BURNOUT SYNDROME IN NURSING PROFESSIONALS DURING THE COVID-19 PANDEMIC: A LITERATURE REVIEW
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410311610
José Augusto de Castro
RESUMO
A síndrome de Burnout é uma das doenças que acometem os trabalhadores, principalmente da área da saúde, caracterizando-se como uma resposta ao estresse laboral crônico. O presente trabalho teve o objetivo geral de compreender a prevalência da Síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem frente à pandemia de Covid-19, por meio de uma revisão de literatura. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa. A base de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS/BIREME) foi consultada entre os anos de 2019 e 2022 e foram selecionados os artigos correspondentes à temática em questão, a partir dos descritores “síndrome de Burnout”, “enfermagem” e “covid-19” e de critérios de inclusão e exclusão. Resultaram cinco artigos para compor a revisão, os quais tratam de pesquisas empíricas relacionadas ao tema de interesse. Tais pesquisam foram realizados em cinco estados do Brasil e contaram com a participação de enfermeiros e técnicos de enfermagem. O instrumento mais utilizado foi o Maslach Burnout Inventory (MBI). Em geral, os resultados apontam para a incidência da síndrome Burnout nestes trabalhadores. Além disso, através da análise de conteúdo dos artigos, puderam ser extraídas três categorias de fatores de riscos para o desenvolvimento da síndrome: a dupla jornada; o contexto da Covid-19; e consumo de bebida alcoólica. Conclui-se que a prevalência da síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem aumentou consideravelmente durante a pandemia de Covid-19. O contexto pandêmico trouxe diversas consequências para a saúde física e mental desses profissionais, como o isolamento social, o afastamento dos entes queridos, o medo de contrair a doença, entre outros. É essencial que sejam elaboradas ações específicas voltadas para mudanças no ambiente de trabalho, a fim de minimizar os danos à saúde, reduzir o estresse no trabalho e melhorar a qualidade dos serviços prestados.
Palavras-chave: Esgotamento profissional. Enfermagem. Coronavírus. Saúde do Trabalhador.
ABSTRACT
Burnout syndrome is one of the diseases that affect workers, especially those in the healthcare field, characterized as a response to chronic occupational stress. The general objective of this study was to understand the prevalence of Burnout syndrome in nursing professionals during the Covid-19 pandemic through a literature review. The methodology used was qualitative bibliographic research. The Virtual Health Library database (BVS/BIREME) was consulted between the years 2019 and 2022, and articles corresponding to the theme in question were selected based on the descriptors “Burnout syndrome,” “nursing,” and “Covid-19,” as well as inclusion and exclusion criteria. Five articles were selected to compose the review, which addressed empirical research related to the topic of interest. These studies were conducted in five Brazilian states and included the participation of nurses and nursing technicians. The most commonly used instrument was the Maslach Burnout Inventory (MBI). Overall, the results indicate the incidence of Burnout syndrome in these workers. Additionally, through the content analysis of the articles, three categories of risk factors for the development of the syndrome could be extracted: double workload; the context of Covid-19; and alcohol consumption. It is concluded that the prevalence of Burnout syndrome in nursing professionals has increased considerably during the Covid-19 pandemic. The pandemic context has brought various consequences for the physical and mental health of these professionals, such as social isolation, separation from loved ones, fear of contracting the disease, among others. It is essential to develop specific actions aimed at changes in the work environment to minimize health damage, reduce work stress, and improve the quality of services provided.
Keywords: Professional Burnout. Nursing. Coronavirus. Worker’s health.
INTRODUÇÃO
Segundo o Ministério da Saúde (2001a), o termo Saúde do Trabalhador refere-se ao campo de estudo destinado a entender as relações entre o trabalho e o processo saúde/doença. Nessa concepção, saúde e doença são vistos como processos estreitamente articulados com o modo de produção dos seres humanos em determinado tempo histórico. Logo, o ambiente de trabalho é um fator determinante para formas específicas de adoecimento da população. Os trabalhadores estão expostos a diversos riscos, entre eles os riscos ambientais e organizacionais, que precisam ser anulados e/ou minimizados. É por isso que a Saúde do Trabalhador passou a fazer parte da agenda nacional de saúde, sendo objeto de intervenções específicas e orientadas à prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde. (BRASIL, 2001a).
