REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411081112
Steferson Dias Sampaio1
Ana Patrícia Alves da Silva2
Giovanna Cristina da Silva Monteiro3
Natércia Maria Moura Bruno5
Maria Eridan Lima Barreto6
Karla Maria Carneiro Rolim7
RESUMO
Objetiva-se demonstrar os desafios e possibilidades de intervenções da neuropsicologia com crianças convivendo com autismo na Educação Infantil. Trata-se de uma revisão de literatura científica nacional. A educação e a neuropsicologia nos propõem a pensar sobre as especificidades de cada ator do contexto educacional e os desafios que vivenciamos em cada frente. No contexto escolar valores são trabalhados por meio de vivências socializadoras que contribuem para o desenvolvimento integral da criança e pleno direito a gozar de uma educação de qualidade e respeito as suas limitações. O autismo precisa ser compreendido em sua totalidade e trabalhado dentro de todas as dimensões sociais, em especial, no contexto da educação infantil. A inclusão de crianças autistas nas salas de aulas regulares de todo sistema educacional brasileiro, em especial na educação infantil rompe com essa visão preconceituosa e deturpada que crianças com autismo devem estar em escolas especiais, um mundo a parte aos ditos sujeitos “normais”. Desse modo é fundamental que reflitamos sobre a inclusão de crianças com autismo na educação infantil e de que maneira o profissional da Neuropsicologia pode intervir nesse processo a fim de elaborarmos estratégias que favoreçam a superação dos desafios que perpassam a relação autismo e escola. Esperamos que, através desse estudo, possamos ampliar os olhares à cerca dessa relação e dar visibilidade as ocorrências dessa especificidade do contexto escolar.
PALAVRAS-CHAVE: neuropsicologia e educação infantil. Psicologia e educação inclusiva. Neuropsicologia e autismo. Educação infantil e autismo. Autismo.
1 INTRODUÇÃO
A educação escolar tem o papel de transmissão do conhecimento cultural da humanidade de forma sistemática e respeitando as similaridades e singularidades de todos e todas que a compõe. Nesta perspectiva, a Psicologia, e diversas vertentes dela, tal como a Neuropsicologia, é convocada a implementar propostas de intervenções que contribuam para a visão de uma escola plural, ajudando a comunidade escolar a desenvolver estratégias que transformem a escola em um ambiente acolhedor a todas as pessoas.
Um dos maiores desafios da educação inclusiva é a inserção da criança com autismo na escola (BENITEZ, P.; DOMENICONI, C., 2018). Compreendendo as especificidades deste transtorno e como se dá a repercussão dele na sala de aula e na escola se faz necessária a construção de medidas adaptativas e de inclusão para uma melhor inserção desse indivíduo no ambiente escolar. Os investimentos no conhecimento e na aprendizagem dos professores e dos demais funcionários do ambiente contribuem de maneira satisfatória, completa e inclusiva em todos os seus contextos (CABRAL, C. S.; MARIN, A. H., 2017).
A educação infantil é o primeiro encontro da criança com este novo lugar, que mais tarde será seu principal ambiente de socialização humana. É necessário que este espaço seja facilitador de processos que desenvolvam este sujeito não apenas no que cabe ao aspecto pedagógico, mas, acima de tudo, no sentido biopsicossocial e espiritual. Essa pesquisa poderá contribuir, por meios de estratégias que tentem reconhecer os desafios e ajudar nas intervenções com crianças com necessidade educacionais, em especial, ações que favoreçam a compreensão dos aspectos neuropsicológicos que influenciam no desenvolvimento humano de crianças diagnosticadas com Autismo na Educação Infantil.
Os neuropsicólogos no processo de inclusão de crianças com necessidades educacionais específicas ganham um desafio de contribuir nos processos de adaptações dos alunos e da comunidade escolar no sentido de alcançar a eficácia da educação para todas as crianças, independente de sua condição física, social, psíquica e/ou espiritual. Nossa atuação traz em seu escopo ferramentas que ajudam a operacionalizar o processo de construção de práticas inclusivas entre gestores, professores, alunos e demais membros da comunidade escolar. Compreende-se que a abrangência de nossas estratégias neste contexto percorre um limiar cada vez mais amplo. Nosso desafio é com cada aluno e com todos eles ao mesmo tempo, através de ações que proporcionem a todos os estudantes todas as oportunidades possíveis para vivenciar a experiência da aprendizagem como elemento potencial do saber e do sentir (GAITAS, S.; MORGADO, J., 2010).
