CONTRIBUIÇÕES DA RESSONÂNCIA MAGNÉTICA PARA O DIAGNÓSTICO DA DISLEXIA DO DESENVOLVIMENTO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411251550


Enaile Sininger Fulgencio Vidal1
Gilmar Santana Lima2


Resumo: as contribuições da ressonância magnética para a caracterização da dislexia em nível de estudo são inegáveis, entretanto sua participação efetiva no diagnóstico desta condição ainda é pouco investigada. Este trabalho tem como objetivo realizar uma análise de artigos que relacionam o exame de ressonância magnética a dislexia, apresentando ainda como objetivos específicos determinar a quantidade de artigos publicados nos últimos cinco anos em bases de pesquisa científica, relacionados com o presente tema, estabelecer as contribuições destes artigos para o aprimoramento do diagnóstico desse distúrbio e quais bases foram suportes para os trabalhos mencionados. Foi realizada uma revisão bibliográfica nas bases PubMed, BVS e SciELO, entre janeiro de 2019 e maio de 2024. Os artigos analisados apontam impactos positivos da neuroimagem para o diagnóstico da dislexia do desenvolvimento, apesar de ainda serem necessários estudos complementares quanto à confiabilidade do método. 

Palavras-chave: Diagnóstico; Dislexia; Ressonância Magnética.

1 INTRODUÇÃO

Segundo define o Manual Diagnóstico e Estatístico de transtornos mentais em sua quinta edição (DSM-V), dislexia é um termo usado para se referir a dificuldades de aprendizagem caracterizadas por problemas no reconhecimento preciso ou fluente de palavras, problemas de decodificação e dificuldades em ortografar. (American Psychiatric Association, 2013).

          A dislexia do desenvolvimento (DD), como é denominada a condição congênita deste transtorno específico de aprendizagem afeta cerca de 20% da população mundial, com a prevalência de 5:1 de homens em relação a mulheres (Shaywitz et al., 2021). Existem diferentes hipóteses as possíveis causas deste transtorno, dos quais se destacam aqueles que relacionam a dislexia a possíveis alterações nos aspectos morfofuncionais do cérebro.

           Estudos de neuroimagem funcional da DD relatam diferenças morfológicas importantes entre as regiões do giro frontal inferior (GFI), giro temporal superior (GTS) e giro supramarginal e ainda diferentes aspectos no processo de laterização do telencéfalo de disléxicos em relação a leitores hábeis.(Freitas, 2014).

         Entretanto segundo a 2ª edição do tratado de Neurologia pediátrica, exames complementares de neuroimagem não são considerados úteis ao diagnóstico, que é feito integralmente na análise clínica de diversos profissionais de diferentes áreas como neurologistas, fonoaudiólogos, psicólogos, entre outros, com foco principal em descartes de outros diagnósticos eventualmente suspeitos. (Neurologia pediátrica 2a ed. p 56).

         Contrapondo-se ao método diagnóstico vigente, recursos tecnológicos como a ressonância magnética (RM), possuem um grande potencial em simplificar e otimizar o diagnóstico de DD, uma vez que promove uma avaliação não invasiva as estruturas encefálicas e possibilita a visualização multiplanar com alta definição anatômica.

           Diante destas informações este trabalho tem como objetivo realizar uma análise de artigos que relacionam neuroimagem e o diagnóstico de dislexia, apresentando como objetivo específico determinar a quantidade de artigos publicados nos últimos cinco anos, estabelecer o que esses achados contribuíram para caracterização e diagnóstico deste transtorno e quais bases de dados foram suporte para esses artigos.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Dislexia

            A dislexia do desenvolvimento é definida pela Associação Internacional de Dislexia como um transtorno de base neurobiológica que resulta em um déficit no componente fonológico da linguagem, inesperado em relações a idade, inteligência, capacidade cognitiva, oportunidades socioculturais e qualidade da instrução educacional (International Dyslexia Association, 2002). 

            O processo de leitura e escrita envolve múltiplos circuitos do sistema nervoso em ambos os hemisférios, com ação mais ativa do hemisfério esquerdo uma vez que este é responsável por promover o processamento e decodificação de dados linguísticos. Em especial dois sistemas se destacam, o sistema anterior, situado na região do GFI, sistema posterior, que engloba o giro supramarginal e partes posteriores do GTS (Rodrigues, 2013).

            Sistema anterior: O giro frontal inferior é uma região bem mapeada no encéfalo, adjacente e anterior ao córtex motor que historicamente tem sido de grande interesse a pesquisadores de leitura e produção de fala, o GFI é formado por três estruturas distintas, áreas de Brodmann (BA), são elas, parte opercularis (BA44), responsável pelo processamento baseado no som e nos movimentos motores preparatórios. Parte triangularis (BA45), que possui grandes evidências de seu papel na produção de leitura e fala. E a parte orbitalis (BA47), que está envolvida no processo de leitura múltipla e memória de trabalho (Nisbet et al., 2024).