De acordo com Lourenço e Bertani (2007, p. 123),
a incorporação da saúde do trabalhador pelo SUS reconhece, nos ambientes e processos de trabalho, as condições para os eventos agressivos à saúde “de quem trabalha” na perspectiva epidemiológica. Não se restringe a atender o lesionado individualmente, mas busca quantificar o número de pessoas expostas à insegurança e qualificar essas condições para posteriores mudanças.
Paralelo a isso, hoje muito se fala sobre Qualidade de Vida no Trabalho (QVT). A QVT pode ser definida como um conjunto de práticas adotadas pelas organizações visando aumentar o nível de satisfação dos colaboradores, tendo como parâmetro um ambiente de trabalho adequado para a realização das atividades laborais, levando-se em consideração a saúde e o bem-estar dos trabalhadores. A QVT vem sendo amplamente discutida pois sabe-se que, atualmente, o trabalho ocupa um espaço significativo na vida e no tempo das pessoas e que, a depender dos fatores de risco ocupacionais a que os trabalhadores estão expostos, pode-se gerar prejuízos físicos e psicológicos, como cansaço excessivo, estresse e insatisfação, os quais, por sua vez, podem comprometer a saúde a longo prazo. (PEREIRA; VASCONCELOS, 2018).
Osaki e Pustiglione (2019) expõem que a QVT está intimamente relacionada à satisfação das necessidades humanas. A hierarquia das necessidades humanas pode ser representada pela “Pirâmide de Maslow” (Figura 1). Segundo os autores, a satisfação destas necessidades se configura como agente motivador a partir do qual o homem participa com prazer e satisfação de suas atividades e tarefas, fato que certamente repercute positivamente no ambiente de trabalho.
Figura 1. “Pirâmide de Maslow”
Fonte: OSAKI; PUSTIGLIONE, 2019.
Em contrapartida, têm-se as Doenças Relacionadas ao Trabalho, que podem ser conceituadas como doenças em que o trabalho é provocador de um distúrbio latente ou agravador de doença preexistente. Ou seja, para que o agravo pertença a classe das doenças profissionais, o trabalho ou as condições em que ele é realizado devem constituir causa direta ao adoecimento (BRASIL, 2001b). Dentre tais doenças está a Síndrome de Burnout, que também pode ser chamada de Síndrome do Esgotamento Profissional ou Sensação de Estar Acabado. De acordo com o Manual de Procedimentos para os Serviços de Saúde, a respeito das Doenças Relacionadas ao Trabalho, publicado pelo Ministério da Saúde (2001b, p. 191), a Síndrome de Burnout é definida como
um tipo de resposta prolongada a estressores emocionais e interpessoais crônicos no trabalho. Tem sido descrita como resultante da vivência profissional em um contexto de relações sociais complexas, envolvendo a representação que a pessoa tem de si e dos outros. O trabalhador que antes era muito envolvido afetivamente com os seus clientes, com os seus pacientes ou com o trabalho em si, desgasta-se e, em um dado momento, desiste, perde a energia ou se “queima” completamente. O trabalhador perde o sentido de sua relação com o trabalho, desinteressa-se e qualquer esforço lhe parece inútil. (BRASIL, 2001b, p. 191).
A Síndrome de Burnout é composta por três elementos centrais: exaustão emocional, despersonalização e diminuição do envolvimento pessoal no trabalho. A exaustão emocional refere-se a sentimentos de desgaste emocional e esvaziamento afetivo. A despersonalização corresponde a uma reação negativa, uma insensibilidade ou um afastamento excessivo do público que deveria receber os serviços ou cuidados do paciente. Por fim, a diminuição do envolvimento pessoal no trabalho diz respeito ao sentimento de diminuição de competência e de sucesso no trabalho. (MASLACH; JACKSON, 1981 apud BRASIL, 2001b, p. 191).
Isso quer dizer que a Síndrome de Burnout seria uma resposta ao estresse laboral crônico, que envolve condutas negativas com relação aos clientes ou usuários, acarretando consequências ruins tanto para o trabalhador, quanto para a organização. Ademais, tal síndrome acomete, principalmente, profissionais cuidadores, que têm contato direto com os usuários, como os profissionais da saúde (BRASIL, 2001b).
