REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10241112339
Ana Beatriz Da Silva
Ana Beatriz De Lucena Silva
Maria Priscila Guenes Do Lago
Orientação: Prof.(A) Ma. Nayara Bezerra Cavalcanti De Siqueira
Coorientação: Prof.(A) Ma. Maria Eduarda Pontes Dos Santos
RESUMO
INTRODUÇÃO: A incontinência urinária (IU) é uma condição significativa entre mulheres, especialmente atletas de esportes de alto impacto, afetando entre 25% e 45% das mulheres acima de 30 anos. OBJETIVO: Este estudo investigou a prevalência de IU em atletas femininas praticantes de crossfit, levantamento de peso e corrida, visando compreender a relação entre esses esportes e a IU. METODOLOGIA: Realizou-se uma revisão integrativa da literatura entre agosto e outubro de 2024, analisando artigos publicados nos últimos cinco anos nas bases de dados PubMed, SciELO e BVS. Foram incluídos estudos originais que investigaram a IU em atletas femininas maiores de 18 anos. A seleção seguiu um processo em quatro etapas, garantindo a relevância e qualidade dos dados. RESULTADOS E DISCUSSÃO: A revisão revelou uma alta prevalência de IUE entre atletas, com fatores como idade e IMC influenciando a condição. Apesar de as atletas apresentarem resistência muscular, suas taxas de IU são superiores às de mulheres sedentárias. Os esportes de alto impacto, como crossfit, corrida e levantamento de peso, demonstraram aumentar a sobrecarga no assoalho pélvico. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A prevalência de IU em atletas femininas é preocupante e deve ser considerada para promover a saúde e o desempenho dessas atletas. A necessidade de mais estudos específicos sobre a biomecânica de cada esporte e avaliação mais objetiva da IU é evidente, para melhor compreender e tratar essa condição.
Palavras-chave: Incontinência urinária de esforço; esportes; atletas; assoalho pélvico.
INTRODUÇÃO
A incontinência urinária (IU) é uma das patologias mais relevantes associadas às disfunções do assoalho pélvico, destacando-se pela sua etiologia multifatorial. (Rodríguez et al, 2022). Idade, IMC, paridade, cirurgias ginecológicas, menopausa e prática de exercícios físicos, se configuram como os principais causadores do desencadeamento da IU, afetando em principalmente o sexo feminino, com prevalência entre 25% e 45% em mulheres acima de 30 anos (Hu et al, 2019; Lamerton, Mielke, Brown, 2020).
A IU pode ser classificada em duas categorias quanto à sua duração: transitória e crônica (Hu et al, 2019). A última é subdividida em três tipos conforme a sintomatologia apresentada: incontinência urinária de esforço (IUE), que provoca a perda de urina durante o esforço físico; incontinência urinária de urgência (IUU), relacionada ao aumento da necessidade miccional; e incontinência urinária mista (IUM), que combina as características das modalidades mencionadas (Da Silva et al, 2020; Weber-Rajek et al, 2019).
O incentivo à prática de exercícios físicos e esportivas tem aumentado com o passar dos anos, entretanto, há pouca disseminação de informação sobre os riscos que eles também podem trazer à saúde de seus praticantes (Moreno et al, 2022). O grupo de músculos do assoalho pélvico feminino, por exemplo, é um dos complexos musculares que sofrem diversas alterações com a prática esportiva intensa, gerando diferentes disfunções, dentre elas a IU se destaca, afetando cerca de 36,1% de atletas femininas, desse percentual, 44% corresponde a IUE (Teixeira et al, 2018). Esse número aumenta se o esporte for considerado de alto impacto (Skaug; Engh; Bo, 2024).
Os esportes que trazem maior risco são aqueles que apresentam movimentos específicos que geram sobrecarga sobre o assoalho pélvico (AP), um exemplo é o Crossfit, que traz uma grande série de saltos, altas cargas, acrobacias e números ginásticos (Forner et al, 2021; High et al, 2020). Também se destaca o levantamento de peso que exige séries com cargas ainda mais altas em movimentos específicos de sua modalidade e a corrida, principalmente de longa distância, causando bastante impacto nos músculos do assoalho pélvico (MAP’s) devido ao tempo de exposição ao desporto (Araujo et al, 2021).