            Sistema posterior: Formado pelos giro supramarginal e temporal superior, esse sistema tem se mostrado substancialmente notável na pesquisa de dislexia, por apresentar uma diminuição da substância cinzenta para disléxicos em comparação a leitores hábeis (Braid; Richlan, 2022 apud Nisbet et al., 2024), sendo estas estruturas fundamentais para o processamento fonológico e mapeamento de grafema a fonema (Verley et al., 2019 apud Nisbet et al., 2024), desempenho de tarefas de descriminação e identificação de sílabas e leitura de pseudopalavras (Vandermosten et al., 2012 apud Nisbet et al., 2024).

            Essas anomalias morfológicas no encéfalo resultam em um déficit fonológico, porém sem prejuízo às outras capacidades cognitivas que permanecem preservadas, indivíduos com DD apresentam problemas de compreensão léxica e fonação gramatical assim como também baixa competência ortográfica, a identificação de qual domínio é afetado em maior ou menor grau é fundamental para correlação neuropsicólogica e neurobiologica que variam em cada indivíduo afetado (Rodrigues; 2013).

Método diagnóstico atual

            O manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais em sua 5ª edição caracteriza o diagnóstico de transtornos específicos da aprendizagem como não podendo ser atribuído a algum transtorno neurológico, por exemplo, Acidente Vascular Cerebral, ou motor ou a qualquer deficiência física (Cegueira, deficiência auditiva) porém ligados a uma dificuldade de aprendizagem limitada a uma habilidade ou domínio acadêmico (leitura de palavras isoladas), o manual ainda ressalta a necessidade de uma avaliação abrangente e multidisciplinar, incluindo testes psicométricos padronizados apesar de reconhecer a ambiguidade destes testes uma vez as habilidades de um indivíduo são entendidas como um continnum do conhecimento (American Psychiatric Association, 2013).

Esse critério, todavia, também requer evidências psicométricas resultantes de teste de desempenho acadêmico administrado individualmente, psicometricamente apropriado e culturalmente adequado, padronizado ou referenciado a critérios. As habilidades acadêmicas distribuem-se ao longo de um continnum; assim, não há ponto de corte natural que possa ser usado para diferenciar indivíduos com ou sem transtorno específico da aprendizagem. Portanto, qualquer limiar usado para especificar o que constitui desempenho acadêmico significativamente baixo (p. ex., habilidades acadêmicas muito abaixo do esperado para a idade) é, em grande parte, arbitrário (American Psychiatric Association, 2013 p 113).

            Assim, a associação americana de psiquiatria aconselha ainda a aplicação de múltiplos testes para maior clareza diagnóstica, uma vez que escores são variáveis de acordo com a rigidez da metodologia aplicada e a capacidade de mensuração de cada um, deste modo é de responsabilidade do examinador, com base em juízo clínico, modificar critérios de tolerância segundo as evidências de aprendizagem que apoiem ou conflitam para o diagnóstico

Baixos escores acadêmicos em um ou mais de um teste padronizado ou em subtestes em um domínio acadêmico são necessários para maior certeza diagnóstica.

Escores exatos, entretanto, irão variar de acordo com os testes padronizados específicos empregados. Com base em juízos clínicos, pode ser usado um limiar mais tolerante quando as dificuldades de aprendizagem são apoiadas por evidências convergentes de avaliação clínica, história acadêmica, relatórios escolares ou escores de testes. Além do mais, considerando que testes padronizados não estão disponíveis em todos os idiomas, o diagnóstico pode então ser baseado, em parte, no julgamento clínico (American Psychiatric Association, 2013 p 113).

             Deste modo, todo o processo diagnóstico da DD é pautado na abordagem clínica, uma vez que a aplicação de testes se prova pouco eficaz e não há indicações para utilização de exames laboratoriais ou de imagem, apesar das comprovações científicas de que a dislexia tenha ligações a alterações genéticas e morfológicas do sistema nervoso, a não ser se utilizadas para descartar outros diagnósticos eventualmente suspeitos (Pereira et al., p 57).

Contribuições da neuroimagem 

           Apesar de pouco difundido na prática diagnóstica, exames de imagem por métodos como a ressonância magnética (RM) tem se mostrado cada vez mais úteis para avaliar distúrbios do neurodesenvolvimento uma vez que pode revelar alterações morfológicas e funcionais (Handbook of Clinical Neurology, 2020 p 265).