Este artigo tem o objetivo de demonstrar os desafios e possibilidades de intervenções do profissional da Neuropsicologia em crianças diagnosticadas com autismo na Educação Infantil. Para isso buscaremos conhecer, a partir da literatura científica, como se dar o processo de desenvolvimento humano da criança diagnosticada com autismo, na escola. Como também as possibilidades de intervenções do neuropsicólogo nessa atuação e os fatores psicológicos que podem vir a influenciar no processo de inclusão da criança.
Ao abordar os desafios e possibilidades de intervenções no ambiente escolar com crianças diagnosticadas com autismo na educação infantil esta pesquisa aguça a comunidade científica e a sociedade como um todo a refletir que a inclusão destes sujeitos está diretamente ligada à reestruturação organizacional do modelo de educação que vivemos e alimentamos atualmente e, assim, nos desperta a tentar enxergar novas possibilidades de atuações que contemplam, na totalidade e equitativamente, as crianças com necessidades educacionais específicas. Por fim, mas não menos importante, este trabalho elucida, e nos convoca, a compreensão da importância de um diagnósticoprecoce, considerando que a idade em que a criança começa a receber intervenções apropriadas representa um dos elementos essenciais para um melhor prognóstico em termos de seudesenvolvimento.
Para alcançarmos o objetivo do presente estudo realizamos uma revisão da literatura científica nacional utilizando pesquisas que abordassem a temática de forma direta ou tangencial. Foram contemplados estudos entre 2012 e 2021, resgatados a partir dos descritores: neuropsicologia e educação infantil; psicologia e educação inclusiva; neuropsicologia e autismo; educação infantil e autismo; autismo. Após seleção construímos uma análise de dados a partir das comparações de ideias dos diferentes autores encontrados tendo como finalidade respondermos à pergunta norteadora de nossa pesquisa.
2 DESENVOLVIMENTO
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A partir da Declaração Mundial de Educação para Todos (1990), a educação inclusiva passou a ser discutida com mais vigor e obteve uma forte influência para essa crescente. Em paralelo a isso surge, também, a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), pautando que toda pessoa (crianças, jovens e adultos), deve ter acesso às oportunidades educacionais das quais suprissem suas necessidades de aprendizagem. Foi também estabelecido que pessoas com algum tipo de deficiência obtivessem acesso a uma atenção especial, e que medidas seriam estabilizadas para que a igualdade dentro desse contexto ganhasse mais espaço frente à educação que lhes eram ofertadas (CABRAL, C. S.; MARIN, A. H., 2017).
No Brasil tivemos, por meio, do Sistema Brasileiro de Educação, o estabelecimento de políticas que fomentassem um ambiente educacional inclusivo, através do surgimento de recursos pedagógicos que buscavam qualificar professores e demais profissionais escolares para a lida com pessoas com necessidades educacionais especiais. Foram implementadas medidas adaptativas na reorganização dos modelos de aprendizagem, tendo em vista a importância do reconhecimento das diferenças subjetivas de cada um ganharam um maior espaço e reconhecimento. Entretanto, mesmo com todo o movimento que tivemos em torno desta discussão desde a década de 90, ainda temos muito a construir para alcançarmos um modelo educacional inclusivo (CABRAL, C. S.; MARIN, A. H., 2017).
Educação inclusiva é promover equidade, pois implica no processo de construir uma cultura que trata todos de forma igualitária respeitando as diferenças de cada um. Nesta perspectiva, a interface entre escola e inclusão nos trazem grandes desafios às relações humanas. Professores, pais e alunos, cada um em sua particularidade, passam diariamente por desafios que requerem preparação e cuidado. Pensando nisso, o psicólogo escolar, passou a ser submerso no contexto da educação inclusiva (FONSECA, T. S.; FREITAS, C. S. C.; NEGREIROS, F., 2018).
A educação inclusiva e a psicologia nos propõem a pensar sobre as especificidades de cada ator do contexto educacional e os desafios que vivenciamos em cada frente (BENITEZ, P.; DOMENICONI, C., 2018). A partir disso, nosso trabalho busca refletir sobre a inserção de crianças com autismo na educação infantil.