Mulheres atletas possuem um número de 2,77 vezes a mais de probabilidade de evoluírem com um quadro de incontinência quando comparadas com mulheres consideradas sedentárias (Teixeira et al, 2018). Isso acontece devido à biomecânica dos gestos esportivos realizados e ao impacto que eles exercem sobre o corpo, gerando uma reação do diafragma pélvico mediante esse estímulo (Velásquez et al, 2021). Ademais o aumento da pressão intra-abdominal causada pela fisiologia do exercício praticado, pode aumentar a sobrecarga nos músculos do assoalho pélvico (MAP’s) e somado a ausência de uma cocontração voluntária do períneo aumenta as chances de reduzir a continência nessas atletas (Szumilewicz et al, 2019).
Na literatura científica existem métodos que conseguem melhorar a continência urinária em pessoas do sexo feminino, destacando-se o tratamento conservador realizado pela fisioterapia pélvica (Piernicka et al, 2022). O seu intuito é melhorar a função dos MAP’s, para que assim consigam suportar cargas sem o escape de urina, queixa principal de mulheres esportistas incontinentes (Fitz et al, 2012).
Dentre as abordagens da fisioterapia pélvica, a cinesioterapia é a mais utilizada para o tratamento da IU, sendo considerada padrão ouro, pois através da contração voluntária dos MAP’s, instruída adequadamente por um profissional fisioterapeuta, é possível treinar essa musculatura para exercer corretamente sua função de controle miccional (Moroni et al, 2016). Existem ainda recursos que podem ser associados ao treinamento muscular do assoalho pélvico (TMAP), a fim de potencializar seus resultados, a estimulação elétrica, o uso de cones vaginais e o Biofeedback (Alouini et al, 2022).
A International Continence Society define o biofeedback como um sensor aplicado diretamente no MAP’s a fim de conseguir mensurar e dosar a força que está sendo aplicada na musculatura (Bo et al, 2017). Além disso, traz também o conceito de cones vaginais, objetos com diferentes pesos, que proporcionam um feedback sensorial para as pacientes e aumentam o recrutamento de fibras musculares, sobretudo associado às atividades de vida diária (AVD’s) (Bo et al, 2017). Já a utilização da estimulação elétrica, pode ser feita por diferentes correntes e aparelhos, que possuem diferentes objetivos, a mais utilizada na IUE é a Estimulação elétrica neuromuscular, que facilita a contração muscular e o fechamento uretral (Bo et al, 2017).
Tendo em vista que há um crescimento exponencial da busca e da presença feminina nas práticas esportivas e a escassez de informação sobre o impacto da incontinência urinária na qualidade de vida e desempenho dessas atletas, se faz necessário que haja evidências científicas específicas que observem essa relação. Portanto, o objetivo desse estudo foi identificar a prevalência de incontinência urinária em atletas femininas de esporte de alto impacto, maiores de dezoito anos, com destaque para três esportes: crossfit, levantamento de peso e corrida.
METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura conduzida do mês de Agosto de 2024 a Outubro de 2024, objetivando sintetizar artigos que analisaram a prevalência da incontinência urinária nas atletas femininas em esportes de alto impacto. A pesquisa foi realizada nas bases de dados eletrônicas PubMed (National library of medicine), SciELO (Scientific Electronic Library Online) e BVS (Biblioteca virtual em saúde).
Inicialmente foi realizada seleção dos descritores mediante consulta ao DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) e MeSH (Medical Subject Headings), considerando, respectivamente, os descritores nos idiomas inglês e português. Além disso, foi realizada uma busca reversa, sendo consideradas as referências dos estudos selecionados como forma complementar à seleção de artigos. O termo booleano “AND” foi utilizado para combinar os termos nas bases de dados, nas seguintes configurações: (“Atleta”) AND (“incontinência urinária”); (“Athlete”) AND (“urinary incontinence”); (“Esporte”) AND (“incontinência urinária”); (Sport) AND (“urinary incontinence”).
