CHALLENGES AND IMPACTS OF SEROLOGICAL CONFIDENTIALITY IN CARE AND SOCIAL INTERACTIONS: AN EXPERIENCE REPORT
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202411241712
Guilherme Alberto Camilo da Silva1
Mário Henrique da Silva Lima2
Leidiane Pereira da Silva3
Thais Galvão Pinheiro4
Francisco Jackson Pereira Alves5
Rebeca Gomes de Amorim6
Iandra Sofia Cardoso Monteiro7
Tamires da Silva Rodrigues8
Talita de Lemos Araújo9
RESUMO
Objetivo: analisar os desafios e impactos do sigilo sorológico no cotidiano das pessoas que vivem com HIV em uma casa de apoio.Métodos: Este estudo descritivo e qualitativo, realizado em uma casa de apoio para pessoas com HIV/AIDS, foca na violação do sigilo sorológico, que compromete a privacidade e infringe normas legais, como o Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.931/09), a Lei nº 14.289/2022 (sigilo sobre a condição de HIV), a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.853/2019) e a Lei nº 12.984/2014, que criminaliza a discriminação contra pessoas com HIV/AIDS.Resultado: Durante o período de vivência com os usuários da Casa de Apoio, observou-se que questões referentes ao sigilo sorológico são recorrentes e por vezes os próprios usuários infringem esse direito. Diante dessa realidade propôs-se um momento para educação em saúde, em que discutiu-se sobre as legislações que protegem as pessoas que vivem com HIV/AIDS e a importância de manter o sigilo.Discussão:Na Casa de Apoio, observou-se que questões sobre o sigilo sorológico são recorrentes, e, em alguns casos, os próprios usuários o quebram. Realizou-se uma roda de conversa sobre a importância do sigilo, envolvendo tanto profissionais quanto usuários. Discutiu-se que o sigilo pode ser quebrado com autorização do usuário, por ordem judicial ou para proteger terceiros. Destacou-se que a violação pode levar a reparação por danos morais e processos disciplinares.Conclusão: A preservação do sigilo sorológico é fundamental para proteger os direitos de pessoas com HIV e outras doenças infecciosas. Embora existam leis de proteção, a quebra desse sigilo ainda é comum, tanto por profissionais quanto por usuários. A educação em saúde é uma estratégia eficaz para conscientizar sobre a importância dessas legislações, combater o estigma e promover uma sociedade mais inclusiva.
Palavras-chave: Sigilo Sorológico. HIV/AIDS. Desafios no cuidado. Impactos sociais
ABSTRACT
Objective:To analyze the challenges and impacts of serological confidentiality in the daily lives of people living with HIV in a support house.Methods: This descriptive and qualitative study, conducted in a support house for people with HIV/AIDS, focuses on the violation of serological confidentiality, which compromises privacy and violates legal norms, such as the Medical Ethics Code (Resolution CFM 1.931/09), Law No. 14.289/2022 (which ensures confidentiality regarding HIV status), the General Data Protection Law (Law No. 13.853/2019), and Law No. 12.984/2014, which criminalizes discrimination against people living with HIV/AIDS. Results:During the time spent with the users at the support house, it was observed that issues related to serological confidentiality were frequent, and at times, users themselves violated this right. In response to this, a health education session was proposed, discussing the laws protecting people living with HIV/AIDS and the importance of maintaining confidentiality. Discussion:At the support house, it was observed that questions regarding serological confidentiality were recurrent, and in some cases, users themselves breached this right. A conversation circle was held about the importance of confidentiality, involving both professionals and users. It was discussed that confidentiality could be broken with the user’s consent, by court order, or to protect third parties. It was emphasized that such violations could result in moral damages and disciplinary proceedings. Conclusion:The preservation of serological confidentiality is essential to protect the rights of people with HIV and other infectious diseases. Although legal protections exist, breaches of confidentiality remain common, both by professionals and users. Health education is an effective strategy to raise awareness of the importance of these laws, combat stigma, and promote a more inclusive society.
Keywords: Serological Confidentiality. HIV/AIDS. Care Challenges. Social Impacts.
INTRODUÇÃO
O sigilo sorológico se refere à confidencialidade das informações sobre o estado sorológico de um indivíduo, sendo um tema de crescente relevância no contexto da saúde pública e das relações sociais. À medida que doenças infecciosas, como o HIV/AIDS, continuam a desafiar sociedades em todo o mundo, a proteção dos dados pessoais se torna um aspecto crucial para garantir a privacidade do paciente e a eficácia das estratégias de prevenção e tratamento. A violação do sigilo sorológico pode acarretar sérios impactos na vida social e emocional dos indivíduos, levando à estigmatização, discriminação e até mesmo à exclusão social (FREIRE; MINAYO, 2024).