O Transtorno Espectro Autista (TEA) é visto como uma síndrome comportamental complexa que possui etiologias múltiplas, combinando fatores genéticos e ambientais. Os comportamentos apresentados e a história de vida de cada indivíduo são base na identificação do diagnóstico, pois as bases biológicas ainda não são capazes de sozinhas de fazê-lo sozinho (ZANON, R. B. et al., 2014).
Segundo Camargo e seus colaboradores (2008), é nítido que crianças com autismo têm fortes dificuldades em estabelecer relações, se comunicar de formar habitual com as pessoas, desde bem pequena. Em sua grande maioria a falta de respostas mediante a comunicação deve-se a ausência de compreensão do que está sendo pedido dela, ao contrário de um comportamento de isolamento. Sendo assim, focar no julgamento de que a criança se torna indiferente ao que acontece diante de si e ao seu redor, limita o desejo de investir em sua potência para interagir e se comunicar.
Mesmo com todas as dificuldades encontradas por agentes educacionais inseridos no processo de inclusão de crianças com Transtorno Espectro Autista (TEA), percebe-se que quando as intervenções são bem planejadas conseguimos bons resultados, tanto no que tange as habilidades de linguagem, quanto no que concernem as habilidades sociais (BENITEZ, P.; DOMENICONI, C., 2018).
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Trata-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica da literatura científica nacional. É uma estratégia metodológica que visa mapear a produção científica a fim de permitir uma reflexão mais aprofundada a respeito de determinado tema. Reconhecendo o que já foi estudado por outros autores a respeito do tema.
A pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites […] procurando referências teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a resposta (FONSECA, 2002, p. 32).
A abordagem deste trabalho e qualitativa e os procedimentos adotados são: identificação do tema e da questão norteadora; estabelecimento de critérios de inclusão/exclusão; integração de conceitos que alicerçam a resposta para a questão norteadora.
Os artigos selecionados foram acessados por meio da base eletrônica e de acesso aberto Scientific Eletronic Library OnLine (SciELO). Os descritores utilizados foram: “psicologia e educação infantil”, “psicologia e educação inclusiva”, “psicologia e autismo”, “educação infantil e autismo” e “autismo”. Elencamos os seguintes critérios de inclusão: (1) artigos indexados e disponíveis na íntegra; (2) no idioma português; (3) publicados no período de 2012 a 2021; (4) com temática pertinente aos objetivos da revisão. E, os seguintes critérios de exclusão: (1) artigos que eventualmente não abordassem o tema investigado; (2) artigos que tiveram ocorrência repetida na base de dados; (3) livros, monografias, resenhas, notícias, dissertações e teses.
A busca inicial ocorreu em abril de 2021 e a partir dela 62 publicações foram encontradas. Elas correspondiam à somatória de todas as buscas realizadas com os descritores utilizados. Destes,2 foram encontrados quando buscados pelo descritor “psicologia e educação infantil”; 9 pelo descritor “psicologia e educação inclusiva”; 9 itens pelo descritor “psicologia e autismo”; 3 itens pelo descritor “educação infantil e autismo”; e 37 itens pelo descritor “autismo”. Após uma primeira seleção realizada, por meio dos resumos, 22 arquivos foram selecionados, mas apenas 8 foram recuperados, onde demos início à análise a seguir.
ANÁLISE DE DADOS
HISTÓRIA DO DIAGNÓSTICO
Ao falarmos em crianças com autismo é importante inicialmente discorrer como se deu o entendimento do que é o autismo e de seu espectro, como forma de diagnostico. A princípio descrito pelo psiquiatra Leo Kanner, a qual realizou um estudo de onze crianças onde observou comportamentos distintos, que julgava não se tratar de uma condição apenas neurológica, mas que aparentemente dependia da impossibilidade de estabelecimento de vínculos afetivos com outras pessoas e para comportar mudanças menores ao ambiente e de suas rotinas. E em sua principal característica continha a de não se relacionar com as demais pessoas, dando ênfase em seus primeiros anos de vida (DAINEZ, D., 2017).