Foram incluídos na presente revisão artigos originais que correspondem a estudos transversais; ensaios clínicos; ensaios clínicos randomizados e estudos de prevalência, que avaliassem a incontinência urinária em atletas femininas maiores de 18 anos, praticantes de crossfit, levantamento de peso e corrida, publicados nos últimos 5 anos, ou seja, de 2019 a 2024 e que estivessem nas línguas inglês, português de espanhol. Foram excluídos estudos de revisão, artigos repetidos nas bases de dados, fora da temática abordada, monografias, resenhas, dissertações, teses, resumos publicados em anais de congressos e artigos não disponíveis na íntegra.
A seleção de estudos foi realizada em quatro etapas distintas. A primeira etapa, destacou-se pelas pesquisas realizadas nas bases de dados, através dos descritores e operadores booleanos selecionados previamente, com aplicação de filtros e classificação dos estudos conforme o modelo definido. Na segunda fase, efetuou-se a seleção dos estudos através da análise de títulos e identificação da relevância temática. Na terceira etapa foi feita a leitura dos resumos e no quarto estágio foi realizada a leitura integral dos estudos pré-selecionados.
O método de seleção dos estudos está descrito no fluxograma da figura 1, apresentando especificamente todo o processo que procedeu à seleção. Os dados coletados foram organizados em uma planilha a fim de facilitar a análise do conteúdo e a comparação do ponto de vista de cada autor a respeito do assunto em questão.
Figura 1 – Fluxograma com as etapas de seleção dos artigos
Fonte: Autoria própria, 2024
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após a etapa de triagem, dentre os 1190 artigos identificados, sete foram considerados elegíveis conforme os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos (Tabela 1).
Tabela 1– Características dos estudos selecionados
Auto/ Ano | Título | Objetivo | Metodologia | Resultados |
Wikander; Cross; Gahreman, 2019. | Prevalence of urinary incontinence in women powerlifters: a pilot study | Investigar a incidência de IU em levantadoras de peso competitivas e estabelecer se os fatores de risco comumente citados afetam a incidência de IU. | Estudo: Transversal, piloto. Amostra: 134 mulheres levantadoras de peso de 3 Federações australianas. Variáveis: Faixa etária, categorias de peso corporal, grau de competição, experiência em levantamento de peso e experiência em treinamento de resistência. | A prevalência de IU em mulheres levantadoras de peso foi de 37% durante atividades de levantamento e 11% durante atividades cotidianas. Um longo histórico de realização de treinamento de resistência, movimentos de levantamento terra e agachamento e uso de cinto, foram variáveis que aumentaram a incidência de IU. |
De Oliveira Leal et al, 2020. | Prevalência de incontinência urinária e perfil miccional de mulheres praticantes de Crossfit | Avaliar a prevalência de perda de urina e o perfil miccional em mulheres praticantes de Crossfit em academias de Patos de Minas/MG. | Estudo: Transversal, exploratório, com abordagem quantitativa. Amostra: 38 mulheres praticantes de crossfit das academias: Studio Wagner Fagundes, On Fitness e Vassalos. Variáveis: Escolaridade, renda mensal, estado conjugal, antecedentes obstétricos, perfil de treinamento da atleta, tempo no esporte, perda urinária em atividades específicas do Crossfit, padrão miccional. | Observou-se que das mulheres praticantes de Crossfit analisadas apenas 7,9% apresentaram perda urinária durante o exercício e 10,5% relataram vazamento urinário do tipo urge-incontinência. A prevalência encontrada no presente estudo foi justificada pelas características da amostra. |
Almeida et al,2021. | Urinary incontinence in female road runners from the Brazilian Federal District – occurrence and associated risk factors | Analisar IU e fatores associados em mulheres corredoras de rua no Distrito Federal (DF), Brasil. | Estudo: Estudo transversal, com aplicação de questionário adaptado, em mulheres, no DF. Amostra: 94 corredoras. Variáveis: Relação entre corrida e IU, idade, IMC, tempo de corrida, nível de escolaridade, tipo de parto, peso do bebê ao nascer, episiotomia, tempo envolvido no esporte, tempo de treinamento semanal. | Observou-se que, 72,30% (68) não sentem urgência urinária ao correr, 95,70% (90) conseguem reter urina enquanto correm, 3,20% (3) perdem urina ao correr e 16% (15) se preocupam com o cheiro da urina após a corrida. Embora poucas mulheres tenham relatado sentir IU durante a corrida, os resultados sugerem que o SI está presente e precisa ser abordado. |
