REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411200011
Bárbara Crys Assunção Moreira Gois Santos1
Fadja Mariana Fróes Rodrigues2
Letícia Meira Marques3
Paulo Henrique Oliveira Soares4
RESUMO
Com o passar do tempo, o debate acerca da desigualdade de gênero ganhou destaque no âmbito social. A antiga posição de subalternidade que a mulher ocupava em uma sociedade marcada pelo sistema patriarcal, resultou em inúmeras violações de direitos sofridas por esse grupo durante séculos. A violência contra a mulher, em especial no âmbito doméstico, gerou inúmeros movimentos em busca de melhorias na proteção e garantia de direitos dessas vítimas. Nesse diapasão, surge no ordenamento jurídico brasileiro a Lei 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha. Embora tal norma tenha inovado de maneira relevante na defesa da mulher vítima de violência, ainda existem procedimentos, dentro do sistema de justiça, que a expõem. Nesse viés, surgem os mecanismos de oitiva da escuta protegida e do depoimento especial, criados pela Lei 11.431/2017, como possíveis alternativas para resguardar a intimidade da ofendida. A partir de uma metodologia descritiva e exploratória, o presente artigo irá realizar uma retrospectiva histórica da evolução dos procedimentos de combate à violência contra a mulher; examinando as disposições da Lei da Escuta Protegida e do Depoimento Especial, verificando a compatibilidade entre as leis supramencionadas para, ao final, analisar a importância da aplicação da escuta protegida e do depoimento especial nos procedimentos em que incide a Lei Maria da Penha.
Palavras-chave: violência doméstica; escuta protegida; depoimento especial, revitimização; justiça.
1.Introdução
A lei n° 13.413 foi inserida no sistema de justiça no dia 4 de abril de 2017, e trouxe ao ordenamento jurídico a Escuta Protegida e o Depoimento Especial. Os procedimentos trazidos pela lei supracitada determinam como as crianças e os adolescentes, que são vítimas ou testemunhas de violência, devem ser ouvidos pelos órgãos do sistema de justiça.
Por meio da Escuta Protegida, a criança ou adolescente serão atendidos por profissionais e instituições da educação, saúde e assistência do município, que devem estabelecer uma relação não invasiva de cuidado e acolhimento, para que de forma livre, possa relatar todo o ocorrido. O Depoimento Especial, por sua vez, consiste na oitiva da vítima, diante de autoridade policial ou judiciária, com caráter investigativo, sendo realizado apenas uma única vez. Ambas necessitam ser realizadas em locais acolhedores que preservem a intimidade e a privacidade das vítimas e testemunhas.
De maneira diversa, sob a ótica da violência doméstica, a mulher é atendida da maneira tradicional durante a persecução penal. Durante a audiência de instrução e julgamento, é possível que a vítima solicite que sua oitiva ocorra sem a presença do réu. Não obstante, mesmo com a retirada do agressor da sala, a mera presença deste no ambiente já é motivo para causar desconforto àquela que sofreu algum tipo de agressão.
Nesse contexto, é mister salientar que, muito embora um dos objetivos da ação penal seja punir o infrator, é evidente que o Judiciário tem como principal objetivo resguardar aqueles que tiveram seus direitos violados. Logo, a preservação da vítima deve ser um dos objetivos norteadores da instrução penal, a fim de evitar sua revitimização ao ter de reviver um momento traumático.
Diante disso, é importante realizar a seguinte indagação: de que forma a proteção da vítima no âmbito da violência doméstica pode ser otimizada à luz do depoimento especial e da escuta protegida?
Para tanto, objetiva-se de forma geral analisar a importância da aplicação da escuta protegida e do depoimento especial no âmbito da violência doméstica contra a mulher.
A partir disso, o presente artigo, especificamente, irá realizar uma retrospectiva histórica da evolução dos procedimentos de combate à violência contra a mulher no âmbito internacional e interno, até a criação da Lei Maria da Penha; examinar as disposições da Lei da Escuta Protegida e do Depoimento Especial, averiguando-se os conceitos e procedimentos abarcados por essa legislação; analisar a compatibilidade entre as leis supramencionadas a partir das disposições em comum destas como um meio de efetivação dos direitos femininos, buscando-se assim, contribuir para o debate acerca da necessidade de melhoria dos mecanismos de proteção à mulher vítima de violência.
