REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202411232217
Camila Rodrigues Orsi
Resumo
O derrame pleural é um acúmulo exacerbado de líquido no espaço pleural, podendo ser causado por variadas etiologias. Entre as manifestações clínicas estão a dispneia, dor torácica pleurítica, tosse não produtiva e febre. OBJETIVO: Realizar uma revisão literária para observar os recursos fisioterapêuticos disponíveis para o tratamento do derrame pleural. MÉTODOS: Revisão integrativa de literatura, com a seguinte pergunta norteadora: “Quais são os métodos fisioterapêuticos descritos na literatura para auxiliar no tratamento de pacientes com derrame pleural?”. A pesquisa foi realizada nas bases de dados da United States National Library of Medicine(PubMed), Scientific Electronic Library Online (SciELO), Physiotherapy Evidence Database (PEDro) e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). RESULTADOS: Foram identificados 300 artigos, e após análise dos métodos, dos títulos e da exclusão dos repetidos, selecionou-se 5 deles, que fizeram parte dos resultados. CONCLUSÃO: Observou-se que a fisioterapia respiratória aplicada no derrame pleural drenado, através de exercícios de mobilização, espirometria de incentivo, técnicas e exercícios respiratórios e o uso de CPAP, auxilia na minimização dos efeitos deletérios do acúmulo de líquido entre as pleuras, além do aumento de volumes e capacidades pulmonares e melhora as trocas gasosas, melhorando, assim, o padrão respiratório.
Palavras-chave: Pleural Effusion. Non-invasive ventilation. Physiotherapy, breathing exercises.
1 Introdução
O derrame pleural (DP) é um aumento excessivo de líquido no espaço pleural, que pode ter diversas etiologias, como pneumonia, infecções virais, tuberculose, lesões – como fratura de costela ou equimose –, insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal, entre outras1,2. Dependendo do seu volume e da etiologia, o excesso de líquido pleural pode causar dispneia, dor torácica e tosse. Alguns estudos descrevem também diminuição do murmúrio vesicular ou abolição do local acometido, redução da mobilidade torácica e som maciço durante a percussão pulmonar1,2,3.
O líquido acumulado entre as pleuras é dividido em transudato e exsudato; a diferenciação ocorre através do exame de dosagem das proteínas, auxiliando na causa que ocasionou o derrame pleural. O líquido do transudato é transparente e com baixo índice proteico; já o líquido do exsudato é rico em proteína, onde a etiologia dos casos são infecciosos. Pode-se dividir em empiema (acúmulo de pus na cavidade pleural), quilotórax (acúmulo de gordura na cavidade pleural) e hemotórax (acúmulo sangue na cavidade pleural). Para a retirada do líquido entre as pleuras em pequena quantidade, pode-se tratar mediante aspiração do fluido através de uma agulha intercostal, procedimento esse conhecido como toracocentese. Em casos de derrames extensos, é necessária a inserção de um dreno pleural que promove a drenagem do líquido1,2.
A fisioterapia respiratória nos casos de derrame pleural tem como objetivo principal a restauração dos distúrbios ventilatórios restritivos, recuperação da capacidade residual funcional (CRF), aumento da mobilidade da caixa torácica e reexpansão pulmonar, promovendo, assim, uma melhora na ventilação pulmonar e nas trocas gasosas. Dessa forma, gera-se uma recuperação mais rápida, que, consequentemente, reduz o tempo de internação hospitalar3,4,5.
O uso da ventilação com pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) ou ventilação não invasiva (VNI) propaga-se de forma complementar às técnicas convencionais de fisioterapia respiratória. O uso da pressão positiva na terapia respiratória promove a reexpansão pulmonar, diminui o trabalho respiratório durante o treinamento da musculatura respiratória e auxilia na remoção de secreção e da melhora da relação ventilação-perfusão4,6,7.
As técnicas e recursos da fisioterapia respiratória – que incluem exercícios respiratórios; emprego de equipamentos que oferecem resistência expiratória; treinadores musculares inspiratórios; exercícios com pressão positiva intermitente; além dos exercícios motores gerais de membros superiores e inferiores –, visam ao tratamento de disfunções mecânicas e ventilatórias causadas pelo acúmulo de líquido entre as pleuras3,5,8.