Ainda, segundo Goulart Júnior et al. (2023, p. 4),
o estresse ocupacional surge quando as exigências da situação excedem os recursos, desejos ou capacidades do indivíduo, sendo resultante da forma como a pessoa lida com as necessidades do trabalho e do modo como realiza o seu enfrentamento (Carvalho et al., 2020). Quando se trata do estresse ocupacional, são inúmeras as possíveis respostas aos fatores psicossociais que afetam negativamente a saúde do trabalhador. Este, por sua vez, pode apresentar manifestações de cunho emocional como aumento da insatisfação, do desinteresse e da irritabilidade, respostas fisiológicas como aumento da pressão sanguínea, do ritmo cardíaco e dos níveis hormonais e/ou comportamentais tais como tensão exagerada, fragilidade diante das relações interpessoais e dificuldades de concentração.
A prevalência da Síndrome de Burnout em profissionais da saúde vem sendo comprovada através de diversas pesquisas (FERRARI; FRANÇA; MAGALHÃES, 2012; PERNICIOTTI et al., 2020; JARRUCHE; MUCCI, 2021), demonstrando que essa classe está suscetível a fatores de riscos específicos ao contexto em que atuam, sobretudo na área hospitalar. Alguns destes riscos são: alta exposição a agentes químicos e físicos; falta de autonomia; sobrecarga quantitativa de trabalho — longas jornadas de trabalho, alto número de pacientes e recursos humanos insuficiente — e sobrecarga qualitativa de trabalho, isto é, o caráter emocional estressante relacionado ao cuidado.
Na classe dos profissionais da saúde, comprova-se que a categoria dos trabalhadores de enfermagem (auxiliares de enfermagem, técnicos de enfermagem e enfermeiros) é uma das mais vulneráveis à Síndrome de Burnout. Ferreira e Lucca (2015) avaliaram a prevalência da síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem de um hospital público universitário através da aplicação do Inventário de Burnout de Maslach (MBI-SS) em 534 profissionais. A prevalência da síndrome entre os profissionais foi de 5,9%. Além disso, 23,6% desses apresentaram alto desgaste emocional; 21,9% alta despersonalização; e 29,9% baixa realização profissional. Para os autores, a atenção intensa e prolongada, somada ao contato íntimo com pacientes de difícil manejo e o receio de cometer erro no cuidado são fatores que proporcionam estresse crônico aos técnicos de enfermagem.
Outro estudo, realizado por Tavares et al. (2014), visou identificar a ocorrência da síndrome de Burnout em residentes de enfermagem. Foi aplicado o Inventário de Burnout de Maslach (MBI-SS) em 48 residentes do segundo ano, dos quais dez (20,83%) tiveram alterações em três dimensões (Exaustão Emocional, Despersonalização e Realização Profissional), sugerindo o desenvolvimento da síndrome. Já a pesquisa de Silva et al. (2015), realizada com 130 profissionais (enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem) que trabalhavam em unidades de terapia intensiva de hospitais de grande porte, constatou a prevalência de síndrome de Burnout em 55,3% (n = 72) dos participantes, utilizando o Inventário de Burnout de Maslach (MBI-SS). Analisando esses dados, tem-se que os profissionais de enfermagem são consideravelmente afetados pela Síndrome de Burnout.
Trazendo o debate para os dias atuais, com o surgimento da pandemia de Covid-19, doença ocasionada pelo novo coronavírus, muitos desafios foram impostos aos profissionais de enfermagem. A Covid-19 foi identificada pela primeira vez em dezembro de 2019 na China. Em 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que a epidemia de Covid-19 seria uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), e em 11 de março de 2020 declarou a Covid-19 como uma pandemia (OLIVEIRA et al., 2020). A partir daí, emergiu-se uma série de preocupações sobre os efeitos do vírus Sars-CoV-2 na saúde da população global, bem como os efeitos sociais e econômicos. O controle da pandemia esteve na dependência da detecção dos casos infectados e seus contactantes, seguido de medidas de isolamento, a fim de interromper a transmissão do vírus na comunidade e mitigar os impactos na saúde humana. (TOGNOTTI, 2013 apud PRADO et al., 2021)
Segundo Costa (2020, p. 20) “os obstáculos significativos e simbólicos impostos pela Covid-19 à saúde da Enfermagem podem ser categorizados em limites, insuficiência e carências produzidas pela vivência de cuidar de pessoas com Covid-19 e a doença manifesta”. O contexto da Covid-19 deixou os trabalhadores de enfermagem expostos ao risco de contaminação, à insuficiência de materiais e recursos humanos e, certamente, à distância do convívio familiar, devido a necessidade de isolamento, visto estarem na “linha de frente”. Tais condições de trabalho trouxeram impactos físicos e psicológicos à categoria profissional. Nesse sentido, cabe pensar se a prevalência da Síndrome de Esgotamento Profissional aumentou nos últimos dois anos, quer dizer, durante o período da pandemia de Covid-19, entre os profissionais de enfermagem.
