METILXANTINAS NO TRATAMENTO DA APNEIA DA PREMATURIDADE: UMA REVISÃO DE LITERATURA

METHYLXANTHINES IN THE TREATMENT OF APNEA OF PREMATURE: A LITERATURE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202412021214


Cristiana Bridge da Silva Brito1, Rodrigo Alexandre Torres Barros1, Elaine Maria Souza Lima1, Maria Alânia da Silva Nascimento1, Nayara Fernanda dos Santos1, Kaíque Ferreira Alves1,3, Ainã Barbosa Chagas2, Carolina Gama Martins dos Santos2, Igor Wanderley Magalhães Silva2, Jakson Henrique Silva1,3


RESUMO

INTRODUÇÃO: A apneia da prematuridade (AOP) é caracterizada por pausas na respiração de 20 segundos ou mais, ou por interrupções curtas com bradicardia (<100 bpm), cianose ou palidez. A incidência da AOP está relacionada ao grau de prematuridade, sendo mais comum em recém-nascidos (RN) com idade gestacional (IG) <28 semanas. A presença de receptores de adenosina no cérebro e em outros sistemas faz com que a utilização de metilxantinas, como a cafeína, cause efeitos secundários por agir como antagonista inespecífico desses receptores. O citrato de cafeína é amplamente reconhecido na medicina neonatal como tratamento de escolha para a apneia da prematuridade, estimulando o sistema respiratório, reduzindo os episódios de apneia, auxiliando na extubação e acelerando a descontinuação de dispositivos de pressão positiva. OBJETIVO: Elucidar sobre o uso de metilxantinas no tratamento da apneia da prematuridade, descrevendo sua eficácia, segurança e impacto na descontinuação do suporte ventilatório. METODOLOGIA: Revisão de literatura nas bases de dados PubMed e BIREME, contemplando artigos disponíveis em texto completo, publicados nos últimos dez anos e sem restrição de idioma. A busca ocorreu nos meses de outubro e novembro de 2024, orientada pelo cruzamento dos descritores padronizados pelos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): “cafeína”, “recém-nascido prematuro” e “apneia”. Estudos de revisão foram excluídos para priorizar dados primários e evidências empíricas. RESULTADOS: Foram incluídos três ensaios clínicos randomizados e um estudo de coorte, envolvendo 3.410 RN com IG média de 30 ± 1,97 semanas, todos submetidos ao tratamento da AOP com citrato de cafeína. O tratamento durou, em média, 6 semanas com dosagem média de ataque de 32 mg/kg e 7 mg/kg/dia de manutenção. O tratamento com o citrato de cafeína contribuiu para redução significativa da necessidade de utilização de VMI e CPAP e para o desmame ventilatório precoce, além de reduzir a incidência de displasia broncopulmonar e enterocolite necrosante. CONCLUSÃO: Com uma boa aprovação na redução da apneia em prematuros, a cafeína vem facilitando a retirada dos dispositivos respiratórios de pressão positiva.

Palavras-chave: Apneia da prematuridade; Metilxantinas; Desmame da ventilação mecânica; Tratamento neonatal; Sistema respiratório.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Apnea of prematurity (AOP) is characterized by pauses in breathing lasting 20 seconds or more, or by short interruptions with bradycardia (<100 bpm), cyanosis or pallor. The incidence of AOP is related to the degree of prematurity, being more common in newborns (NB) with gestational age (GA) <28 weeks. The presence of adenosine receptors in the brain and other systems means that the use of methylxanthines, such as caffeine, causes side effects by acting as a non-specific antagonist of these receptors. Caffeine citrate is widely recognized in neonatal medicine as the treatment of choice for apnea of prematurity, stimulating the respiratory system, reducing apnea episodes, aiding extubation and accelerating the discontinuation of positive pressure devices. OBJECTIVE: To elucidate the use of methylxanthines in the treatment of apnea of prematurity, describing their efficacy, safety and impact on the discontinuation of ventilatory support. METHODOLOGY: Literature review in the PubMed and BIREME databases, including articles available in full text, published in the last ten years and without language restrictions. The search took place in the months of October and November 2024, guided by the crossing of descriptors standardized by the Health Sciences Descriptors (DeCS): “caffeine”, “premature newborn” and “apnea”. Review studies were excluded to prioritize primary data and empirical evidence. RESULTS: Three randomized clinical trials and one cohort study were included, involving 3,410 newborns with a mean GA of 30 ± 1.97 weeks, all undergoing AOP treatment with caffeine citrate. Treatment lasted, on average, 6 weeks with an average loading dosage of 32 mg/kg and 7 mg/kg/day for maintenance. Treatment with caffeine citrate contributed to a significant reduction in the need to use IMV and CPAP and to early ventilatory weaning, in addition to reducing the incidence of bronchopulmonary dysplasia and necrotizing enterocolitis. CONCLUSION: With good approval in reducing apnea in premature babies, caffeine has been facilitating the removal of positive pressure breathing devices.