Esta revisão literária tem como objetivo observar os recursos fisioterapêuticos disponíveis para o tratamento do derrame pleural.
2 Método
Trata-se de uma revisão, cuja finalidade foi reunir e sintetizar resultados de pesquisas de maneira sistemática e ordenada, contribuindo para aprofundar o conhecimento do tema investigado. Foi realizada uma busca de artigos científicos publicados no período de 2012 a 2024, listados nas bases de dados das plataformas Biblioteca Virtual em Saúde (também conhecida como BVS), United States National Library of Medicine(PubMed), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Physiotherapy Evidence Database (PEDro) usando os seguintes termos: “pleural effusion”, “non-invasive ventilation”, “physiotherapy” e “breathing exercises”. As pesquisas foram feitas no período de fevereiro a julho de 2024.
Os critérios de inclusão para análise foram ensaios clínicos, publicados na íntegra em português, inglês ou espanhol, disponíveis eletronicamente nas plataformas mencionadas anteriormente, e foram excluídos editoriais, cartas, teses, dissertações, monografias, manuais, resumos de congressos, artigos duplicados em mais de uma base de dados e artigos que não atendessem à questão de pesquisa.
A análise dos dados foi feita a partir da leitura dos títulos, resumos e, finalmente, dos artigos na íntegra. Ao todo, foram encontrados 300 artigos, sendo: 120 na PubMed; 164 na BVS; 9 na PEDro; e na 7 SciELO. Desses, 256 foram excluídos após a leitura dos títulos; 27 foram excluídos após a leitura dos resumos; 12 foram excluídos após a leitura na íntegra; e restaram 5, que fizeram parte desta pesquisa.
3 Resultados
Com a análise realizada, foi feita a seguinte extração de dados dos artigos selecionados.
Quadro 1 – Principais características dos estudos incluídos na revisão
Autores, local, ano e título | Tipo de estudo | Objetivos | Características da amostra | Métodos | Resultados |
Oliveira, J. et al. (2010)9 | Ensaio clínico randomizado | Determinar o efeito do uso de pressão positiva continua nas vias aéreas na absorção do derrame pleural em pacientes com tuberculose. | 20 pacientes: Grupo controle (GC): 10 pacientes com idade de 39,5±17,6 anos. Grupo intervenção (GI): 10 pacientes com idade de 42,5±13,5 anos. | GI recebeu pressão positiva em vias aéreas três vezes por semana durante as quatro primeiras semanas do tratamento antiTB. GC recebeu somente droga anti-TB. Realizou a avaliação do volume de líquido pleural após 4 semanas de tratamento. | A redução do volume do derrame pleural foi significativame nte maior no grupo intervenção que no grupo controle. |
Santos, E. et al. (2020)10 | Ensaio clínico randomizado | Avaliar os efeitos fisiológicos e no tempo de internação através das técnicas de fisioterapia com a associação de pressão positiva em pacientes com derrame pleural. | 156 pacientes com diagnóstico de hemotórax traumático divididos em 3 grupos: Grupo Exp2 – n=52; Grupo Exp1- n =52; Grupo controle n =52. | Grupo controle: não recebeu intervenções ativas adicionais. Grupo Experimental1: recebeu exercícios respiratórios, técnica de desobstrução das vias aéreas e mobilização. Grupo Experimental2: recebeu as mesmas intervenções do Exp1 com a adição de períodos de pressão positiva nas vias aéreas. | O grupo Exp2 teve menos uso de antibióticos e incidência de pneumonia, além de menor duração de drenagem torácica e duração de internação em comparação com os grupos Exp1 e Con. |
VALENZADEMET, G. et al. (2014)11 | Ensaio clínico randomizado | Investigar os efeitos de um protocolo de fisioterapia em pacientes com derrame pleural. | Um total de 104 pacientes com idade de 18 a 80 anos, divididos em 2 grupos: controle e intervenção | Grupo intervenção (GI): recebeu fisioterapia associada ao tratamento padrão; Grupo controle (GC): recebeu tratamento médico e drenagem torácica. | GI obteve uma melhora significativa dos parâmetros espirométricos VEF1 e Peak Flow em comparação com o GC. |
