O USO DA OZONIOTERAPIA EM ENDODONTIA: UMA REVISÃO NARRATIVA DA LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202410311750


Fabricia de Souza Rodrigues1;
Paulo Ricardo Carvalho Dos Santos2


RESUMO 

Introdução: O ozônio, um potente agente oxidante, possui propriedades antimicrobianas, analgésicas e anti-inflamatórias, sendo uma alternativa promissora na odontologia, especialmente na endodontia. Objetivos: Este estudo visa revisar a literatura sobre o uso da ozonioterapia como terapia coadjuvante na desinfecção de canais radiculares. Materiais e Métodos: Foi realizada uma revisão narrativa de artigos científicos publicados entre 2020 e 2024, utilizando bases de dados como PubMed, SciELO, LILACS e Google Acadêmico. Foram selecionados nove artigos relevantes com foco na aplicação do ozônio em endodontia. Discussão: O ozônio demonstrou eficácia na inativação de microrganismos sem causar danos aos tecidos humanos, apresentando-se como uma opção viável ao hipoclorito de sódio (NaOCl), que, embora eficaz, possui efeitos adversos. O uso da ozonioterapia pode complementar os métodos tradicionais, melhorando a desinfecção. Conclusão: A ozonioterapia representa uma alternativa eficaz e segura na desinfecção endodôntica, mas mais estudos são necessários para estabelecer protocolos padronizados e assegurar sua aplicação na prática clínica. 

Palavras-chave: “Ozonioterapia”, “Endodontia ” e “Ozônio” 

ABSTRACT 

Introduction: Ozone, a powerful oxidizing agent, has antimicrobial, analgesic and anti-inflammatory properties, making it a promising alternative in dentistry, especially in endodontics. Objectives: This study aims to review the literature on the use of ozone therapy as an adjuvant therapy in the disinfection of root canals. Materials and Methods: A narrative review of scientific articles published between 2020 and 2024 was carried out, using databases such as PubMed, SciELO, LILACS and Google Scholar. Nine relevant articles focusing on the application of ozone in endodontics were selected. Discussion: Ozone has demonstrated efficacy in inactivating microorganisms without causing damage to human tissues, presenting itself as a viable option to sodium hypochlorite (NaOCl), which, although effective, has adverse effects. The use of ozone therapy can complement traditional methods, improving disinfection. Conclusion: Ozone therapy represents an effective and safe alternative for endodontic disinfection, but more studies are needed to establish standardized protocols and ensure their application in clinical practice. 

Keywords: “Ozone Therapy”, “Endodontics” and “Ozone”. 

INTRODUÇÃO 

O ozônio é uma forma alotrópica natural do oxigênio se tratando de um um gás instável, que libera oxigênio atômico ao se decompor, um agente oxidante poderoso com uma ampla gama de efeitos benéficos. Entre suas aplicações estão suas propriedades antimicrobianas eficazes, a capacidade de interferir no metabolismo de células tumorais, sua atuação na modulação imunológica e metabólica, bem como na esterilização de materiais médicos e odontológicos, além da purificação de água. Na odontologia, o ozônio vem se mostrando um promissor objeto de estudo em diversas áreas, contribuindo para o avanço científico das terapias convencionais1

Em 1839, Christian Friedrich Schonbein foi o primeiro a observar o surgimento de um gás pungente com um cheiro elétrico, o qual ele denominou de ozônio, que, em grego, significa exalar um cheiro. Atualmente, a terapia com ozônio atua como um tratamento médico alternativo em diferentes especialidade, incluindo em processos infecciosos2

Compreendendo que microrganismos e seus subprodutos são a principal causa de doenças pulpares e perirradiculares, é preciso que o preparo do canal radicular faça a ampliação do canal principal, gerando a remoção mecânica da dentina infectada e, concomitantemente, favorecendo a penetração de irrigantes através dos canais, melhorando o processo de descontaminação. Todavia, uma parcela significativa da superfície do canal radicular permanece inalterada, independentemente dos instrumentos utilizados durante o preparo mecânico. Essas áreas não alcançadas podem proteger os microrganismos dos protocolos de desinfecção do canal radicular1,2

O hipoclorito de sódio (NaOCl) é o irrigante de canal radicular mais amplamente utilizado, possuindo uma atividade antimicrobiana considerada eficaz, agindo sobre uma variedade de microrganismos e gerando uma redução significativa dos níveis de endotoxinas. No entanto, alguns estudos demonstraram que a eliminação microbiana completa não é alcançada de forma consistente por nenhum dos protocolos de desinfecção utilizados atualmente, com isso, novos esforços têm sido gerados no desenvolvimento de novas técnicas para desinfecção do sistema de canais radiculares3.

