PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES NO PÓS-OPERATÓRIO DE TRAQUEOSTOMIA EM PACIENTES PEDIÁTRICOS: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

MAIN POST-OPERATIVE COMPLICATIONS OF TRACHEOSTOMY IN PEDIATRIC PATIENTS: AN INTEGRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202501102127


Fernanda Póvoas dos Anjos1; Alexia Adriane Santiago Abdon1; Ludimila Silva Castro Marçal1; Ana Costa de Oliveira1; Rosiane de Sousa Santos1; Hyandra Gomes de Almeida Sousa1; Lorena de Oliveira Tannus1; Marcus Vinicius Henriques Brito1; Priscila Xavier de Araújo1


RESUMO

Objetivo: Identificar e classificar na literatura as principais complicações associadas à traqueostomia em pacientes pediátricos. Métodos: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, baseada em artigos publicados nos últimos 10 anos. A coleta de artigos ocorreu no período de 01 a 05 de maio de 2024, sendo realizadas buscas nas bases PubMed/MEDLINE da U. S. National Library of Medicine, Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Biblioteca virtual em saúde (BVS), por meio dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): “traqueostomia”, “complicações” e “pediatria” realizando combinações com os termos com o uso do operador booleano “AND”. Resultados: A revisão mostrou, por meio de 9 artigos inclusos, que a fisioterapia respiratória é fundamental para a reabilitação pulmonar dessas crianças, prevenindo complicações respiratórias e reduzindo o número de hospitalizações. No entanto, foram identificadas deficiências na atenção primária em Marabá, como a falta de equipes multiprofissionais e de suporte especializado para os cuidadores no ambiente domiciliar. Essas limitações comprometem a qualidade do atendimento e o bem-estar das crianças. Conclusão: O estudo reforça a importância de uma abordagem preventiva e proativa no manejo da traqueostomia pediátrica na minimização de complicações, e destaca a relevância da fisioterapia respiratória no cuidado integral de crianças traqueostomizadas.

Palavras-chave: Traqueostomia, Fisioterapia respiratória, Atenção primária, Cuidados domiciliares, Pediatria.

ABSTRACT

Objective: To identify and classify in the literature the main complications associated with tracheostomy in pediatric patients. Methods: This is an integrative literature review, based on articles published in the last 10 years. The article collection took place from May 1 to May 5, 2024, with searches conducted in the PubMed/MEDLINE databases of the U.S. National Library of Medicine, Scientific Electronic Library Online (SciELO), and Virtual Health Library (VHL), using the Health Sciences Descriptors (DeCS): “tracheostomy,” “complications,” and “pediatrics,” combined with Boolean operator “AND.” Results: The review, including 9 articles, showed that respiratory physiotherapy is essential for pulmonary rehabilitation in these children, preventing respiratory complications and reducing hospitalizations. However, deficiencies were identified in primary care in Marabá, such as the lack of multidisciplinary teams and specialized support for caregivers in the home environment. These limitations compromise the quality of care and the well-being of the children. Conclusion: The study reinforces the importance of a preventive and proactive approach in managing pediatric tracheostomy to minimize complications and highlights the relevance of respiratory physiotherapy in the comprehensive care of children with tracheostomies.

Keywords: Tracheostomy, Respiratory physiotherapy, Primary care, Home care, Pediatrics

INTRODUÇÃO

A traqueostomia é um procedimento que consiste em uma abertura cirúrgica realizada do pescoço até a traqueia, indicado quando ocorre a obstrução das vias respiratórias superiores, como uma forma de favorecer a ventilação mecânica prolongada ou para facilitar a higienização brônquica. Inicialmente sua aplicação ocorria principalmente em pacientes com infecções das vias respiratórias, entretanto, atualmente o procedimento é mais comum em crianças que possuem doenças cardiopulmonares complexas (GOBBI AB, KUTCHAK FM, 2020).

Aproximadamente 4500 crianças são submetidas a traqueostomia anualmente nos Estados Unidos, com redução estimada de 6,8 casos por 100.000 crianças por ano em 2000 para 6 casos por 100.000 crianças em 2012. O declínio pode ser atribuído à ampliação vacinal e melhores estratégias de intubação (ONG T et al., 2020). No Brasil, estudos epidemiológicos nacionais sobre crianças traqueostomizadas são escassos, sendo identificados em 2016 17.532 intubações em adultos e crianças realizados em hospitais públicos (NAZARIO LC, et al., 2022).