A compreensão e a adesão às políticas de sigilo promovem a formação de um ambiente de confiança que favorece o diagnóstico precoce e a busca por tratamento. Contudo, o cenário atual revela que muitos ainda enfrentam dificuldades para equilibrar a necessidade de transparência na saúde pública com a proteção dos direitos individuais, evidenciando um dilema ético significativo (FREIRE; MINAYO, 2024).
A Lei 14.289 fundamenta a obrigatoriedade da preservação do sigilo sobre as condições de saúde das pessoas que vivem com HIV ou outras doenças infecciosas. Assim, contribuindo que não haja estigmatização ou discriminação a esses indivíduos. Esse direito está relacionado à privacidade do indivíduo e à confidencialidade das informações médicas, pois garante o respeito à dignidade humana, evita exposições que acarretam exclusão social e preconceito. O presente relato de experiência tem como objetivo analisar os desafios e impactos do sigilo sorológico no cotidiano das pessoas que vivem com HIV em uma casa de apoio.
METODOLOGIA
A metodologia do estudo consiste em um relato de experiência de caráter descritivo, com uma abordagem qualitativa. O presente trabalho foi realizado em uma casa de apoio para pessoas vivendo ou convivendo com o HIV/Aids, a Casa de Retaguarda Clínica (CRC), uma instituição de apoio que abriga pessoas que se encontram em situações de vulnerabilidade e que estão em tratamento em um hospital de referência à doenças infectocontagiosas em Fortaleza-CE. As ações da CRC são realizadas por profissionais voluntários e residentes multiprofissionais em percurso de vivência, sendo incluídos enfermeiros, assistentes sociais, nutricionista e psicólogos que oferecem acolhimento, rodas de conversa e orientação de adesão ao tratamento.
A roda de conversa foi motivada pela crescente preocupação com a violação do sigilo sorológico entre os pacientes. A quebra dessa confidência, quando ocorre sem o consentimento do indivíduo, compromete não apenas o direito à privacidade e à confidencialidade, mas também infringe normas legais que protegem esses direitos. A atividade foi conduzida por residentes multiprofissionais em infectologia, durante uma roda de conversa previamente agendada, integrada à semana de atividades da CRC.
Identificada a necessidade de discutir informações relevantes sobre o tema, foi elaborado um folder que compila as principais legislações pertinentes, incluindo: o Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.931/09), a Lei nº 14.289, de 3 de janeiro de 2022, que torna obrigatória a preservação do sigilo sobre a condição de pessoas que vivem com infecções pelo HIV e hepatites crônicas (HBV e HCV), assim como sobre a hanseníase e a tuberculose. Esta lei proíbe a divulgação, por agentes públicos ou privados, de informações que possam identificar essas pessoas.
Ao longo da atividade outras duas leis foram abordadas, a Lei nº 13.853, de 8 de julho de 2019, que institui a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira, estabelecendo normas rigorosas para o tratamento de dados de saúde, incluindo a exigência de consentimento explícito para a divulgação de tais informações e diretrizes para sua proteção e armazenamento. Por fim, a Lei nº 12.984, de 2 de junho de 2014, que criminaliza atos de discriminação e estigmatização contra pessoas que vivem com HIV/AIDS, também foi discutida, enfatizando a necessidade de proteção legal e social para esses indivíduos. Essa abordagem metodológica visa sensibilizar os participantes sobre a importância do sigilo sorológico e fomentar um ambiente de respeito e cuidado, contribuindo para a promoção da saúde e do bem-estar social.
RESULTADO
Durante o período de vivência com os usuários da Casa de Apoio, os observou-se que questões referentes ao sigilo sorológico são recorrentes e por vezes os próprios usuários infringem esse direito. Diante dessa realidade propôs-se um momento para educação em saúde, em que discutiu-se sobre as legislações que protegem as pessoas que vivem com HIV/AIDS e a importância de manter o sigilo. Ao longo do encontro, debateu-se sobre a obrigatoriedade de confidencialidade por parte dos profissionais de saúde perante ao status sorológico e demais informações fornecidas pelo usuário durante o atendimento.
Contudo, houve menção de condições em que o sigilo profissional pode ser quebrado, seja por autorização do próprio usuário, determinação judicial e proteção da vida ou integridade física de terceiros. A medida é uma forma de evitar preconceito, constrangimento e surgimento de outras barreiras sociais que impeçam e atrapalhem essas pessoas de desfrutar da plena cidadania, seja o acesso ao trabalho, educação ou outros direitos afetados por essas condições.
Para além, reforçou-se que o sigilo não limita-se aos profissionais de saúde e que os cidadãos cientes da condição de uma PVHA também possuem essa responsabilidade que, uma vez transgredida, pode acarretar em consequências. O indivíduo cuja privacidade for violada, pode recorrer às instâncias judiciais em busca de reparação por danos morais, e o profissional pode ser submetido a processos disciplinares perante o conselho de classe que o rege.