Após Kanner desdobrar a chamada teoria de mães geladeiras onde se observou que o fato de que as mães que constituíam de uma maternidade distante e ausente, poderia sim ter correlação com esse aspecto de desenvolvimento das crianças com o autismo. Porém Kanner pode notar também que em algumas de suas anotações havia mães que eram mais presente, mas que tinham filhos com diagnostico do autismo. Após anos pode observar que estas não desenvolveram contatos com outras pessoas, adquiriram linguagem e comunicação, mantendo somente a mesma rotina de sempre (DAINEZ, D., 2017).
Em sequência o psicólogo Jean Piaget desenvolveu a ideia de que o autismo se derivava de uma inteligência do ego, e logo após uma inteligência a qual se dava a comunicação, já em um estudo anterior Piaget definia o pensamento autista como acima do consciente a qual não havia percepção consciente dos objetivos e dos problemas a serem resolvidos, desta forma o pensamento não era adaptado a realidade externa, mas criva um mundo em si mesmo, o mundo dos sonhos. Já Lauretta Bender estudava o diagnóstico do autismo observando crianças já diagnosticadas, correlacionados a dificuldade da fala, que mantinham um relacionamento diferenciado com o mundo exterior a eles, que denominava esta condição como “esquizofrenia da infância”, ela reconhecia que os sintomas decorriam da criança e não somente do ambiente (DAINEZ, D., 2017).
Gaspar et. al (2017) nos trazem que a partir das análises de Asperger e Kenner se pode evidenciar que o autismo possuía diversas facetas e níveis de manifestação da doença. Entretanto mesmo com essa ampla visão a respeito da amplitude da doença, os apontamentos ainda não foram precisos. Somente na década de 60, com o lançamento da terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, fazendo menção ao autismo, onde não havia distinção desse transtorno para a esquizofrenia infantil, passando a incluir o diagnóstico de autismo e dos demais transtornos globais do desenvolvimento em suas páginas, como condições distintas das demais patologias psiquiátricas (GASPAR, A.; SERRANO, A. M., 2017).
Compreende-se que o TEA é uma condição que tem início no processo de maturacional do bebê, em vias de estimulação precoce, e se propaga por todo o processo de desenvolvimento do sujeito. Zanon e seus colaboradores (2104) referenciam o diagnóstico como um fator de comprometido ao desenvolvimento do individuo no decorrer de toda a vida, frisando que existem variações em relação a forma de apresentação continua ou gradativa dos sintomas e a intensidade em que o diagnóstico se revela. Hoje vimos o TEA como um transtorno de base múltipla, ou seja, com bases comportamentais combinados a aspectos ambientais e genéticos (GASPAR, A.; SERRANO, A. M., 2017).
Diante disso, hoje podemos ter um olhar mais abrangente sobre o autismo, fazendo-se assim de extrema importância trazer do que se trata o Transtrono do Espectro Autista (TEA) em sua totalidade, do qual na grande maioria dos casos, principalmente casos presentes no âmbito escolar pouco se faz presente a distinção e esclarecimento de como se constitue esse trantorno do qual engloba diversas necessidades educacionais específicas (GASPAR, A.; SERRANO, A. M., 2017).
TEA é um transtorno bem abrangente, que não apresenta não somente os sintomas de inabilidades ou ausência de uma comunicação social típica. É um construto de fatores que engloba a doença e implica que o sujeito que se descobre nessa condição tenha as possibilidades de possuir uma vida, dita típica, reduzida. O diagnóstico em questão passa a ser um divisor de águas entre aqueles que o vivenciam, como se antes de ter o diagnóstico ele existisse como alguém sem precedentes, mas a posteriori ao a isso ele fosse, exclusivamente, visto como pessoas com autismo. São questões sociais, subjetivas e culturais que atravessam esse diagnóstico e fazem dele algo, reverberadamente, maior do que clinicamente ele representa (GASPAR, A.; SERRANO, A. M., 2017).
NEUROPSICOLOGIA COMO FERRAMENTA DE CONSTRUÇÃO DE ESPAÇO POTENCIAL DE DESENVOLVIMENTO DE CRIANÇAS COM AUTISMO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
A Neuropsicologia, como uma das vertentes de estudos da Psicologia, norteia-se na subjetividade e nas relações humanas e por isso deve está alinhada com as múltiplas lutas pela acessão de direitos iguais para todos. A educação inclusiva, do ponto de vista dos direitos humanos, é a ação de oportunizar que todos os alunos tenham acesso a educação de qualidade e, além disso, de maneira equitativa (PAULA, J. B.; PEIXOTO, M. F., 2019).