KEYWORDS:  Apnea of prematurity; Methylxanthines; Weaning from mechanical ventilation; Neonatal treatment; Respiratory system.

INTRODUÇÃO

A apneia da prematuridade é uma condição clínica que afeta neonatos prematuros, definida pela interrupção da respiração por mais de 20 segundos, geralmente acompanhada de bradicardia e dessaturação de oxigênio (Souza et al. 2022). Esse distúrbio é prevalente em recém-nascidos que nascem antes das 37 semanas de gestação, devido à imaturidade dos centros respiratórios no tronco encefálico (Ferraz e Moura, 2021). A apneia da prematuridade pode levar a consequências significativas, incluindo complicações neurológicas e riscos elevados de morbidade e mortalidade neonatal (Carvalho et al., 2020).

Dentre as estratégias de manejo da apneia da prematuridade, o uso de metilxantinas, como cafeína e teofilina, tem se destacado como um tratamento de primeira linha (Ferreira et al. 2023). As metilxantinas atuam como estimulantes do sistema nervoso central, aumentando a sensibilidade dos quimiorreceptores periféricos e melhorando a contratilidade dos músculos respiratórios (Santos; Oliveira, 2021). A cafeína, em particular, tem mostrado um perfil de eficácia superior e menor incidência de efeitos adversos em comparação com outras metilxantinas, sendo amplamente utilizada em unidades de terapia intensiva neonatal (UTIN) (Lima et al., 2022).

Estudos indicam que a administração de cafeína em prematuros contribui significativamente para a redução da incidência de episódios de apneia, além de melhorar a sobrevida e os desfechos neurológicos a longo prazo (Pereira et al. 2021). A cafeína apresenta uma meia-vida prolongada e penetra rapidamente no sistema nervoso central, o que a torna uma opção terapêutica vantajosa (Menezes; Freitas, 2020). Essa droga também tem efeitos anti-inflamatórios e antioxidantes que podem promover um desenvolvimento mais saudável nos neonatos (Silva et al., 2021).

A utilização de metilxantinas no tratamento da apneia da prematuridade tem contribuído para a redução da dependência de suporte ventilatório e diminuição do tempo de internação hospitalar (Alvarenga; Pontes, 2023). Os avanços no manejo farmacológico, aliados às intervenções não farmacológicas, como o uso de ventilação mecânica com pressão positiva contínua (CPAP), têm melhorado significativamente os resultados nesta população (Gomes et al., 20221)

Diante da relevância clínica da apneia da prematuridade e dos benefícios associados ao uso de metilxantinas, justifica-se a realização de uma revisão da literatura sobre esse tema. Diante disto o objetivo deste trabalho é analisar as evidências sobre a eficácia e segurança das metilxantinas no tratamento da apneia em recém-nascidos prematuros, destacando suas implicações clínicas e as perspectivas para futuras pesquisas.

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão de literatura com abordagem descritiva. O levantamento foi realizado entre os meses de outubro a novembro de 2024, em artigos publicados nos últimos 10 anos, utilizando as bases de dados: PubMed e BIREME. A pesquisa foi direcionada pelo Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) utilizando os seguintes descritores “cafeína”, “recém-nascido prematuro” e “apneia”, realizada com a técnica dos operadores Booleanos “AND” para obter resultados. Foram utilizados como critérios de inclusão ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte, artigos disponíveis em texto completo e sem restrição de idiomas. Foram excluídos os artigos que não estavam ligados ao objetivo de pesquisa, revisões e publicados à mais de 10 anos.

