação dos resultados de maneira fundamentada. Por fim, foi elaborada a apresentação da revisão integrativa, sintetizando as informações obtidas e discutindo as implicações para o entendimento das diferenças e semelhanças entre TDAH e TEA.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente análise das semelhanças e diferenças neuroanatômicas e fisiológicas entre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) revela uma série de interseções e divergências cruciais para a compreensão clínica desses transtornos do neurodesenvolvimento. Ao longo da revisão integrativa, observamos que, embora o TEA e o TDAH compartilhem algumas disfunções neurológicas, como a alteração na função do córtex pré-frontal e os desequilíbrios nos sistemas neurotransmissores, cada transtorno manifesta-se de maneira distinta, especialmente em relação à interação social e à capacidade de atenção.
Conforme pontuado na revisão literária realizada, foram identificados variados aspectos neuroanatômicos e funcionais que contribuem para a diferenciação e convergência entre o TEA e o TDAH, conforme ilustrado a seguir:
- Similaridades Neuroanatômicas e Fisiológicas. Ambos os transtornos retratam disfunções no córtex pré-frontal (Sella, 2018), sendo esse elemento de extrema importância para aspectos como a tomada de decisões e o controle inibitório. Tais alterações podem contribuir para o aparecimento de sintomas de déficit de atenção e impulsividade, que, embora mais acentuados em indivíduos com TDAH, são comuns entre os dois transtornos.
- Diferenças Anatômicas e Fisiológicas. Estudos indicam que o TEA está associado de modo mais acentuado a áreas como o hipocampo, células de Purkinje, corpo caloso e os gânglios da base, áreas que impactam diretamente na interação social e nas competências comunicativas, ligadas tanto à linguagem verbal quanto à não verbal, além das estereotipias com interesses e comportamentos específicos (Monteiro et al., 2021). Em contrapartida, o TDAH envolve disfunções no lobo frontal e em neurotransmissores como serotonina, noradrenalina e dopamina, impactando diretamente na atenção e controle da impulsividade (Couto et al. 2010) e nas funções executivas, o que dificulta a capacidade de focar por longos períodos em atividades (Borges e Albrecht, 2022).
Ambos os transtornos envolvem, de maneira significativa, o comprometimento de estruturas cerebrais responsáveis pelas funções executivas e pelo controle motor. A disfunção do córtex pré-frontal, uma área essencial para o planejamento, controle de impulsos e regulação emocional, é uma característica comum tanto no TDAH quanto no TEA. Em indivíduos com TDAH, a redução da atividade dopaminérgica nas vias mesocorticais pode resultar em dificuldades de foco e desorganização no planejamento de atividades cotidianas. Já no TEA, as alterações na conectividade neural e nas vias dopaminérgicas podem interferir na percepção social e no processamento de estímulos ambientais, o que agrava a dificuldade de interação social e comunicação.
Além disso, a presença de alterações nas vias dopaminérgicas em ambos os transtornos sugere uma intersecção importante entre os dois. No TDAH, a dopamina é crucial para a motivação e o controle da atenção, enquanto no TEA, essa substância neuroquímica parece desempenhar um papel na modulação da motivação social e na resposta emocional aos estímulos. Essas disfunções podem explicar, em parte, o comportamento impulsivo e as dificuldades de regulação emocional observadas em indivíduos com ambos os transtornos.
Apesar das semelhanças, existem diferenças notáveis nas regiões cerebrais mais afetadas por cada transtorno. No TEA, além do córtex pré-frontal, outras áreas, como o hipocampo e os gânglios da base, mostram disfunções que afetam a integração sensorial e a capacidade de gerar respostas motoras coordenadas. O comprometimento na comunicação inter-hemisférica, com destaque para a alteração no corpo caloso, também parece ser um marcador distintivo do TEA, resultando em dificuldades significativas em estabelecer conexões sociais e na comunicação verbal e não verbal.
Por outro lado, o TDAH apresenta alterações mais concentradas em circuitos relacionados à atenção, controle de impulsos e função executiva. As disfunções nas vias dopaminérgicas que conectam o córtex pré-frontal aos núcleos da base parecem ser mais pronunciadas no TDAH, levando a déficits no controle da atenção, à dificuldade em sustentar o foco em tarefas e à tendência à hiperatividade e impulsividade. Essas diferenças estruturais podem justificar a maior prevalência de dificuldades no controle da atenção no TDAH, enquanto o TEA é mais caracterizado por prejuízos significativos em habilidades sociais e comunicação.