DISCUSSÃO
O sigilo sorológico, que envolve a proteção da privacidade de indivíduos portadores de doenças infecciosas, como o HIV, é uma questão de grande importância no cuidado à saúde e na vida em sociedade. A confidencialidade dessas informações é garantida por normas e legislações que visam proteger os pacientes de possíveis discriminações. No entanto, sua implementação apresenta desafios que afetam tanto os profissionais de saúde quanto a própria população que convive com o vírus.
Do ponto de vista social, o sigilo sorológico pode influenciar profundamente as relações e a convivência das pessoas afetadas. Muitas vezes, o receio de ter sua condição de saúde exposta leva indivíduos a evitar interações sociais, resultando em isolamento. O estigma relacionado a doenças como o HIV ainda é uma realidade em muitos contextos, o que torna o sigilo uma forma de proteção contra o preconceito, mas também pode reforçar a marginalização desses indivíduos (SALVADORI; HAHN, 2019).
Um dos maiores desafios no contexto da saúde é a busca pelo equilíbrio entre o respeito ao sigilo do paciente e a necessidade de promover um ambiente seguro para todos. Profissionais de saúde, muitas vezes, enfrentam dilemas éticos, pois podem estar em situações onde a proteção de terceiros deve ser levada em consideração. Embora a confidencialidade seja um direito do paciente, em algumas ocasiões, pode haver a necessidade de compartilhamento de informações para garantir a segurança do próprio paciente, de terceiros e da coletividade, principalmente se houver risco iminente (SCIAROTTA et al., 2021).
Nesse sentido, abre-se um debate sobre os limites éticos para o compartilhamento de informações e como o manejo deve ser conduzido, sem comprometer a integridade física, psicológica e social do paciente. O desenvolvimento de políticas públicas e campanhas de conscientização é essencial para criar um ambiente social mais inclusivo e informativo, reduzindo o estigma e garantindo que a privacidade seja respeitada, sem ameaçar a segurança coletiva (VILLAS-BÔAS, 2015).
Em suma, o sigilo sorológico apresenta uma série de desafios, tanto para a prática dos profissionais de saúde quanto para a convivência social. A proteção da privacidade dos pacientes é fundamental, mas deve ser balanceada com medidas que garantam a segurança de todos e promovam a inclusão social. Fortalecer campanhas de educação e criar ambientes de saúde acolhedores são passos importantes para mitigar os efeitos negativos do sigilo sorológico. O folder utilizado como material didático auxiliar durante a roda de conversa pode ser encontrado na Figura 1, conforme ANEXO 1.
CONCLUSÃO
A preservação do sigilo sorológico é uma questão essencial para proteger os direitos das pessoas vivendo com HIV e outras doenças infecciosas. O relato de experiência na casa de apoio revelou que, apesar das proteções legais, a quebra do sigilo ainda é uma realidade que pode ocorrer tanto por parte dos profissionais de saúde quanto dos próprios usuários. A educação em saúde se mostrou uma estratégia importante para conscientizar sobre a relevância das legislações que garantem esse direito e os impactos da violação, não apenas para a integridade pessoal, mas também para a vida social e profissional das pessoas afetadas.
O sigilo é um pilar de respeito à dignidade humana, e sua manutenção é fundamental para combater o estigma e a discriminação, promovendo uma sociedade mais justa e inclusiva. Assim, cabe a todos os profissionais de saúde, cidadãos e o sistema judicial garantir que esse direito seja resguardado, promovendo a cidadania plena e a proteção da privacidade e dignidade das pessoas que vivem com essas condições.
REFERÊNCIAS
FREIRE, I. M.; MINAYO, M. C. DE S. Silêncio, segredo e sigilo: desafios da revelação do diagnóstico de HIV/AIDS em jovens infectados por transmissão vertical. Revista Pesquisa Qualitativa, v. 12, n. 29, p. 95–118, 2024.
SALVADORI, M.; HAHN, G. V. Confidencialidade médica no cuidado ao paciente com HIV/aids. Revista Bioética, v. 27, n. 1, p. 153–163, 2019.
SCIAROTTA, D. et al. O “segredo” sobre o diagnóstico de HIV/Aids na Atenção Primária à Saúde. Interface, v. 25, 2021.
VILLAS-BÔAS, M. E. O direito-dever de sigilo na proteção ao paciente. Revista Bioética, v. 23, n. 3, p. 513–523, 2015.
ANEXO 1 – MATERIAL DIDÁTICO
Figura 1. Folder Direito Sigilo Sorológico
1Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
2Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
3Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
4Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
5Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
6Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
7Residente em Infectologia da Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará
8Psicóloga do Hospital Federal de São Carlos – UFSCar
9Mestra em Saúde Mental – UPE/ GARANHUNS