Trata-se, portanto, de uma pesquisa descritiva e exploratória, cuja abordagem utilizada é a qualitativa, com base nos procedimentos bibliográfico e documental para expor, a partir de doutrinas e artigos, o posicionamento de alguns autores quanto às temáticas isoladamente e em conjunto.
2. A Lei Maria da Penha e a evolução histórica dos mecanismos de combate à violência contra a mulher
Embora atualmente existam algumas legislações que contribuem para o combate à violência doméstica e familiar, nem sempre os direitos das mulheres foram priorizados na sociedade. Ainda que exista um longo caminho a ser percorrido para que a proteção integral da vítima seja alcançada, o atual ordenamento jurídico reflete séculos de lutas a fim de que a mulher fosse reconhecida como uma pessoa de direito.
É em virtude dos inúmeros movimentos em prol da defesa e valorização da mulher que inúmeros tratados, leis e políticas públicas foram desenvolvidas neste último século para resguardar a mulher vítima de violência.
Diante das inúmeras violações de direitos sofridas por esse grupo desde os primórdios da humanidade, é inegável que houve avanços relevantes no enfrentamento à desigualdade de gênero, o que, todavia, ainda não é suficiente para compensar todo o período em que a mulher viu-se exposta para a sociedade como um objeto. De qualquer forma, embora sejam necessários avanços nessa área, é imprescindível mencionar a evolução ocorrida até o momento no enfrentamento dessa problemática.
2.1 Evolução histórica
A violência contra a mulher, temática que se faz presente nos dias atuais, consiste em uma violação de direitos humanos que se perpetua ao longo do tempo. Antes de adentrar nos atuais mecanismos que objetivam conter essa prática, é imprescindível analisar os principais marcos históricos que serviram como base para as legislações modernas a respeito do tema, bem como para as políticas públicas e outras ações voltadas para a defesa desse grupo.
A desigualdade de gênero[1], ainda presente na contemporaneidade, está enraizada desde os primórdios da sociedade humana. Trata-se de uma problemática marcante da qual se originou os inúmeros movimentos em prol dos direitos femininos.
Nesse viés, destaca-se a obra de Rodrigues (2020), “Memória e violência contra a mulher: o feminicídio como último ato da dominação masculina”. Em seu livro, a autora traz uma abordagem cronológica, desde a antiguidade até os dias atuais, para demonstrar como essa desigualdade se desenvolveu no meio social, marcado pelo sistema patriarcal, em que a mulher é um ser submisso ao homem.
Dentre os movimentos citados pela autora, voltados à proteção da mulher, destacam-se, no âmbito internacional: a primeira Convenção dos Direitos da Mulher, ocorrida em Nova Iorque no ano de 1848, considerado o nascimento do feminismo; a “Década da Mulher”, período que engloba os anos de 1975 até 1985, e; a “Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres” (CEDAW), em 1979.
A CEDAW, conforme menciona Rodrigues (2020), fora aderida pelo Brasil em 1984, contudo, com reservas. Somente após a promulgação da CF/88, a qual prevê a igualdade entre homens e mulheres, é que a CEDAW, em 1994, foi aprovada, ratificada e promulgada sem reservas no Brasil, com status de norma constitucional.
O ano de 1994, em que ocorreu a incorporação total do disposto na CEDAW pelo ordenamento jurídico pátrio, do ponto de vista da autora, foi fundamental para o combate à violência contra a mulher, pois no mesmo ano ocorreu à “Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica – Convenção de Belém do Pará”, a qual Rodrigues (2020) entende como marco decisivo para todas as legislações posteriores, no Brasil, que versam sobre essa problemática.
Além de todas essas convenções, com destaque para a última citada (que foi a responsável por trazer a definição do que é a violência contra a mulher), a autora menciona o fato ocorrido em 2001, qual seja, a condenação do Brasil pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), após o país ser denunciado pelo caso que envolveu a cearense Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de violência doméstica durante o seu casamento.