As implicações dessas semelhanças e diferenças neuroanatômicas são evidentes no comportamento dos indivíduos com TEA e TDAH. O TEA é frequentemente associado a uma dificuldade marcante em estabelecer interações sociais, comunicação verbal e não verbal, além de um padrão restrito e repetitivo de comportamentos. Em contraste, o TDAH se manifesta predominantemente por uma incapacidade de manter a atenção em atividades cotidianas e por um comportamento hiperativo, que é menos relacionado a questões sociais ou comunicativas e mais a um descontrole motor.
A interseção dessas condições sugere que, embora os transtornos tenham características distintas, existem pontos de sobreposição que tornam as abordagens terapêuticas mais desafiadoras. Estratégias que busquem tratar as dificuldades de controle de impulsos e de atenção, como as terapias que envolvem o treinamento de funções executivas, podem ser eficazes tanto para indivíduos com TDAH quanto para aqueles com TEA. No entanto, as intervenções também devem ser suficientemente personalizadas para atender às especificidades de cada transtorno. Enquanto no TEA é crucial focar no desenvolvimento de habilidades sociais e de comunicação, no TDAH o foco deve ser maior no aprimoramento da capacidade de atenção e na regulação comportamental.
Portanto, diante dos elementos supracitados, cabe afirmar que esses resultados contribuem significativamente para a ampliação do entendimento sobre as distinções e intersecções entre TEA e TDAH, evidenciando a necessidade de intervenções práticas orientadas e fundamentadas por perspectivas neuropsicológicas inerentes a cada transtorno. A interseção entre o TEA e o TDAH aponta para a necessidade de abordagens terapêuticas multidisciplinares e altamente personalizadas. Profissionais de diferentes áreas, como psicologia, neuropsicologia, psiquiatria e pedagogia, devem colaborar para fornecer estratégias terapêuticas integradas, levando em consideração tanto as particularidades de cada transtorno quanto suas sobreposições. O uso de intervenções comportamentais, terapias cognitivo-comportamentais, programas de treinamento de funções executivas e, em alguns casos, farmacoterapia, pode ser fundamental para melhorar o controle de impulsos, a regulação emocional e as habilidades sociais.
A personalização do tratamento é, portanto, essencial para garantir a eficácia das intervenções e, consequentemente, a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos com TEA e TDAH. Reconhecer as áreas de interseção entre esses transtornos pode ser um ponto de partida para a implementação de tratamentos mais adequados e para o desenvolvimento de novas pesquisas sobre as abordagens terapêuticas. Apesar das importantes contribuições da pesquisa atual, ainda há muitas lacunas a serem exploradas no entendimento das relações neurológicas entre o TEA e o TDAH.
Investigações futuras podem se beneficiar de uma abordagem mais detalhada sobre como as diferenças na estrutura cerebral, como a densidade de neurotransmissores e a conectividade funcional entre as regiões cerebrais, influenciam as manifestações comportamentais desses transtornos. Além disso, mais estudos longitudinais são necessários para acompanhar o desenvolvimento desses transtornos ao longo do tempo, especialmente considerando que o impacto das disfunções neurológicas pode variar conforme a idade e o ambiente em que o indivíduo está inserido. Em suma, a continuidade das pesquisas na área, com ênfase nos mecanismos biológicos que conectam e diferenciam o TEA e o TDAH, é crucial para avançar no campo da neurociência aplicada ao comportamento humano, melhorando a capacidade de diagnóstico, a personalização do tratamento e a qualidade de vida de pacientes com esses transtornos.
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[1] Graduanda em psicologia pela faculdade Anhanguera de Imperatriz. alinebrandao407@gmail.com
[2] Psicólogo graduado na universidade Ceuma de Imperatriz e especialista em Neuropsicologia. psicologia.cadu@gmail.com.
3 Graduanda em psicologia pela faculdade Anhanguera de Imperatriz. es95896@gmail.com
4 Graduanda em psicologia pela faculdade Anhanguera de Imperatriz. kethelenoliveira2003@gmail.com
5 Graduando em psicologia pela faculdade Anhanguera de Imperatriz. paulocentroga@gmail.com