RESULTADOS

Um total de 26 artigos foram identificados, porém apenas 4 estavam dentro dos padrões seguindo os critérios de elegibilidade. Informações sobre a triagem dos estudos estão contidos no fluxograma 1.

Fluxograma 1 – Identificação de estudos via banco de dados e registro

Foram incluídos quatro estudos, publicados entre os anos de 2017 a 2022, três de origem americana e um de origem asiática, sendo três ensaios clínicos randomizados e um estudo de coorte, envolvendo 1.482 RN com idade gestacional variando entre 28 a 30 semanas, 75% dos estudam evidenciaram maior prevalencia do sexo masculino, com peso ao nascimento variando de 500 a 1.289g. Todos foram submetidos ao tratamento da AOP com citrato de cafeína. O tratamento durou, em média, 6 semanas com dosagem média de ataque de 32 mg/kg e 7 mg/kg/dia de manutenção.

Os desfechos mais positivos relatados pelos estudos foram a frequência e o número de dias com episódios apneicos, assim como o tempo de ventilação mecânica. Os demais dados estão contidos na tabela 1.

Tabela 1 – Características gerais dos estudos incluídos

DISCUSSÃO

A prematuridade traz consigo uma série de repercussões, dentre elas o desenvolvimento da apneia da prematuridade (AOP), provocando uma necessidade de suporte ventilatório invasivo ou não invasivo, podendo repercutir em altas taxas de mortalidade neonatal. Este estudo evidencia o perfil sociodemográfico, clínico e as indicações necessárias para o tratamento farmacológico da AOP.

Os estudos evidenciam que os recem nascidos do sexo masculino foram mais suceptíveis ao nascimento prematuro e ao uso de metilxantinas no tratamento da AOP. Perfil semelhante ao estudo de Kaltofen et al. (2015) onde houve predomínio no sexo masculino, isso ocorre, pois, durante o desenvolvimento pulmonar, as células alveolares fetais femininas possuiem uma atividade de transporte de Na+, mais alta em comparação as do sexo oposto, além do mais os andrógenos masculinos também diminuem a produção de surfactantes e atrasam a maturidade pulmonar.

Nossa revisão elucidou uma maior prevalência de recém nascidos com idade gestacional variando entre 28 a 30 semanas com peso ao nascimento entre 500 a 1289g. Dados semelhantes encontrados no estudo de acompanhamento de ensaio clínico randomizado, de Schmidt et al., (2017), onde a idade gestacional foi menor que 32 semanas e o peso variando entre 500 a 1.250g, em contra partido o estudo de coorte de realizado por Puia-Dumite et al. (2019) que relata uma idade gestacional menor que 28 semanas e o peso variando entre 500 a 1.250g.

Nosso estudo mostrou que dentre as metilxantinas como a cafeína e teofilina tem se destacado no tratamento padrão Ferreira et al. (2023), porém a cafeína vem sendo a mais utilizada pela sua maior eficácia e menor frequência de efeitos adversos em relação a outras metilxantinas Lima et al. (2022). Nossa pesquisa evidencia que a maioria dos estudos utilizada como referência para dosagem tendo como média 32 mg/kg como dose de ataque e 7mg/kg/dia de manutenção. Em contrapartida, o estudo Kori et al. (2021) evidencia que as doses utilizadas são de 40mg/kg/dia, e a dose de manutenção de 20mg/kg/dia.

A revisão evidenciou que o uso do citrato de cafeína no manejo da apneia da prematuridade (AOP) é eficaz na redução de episódios apneicos, na diminuição da necessidade de suporte ventilatório e no tempo de internação, corroborando a literatura atual sobre o tema (Ferreira et al., 2023). Os dados analisados reforçam o papel central da cafeína como tratamento de primeira linha, sendo uma intervenção segura e com benefícios de curto e longo prazo para neonatos prematuros.

Os estudos incluídos mostraram que o citrato de cafeína é eficaz na redução da frequência e duração dos episódios apneicos. Schmidt et al. (2017) relataram uma redução significativa do tempo de uso do CPAP, enquanto Puia-Dumit et al. (2019) observaram diminuição da dependência de suporte ventilatório. Esses achados são consistentes com a literatura que destaca os efeitos estimulantes da cafeína no sistema nervoso central e na melhora da contratilidade dos músculos respiratórios (Menezes e Freitas, 2020).