Após o Brasil ser condenado por não possuir os mecanismos adequados para o combate dessa violação de direitos humanos, Rodrigues (2020) entende que a pressão que o país sofreu dos organismos internacionais de proteção dos direitos das mulheres foi o fator determinante para a elaboração da Lei Maria da Penha, a qual representa uma grande conquista no processo de defesa e garantia de direitos de todas as mulheres, em especial, àquelas que são vítimas de violência, sendo, atualmente, a principal legislação que trata do tema em vigência no ordenamento jurídico brasileiro.
2.2 Criação da Lei Maria da Penha
A Lei nº 11.340/06, a qual recebeu o nome Lei Maria da Penha, foi criada para ser o grande instrumento de combate à violência doméstica contra a mulher no ordenamento jurídico brasileiro. Esta legislação foi assim nomeada como uma homenagem à cearense Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de violência doméstica em um caso que repercutiu internacionalmente.
Em sua autobiografia, Fernandes (2014) narra as duas vezes em que foi vítima de tentativa de homicídio por parte de seu ex-marido, Marco Antonio Heredia Viveros e os desdobramentos desse caso. Na obra, a autora relata que as agressões sofridas começaram após seu ex-cônjuge, que era colombiano, ter obtido cidadania brasileira e se estabilizado profissionalmente. Ela conta que, após alguns anos de casamento, seu marido passou a ser agressivo tanto com ela, quanto com as suas filhas, vindo a sofrer, no ano de 1983, duas tentativas de homícidio.
A vítima relata que a primeira delas ocorreu enquanto dormia, narrando o fato conforme a seguir:
Acordei de repente com um forte estampido dentro do quarto. Abri os olhos. Não vi ninguém. Tentei mexer-me, mas não consegui. Imediatamente fechei os olhos e um só pensamento me ocorreu: ‘Meu Deus, o Marco me matou com um tiro’. Um gosto estranho de metal se fez sentir, forte, na minha boca, enquanto um borbulhamento nas minhas costas me deixou ainda mais assustada. Isso me fez permanecer com os olhos fechados, fingindo-me de morta, pois temia que Marco me desse um segundo tiro (Fernades, 2014, pág. 34).
Como consequência dessa primeira tentativa de homicídio, Fernandes (2014) afirma que não conseguia se mexer, em virtude da tetraplegia. Apesar da gravidade do delito, inicialmente, Marco declarou à polícia que haviam sofrido uma tentativa de assalto. Contudo, tal versão não se sustentou diante da perícia.
Todavia, a demora no descobrimento da autoria do delito resultou na segunda tentativa de homícidio. Após retornar para casa, depois de quatro meses internada, a vítima fora mantida em cárcere privado pelo ofensor durante o período de 15 dias, período no qual ele tentou eletrocutá-la no banho.
Conforme Fernandes (2014), após diversas artimanhas do agressor na tentativa de omitir os seus crimes, a sua família e os amigos providenciaram o apoio que ela precisava para sair da casa e denunciar o seu ex-cônjuge.
Entretanto, por mais escandaloso que seja o caso, não foi fácil para a vítima ver a justiça ser feita. Embora as tentativas de homícidio tenham ocorrido em 1983, apenas em 1991 ocorreu o primeiro julgamento. Na oportunidade, o réu fora sentenciado a 15 de anos de prisão, mas pôde recorrer em liberdade.
O segundo julgamento só veio a ocorrer em 1996, ou seja, 13 anos após os fatos, e, na ocasião, “novos recursos foram interpostos, retardando ainda mais a obtenção de uma decisão definitiva na justiça brasileira” (Fernandes, 2014, pág. 205).
Inconformada com toda a situação, Maria da Penha precisou recorrer ao Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e ao Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), os quais levaram o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA).
Apesar do Estado brasileiro ter se comprometido a garantir a proteção dos direitos humanos em diversos tratados assinados, continuou inoperante, mesmo após a denúncia, no que diz respeito às providências necessárias para proteger mulheres vítimas de violência.