A traqueostomia é indicada em casos de malformações congênitas, infecções e tumores que afetam as vias aéreas, disfunções faríngeas, traumas, pós-operatórios, apneia do sono, para proteção das vias aéreas superiores em casos de coma e cirurgias de vias aéreas, pescoço e cavidade oral, edema glótico e estenose subglótica, distúrbios de deglutição, higiene das vias aéreas e suporte ventilatório (NAZARIO LC, et al., 2022).

Estudos recentes têm apontado que a traqueostomia oferece benefícios significativos, como a redução do esforço respiratório e da resistência das vias aéreas. Além disso, observou-se uma melhor tolerância por parte de pacientes conscientes e a prevenção de danos à laringe, quando comparada à utilização de tubo orotraqueal por longos períodos. É uma técnica amplamente reconhecida em muitos serviços como um procedimento essencial, não apenas para assegurar vias aéreas estáveis, mas também para reduzir as potenciais lesões laríngeas associadas à intubação endotraqueal. Além disso, a transição dos tubos da intubação endotraqueal para os tubos de traqueostomia facilita a higienização das secreções das vias aéreas. Este procedimento é frequentemente realizado no tratamento de condições como insuficiência respiratória decorrente de obstrução das vias aéreas superiores, trauma traqueal e manejo de pacientes com desmame ventilatório difícil (DONOSO MTV, et al., 2021).

No entanto, há também evidências que sugerem que a realização da traqueostomia pode afetar a função dos músculos cervicais e torácicos, bem como a coordenação das funções da faringe, laringe e glote. Esse desequilíbrio funcional pode resultar na redução do volume residual pulmonar e no aumento da elastância do sistema respiratório, levando ao desenvolvimento de microatelectasias e, potencialmente, à evolução para insuficiência respiratória aguda e infecções respiratórias agudas (MOTA JDH, et al., 2020).

Pacientes submetidos à traqueostomia requerem cuidados especiais para garantir uma recuperação segura e minimizar complicações. A abertura artificial na traqueia, estabelecida durante o procedimento, não apenas facilita a respiração, mas também expõe o paciente a uma série de riscos que exigem atenção contínua e especializada (DONOSO MTV, et al., 2021).

Além de abordar os cuidados essenciais para pacientes submetidos à traqueostomia, é crucial que os profissionais de saúde compreendam as complicações associadas ao procedimento. As complicações associadas à traqueostomia podem ser categorizadas em três grupos distintos: imediato, breve e tardio, sendo que as duas últimas categorias ocorrem no período pós-operatório. As complicações classificadas como breves ocorrem nos primeiros sete dias após a realização da traqueostomia, enquanto as tardias surgem após esse período. Entre as complicações breves mais comuns destaca-se o sangramento pós-operatório, enquanto a estenose das vias aéreas emerge como uma complicação tardia proeminente. Além dessas, várias outras complicações podem surgir durante o procedimento, incluindo dessaturação grave, acidente vascular cerebral (AVC), pneumotórax, hemorragia significativa, parada cardiorrespiratória decorrente da supressão do centro respiratório induzida pelo oxigênio, edema pulmonar agudo, aspiração de sangue, formação de fístula traqueoesofágica e lesões das fibras nervosas, como o nervo laríngeo recorrente (SANTA-CRUZ F, et al., 2020).

Devido à complexidade desse procedimento cirúrgico e suas implicações para os pacientes traqueostomizados, é fundamental explorar as complicações mais comuns no período pós-operatório, na população pediátrica visando garantir uma assistência de qualidade. Portanto, este estudo, centrado em compreender as principais complicações associadas à traqueostomia, foi guiado pela seguinte questão norteadora: quais são as complicações mais frequentemente mencionadas como decorrentes da traqueostomia na população pediátrica? Destaca-se que os resultados desta pesquisa têm o potencial de fornecer resultados valiosos que podem melhorar a qualidade da assistência prestada aos pacientes pediátricos submetidos à traqueostomia.

MÉTODOS

Este estudo é uma revisão integrativa realizada por meio de levantamento bibliográfico em base de dados científica com o objetivo de responder ao questionamento inicial que é de compreender as complicações mais frequentemente mencionadas como decorrentes da traqueostomia na população pediátrica.