A administração precoce da cafeína contribuiu para uma menor incidência de complicações, como a displasia broncopulmonar (DBP), retinopatia da prematuridade e atraso cognitivo em 18 meses, conforme destacado por Schmidt et al., (2017) e Puia-Dumit et al. (2019). Esses resultados confirmam o potencial da cafeína em promover melhores desfechos clínicos e reduzir morbidades em neonatos prematuros. McPherson et al., (2022) sugeriram que doses mais altas podem estar associadas a maior incidência de hemorragia cerebral e hipertonicidade. Por outro lado, os efeitos adversos de longo prazo, como neurotoxicidade, não foram evidenciados. Esses achados destacam a importância de ajustar as dosagens e monitorar cuidadosamente os neonatos submetidos a terapias com cafeína.

No estudo de Kori et al., (2021) foi evidenciado as diferenças mínimas entre grupos tratados com doses altas e baixas, indicando que estratégias personalizadas podem ser necessárias para otimizar o balanço entre eficácia e segurança. A revisão reforça que a cafeína apresenta vantagens significativas em relação a outras metilxantinas, como a teofilina, devido à meia-vida mais longa e menor incidência de efeitos adversos (Lima et al., 2022). Além disso, a combinação de terapias farmacológicas com intervenções não farmacológicas, como CPAP, também demonstrou ser eficaz na melhora dos desfechos, como relatado por Alvarenga e Pontes (2023).

CONCLUSÃO

Os resultados desta revisão confirmam que o citrato de cafeína é um tratamento eficaz e relativamente seguro para a AOP, contribuindo para a melhora dos desfechos neonatais. No entanto, o manejo deve ser cuidadosamente ajustado às necessidades individuais, e estudos adicionais são necessários para refinar protocolos e investigar potenciais efeitos a longo prazo.

As evidências sobre o efeito da cafeína em comparação com outras metilxantinas no desenvolvimento a longo prazo e nos efeitos colaterais na apneia da prematuridade são bastante incertas. Apesar de serem bastante usadas em recém nascidos prematuros, há escassez de evidências diretas para fundamentar entre diferentes metilxantinas, sendo necessários mais estudos com qualidade metodológica, capaz de evidenciar as principais causas e efeitos das metilxantinas principalmente em bebês extremamente prematuros.

REFERÊNCIAS

Alvarenga, P.; Pontes, L. Redução da dependência de suporte ventilatório em prematuros com uso de metilxantinas. Jornal de Medicina Neonatal, v. 15, n. 4, p. 456-462, 2023.

Carvalho, J. et al. Apneia da prematuridade: prevalência e impacto clínico. Cadernos de Saúde Neonatal, v. 7, n. 1, p. 20-29, 2020.

Ferreira, L. et al. Terapias farmacológicas para apneia da prematuridade: uma revisão sistemática. Revista de Cuidados Neonatais, v. 20, n. 1, p. 89-96, 2023.

Ferraz, M.; Moura, C. Incidência e fisiopatologia da apneia em neonatos prematuros. Revista Brasileira de Pediatria e Neonatologia, v. 14, n. 2, p. 122-130, 2021.

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Kaltofen, A. et al. Sex is Associated with a Reduced Alveolar Epithelial Sodium Transport.          PLoS One. Aug 2015.

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Santos, C.; Oliveira, V. Mecanismos de ação das metilxantinas no sistema respiratório neonatal. Revista de Fisiologia Neonatal, v. 7, n. 1, p. 75-81, 2021.

Schmidt, B. Caffeine for apnea of prematurity: Too much or too little of a good thing. The journal of pediatrics, v. 259, n. 113488, p. 113488, 2023.

Silva, T. et al. Efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios da cafeína em neonatos prematuros. Revista Brasileira de Pesquisa Neonatal, v. 10, n. 2, p. 210-218, 2021.

Souza, L. et al. Características e diagnóstico da apneia da prematuridade. Revista Brasileira de Neonatologia Clínica, v. 15, n. 1, p. 15-22, 2022.


1Departamento de Fisioterapia do Centro Universitário Maurício de Nassau (Uninassau) Caruaru,PE

2Fisioterapeuta pelo Centro Universitário Tabosa de Almeida (ASCES-UNITA), Caruaru-PE

3Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife-PE