METODOLOGIA
A metodologia adotada é a pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa, mediante busca eletrônica de artigos indexados na base de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS/BIREME) sobre a temática estudada. A revisão bibliográfica pode ser conceituada como um levantamento da literatura relevante e já publicada na área, servindo de base à investigação do trabalho proposto. Logo, não se trata apenas de transcrever dados, mas analisar e discutir ideias (OLIVEIRA, 2002 apud GUEDES et al. 2015). Já a base de dados da BVS/BIREME foi escolhida por conter um maior número de periódicos indexados na área da saúde, disponibilizados eletronicamente, possibilitando uma visão mais ampla dos artigos publicados. (ANDRADE; CARDOSO, 2012).
A estratégia de busca baseou-se na utilização dos descritores em português “síndrome de Burnout”, “enfermagem” e “covid-19”, acrescido do operador booleano “AND” entre os termos. Além disso, a busca se deu por artigos publicados entre os anos de 2019 e 2022, haja visto que esse foi o período de surgimento e propagação do vírus da Covid-19, até o presente momento. A revisão de literatura aconteceu no período de setembro a novembro de 2022.
Os critérios de inclusão adotados para a seleção dos estudos foram: 1) artigos publicados na íntegra e indexados na base de dados supracitada; 2) disponíveis em língua portuguesa; 3) tratando-se de pesquisas empíricas sobre o tema em questão, qual seja a ocorrência da síndrome de Burnout em trabalhadores de enfermagem durante a pandemia de Covid-19. Foram excluídos os artigos que não se relacionavam com o tema proposto ou que se tratavam de pesquisas teóricas.
Após a seleção dos artigos, realizou-se o levantamento e a descrição das seguintes informações: autores, local da pesquisa, ano de coleta, ano de publicação, título, periódico, sujeitos da pesquisa e instrumentos utilizados. Na sequência, procedeu-se a análise de conteúdo (BARDIN, 2011), dando ênfase aos fatores de risco para o desenvolvimento da Síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem durante a pandemia de Covid-19.
REFERENCIAL TEÓRICO
A enfermagem e os desafios no trabalho
O trabalho tem um impacto significativo na saúde do trabalhador, podendo tanto promovê-la quanto conduzir ao adoecimento. Logo, o trabalho é um fator determinante e condicionante no processo de saúde/doença. Hoje em dia muito se fala do estresse relacionado ao trabalho. Há situações de trabalho potencializadoras e desencadeadoras do estresse e, consequentemente, do adoecimento. Dentre essas situações, há aquelas referentes ao conteúdo do trabalho, como as fortes exigências quantitativas e qualitativas, bem como as dificuldades ligadas às tarefas e os riscos inerentes à sua execução. Também há situações relacionadas à organização do trabalho e às relações sociais no ambiente laboral. (CARDOSO, 2015).
Em relação ao trabalho dos profissionais de enfermagem, Junior et al. (2014) mencionam que a equipe de enfermagem precisa ter cada vez mais capacidade técnico-científica em um contexto dinâmico-capitalista. No entanto, a baixa remuneração, sobrecarga de trabalho, falta de autonomia e reconhecimento podem contribuir para o surgimento de alterações psíquicas que levam os funcionários ao estado de exaustão emocional. Esse estado pode levar à perda de interesse pelas pessoas que eles devem ajudar, bem como à baixa produtividade profissional e pessoal. Esses profissionais podem acreditar que o trabalho não vale a pena e que não há possibilidade de melhorar pessoalmente, o que pode ter impactos negativos tanto para a saúde individual quanto para a qualidade do cuidado oferecido aos pacientes. (JUNIOR et al., 2014).