Assim, o uso da ozonioterapia vem sendo proposto e testado tanto como um agente alternativo ao NaOCl quanto como uma fonte potencial de complementar a desinfecção no preparo químico-mecânico do canal. Dessa forma, o presente trabalho objetiva revisar a literatura no que tange ao uso da ozonioterapia em endodontia. 

MATERIAIS E MÉTODOS 

Trata-se de um estudo de caráter exploratório, caracterizado como revisão narrativa de literatura, realizada através da coleta de artigos científicos durante o período de setembro a outubro de 2024. As bases de dados eletrônicas utilizadas foram o PubMed, Scientific Electronic Library Online – SciELO, LILACS e Google Acadêmico. Os descritores utilizados para a busca nas bases de dados foram nos idiomas inglês e português, com o uso do operador booleano AND. Foram utilizados os descritores nos idiomas português e inglês, respectivamente: “Ozonioterapia” e “Endodontia ”, “Ozonio” e “Ozone Therapy”, “Endodontics” e “Ozone”. 

Os critérios de inclusão dos artigos foram: estudos que abordassem o uso do ozônio como terapia coadjuvante na terapia endodôntica; publicados entre 2020 e 2024; com resumo e texto completos disponíveis; publicados na língua portuguesa ou inglesa. Foram descartados os artigos que não apresentavam resumos nas plataformas de busca. Além disso, estudos que não abordassem o tema de forma pertinente também foram desconsiderados. 

Foram encontrados 10 artigos no PubMed, 1 no Scientific Electronic Library Online – SciELO, 3 no Lilacs e 24 no Google Acadêmico. Após a leitura inicial dos resumos e títulos, foram descartados os estudos que não abordassem diretamente o tema proposto, bem como os estudos duplicados. Assim, a amostra final foi totalizada em 9 artigos. 

Quadro 01. Cruzamentos dos descritores e quantidade de estudos encontrados nas respectivas bases de dados.

BASE DE DADOSCRUZAMENTOAMOSTRA IDENTIFICADAEXCLUÍDOSAMOSTRA FINAL
GOOGLE ACADÊMICO“Ozonioterapia” and “Endodontia” and “ozonio”24204
PUBMED“Ozone Therapy” AND “Endodontics” AND “Ozone”.1064
SCIELOOzone Therapy AND Endodontics110
LILACS“Ozonioterapia” and “Endodontia”321

REVISÃO DE LITERATURA 

APLICAÇÃO DO OZÔNIO EM ODONTOLOGIA 

O ozônio foi sugerido pela primeira vez para tratamento de canal radicular devido à sua alta ação antimicrobiana relatada1-3. A ozonioterapia possui a capacidade de inativar bactérias, vírus, fungos e protozoários através do dano causado nas membranas celulares, alterando a estabilidade osmótica e a permeabilidade dos microrganismos. Além disso, é descrito como possuidor de ação analgésica, anti-inflamatória e de reparo tecidual em situações de regeneração óssea, além de contribuir com um efeito biomodulador após a estabilização de processos infecciosos. No mais, é relatado que o ozônio não gera efeitos colaterais significativos aos pacientes, sendo também seguro no meio ambiente, sendo uma excelente modalidade de tratamento para situações na odontologia1-4

Em odontologia, a ozonioterapia vem sendo utilizada na área cirúrgica, no tratamento de desordens temporomandibulares, em implantodontia, na odontologia conservadora e dentística, no tratamento de patologias orais, em próteses e na endodontia5

OZONIOTERAPIA 

Considerado um dos gases mais relevantes existentes na atmosfera, o ozônio é um composto químico formado por três átomos de oxigênio O3. Sendo produzido de forma natural em decorrência de descargas elétricas em tempestades e através da radiação ultravioleta (UV) emitida pelo sol6

Atualmente, três principais formas de apresentação do ozônio são conhecidas, sendo elas: óleo ozonizado, água ozonizada e gás ozônio. O cirurgião-dentista pode utilizá-las tanto de forma isolada como associadas umas às outras5-6

A ozonioterapia é baseada no estresse oxidativo, ou seja, na liberação das espécies reativas do Oxigênio (ERO), pela dissociação do O3 em O5