Os profissionais da neuropsicologia em contexto educacional trazem em sua práxis o dever de corroborar com as relações em desenvolvimento neste ambiente. Sendo assim, os autores afirmam como atribuições do psicólogo escolar colaborar com os processos adaptativos de alunos, pais e professores, somando os conhecimentos da Psicologia que lhes sejam úteis no desenvolvimento reflexivo de seus papeis; promover ações que favoreçam as relações professoraluno, com o foco em atividades interdisciplinares que potencializem o estabelecimento do vínculo e de estratégias metodológicas que aperfeiçoem a aprendizagem e o desenvolvimento do aluno; participar dos processos de construções e ajuste planos políticos pedagógicos, elaboração de currículos e implementação de políticas educacionais, concentrando sua ação em aspectos relativos aos processos de desenvolvimento humano, de aprendizagem e das relações interpessoais, bem como participar da avaliação e redirecionamento das práticas educacionais (PAULA, J. B.; PEIXOTO, M. F., 2019).
A psicologia não discorda das escolas especiais, mas sim, de um sistema paralelo de ensino que, em vez de potencializar as habilidades socioafetivas e socioculturais dos alunos, os reduz a categorias. Desacreditamos que exista possibilidade de eficácia no processo de aprendizagem em um contexto de segregação. Em tese a conceituação da educação inclusiva é fácil, mas na prática ela atravessa diversos segmentos e questões objetivas e subjetivas dos processos de aprendizagem e da manutenção das relações no âmbito escolar (PAULA, J. B.; PEIXOTO, M. F., 2019).
A educação infantil é um espaço de troca e aprendizagem, onde as crianças são estimuladas potencialmente pelo ambiente a fim de potencializar suas habilidades socioculturais e cognitivas. Ao abordarmos o tema da educação infantil falamos de infância, são temas que atravessam um ao outro nas mais complexas formas de serem vistas e por tal são indivisíveis. Logo, para falarmos de educação infantil precisamos falar de crianças (DAINEZ, D., 2017).
Segundo Freitas (2014), a história da criança vem dando a este sujeito, ao longo dos anos, o lugar de sujeito à margem. A criança já foi vista como um mini adulto, ou seja, aquele que coexiste ao adulto, que são reconhecidos como pessoas menos capazes. Essa visão está correlacionada ao fato da criança está ligado ao trabalho, assim como os adultos, tanto nos fatores de responsabilidades quanto no sentido de punições a eles acometidas.
A escola tem um grande desafio, ver a criança e como criança que mesmo com toda a sua responsabilidade está em um espaço potencial de crescimento e construção de aprendizagens e afetos. Na educação infantil esse desafio é ainda maior, pois as fases iniciais da escola são as que, em grande maioria, vão ser compreendidas pela criança como frustação, tendo em vista que aquele espaço é o responsável pelo afastamento de casa e dos seus (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
As políticas educacionais do Brasil para crianças até seis anos eram pensadas, até o início da década de 80, no sentido de intervir por meios compensatórios com a intensão plena de compensar possíveis carências culturais, dificuldades linguísticas, de aprendizagem e problemas afetivos que as crianças adquiriam nos meios populares. A partir da perspectiva, pautada em pesquisas Americanas e Europeias sobre pré-escola, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) desenvolveu, em 1980, suas primeiras intervenções e estratégias que fomentavam a pré-escola como uma coisa possível e promissora e prepositiva ao contexto das dificuldades escolares (DAINEZ, D., 2017).
A educação infantil, como primeira etapa da educação básica, vem com uma proposta que está para além da convencional de promover conhecimento. Na educação infantil buscamos propiciar um ambiente potencial, que promova a estes sujeitos que estão em fase inicial de vida o direito de reconhecer a escola como um lugar que remeta ao vínculo familiar, considerando este nível de educação como uma forma de acolher para que todas as outras fases sejam seguidas de forma qualitativa. A educação infantil, por finalidade, compromete-se com o desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (DAINEZ, D., 2017).