Por conta disso, em 2001, o Brasil foi responsabilizado pela sua omissão em relação à defesa e proteção das mulheres vítimas de violência doméstica. Em decorrência dessa responsabilização, o Estado começou a se movimentar para cumprir as recomendações impostas pela CIDH. Em 2002, por exemplo, formou-se um Consórcio de ONGs Feministas com o objetivo de elaborar uma legislação voltada ao combate e repressão da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Após inúmeros debates, no ano de 2004 fora aprovado, por ambas as Casas Legislativas, o projeto de Lei que viria, posteriormente, a ser convertido na Lei nº 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha.
2.3 Tipos de violência e procedimentos previstos na Lei 11.340/06
A Lei Maria da Penha surge no ordenamento jurídico com a imprescindível missão de garantir o que, até a sua criação, o Brasil não tinha sido capaz de cumprir: assegurar o mínimo de cuidado para com a mulher vítima de violência doméstica.
Dentre as disposições preliminares trazidas pela mencionada legislação, destacam-se: garantir que a mulher goze dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana (art. 2º) e assegurar as condições para o exercício efetivo de inúmeros direitos, dentre eles a vida, segurança, moradia, educação, entre outros (art. 3º).
Outro importante elemento a ser citado a respeito da legislação, é a sua minuciosidade na definição daquilo que ela objetiva resguardar. O art. 5º, caput e seus incisos I, II e III, por exemplo, aborda o que configura violência doméstica e familiar contra a mulher, trazendo a definição do que configura relação íntima de afeto, âmbito da unidade doméstica e âmbito familiar, para efeitos da lei.
Nesse viés, talvez o artigo mais importante da Lei seja o 7º, que em um rol exemplificativo, aborda em seus incisos as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, separando-as em: violência física, violência psicológica, violência sexual, violência patrimonial e violência moral. A já mencionada minuciosidade é perceptível neste dispositivo, vez que define os atos que constituem cada uma das violências mencionadas.
Um dos pontos trazidos por essa importante norma diz respeito ao cuidado no atendimento da vítima, a fim de se evitar a revitimização[2]. A necessidade de preservar a vítima torna imprescindível que novos procedimentos sejam implementados, de maneira que a evolução da sociedade não implique na ineficiência do sistema.
Dentre os procedimentos previstos na Lei que versam sobre este cuidado, pode-se citar o previsto no art. 10-A, que dispõe ser um direito da mulher vítima de violência ser atendida por servidores preferencialmente do sexo feminino.
Nesse viés, Bianchini (2023) menciona o protagonismo do(a) magistrado(a) nos processos que envolvem a Lei Maria da Penha. A mencionada legislação coloca à disposição dos magistrados diversas possibilidades para as suas decisões, tanto no aspecto assistencial à vítima, como também preventivo e de repressão ao agressor.
Outro ponto abordado pela autora é a necessidade de discriminações positivas, as quais derivam do princípio constitucional da isonomia, e que foram impulsionadas a partir da Lei 11.340/06, objetivando a materialização da igualdade que é tão debatida na sociedade.
Bianchini (2023), seguindo essa linha de raciocínio, pontua que a Lei Maria da Penha, além de ter como objetivo principal a proteção dos direitos das mulheres, é também uma legislação que busca restringir os direitos dos agressores.
Esse ponto de vista trazido pela autora evidencia-se no disposto no art. 12-C, que trata da possibilidade de afastamento do agressor do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida e nos arts. 18 e 19 que abordam a concessão de medidas protetivas.
O procedimento de concessão das medidas protetivas é de suma importância para o enfrentamento dessa problemática, sendo o seu descumprimento, inclusive, o único crime previsto nesta legislação. A possibilidade das medidas serem concedidas de imediato, por exemplo, conforme o §1º do art. 19, é uma relevante maneira de resguardar a vítima.
Assim, é inegável a expressividade da Lei Maria da Penha no combate à violência de gênero, não eximindo, obviamente, o Estado de inovar constantemente os mecanismos já previstos, com o propósito de otimizar sua aplicação e, consequentemente, aumentar a eficácia de proteção às mulheres.