Utilizando concentrações ideais, a ozonioterapia apresenta atividade antimicrobiana, analgésica, anti-inflamatória, cicatrizante e na estimulação da oxigenação dos tecidos. Por apresentar alta solubilidade e instabilidade, o ozônio é completamente absorvido pelo organismo, com isso, possuindo a característica de ser biocompatível e não tóxico para células in vitro. No mais, seus efeitos não são considerados potenciais de levar a resistência antimicrobiana5

APLICAÇÃO DA OZONIOTERAPIA EM ENDODONTIA 

O tratamento endodôntico tem como objetivo eliminar os microrganismos causadores de infecção e inflamação dos tecidos pulpares e periapicais. Assim, o processo de desinfecção dos sistemas de canais radiculares é feito através da associação de produtos químicos e ação mecânica realizada através de limas endodônticas5-6

O hipoclorito de Sódio (NaOCl) é o agente irrigante de uso mais difundido nos tratamentos endodônticos, o que se deve ao fato dele possuir efetividade antimicrobiana o que favorece a dissolução dos tecidos necróticos localizados na polpa, além do mais, ele possui capacidade de dissolver constituintes orgânicos da dentina infectada5. Contudo, o NaOCl também apresenta efeitos adversos já bem documentados, como: citotoxicidade, corrosividade, sabor desagradável para o paciente, além de poder causar reações alérgicas5-6. Dessa forma, a comunidade científica está constantemente em busca de alternativas que possam ser utilizadas clinicamente para promover a desinfecção dos canais radiculares de uma maneira que seja tão eficaz ou até mesmo superior ao NaOCl, que é considerada a solução irrigadora padrão-ouro4-5

Estudos demonstram que o ozônio tem a capacidade de levar os microrganismos à destruição, atuando principalmente por danos à membrana citoplasmática das células como uma consequência da ozonólise e, em segundo plano, gera alterações no conteúdo intracelular que se deve ao efeito oxidante secundário gerando à oxidação da proteína e à perda da função da organela. O ozônio possui efeito desinfetante ao desencadear a quebra da membrana celular do microrganismo. Além disso, o ozônio não possui potencial de danificar as células humanas, pois a ação permanece seletiva para as células microbianas. Em suma, devido a ação do ozonio todas as funções vitais dos microrganismos são interrompidas após alguns segundos da aplicação do ozônio. Além do mais, estudos demonstram que as bactérias gram-positivas mostram mais sensibilidade ao ozônio em comparação com os organismos gram-negativos7

Na endodontia, o ozônio pode ser utilizado durante o preparo dos canais de diversas formas: como gás, água ozonizada para integridade (semelhante ao uso em tratamentos periodontais) ou óleo ozonizado como medicação intracanal. Essas formas podem ser aplicadas de maneira isolada ou combinada8

A água ozonizada apresenta uma ação antimicrobiana semelhante à do hipoclorito de sódio, que é amplamente utilizada para a infecção dos canais radiculares, sem causar danos aos tecidos. No entanto, a utilização de limas e hipoclorito de sódio continuam sendo essenciais para garantir a desinfecção dos canais e a eliminação de resíduos bacterianos. A água ozonizada pode ser empregada de forma complementar como solução irrigante, auxiliando no combate aos microrganismos9

DISCUSSÃO 

A literatura revisada aponta o potencial promissor do ozônio na endodontia, destacando suas propriedades antimicrobianas, analgésicas e anti-inflamatórias, com um perfil de segurança que o torna uma alternativa viável ou um complemento ao hipoclorito de sódio (NaOCl) .Enquanto o NaOCl é eficaz na eliminação de microrganismos e na dissolução de tecidos necrosados, seus efeitos adversos, como citotoxicidade e reações alérgicas, justificam a busca por substitutos ou coadjuvantes no tratamento endodôntico. Estudos indicam que o ozônio atua de forma eficaz na destruição de microrganismos, principalmente por meio de danos à membrana celular, e demonstra seletividade para células microbianas sem deficiência de tecidos humanos. Essa ação seletiva pode ser uma vantagem significativa, considerando a sua propriedade antimicrobiana eficaz sem efeitos citotóxicos.Assim, o ozônio se destaca por suas propriedades antimicrobianas e anti-inflamatórias, além de ser biocompatível e não apresentar potencial para induzir resistência microbiana. 

O ozônio, seja na forma de gás, água ozonizada ou óleo ozonizado, apresenta eficácia na destruição de microrganismos por meio de danos à membrana celular e alterações intracelulares, sem danos às células humanas. Essa seletividade pode ser vantajosa em comparação ao NaOCl, que, apesar de ser o padrão-ouro, possui efeitos adversos como citotoxicidade e potencial para reações alérgicas. 