Toda educação deve ser acolhedora e promover inclusão. Na educação infantil a inclusão tem um papel que se sobre sai aos demais, tendo em vista que, aquele é o momento de inserção da criança na escola e o seu primeiro contato com a cultura escolar e, acima de tudo, o momento em que ela inicia sua implicação sobre a manutenção ou a construção de uma nova cultura no contexto da escola. Nesta perspectiva, entender como compreendemos o ser humano e a pluralidade que nasce de nossa existência é se permitir enxergar as diversas possibilidades e potencialidades humanas de cada um sem acentuar as diferenças (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
Quando pensamos em inclusão suscitamos reestruturação, novas performances e adaptações. Incluir um aluno autista requer que repensemos estrutura física, disposição organizacional, recurso humano e, acima de tudo, estratégias de ação de equitativa que envolva toda a comunidade escolar em prol da viabilização do processo de aprendizagem e construções de experiências afetivas destes alunos. Estas ações garantem a efetivação de um processo inclusivo (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
Compreende-se que para que nossa educação infantil esteja preparada para receber e acolher os alunos com autismo precisamos conhecer novas propostas de educação, rompendo com os modelos tradicionais de educação. É necessário que rever nossas práticas e nos inserirmos em uma vivência efetiva de mudança de cultura, oportunizando que a escola se torne um ambiente naturalmente preparado para receber crianças com autismo e não apenas um espaço adequado com o intuito de integrar alguém. Além disto, vimos como extremamente relevante o estabelecimento de condutas que favoreçam a construção do vínculo afetivo com o aluno para que ele possa se sentir parte do processo de intervenção e, ainda, parte da escola, iniciando, assim, com a formação de hábitos e atitudes socialmente aceitos, efetivação da comunicação, mesmo que não verbal, até a aprendizagem acadêmica propriamente dita (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
A inclusão de crianças com autismo na escola requer que entendamos o contexto em que o autismo e a infância, conjuntamente, se constroem. Ambos são territórios de exclusão e preconceito. Incluir crianças com autismo é se propor a fragmentar as crenças do sistema de que este sujeito é uma pessoa incapaz e improdutiva e que isso é resultado de sua existência como pessoa com autista, uma condição de anormalidade, não apenas patológica, mas, também, social (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
Nesta perspectiva, as leis ao contemplarem e priorizarem a inclusão de crianças autistas nas salas de aulas regulares de todo sistema educacional brasileiro, em especial na educação infantil, rompem com essa visão preconceituosa e deturpada que crianças com autismo devem ser segregadas (FREITAS, L. C. & DEL PRETTE, Z. A. P., 2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do percurso pela literatura científica sobre a inserção de alunos com autismo na educação infantil, conclui-se que, a questão da inclusão destes sujeitos está diretamente ligada a reestruturação organizacional e enxergar novas possibilidades de desempenho dos profissionais com crianças com necessidades educativas especiais.
O estudo destacou que os autores que abordam a temática do autismo na educação infantil trazem muito sobre a interação sociocultural de alunos com autismo na escola no sentindo de como esse processo pode ajudar no desenvolvimento de habilidades sociais e de linguagens dessas crianças.
Os autores compreendem que o papel social da escola ultrapassa essa ideia de ser apenas um lugar que transmite conhecimentos. A proposta da escola é que os alunos experimentem um ambiente potencial de conhecimentos e afetos, a fim de que todas possam vivenciar momentos de troca de aprendizagem. A ideia é que a comunidade escolar torne-se um grupo de agentes construtores de uma nova cultura e transformadores da sociedade. A função social da escola é, por natureza, o desenvolvimento humano pessoal e intrapessoal, através de conhecimentos, mas, também, da manutenção das relações desenvolvidas no decorrer deste processo.
Em síntese teórica, vimos que o diálogo entre psicologia e inclusão de crianças com autismo na escola é um diálogo possível. Todos os autores visitados neste estudo nos trazem que é possível incluir crianças com autismo na educação regular e frisam que esse ambiente é favorável ao desenvolvimento integral das crianças. Os autores concordam que as escolas especiais são segregadoras e que uma criança com autismo quando matriculado em uma escola regular está disponível ao convívio com a pluralidade humana, enquanto que na escola especial ele só terá convívio com pessoas com necessidades educativas especiais, retirando dele o direito de conhecer o diferente e o obrigando a se desenvolver em um mundo paralelo.