Sabe-se que a enfermagem é uma profissão fundamental para a promoção, prevenção e assistência à saúde da população. Os profissionais de enfermagem possuem um papel crucial em todas as etapas do cuidado, desde a promoção da saúde e prevenção de doenças até o tratamento e reabilitação de pacientes em diferentes contextos de atenção à saúde. Além disso, os enfermeiros são responsáveis por promover a segurança do paciente, coordenar equipes multidisciplinares, gerenciar recursos e tecnologias, realizar pesquisa e educação em saúde. Sua presença é imprescindível em diversos serviços de saúde, como hospitais, clínicas, unidades básicas de saúde, entre outros (SILVA; MACHADO, 2020). No Brasil, a enfermagem é regulamentada pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e pelos Conselhos Regionais de Enfermagem (CORENs), que zelam pela ética, normatização e fiscalização do exercício profissional dos enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem.
Entretanto, a realidade do trabalho desta categoria é dura. Segundo dados da pesquisa “Perfil da Enfermagem no Brasil” (MACHADO, 2017 apud SILVA; MACHADO, 2020), metade dos profissionais de enfermagem no Brasil estão em situação de precarização do trabalho, 62,5% têm salários de até 3 mil reais e 14,4% estão na condição de subsalários (igual ou inferior a mil reais). Ainda segundo essa pesquisa, a Enfermagem no Brasil apresenta sinais de esgotamento, conforme indicam os dados que apontam que 65,9% dos profissionais da área sofrem desgaste profissional, o que tem gerado problemas como depressão, obesidade, extremo cansaço e sentimento de desvalorização.
Além disso, índices alarmantes de licenças médicas têm sido registrados devido a esse quadro crescente. Outros dados mostram que 56,1% dos enfermeiros adoeceram nos últimos 12 meses e precisaram de atendimento médico, além de haver altos índices de acidentes de trabalho, chegando a 10% em média. Esse índice representa mais de 180 mil profissionais que sofreram acidentes no último ano. A falta de assistência também é um problema, já que apenas 40,6% dos profissionais adoecidos são atendidos no próprio local de trabalho, o que pode levar ao óbito em casos mais graves. (MACHADO, 2017 apud SILVA; MACHADO, 2020),
O sedentarismo é outro fator preocupante, afetando 66,2% dos enfermeiros, que alegam cansaço, falta de tempo e oportunidade para a prática de atividades físicas. A violência no ambiente de trabalho é um problema grave, com 71% dos profissionais se sentindo desprotegidos em razão da violência instalada em muitas instituições de saúde. Além disso, 52,8% dos enfermeiros declaram ser maltratados e desrespeitados pela população usuária, especialmente pelos familiares dos pacientes, e 19,7% já sofreram violência física, psicológica ou institucional. A falta de infraestrutura de descanso é outro fator que contribui para o desgaste dos enfermeiros, já que menos da metade dos locais de trabalho oferece esse tipo de espaço para os profissionais que trabalham em regime de plantão. (MACHADO, 2017 apud SILVA; MACHADO, 2020),
Todos esses desafios têm levado ao adoecimento dos profissionais de enfermagem e ao acometimento destes por doenças ocupacionais, como a síndrome de Burnout.
A síndrome de Burnout
A síndrome de Burnout é uma das principais consequências do estresse ocupacional vivenciado pelos profissionais de enfermagem, sendo causada pela exposição prolongada a situações de sobrecarga física e mental no ambiente de trabalho. Segundo Guedes et al. (2015), a profissão de enfermagem é classificada como uma das mais estressantes no setor público, devido a diversos fatores, como a jornada de trabalho extensa, conflitos no trabalho em equipe, inexistência de plano de cargos e salários, sobrecarga de atividades, entre outros. Esses fatores contribuem para o alto índice de absenteísmo dos enfermeiros e para a deterioração da qualidade dos serviços de instituições de saúde (GUEDES et al., 2015).