3. A Lei da Escuta Protegida e Depoimento Especial
Em abril de 2017, foi publicada a Lei 13.431, com prazo de vacatio legis de 1 ano. Essa legislação, segundo Zapater (2023, pág. 286), foi a responsável por implementar “o sistema de garantias de direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência”. Este sistema de garantias envolve uma rede interdisciplinar e articulada entre os órgãos públicos para o acolhimento e atendimento de crianças e adolescentes.
Oshima (2022), em um documento disponibilizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), apresenta um passo a passo sobre a implementação da Lei da Escuta Protegida e do Depoimento Especial com base na experiência do município de Vitória da Conquista-Ba. Neste material, a autora faz uma breve apresentação da lei, em que menciona o sofrimento ao qual este grupo vulnerável enfrentava para ter acesso ao sistema de justiça, em decorrência da revitimização que sofriam quando os casos eram denunciados e julgados.
A autora menciona que a referida norma surgiu para “organizar a atuação dos órgãos de atendimento, com o desenho de um fluxo único e protocolos de atendimento integrados para evitar a revitimização e garantir a proteção integral de crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violências (Oshima, 2022, pág. 3)”. Dessa forma, o atendimento deste grupo passou a ter profissionais qualificados para tal, a fim de que fosse otimizada a eficiência do acolhimento.
3.1 Conceito de Escuta Protegida e Depoimento Especial
Entre as principais inovações trazidas pela Lei 13.431/2017, destacam-se os procedimentos da escuta protegida e do depoimento especial. Os arts. 7º e 8º da norma conceituam o que é a escuta protegida e o depoimento especial nos seguintes termos:
Art. 7º Escuta especializada é o procedimento de entrevista sobre situação de violência com criança ou adolescente perante órgão da rede de proteção, limitado o relato estritamente ao necessário para o cumprimento de sua finalidade.
Art. 8º Depoimento especial é o procedimento de oitiva de criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência perante autoridade policial ou judiciária (Brasil, 2017).
Em relação ao art. 7º, Zapater (2023), destaca que essa entrevista ocorre perante o profissional da rede interdisciplinar, que inclui psicólogos, médicos, assistentes sociais, entre outros agentes que tenham expertise no campo. No que diz respeito ao art. 8º, a autora pontua que se trata do depoimento do vulnerável perante a autoridade competente durante o inquérito policial ou ação penal.
Essa entrevista com um profissional especializado, prevista no art. 7º, para atender a necessidade específica enfrentada pela criança e o adolescente, é fundamental para a elucidação do caso tanto no aspecto jurídico quanto psicológico. Juridicamente é importante, pois será uma pessoa capaz de extrair o necessário para elucidar os fatos. Já no aspecto psicológico, por se tratar de uma pessoa capacitada para a situação, a vítima será poupada de procedimentos que a faça reviver o ocorrido, de maneira que a oitiva será conduzida de forma harmônica com o bem estar do menor.
Já em relação ao depoimento especial, previsto no art. 8º, é importante mencionar a presença do entrevistador forense, que é quem intermediará a oitiva da vítima ou testemunha com a autoridade responsável, em uma sala separada, de maneira que a pessoa a ser ouvida não estará exposta aos demais envolvidos no caso.
3.2 Os benefícios de aplicação do procedimento previsto na lei
A Lei 13.431/2017 é inovadora ao inserir no ordenamento jurídico brasileiro os procedimentos anteriormente mencionados. O objetivo de proteção integral da criança e adolescente que foi vítima ou presenciou algum tipo de violência, evidencia-se na aplicabilidade desses mecanismos.
Tanto o procedimento da escuta protegida quanto o do depoimento especial são realizados sem a presença do acusado no recinto. Nesse viés, Zapater (2023) cita os arts. 9º e 10º da lei os quais determinam que o vulnerável seja resguardado do contato com qualquer pessoa que a intimide e que seja atendido em um local apropriado e acolhedor, cujo espaço garanta a sua privacidade.