Considerando os estudos pesquisados, vimos que os trabalhos alcançados em nossa revisão contemplam o tema de nossa pesquisa de maneira tangencial. Pois não trazem efetivamente os descritores educação infantil e autismo conjuntamente. Muitos autores trazem sobre a educação inclusiva, explanando sobre sua história, a divergência existente no que tange ao seu conceito, as leis que garantem esse perfil de educação, estratégias de estabelecimento e fortalecimento de escolas inclusivas; outros autores contemplam o autismo, enfatizando o diagnóstico, os sintomas e a necessidade de crianças com autismo estarem em escolas regulares; alguns autores trazem a educação infantil e o autismo, mas todos que contemplam essa perspectiva direcionam o aporte teórico ao processo de inclusão de crianças com necessidades educativas especiais e trazem o autismo nesse hall.
Os estudos nos trouxeram que os autores que pesquisam essa relação sobre o autismo e educação infantil se preocupam muito com o processo de formação dos profissionais que atuam com este público e para isso seguem com aporte teórico extenso sobre a história do diagnóstico e os seus sinais e sintomas. Com base no que foi pesquisado sobre isso compreendemos que precisamos entender o corpo autista, as particularidades e os desafios de existir como uma criança com autismo fora da escola, para só então compreender este ambiente como um lugar possível para o desenvolvimento de aspectos ditos típicos do diagnóstico, tais como, dificuldade de interação sociocultural e socioafetiva e nos déficits de linguagem.
Os estudos visitados trazem muito sobre educação inclusiva, mas pouco se aborda sobre as vivências subjetivas de crianças com autismo na escola. A partir das lacunas encontradas, entendese ser importante a realização de novos estudos empíricos sobre a temática.
Resguardadas as limitações deste trabalho, o consideramos como uma produção relevante para a ampliação de olhares à cerca da inclusão de crianças com autismo na escola, sobretudo, na educação infantil, contribuindo para o aumento do acervo científico sobre a temática e trazendo um retorno social significativo no sentindo de dar visibilidade à ocorrência dessa especificidade do contexto da escolar.
REFERÊNCIAS
BENITEZ, Priscila; DOMENICONI, Camila. Atuação do psicólogo na inclusão escolar de estudantes com autismo e deficiência intelectual. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 22, n. 1, p. 163172, 2018.
CABRAL, C. S.; MARIN, A. H. Inclusão escolar de crianças com transtorno do espectro autista:uma revisão sistemática da literatura. Educ. rev., Belo Horizonte, v. 33, e142079, 2017.
CAMARGO, S. P. H.; BOSA, C. A. Competência social, inclusão escolar e autismo: revisão crítica da literatura. Psicol. Soc., Florianópolis, v. 21, n. 1, p. 65-74, 2009.
FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UECE, 2002. Apostila.
FONSECA, T. da S; FREITAS, C. S. C.; NEGREIROS, F. Psicologia Escolar e Educação Inclusiva: A Atuação Junto aos Professores. Rev. bras. educ. espec., Bauru, v. 24, n. 3, p. 427440, set. 2018.
FREITAS, L. C.; PRETTE, Z. A. P. D. Categorias de necessidades educacionais especiais enquanto preditoras de déficits em habilidades sociais na infância. Psicol. Reflex. Crit., Porto Alegre, v. 27, n.4, p. 658-669, 2014.
GAITAS, S.; MORGADO, J. Educação, diferença e psicologia. Aná. Psicológica, Lisboa, v.28, n. 2, p. 359-375, 2010.
PAULA, J. B.; PEIXOTO, M. F. A inclusão do aluno com autismo na Educação Infantil: desafios e possibilidades. Cadernos da Pedagogia, v. 13, n. 26, p. 31-45, 2019.
1 Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
E-mail: stefersonsampaio@edu.unifor.br
2 Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
E-mail: alvesanapatricia7@gmail.com
3 Universidade de Fortaleza (UNIFOR) E-mail: gih.cmonteiro@gmail.com
4 Universidade de Fortaleza (UNIFOR) E-mail: naterciabruno@hotmail.com
5 Universidade de Fortaleza (UNIFOR) E-mail: eridanbarreto70@gmail.com
6 Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
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