Arbieto et al, 2021. | Comparison of urinary incontinence, based on pelvic floor and abdominal muscle strength, between nulliparous female athletes and non‐athletes: A secondary analysis | Comparar a força dos músculos abdominais e do assoalho pélvico (MAP) entre atletas nulíparas (AFs) e não atletas (AFNs), para determinar a frequência de incontinência urinária (IU) nesses grupos. | Estudo: Comparativo transversal. Amostra: Dividida em dois grupos de mulheres nulíparas: atletas profissionais que competiram no nível distrital ou superior (N=39) e não atletas (N=34). Variáveis: Idade, peso, IMC, estado civil, tabagismo, presença de incontinência, manometria, resistência dos MAP’s, nível de atividade física, tempo no esporte, classificação na escala de Oxford adaptada, dinamometria isocinética dos músculos abdominais. | A frequência de IU entre atletas foi de 53,8%, contra 35,3% entre não atletas. Além disso, os atletas tiveram diminuição da resistência da MAP quando comparados aos não atletas. |
Wikander et al, 2021. | Urinary Incontinence in Competitive Women Weightlifters | Explorar a questão multifatorial da IU em levantadoras de peso competitivas, com foco na prevalência, fatores de risco e atividades que provocam IU. Além disso, o estudo identificou estratégias de autocuidado usadas por levantadoras de peso competitivas incontinentes. | Estudo: Transversal internacional. Amostra: 191 atletas femininas de levantamento de peso olímpico. Variáveis: Idade, IMC, altura, paridade, tipo de parto, presença e tipos de incontinência, grau de vazamento, tempo no esporte e, na prática de exercícios de força, estratégias de autocuidado e ações e eventos associados à IU. | A prevalência de IU em levantadoras de peso competitivas foi encontrada na faixa inferior à média identificada em outros esportes. O agachamento tem mais probabilidade de provocar IU em levantadoras de peso competitivas do que o snatch, clean and jerk ou pulls e várias estratégias de autocuidado são utilizadas pelas atletas. |
Huebner; Ma; Harding, 2022. | Sport-related risk factors for moderate or severe urinary incontinence in master female weightlifters: A cross-sectional study | Conduzir uma pesquisa com atletas Master femininas em países que são membros da Federação Internacional de Halterofilismo usando um índice de gravidade de incontinência validado e estudar se fatores de risco conhecidos na população em geral aumentam as chances de IU em levantadoras de peso competitivas e se fatores relacionados ao esporte estão associados. | Estudo: Transversal. Amostra: Composto por 824 mulheres levantadoras de peso, dividido em Halterofilistas nulíparas (N = 388) e halterofilistas com gestações anteriores (N = 436). Variáveis: Idade, IMC, gravidade da incontinência, desempenho de levantamento de peso, paridade, menopausa, humor depressivo, tempo no esporte, treino prévio em esportes de alto impacto ou de força, carga horária de treinamento, atividade física e Prevalência de IU em arremessos e agachamentos. | Foi descoberto que, levantadoras de peso tem uma prevalência maior de IU moderada ou grave do que na população em geral e prática prévia de atividades de alto impacto e humor depressivo são fatores de risco. Ademais, níveis mais altos de desempenho e mais horas de exercício, foram associados à IU durante o clean & jerk. |
Mahoney; Heidel; Olewinski, 2023. | Prevalence and Normalization of Stress Urinary Incontinence in Female Strength Athletes | Aumentar o corpo de pesquisa sobre incontinência específica para atletas femininas de força, explorar a prevalência de IUE, normalização de IUE, preferências em fontes de informação sobre IUE e taxas de busca de tratamento para IUE em atletas femininas que participam de weightlifting, powerlifting e strongman. | Estudo: Transversal. Amostra: 425 atletas femininas das categorias weightlifting, powerlifting e strongman. Variáveis: Esporte primário, anos envolvidos em treinamento de força, idade, altura, peso corporal, dados demográficos, fatores de risco para IUE, experiência com IUE em relação ao treinamento e competição, normalização da IUE, fontes preferidas de informações sobre IUE e busca de tratamento. | Foram destacados altas taxas de IUE em atletas de força do sexo feminino e altas taxas de normalização da IUE. Os resultados sugerem a necessidade de compartilhar informações sobre as opções de tratamento e prevenção para IUE e a conscientização entre treinadores e instrutores de força sobre o assunto. |
Legenda: IU (Incontinência Urinária; IMC (Índice de Massa Corporal); SI (Sintomas de Incontinência); MAP (Músculo do Assoalho Pélvico); IUE (Incontinência Urinária de Esforço); AF’s (Atletas Femininas); AFN’s (Não Atletas Femininas).