A mencionada legislação é extremamente detalhista ao definir a maneira que a oitiva deverá acontecer. O art. 11, por exemplo, dispõe que o depoimento especial deverá ser regido por protocolos, preferencialmente realizado uma única vez, em sede de produção antecipada de prova judicial. O §1º deste artigo determina que essa antecipação de prova ocorrerá se a criança tiver menos de 7 (sete) anos ou no caso de violência sexual, e seu § 2º impõe que uma nova tomada de depoimento especial só ocorrerá se for imprescindível e houver a concordância da vítima, da testemunha, ou de seu representante legal.
Zapater (2023) expõe que os protocolos mencionados no art. 11 são descritos no art. 12. É por meio desses protocolos que fica estabelecido que o depoimento será gravado, em caso de antecipação de prova, ou ocorrerá em sala separada durante a audiência no processo judicial, sendo transmitido em tempo real via gravação de áudio e vídeo.
Zapater (2023, pág. 291) destaca que esse procedimento “será sempre acompanhado de um profissional especializado, que esclarecerá à criança ou ao adolescente sobre o que está ocorrendo, assegurando-lhe que narre a situação de violência da forma que preferir”. A norma também da à vítima ou à testemunha, a faculdade de depor diretamente ao magistrado, sem a intervenção do profissional.
Conforme já mencionado, a proteção integral da criança e do adolescente é o foco principal da Lei da Escuta Protegida e do Depoimento Especial. Assim sendo, dentre os protocolos dessa norma, está a garantia de assegurar à vítima ou a testemunha o direito de ter preservado a sua privacidade e intimidade, inclusive quanto a gravação da sua oitiva, cuja violação é o único crime previsto na lei, sendo-lhe assegurado, também, o trâmite do processo em segredo de justiça.
4. A aplicação da Lei 13.431/2017 nos processos de incidência da lei 11.340/2006
Embora a Lei Maria da Penha tenha inovado no ordenamento jurídico no que diz respeito à proteção da mulher vítima de violência doméstica, é imprescindível que a legislação siga evoluindo para resguardar da melhor maneira possível o seu público alvo.
Nesse viés, entende Carvalho (2022) que, ainda que a Lei 11.340/06 tenha criado mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, é preciso que esse procedimento se alie às demais normas protetivas que também visam a proteção de indivíduos em situação de vulnerabilidade, como a Lei da Escuta Protegida.
De acordo com o autor, a escuta protegida e o depoimento especial protegem a privacidade da vítima, de maneira que não se trata de uma inovação no ordenamento, mas uma mera incorporação de um procedimento já aplicado em outros casos, que visa a garantia de direitos e integral proteção das vítimas por ele resguardados.
Carvalho (2022) destaca que, sendo primordial a proteção da mulher, conforme dispõe a Lei Maria da Penha, o cuidado com esta precisa ser otimizado à luz dos procedimentos previstos na Lei 11.431/2017, uma vez que a lei 11.340/2006 se destina a reduzir a violência de gênero causada no âmbito familiar, doméstico ou de afeto, e essa proteção diz respeito também às violências que o Estado pode causar em virtude de um atendimento feito por servidores sem a devida capacitação.
4.1 A relação entre as vítimas protegidas por ambas as legislações
Ao se falar sobre mulheres, crianças e adolescentes vítimas de violência, denota-se, ainda, uma clara influência do sistema patriarcal[3] enraizado na sociedade. A ideia de superioridade de um indíviduo em relação ao outro, como no caso do homem com a mulher, ou do adulto com a criança e o adolescente, é o que leva os agressores a sentirem-se no direito de abusar desses grupos mais vulneráveis, seja pela imposição física, psicológica ou econômica.
Nesse viés, Medeiros (2016, pág. 2) menciona as “práticas como as do uso da força física, psicológica ou intelectual para obrigar o sujeito do sexo feminino a fazer algo contra sua vontade”. Nessa mesma linha, Leal (2023, pág. 1) vai dizer que “a violência contra crianças e adolescentes pode ser definida como qualquer ação ou omissão que cause dano ou sofrimento físico, psicológico ou sexual”. Percebe-se dessas definições a similaridade existente entre as violências sofridas por esses dois grupos de vulneráveis.