            O procedimento da RM não é invasivo, dura poucos minutos, sendo bem tolerado inclusive por crianças, e fornece imagens nítidas em alta resolução de todos os planos anatômicos (axial, coronal e sagital), utilizando principalmente as propriedades magnéticas do hidrogênio encontrado nas moléculas de água, substância abundante no corpo humano, que rotam em seu próprio eixo de forma aleatória e multidirecional ,porém de forma distinta em cada tecido, que quando submetido ao campo magnético do aparelho se alinham a ele possibilitando a formação de imagens. As diferentes velocidades de rotação em diferentes tecidos permitem a visualização de diferentes padrões de aquisição em cada tecido, (p ex. substância branca, cinzenta, licor, gordura) (Rodrigues, 2013). Entretanto o uso da ressonância magnética na clínica ainda permanece restrito (Handbook of Clinical Neurology, 2020 p 265).

3 METODOLOGIA

Foi realizada uma revisão bibliográfica, observando todas as publicações disponíveis nas bases PubMed, BVS e SciELO, entre janeiro de 2019 e maio de 2024, por se acreditar ser suficiente coletar informações mais recentes que envolvem esse tema.

Os descritores utilizados foram “dyslexia”, “dyslexia & neuroimaging”, “dyslexia & magnetic resonance “, “dyslexia & diagnosis”.

            Foram considerados como critérios de inclusão neste trabalho: publicações nos idiomas português e inglês, que se referiam ao diagnóstico de dislexia do desenvolvimento independente da faixa etária.

Quanto aos critérios de exclusão, foram desconsiderados: trabalhos publicados em outros idiomas que não português ou inglês, e/ou não tratavam do distúrbio da dislexia do desenvolvimento ou seu diagnóstico.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A leitura atenta dos artigos pesquisados nas bases PubMed, BVS e SciELO demonstrou que ainda há muito a se pesquisar. As figuras 1, 2 e 3 demonstram o número de artigos encontrados ao utilizar os descritores já supracitados, além disso a tabela 1 compara todos os resultados nas diferentes plataformas. 

  Figura 1: Números de artigos encontrados utilizados os descritores no PubMed.

Figura 2: Números de artigos encontrados utilizados os descritores na BVS.

Figura 3: Números de artigos encontrados utilizados os descritores na SciELO.

Dyslexia Dyslexia & neuroimaging Dyslexia & magnetic resonance Dyslexia & diagnosis 
PubMed 1760209150664
BVS189489909515
SciELO 1343131

Tabela 1: Comparativo entre os dados encontrados na PubMed, BVS e SciELO utilizando os descritores citados.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entende-se que o avanço nas tecnologias médicas contribuiu grandiosamente para a melhor compreensão da dislexia, entretanto sua utilização no processo de diagnóstico ainda é pouco difundida apesar de apresentar importantes contribuições que auxiliariam na confirmação do diagnóstico da DD, uma vez que exames de ressonância magnética possibilitam o conhecimento mais a fundo das diferenças anatômicas e funcionais dos indivíduos disléxicos em detrimento aos que não possuem essa condição.

Sendo assim, constatou-se que a implantação de exames de neuroimagem ao processo de diagnóstico de dislexia do desenvolvimento aumentaria a precisão do método, que não dependeria apenas de análise clínica subjetiva, e diminuiria a necessidade de múltiplas avaliações, uma vez que um único profissional poderia diagnosticar a condição, o que impactaria positivamente em diversos aspectos sociais e emocionais a vida dos indivíduos com esse quadro.

Ainda sim, mais investigações são necessárias para mensurar o grau de confiabilidade de um diagnóstico pautado principalmente em exames por imagens de uma condição tão subjetiva e variável segundo especificidades individuais dos pacientes.

REFERÊNCIAS

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION DSM-5 ®. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://www.institutopebioetica.com.br/documentos/manual-diagnostico-e-estatistico-de-transtornos-mentais-dsm-5.pdf>.

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FREITAS, Lívia Ignacio de. Alterações neuropsicológicas e de morfometria cerebral de indivíduos com dislexia. 2014. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.

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‌PEREIRA, Heloisa Viscaino Fernandes S.; MOREIRA, Andréia de Santana S. Neurologia pediátrica 2a ed..Editora Manole. E-book. ISBN 9788520458082. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788520458082/. Acesso em: 10 mai. 2024.

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1Acadêmica de Medicina na Faculdade de Medicina de Açailândia (FAMEAC), Açailândia, MA, Brasil. enailevidal195@gmail.
² Mestrando em Educação pela Universidad Europea del Atlantico (UNEATLANTICO), Açailândia, MA, Brasil. gilmar.biologia@hotmail.com