Gunjal, S. et al. (2015)12 | Estudo comparativo prospectivo | Comparar a eficácia de exercícios de respiração profunda com exercícios de respiração segmentar na expansão torácica e na função pulmonar em indivíduos com derrame pleural. | Trinta participantes entre 20 e 40 anos com diagnóstico clínico de derrame pleural unilateral. Divididos em dois grupos: o de respiração profunda (grupo A) e o de respiração segmentar (grupo B). | No primeiro grupo, o paciente recebe exercícios de respiração profunda e, no segundo grupo, é recomendado um exercício de respiração segmentar com duração de duas semanas. | Após duas semanas de sessões de fisioterapia nas quais a respiração segmentar foi aplicada em um grupo, verificou-se que houve resultados mais eficazes na expansão torácica do que em comparação aos exercícios de respiração profunda. |
Nunes, A. et al. (2022)13 | Ensaio clínico randomizado | Comparar o efeito agudo de três recursos fisioterapêuticos em pacientes com derrame pleural após procedimento de drenagem torácica. | 60 pacientes com derrame pleural divididos em três grupos: Grupo exercícios respiratórios; Grupo Powerbreath; Grupo Threshold. | Três grupos com 20 pacientes. Cada grupo recebeu uma terapia respiratória: exercícios respiratórios, Threshold PEP™ ou Powerbreathe®. Para avaliar a função pulmonar foram utilizados espirometria, manovacuometri a e peak flow | Os exercícios respiratórios resultaram em diferenças significativas na capacidade vital forçada (CVF), e no grupo tratado com Threshold PEP™ a diferença significativa foi apenas na CVF. |
Na análise feita, foram identificados dois tipos de estudo, conforme mostrado no gráfico a seguir.
Gráfico 1 – Tipos de estudos.
Os resultados das técnicas dos estudos foram os seguintes. Em um dos resultados, foi observada mais de uma técnica empregada.
Gráfico 2 – Técnicas empregadas nos estudos.
Baseado nos autores pesquisados, mostrou que entre as técnicas mais utilizadas foi o uso de pressão positiva utilizada por dois autores e o protocolo fisioterapêutico de recuperação, também usado por dois autores. Tanto a técnica de exercícios de respiração profunda e segmentar quanto o uso de incentivadores respiratórios, ambos sendo mencionados por um autor cada técnica.
3 Discussão
Os estudos analisados enfatizaram a aplicabilidade de diferentes recursos fisioterapêuticos nos pacientes com DP, como as manobras de expansão pulmonar, estimulação diafragmática, padrão respiratório associado a pressão positiva em vias aéreas, exercícios respiratórios e uso de incentivadores respiratórios como Threshold PEP™ e Powerbreathe13.
No estudo de Oliveira et al. (2010)9, os pacientes submetidos a CPAP de 10 cmH2O apresentaram uma gradativa redução de tamanho do derrame pleural após as quatro semanas de tratamento em comparação com o grupo controle, que somente recebeu tratamento medicamentoso anti-TB. O estudo também sugere que o uso do CPAP no início do tratamento pode ser útil, principalmente para aliviar os sintomas de desconforto respiratório que o DP pode causar no paciente.
O estudo de Dos Santos et al. (2020)10 também teve resultados semelhantes, no qual pacientes que receberam tratamento com pressão positiva nas vias aéreas de 15 cmH2O, somado às intervenções de mobilização e fisioterapia respiratória, apresentaram resultados melhores e maior eficiência comparando com a mobilização e a fisioterapia respiratória isoladamente, além de apresentarem como resultado diminuição na duração da drenagem torácica, no tempo de internação, nas complicações pulmonares, no uso de antibióticos e nos custos do tratamento.
Valenza-Demet et al. (2014)11 analisaram os efeitos de protocolos de Fisioterapia em pacientes com derrame pleural. O estudo mostrou que o tratamento no grupo intervenção teve a inclusão de técnicas e exercícios de mobilização, exercícios de respiração profunda e inspirometria de incentivo. Os pacientes desse grupo apresentaram uma melhora nos valores espirométricos, com uma melhores resultados na capacidade vital forçada (CVF) e na redução do tempo de internação hospitalar, além de uma melhor recuperação comparado ao tratamento padrão.