Os fatores que geram essas violações de direitos são igualmente parecidos. No que tange à violência contra a criança e o adolescente, Leal (2023, pág. 9) afirma que a agressão “é resultado de uma complexa interação de fatores individuais, familiares, sociais e culturais que influenciam as atitudes e os comportamentos dos agressores e das vítimas”.
Nessa diapasão, Medeiros (2016, pág. 3) ao falar sobre a violência contra a mulher menciona que “os costumes, a educação e os meios de comunicação criam e preservam estereótipos que, por vezes, reforçam a ideia de que o sexo masculino tem o poder de controlar os desejos, as opiniões e a liberdade de ir e vir das mulheres”.
Dessa forma, é evidente que tanto a mulher quanto a criança e o adolescente vítimas de violência não são vistos, aos olhos dos agressores, como pessoas possuidoras de direitos, mas seres fragilizados que existem para se submeter às vontades desses, que se veem em condição de superioridade em relação àqueles.
4.2 A compatibilização das disposições previstas nas leis 11.340/06 e 11.431/2017, como forma de efetivação dos direitos das mulheres.
A primazia pela proteção do seu público alvo é evidente em ambas as legislações em apreço. Tanto a Lei Maria da Penha quanto a Lei da Escuta Protegida e Depoimento Especial, objetivam ampliar a segurança das vítimas de violência a partir de procedimentos específicos que não se aplicam em outros delitos.
Ao se analisar a viabilidade de aplicação dos procedimentos da Lei 11.431/2017 nos casos que envolvem a Lei Maria da Penha, é imprescindível destacar a harmonia existente entre as normas. Nesse viés, Heeman (2021) menciona a colheita de depoimento de maneira acolhedora por profissional apto nas oitivas de menores de 18 anos e a inquirição não revitimizante da mulher vítima de violência, conforme o disposto no art. 10-A, §1º, III, da Lei 11.340/06.
O combate à violência institucional, marcante na lei da escuta protegida e depoimento especial, a fim de se evitar a revitimização, também é visto em diversos mecanismos de combate à violência contra a mulher. Heeman (2021) cita a Convenção de Belém do Pará e a Recomendação nº 33/2015 da CEDAW, que tratam sobre o direito da mulher de ter respeitada a sua integridade física, mental e moral, além dos Estados serem responsáveis por garantir a proteção da mulher contra a vitimização secundária durante atendimento pelas autoridades judiciais e demais agentes encarregados pela aplicação da lei.
A sintonia entre as legislações, portanto, é evidente em diversos aspectos: ambas versam sobre grupos vulneráveis; objetivam prevenir e combater a violência institucional; priorizam a proteção e a garantia de direitos das vítimas. Não obstante, o art. 6º, parágrafo único da Lei 11.431/2017 prevê que nos casos em que for omissa, a Lei Maria da Penha deverá ser aplicada aos casos ali previstos de forma subsidiária. Heeman (2021) entende que essa disposição funciona como um alicerce que conecta as normas.
Embora não haja previsão semelhante na Lei Maria da Penha, tal ausência não obsta a aplicação dos procedimentos da escuta protegida e do depoimento especial. Nos casos em que o agressor é denunciado com incidência da Lei 11.340/06 e a vítima é menor de 18 anos, os procedimentos da Lei 11.431/2017 são aplicados na fase instrutória do processo. Dessa forma, não há empecilhos para a incorporação desses procedimentos em todos os casos que envolvam violência doméstica e familiar contra a mulher, haja vista que seria uma ampliação das hipóteses em que já são utilizados.
Nesse contexto, Burin e Moretzsohn (2022, pág. 3) ao defenderem a aplicação do depoimento especial do adulto nos casos de violência sexual criticam a limitação etária da Lei 13.431/2017 destacando que “o nível de trauma que a violência sexual é capaz de causar não se restringe às vítimas infanto-juvenis”. Seguindo esse pensamento, é possível ir ainda mais além a fim de se resguardar a mulher vítima de violência, haja vista que o trauma sofrido no âmbito doméstico e familiar não se restringe apenas aos casos de violência sexual.