A eficácia do ozônio na eliminação de bactérias gram-positivas e gram-negativas sugere que ele pode ser uma solução promissora para tratamento das infecções endodônticas, especialmente em casos de resistência bacteriana ou quando há preocupação com os efeitos colaterais dos agentes tradicionais. No entanto, embora a ação antimicrobiana da água ozonizada seja semelhante à do NaOCl, os estudos revisados indicam que o uso do hipoclorito e o uso de limas endodônticas permanecem essenciais para a remoção completa de resíduos bacterianos e tecidos necrosados. Assim, o uso do ozônio como agente complementar pode melhorar a eficácia dos tratamentos, mas não substitui completamente o protocolo convencional. 

Dessa forma, a combinação da ozonioterapia com métodos tradicionais pode ser uma abordagem estratégica para reduzir a carga microbiana e melhorar o prognóstico do tratamento endodôntico. Mais estudos clínicos são necessários para definir os protocolos de aplicação, concentrações ideais e comparações diretas com agentes ocasionais, introduzindo a ozonioterapia como uma prática padronizada em endodontia. 

CONCLUSÃO 

A ozonioterapia vem representando uma alternativa promissora na prática odontológica, especialmente na endodontia, onde a desinfecção eficaz dos canais radiculares é crucial. Com sua potente ação antimicrobiana, propriedades analgésicas e anti-inflamatórias, o ozônio demonstra ser uma opção viável que pode reduzir os riscos associados ao uso de agentes irrigantes convencionais, como o hipoclorito de sódio. Embora a ozonioterapia não apresenta ainda uma substituição total dos métodos tradicionais, ela pode ser utilizada como uma abordagem complementar, potencializando os resultados do tratamento e minimizando os efeitos adversos. A necessidade de mais pesquisas clínicas, principalmente no Brasil, é evidente para estabelecer protocolos padronizados, garantindo a eficácia e segurança do ozônio em diferentes aplicações odontológicas. A continuação dos estudos nesta área poderá contribuir para a evolução das práticas odontológicas, promovendo tratamentos mais seguros e eficazes. 

REFERÊNCIAS 

1. A SR, Reddy N, Dinapadu S, Reddy M, Pasari S. Role of ozone therapy in minimal intervention dentistry and endodontics – a review. J Int Oral Health. 2013 Jun;5(3):102-8. Epub 2013 Jun 23. PM 

2. Sen S, Sen S. Ozone therapy: a new vista in dentistry: integrated review. Med Gas Res. 2020 Oct-Dec;10(4):189-192. doi: 10.4103/2045-9912.304226. PMID: 33380587; PMCID: PMC8092153. 

3. Silva EJNL, Prado MC, Soares DN, Hecksher F, Martins JNR, Fidalgo TKS. O efeito da ozonioterapia na desinfecção do canal radicular: uma revisão sistemática. Int Endod J. 2020;53:317-32. 

4. Schmitt A, Moreira D, Júnior FB, Pacheco J, Pires AL, Bonifacio M. A ozonioterapia na odontologia: revisão da literatura. Rev Fac Odontol. 2021;62(1):1-10.

5. Figueiredo DMS, Oliveira R, Gonçalves G, Silva MV, Abreu S, Lima J. O uso do ozônio na odontologia: uma revisão de literatura. Res Soc Dev. 2021;10(9) 6. Rodrigues A, Pereira A, Almeida C, Silva R, Costa D. A utilização do ozônio na odontologia: uma revisão de literatura. Res Soc Dev. 2021;10(3) 

7. Sen S, Sen S. Ozone therapy: a new vista in dentistry: integrated review. Med Gas Res. 2020;10(4):189-192. 

8. Gusmão L, Araújo A, Anjos S, Carvalho V. A ozonioterapia na odontologia: uma revisão de literatura. Rev Saúde UNIPAR. 2021;20(1):1-10. 

9. Moro A, Landucci LF, Félix C. Ozônio na odontologia. Rev Cient Unilago. 2022;1(1):1-10.


1Cirurgiã-dentista, pós graduanda em Endodontia;
2Cirurgião-dentista, especialista em Farmacologia Aplicada a Odontologia, Patologia Oral e
Maxilofacial, Saúde Pública, Radiologia e Imaginologia Aplicada a Odontologia, Mestrando
em Microbiologia (UFBA)