A coleta de artigos ocorreu no período de 01 a 05 de maio de 224. Para tanto, foi utilizada como base de dados para pesquisa de artigos científicos o PubMed/MEDLINE da U. S. National Library of Medicine, Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Os descritores utilizados foram: “traqueostomia”, “complicações” e “pediatria”, conforme identificado no Descritores de Ciências da Saúde (DeCS). Os descritores foram combinados entre si para identificação de diversos estudos sobre o referido tema da seguinte forma: (traqueostomia) AND (complicações) AND (pediatria).

Foram definidos como critérios de inclusão para esta revisão: população pediátrica, artigos escritos em inglês e português, com disponibilidade de texto completo, indexados nas referidas bases de dados e nos últimos 05 anos. Como critérios de exclusão foram definidos: estudos de anais de congressos e conferência, população adulta, trabalhos com mais de 05 anos de publicação, e aqueles que não tivessem relação com o questionamento inicial da pesquisa.

RESULTADOS

O presente estudo foi realizado a partir da busca e análise de artigos, considerando todos os critérios mencionados. Inicialmente, a busca foi realizada nos bancos de dados com os descritores e logo após a seleção, é realizada uma filtragem através da leitura dos resumos e dos artigos completos. No banco de dados da Scielo 5 artigos foram identificados, sendo selecionados 3 para leitura na íntegra. No BVS, encontrou-se 8 artigos, sendo selecionados apenas 1 para leitura na íntegra. Na plataforma PUBMED foram identificados 5 artigos, sendo que os 5 foram selecionados para leitura na íntegra. Ao total foram selecionados 9 artigos finais para revisão bibliográfica, além de que monografias, artigos que retratavam uma população adulta foram excluídos por não se enquadrarem nos critérios de inclusão (Figura 1).

Figura 1: Estratégia de busca e seleção.

Fonte: Anjos FP, et al., 2024

O Quadro 1 apresenta de maneira resumida os artigos incluídos na amostra final, abrangendo além do título dos artigos, os autores e ano de publicação, tipo de estudo, objetivos e conclusões, inseridos nos principais resultados.

Quadro 1 – Síntese das principais informações dos 9 estudos incluídos nesta revisão integrativa.

Fonte: Anjos FP, et al., 2024

DISCUSSÃO

A mortalidade associada a traqueostomia pediátrica é uma preocupação significativa, especialmente considerando a possibilidade de complicações graves, como obstrução de via aérea ou hemorragia fatal. Estratégias para reduzir esses riscos incluem o desenvolvimento de protocolos de decanulação, equipes multidisciplinares especializadas em vias aéreas pediátricas (HANSEN TP, et al., 2021) e cuidados domiciliares adequados para garantir uma transição segura do hospital para o ambiente domiciliar (CHORNEY SR, et al., 2021; PEREIRA IC, et al., 2024; LINDQUIST SJ, et al., 2020).

Em última análise, é essencial reconhecer a importância de uma abordagem preventiva e proativa no manejo da traqueostomia pediátrica, com o objetivo de minimizar complicações, melhorar os resultados clínicos e promover a qualidade de vida dos pacientes submetidos a esse procedimento. Além disso, esforços conjuntos de diferentes profissionais de saúde mostram melhores resultados, reduzindo os efeitos adversos da traqueostomia em até 58% (PRAGER JD, BAKER CD, 2019; MCKEON M, et al., 2019), uma abordagem que pode ser mais explorada em diversos hospitais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A traqueostomia pediátrica é um procedimento associado a diversas complicações, tanto precoces quanto tardias. Essas complicações podem representar ameaças à vida do paciente e exigem intervenções rápidas e eficazes. Entre as complicações mais comuns estão a obstrução da cânula, decanulação acidental, infecções no estoma, sangramento, enfisema subcutâneo, granulação, estenose traqueal e pneumonia. Além disso, complicações tardias, como estenoses traqueais e fístulas, também foram identificadas em alguns estudos. A mortalidade associada à traqueostomia pediátrica é uma preocupação significativa, destacando a importância de estratégias para reduzir esses riscos. Protocolos de decanulação, equipes multidisciplinares especializadas em vias aéreas pediátricas e cuidados domiciliares adequados são essenciais para minimizar complicações e melhorar os resultados a longo prazo. A colaboração entre profissionais de saúde, cuidadores e familiares é fundamental para fornecer um cuidado abrangente e centrado no paciente.

REFERÊNCIAS

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1 Universidade do Estado do Pará (UEPA), Marabá-Pará. E-mail: alexia.asabdon@aluno.uepa.br