As autoras entendem que a persecução criminal nos crimes que envolvem violência sexual, por si só “já é o bastante para causar efeitos deletérios na vítima” (Burin, Moretzsohn, 2022, pág. 3). Destaca-se que não apenas os delitos sexuais são nocivos às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, haja vista que, muitas vezes, as vítimas sofrem violência reiteradas, inúmeros constrangimentos, até criarem a coragem para levar o agressor à justiça.
O dano sustentado pelas mulheres no decorrer das agressões perpetradas já as deixam demasiadamente expostas, sendo imprescindível que recebam um tratamento adequado e acolhedor durante suas oitivas. Assim, diante da disponibilidade de mecanismos tão relevantes no ordenamento jurídico brasileiro, os quais demonstram-se totalmente compatíveis com a necessidade das demandas, denota-se a indispensabilidade de sua incorporação nos procedimentos da Lei Maria da Penha.
5. Conclusão
A prática da violência doméstica, mesmo com inúmeros dispositivos que objetivam combatê-la, segue recorrente na sociedade. O cuidado com a mulher vítima das mais diversas formas de violência em razão do gênero, é imprescindível para a garantia da dignidade da ofendida que denuncia a agressão sofrida, de maneira que a evolução nos procedimentos de sua oitiva é indispensável para um processo humanizado.
O acesso à justiça não se resume na punição do infrator, mas também, e principalmente, na proteção da vítima. Nesse viés, a implementação do depoimento especial e da escuta protegida foram um grande acréscimo no que tange à garantia de direitos e preservação da intimidade da criança e do adolescente vítimas ou testemunhas de violência. A partir de um atendimento intersetorial por servidores capacitados, esses indivíduos passaram a receber um suporte acolhedor durante suas oitivas.
Diante da revitimização sofrida pelas mulheres durante toda a persecução penal, em que revivem a situação constrangedora e traumatizante inúmeras vezes até a elucidação do caso, urge a necessidade de avanços procedimentais no momento de colheita dos relatos.
Diante da compatibilidade entre a escuta protegida, depoimento especial e Lei Maria da Penha, revela-se possível e urgente a aplicação desses mecanismos de escuta para acolher e proteger a mulher vítima de violência doméstica e familiar. A implementação da oitiva especializada tende a otimizar o processo penal em que incidem as disposições da Lei 11.340/06 a partir de um ambiente mais favorável para que a ofendida sinta-se amparada e segura para expor os fatos que lhe causaram sofrimento.
REFERÊNCIAS
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[1] Para Souza (2013, pág. 14) “é um conceito-chave nas ciências sociais que se refere à construção social do sexo, distinguindo a dimensão biológica da social”.
[2] Para Zapater (2023, pág. 288) “corresponde ao ato de submeter a vítima (ou a testemunha) de uma violência a procedimentos administrativos ou judiciais que poderiam ser dispensados, ocasionando-lhe sofrimento continuado ou repetido em decorrência da lembrança forçada dos atos violentos que sofreu ou testemunhou”.
[3] Para Oliveira, Costa e Sousa (2015, p. 9) é “um sistema contínuo de dominação masculina ainda predominante nas estruturas sociais e estatais, mantendo as formas de divisão sexual do trabalho e perpetuando, consequentemente, a violência cotidiana contra as mulheres (MATOS; PARADIS, 2014)”.
[1]Graduanda em Direito. Faculdade Independente do Nordeste. https://www.fainor.com.br/. E-mail: barbara.crys2008@gmail.com
[2] Doutoranda e Mestre em Memória: Linguagem e Sociedade pelo Programa de Pós-graduação em Memória: Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Especialista em Ciências Criminais pela UESB; Especialista em Novas Metodologias do Ensino Superior pela FASAVIC; Graduada em Direito pela Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). Advogada. Docente do Curso de Direito da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). https://www.fainor.com.br/. E-mail: fadjafroes.ffv.adv@gmail.com
[3]Graduanda em Direito. Faculdade Independente do Nordeste. https://www.fainor.com.br/. E-mail: lettsme060@gmail.com
[4] Graduando em Direito. Faculdade Independente do Nordeste. https://www.fainor.com.br/. E-mail: phenrique272@gmail.com