O estudo de Gunjal et al. (2015)12, encontrou uma melhora significativa da expansão torácica no grupo de exercícios de respiração segmentar, além de apresentar um aumento no volume expiratório forçado em um segundo (VEF1) e na CVF. Já o grupo de respiração profunda apresentou um aumento significativo na capacidade inspiratória devido aos pulmões serem expandidos consideravelmente e as paredes dos alvéolos serem esticadas ao máximo.
No estudo Nunes et al. (2022)13, no grupo G1 o resultado mostrou que os exercícios respiratórios diafragmático, de inspiração em tempos e de suspiro obtiveram aumento nos valores da CVF, no VEF1 e no pico de fluxo expiratório (PFE). Nenhuma intervenção fisioterapêutica aplicada nesse estudo conseguiu aumentar significativamente a força muscular respiratória. O grupo tratado com Powerbreathe® não obteve diferenças significativas em nenhuma das variáveis investigadas.
3 Conclusão
Com esta revisão, observou-se que a fisioterapia respiratória aplicada no derrame pleural drenado através de exercícios de mobilização, espirometria de incentivo, técnicas e exercícios respiratórios e uso de CPAP elevada (15cmH2O) associada a exercícios respiratórios deve ser incentivada, buscando minimizar os efeitos deletérios do acúmulo de líquido entre as pleuras. Este tratamento auxilia no aumento de volumes e capacidades pulmonares e melhora as trocas gasosas, melhorando o padrão respiratório.
Os pacientes que receberam métodos convencional de tratamento, medicamentoso e de drenagem torácica, tiveram piores evoluções. Este fato demonstra a importância da intervenção precoce da fisioterapia nos pacientes com DP.
O presente trabalho também evidencia a existência de poucos estudos cujos objetivos estivessem voltados ao manejo do derrame pleural por meio dos recursos fisioterapêuticos. Também indica a necessidade de realizar novas pesquisas sobre o tema.
Referências
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- Pereira, G; Recursos fisioterapêuticos na abordagem do derrame pleural: revisão de literatura. Goias. 2023.
- Santos, E; et al; Use of lung expansion techniques on drained and non-drained pleural effusion: survey with 232 physiotherapists; Fisioterapia em Movimento, 2020.
- Freitas, A; Silva, C; Scardovelli, D; Fisioterapia respiratória em pacientes ativos com derrame pleural drenado, Araçatuba, 2017.
- Oliveira, P; Zanetti, N; Oliveira, P; Uso da ventilação não invasiva como recurso da fisioterapia respiratória pediátrica; HU Revista, Juiz de Fora, v. 41, n. 1 e 2, p. 15-21, Jun, 2015.
- dos Santos, E; Lunardi, A; Efficacy of the addition of positive airway pressure to conventional chest physiotherapy in resolution of pleural effusion after drainage: protocol for a randomised controlled trial. Journal physiotherapy, 2015.
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- OLIVEIRA, J; et al. Effect of continuous positive airway pressure on fluid absorption among patients with pleural effusion due to tuberculosis. Rev. Bras. Fisioter., v. 14, n. 2, p. 127-132, 2010.
- dos Santos, E; et al; Adding positive airway pressure to mobilisation and respiratory techniques hastens pleural drainage: a randomised trial. Journal physiotherapy, 2019.
- Valenza-Demet , G; et al; The effects of a physiotherapy programme on patients with a pleural effusion: a randomized controlled trial. Clin Rehabil, 2014.
- Gunjal, S; et al. Effectiveness of Deep Breathing versus Segmental Breathing Exercises on Chest Expansion in Pleural Effusion. IJHSR, 2015.
- Nunes, A; et al. Efeitos agudos dos exercícios respiratórios, Threshold PEP™ e Powerbreathe® em pacientes com derrame pleural, no pós-procedimento de drenagem torácica. Rev. méd. Minas Gerais, 2022.