A síndrome de Burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, é um transtorno psicológico que afeta indivíduos que lidam com situações de estresse crônico no ambiente de trabalho. Ela é caracterizada por três dimensões: uma exaustão emocional intensa, uma despersonalização e um sentimento de redução da realização pessoal no trabalho. A exaustão emocional está relacionada à sensação de esgotamento físico e mental, juntamente com a falta de energia e entusiasmo. A despersonalização, por sua vez, diz respeito a alterações na atitude do profissional, que passa a ter um contato impessoal com seus clientes ou usuários do serviço prestado. Já a diminuição da realização profissional está associada à insatisfação com as atividades desenvolvidas, gerando sentimentos de insuficiência, baixa autoestima, fracasso profissional e desmotivação com o trabalho. (MASLACH; JACKSON, 1981).
A síndrome de Burnout pode afetar não apenas o bem-estar emocional e psicológico do indivíduo, mas também a sua performance e satisfação no trabalho, podendo levar a consequências negativas para a saúde e a carreira. De acordo com Maslach e Jackson (1981), os principais fatores que contribuem para o desenvolvimento da síndrome de Burnout são: excesso de trabalho, falta de reconhecimento, falta de apoio social, falta de controle sobre o trabalho, conflitos interpessoais e valores pessoais em conflito com a cultura da organização.
Segundo Campos et al. (2015, p. 765),
os enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem constituem uma equipe com grande predisposição ao desenvolvimento desta síndrome, por serem os profissionais de saúde que mais tempo passam em contato com o paciente e seus familiares (CARVALHO; MAGALHÃES, 2011). Além disso, no âmbito hospitalar, estes profissionais são, comumente, submetidos a condições insalubres e precárias, que geram uma baixa qualidade de vida no trabalho (BECKER; OLIVEIRA, 2008; ELIAS; NAVARRO; 2006). Somam-se a esses fatores as longas jornadas de trabalho, a rígida estrutura hierárquica, a excessiva carga de trabalho, a execução de ações repetitivas, o número limitado de recursos humanos e materiais, o desgaste psicoemocional nas tarefas realizadas e a pressão de chefias, dos colegas de trabalho e, frequentemente, dos próprios pacientes e familiares (BECKER; OLIVEIRA, 2008; FARIA; BARBOZA; DOMINGOS, 2005).
Um estudo realizado por Galindo et al. (2012) com enfermeiros que atuam na assistência pediátrica e tocoginecológica de um hospital geral do Recife (PE) teve como objetivo identificar a prevalência de Burnout e fatores associados neste público. Participaram da pesquisa 63 profissionais. Utilizou-se um questionário sobre aspectos sociodemográficos e condições laborais, além do instrumento Maslach Burnout Inventory (MBI). Os resultados mostraram que os participantes apresentaram altos níveis de exaustão emocional (49,2%) e despersonalização (27%), bem como baixo nível de realização profissional (4,8%). No total, 4,7% da amostra apresentou Burnout. Além disso, 19% apresentaram alta propensão à síndrome, considerando os índices de pelo menos duas das três dimensões.
Outra pesquisa feita por Ferreira e Lucca (2015) com 534 técnicos de enfermagem de um hospital público do estado de São Paulo utilizando o mesmo instrumento verificou a prevalência de 5,9% da síndrome de Burnout na amostra. Além disso, foi observado que 23,6% desses profissionais apresentaram alto nível de desgaste emocional, 21,9% alta despersonalização e 29,9% baixa realização profissional. Foram encontradas associações estatisticamente significativas entre o desgaste emocional e o setor de trabalho e estado civil dos profissionais; entre a despersonalização e a presença de filhos e problemas de saúde; e entre a baixa realização profissional e o setor de trabalho e número de empregos. Outrossim, foi observada uma associação entre a satisfação no trabalho e as três dimensões avaliadas.
Diante disso, faz-se necessário entender como a pandemia da Covid-19 impactou na prevalência da síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem.
A pandemia de covid-19 no Brasil: alguns dados
Desde o início de 2020, o Brasil vem enfrentando uma das piores crises sanitárias da história: a pandemia de COVID-19. A doença, causada pelo vírus SARS-CoV-2, se espalhou rapidamente pelo país e causou milhões de casos confirmados e centenas de milhares de mortes. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2021). A resposta do governo federal e de alguns governos estaduais foi questionada por especialistas e pela população em geral. A falta de coordenação e a demora na adoção de medidas efetivas de contenção do vírus, como a testagem em massa e o isolamento social, contribuíram para o agravamento da situação. Além disso, a falta de investimento em saúde pública ao longo das últimas décadas deixou o país em uma situação ainda mais vulnerável.