Fonte: Autoria própria, 2024
Dentre os principais achados desta revisão, identificou-se que a maioria dos estudos aborda a relação entre idade, IMC, tipo de esporte, carga e tempo de treinamento e os correlacionam com a prevalência dos sintomas da incontinência urinária de esforço nas atletas de alto impacto dos esportes selecionados: corrida, levantamento de peso e crossfit.
Segundo Wikander et al (2019) o aumento da idade não é um preditor para o desencadeamento da IU, podendo acontecer em qualquer faixa etária. No entanto, Almeida et al (2021) observou sintomas de IU em todas as faixas etárias do seu estudo, porém, nas atletas acima de 40 anos essa porcentagem foi maior. Diferente de Huebner, Ma e Harding (2022), pois em sua pesquisa não houve relação entre o avanço da idade e o aumento de IU moderada ou grave.
Além disso, Huebner, Ma e Harding (2022) trazem duas hipóteses para explicar seus achados: a primeira fala sobre o desencorajamento de mulheres mais velhas, na prática de levantamento de peso ou sua interrupção no esporte com o avanço da idade e a segunda traz a atividade física como um meio de prevenir a IU em idosas. Contrariando Almeida et al (2021), que observou uma redução dos escapes com o início do desporto, contudo, não houve relação com a idade das corredoras.
Outra possível explicação dada por Huebner, Ma e Harding (2022) é o fato de idosas sedentárias possuírem um nível de gordura superior às envolvidas em atividades físicas, portanto o fator de risco em questão seria o IMC. Em concordância com a análise de Wikander et al (2019), sobre o SIU em diferentes categorias de peso no esporte, o qual não obteve diferenças significativas, justamente porque as atletas possuem um percentual de massa muscular maior que o de gordura, diferentemente das mulheres sedentárias.
Ademais, Almeida et al (2021) avaliou que o nível de incontinência de algumas corredoras diminuiu após o início da prática esportiva, correlacionando-se com a perda de peso proporcionada pelo exercício, além disso, as atletas consideradas em estado de sobrepeso e obesidade estavam há menos tempo no esporte e obtinham porcentagem de perdas de urina mais altas.
Essas divergências quanto a etiologia da IU nas esportistas e a melhora ou piora com o início da prática do desporto, pode ser elucidada pela especificidade de cada esporte e como eles geram repercussões no AP. Na análise comparativa de Arbieto et al (2021) identificou-se que mulheres atletas apresentam uma contração abdominal e dos MAP’s mais efetivas que as não atletas, corroborando com De Oliveira Leal et al (2020).
Entretanto, as esportistas possuem uma taxa de incontinência maior que as mulheres sedentárias. Arbieto et al (2021) associa esse alto índice de IUE entre as atletas, aos achados de seu estudo, onde foi identificado que apesar da contração efetiva, as atletas apresentam uma baixa resistência dos MAP’s. Somando à pesquisa de Almeida et al (2021) que relaciona os exercícios extenuantes do desporto há um aumento da fadiga nos MAP’s.
O crossfit é uma prática esportiva com muitos elementos parecidos com os executados pelas levantadoras de peso olímpico, porém, traz ainda movimentos ginásticos e com diversos saltos que possuem um fator de impacto maior (Machado et al, 2021). Adicionalmente, De Oliveira Leal et al (2020) afirma que esses exercícios provocam um aumento da pressão intra abdominal e quando somado ao impacto dos saltos pode trazer alterações nos MAP’s a médio e longo prazo.
Apesar disso, em seu estudo, De Oliveira Leal et al (2020) encontrou um percentual de apenas 7,9% de mulheres que relataram escape de urina durante os treinos de crossfit. Os autores atribuíram seus resultados ao tamanho da amostra (N=38) e ao fato da maioria das atletas não estarem no grupo de risco de idade, IMC ou paridade, ademais, grande parte praticava o esporte há menos de um ano.
No levantamento de peso, o fator de impacto é menor, porque não são todas as modalidades que exigem saltos em suas competições, entretanto, dispõem de cargas mais altas, exigindo um grande nível de força nos movimentos a serem executados, segundo Wikander et al (2019). Mahoney, Heidel e Olewinski, (2023), alegam que a cocontração gerada no AP durante os movimentos pode gerar mais força nos MAP’s, entretanto, é insuficiente nos exercícios com maior pressão no abdômen.
O agachamento foi o movimento que mais gerou escapes entre as levantadoras de peso no estudo de Huebner, Ma e Harding (2022) correspondendo a 25,6% das esportistas, entrando em contradição com Wikander et al (2019), onde 11 esportistas relataram mais vazamentos no levantamento terra e apenas 5 no agachamento convencional. Em ambos os movimentos há sobrecarga no AP, todavia, o levantamento terra tem mais influência nos músculos abdominais em comparação ao agachamento.
Ainda na pesquisa de Wikander et al (2021) os praticantes de levantamento de peso informaram maiores perdas durante os treinamentos (25,7%) em comparação às competições (17,8%). Ele atribuiu seu achado ao maior número de séries realizadas nos treinamentos e ao aumento de catecolaminas durante a competição, que agem como receptores na uretra, mantendo-a fechada. Mahoney, Heidel e Olewinski, (2023) igualmente observaram essa diferença de SIU entre treinamento e competição.
Quanto à análise de corredoras feita por Almeida et al (2021) de 94 mulheres, 3 afirmaram perder urina durante as corridas, entretanto de acordo com as respostas do questionário aplicado (“elaborado com base no King’s Health Questionnaire e International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form”) 56,6% tinham IUE, em concordância com Arbieto et al (2021) que detectou que boa parte das atletas femininas não percebem os escapes durante o esporte.
Dissemelhante do crossfit e do levantamento de peso, a corrida não necessita de cargas, mas de uma grande resistência corporal global para suportar o tempo exigido em uma maratona, além disso, o impacto da perna no solo e a força de reação do mesmo, causam uma maior sobrecarga nos MAP’s e aumento da pressão nos músculos abdominais, respectivamente (Mendonça et al, 2023). Condições essas que repercutem para o desenvolvimento da IUE nessa população, traz Almeida et al, (2021).
Apesar da ampla gama de informações obtidas, alguns estudos enfatizaram o risco de viés por subjetividade presente nos questionários aplicados. Além do que, foi visto que ambos os desportos avaliados podem trazer alterações sobre a mecânica do AP das mulheres atletas, porém, cada modalidade esportiva influencia segundo a fisiologia dos movimentos executados e as especificidades de cada um.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos estudos avaliados, foi identificado uma alta prevalência de IUE entre as atletas femininas praticantes de corrida, crossfit e levantamento de peso, esportes classificados como de alto impacto. A presença ou não de fatores de risco como idade e peso corporal podem interferir diretamente na prevalência da IU nessas atletas, assim como observado nas mulheres sedentárias. Ademais, exercícios e treinos mais intensos geram maiores escapes de urina, interferindo negativamente no desempenho esportivo dessas atletas.
No entanto, a subjetividade dos questionários utilizados nos estudos para avaliar essas esportistas podem ter interferido nos resultados encontrados, além disso, a carência de uma abordagem mais específica quanto à relação entre os SIU e a biomecânica e fisiologia específica de cada esporte é notável. Fazendo-se necessários estudos científicos com abordagens mais objetivas quanto às variáveis correspondentes às particularidades de cada um dos desportos citados.
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