Embora a vacinação tenha começado em janeiro de 2021, o país enfrentou desafios na produção e distribuição das doses, o que contribuiu para a lentidão do processo. Além disso, a falta de adesão da população às medidas de prevenção, como o uso de máscaras e o distanciamento social, dificultou o controle da disseminação do vírus. Segundo dados do Ministério da Saúde, até o dia 1º de maio de 2023, foram registrados mais de 24,6 milhões de casos confirmados e mais de 679 mil mortes decorrentes da COVID-19 no país (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2023).
A pandemia de Covid-19 trouxe diversos desafios para a área da saúde, principalmente para os profissionais de enfermagem. Desde o início da pandemia, os enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem têm sido expostos a altos níveis de risco de infecção pelo vírus, além de trabalharem em condições extremamente desafiadoras. Entre os desafios enfrentados pelos profissionais de enfermagem durante a pandemia de Covid-19 estão a falta de equipamentos de proteção individual (EPIs), a sobrecarga de trabalho, o estresse emocional, a pressão psicológica e a falta de apoio institucional. (COSTA et al., 2021).
A falta de EPIs adequados é um problema grave que afeta a segurança dos profissionais de enfermagem. Alguns trabalhadores relatam ter que reutilizar máscaras N95 e outros EPIs, o que aumenta o risco de infecção. Além disso, muitos profissionais de enfermagem têm que lidar com a falta de recursos físicos e humanos e a falta de leitos em hospitais superlotados. A sobrecarga de trabalho é outro grande desafio. Com o aumento no número de pacientes infectados, muitos hospitais e unidades de saúde têm funcionado além de sua capacidade máxima. Isso tem resultado em longas jornadas de trabalho para os profissionais de enfermagem, muitas vezes sem folgas adequadas para descanso e recuperação. (COSTA et al., 2021).
O estresse emocional e a pressão psicológica também têm sido uma preocupação para essa categoria durante a pandemia. O trabalho em um ambiente de alta pressão, com grande carga emocional e incertezas constantes, pode levar a problemas como ansiedade, depressão e síndrome de Burnout. Por fim, existe a falta de apoio institucional e de reconhecimento por parte da sociedade, onde os trabalhadores relatam sentir-se desvalorizados e desrespeitados em sua profissão. (COSTA et al., 2021).
Um estudo preconizado por Herculano et al. (2022) visando analisar as estratégias, os desafios e os enfrentamentos dos profissionais de enfermagem que atuavam em emergências obstétricas durante a pandemia de COVID-19, constatou a vulnerabilidade emocional e psicológica dos profissionais devido às longas horas de trabalho, mudanças frequentes nos fluxos e protocolos assistenciais, sobrecarga de trabalho, escassez de equipe resultante do afastamento de profissionais infectados pelo vírus e licenças médicas devido a transtornos psicológicos, como depressão.
Em resumo, a pandemia de Covid-19 trouxe desafios sem precedentes para os profissionais de enfermagem, colocando em risco sua saúde e segurança e exigindo grande resiliência emocional e física. É fundamental que a sociedade reconheça a importância desses trabalhadores e que as instituições de saúde ofereçam apoio adequado para que possam enfrentar esses desafios com segurança e dignidade. Outrossim, faz-se necessário entender os impactos da Covid-19 na prevalência da síndrome de esgotamento profissional, tema do presente do trabalho.
RESULTADOS
Os resultados da revisão bibliográfica estão descritos a seguir, para posterior discussão e apontamentos. Primeiro, está exposto a sistemática de busca e seleção dos artigos incluídos na revisão bibliográfica. Depois, encontra-se uma síntese destes artigos e um levantamento de suas principais informações. Por fim, está descrito o resultado da análise de conteúdo (BARDIN, 2011).
Sistemática de busca e seleção dos artigos
Ao realizar a busca na base de dados, utilizando os descritores indicados, foi obtido um total de 197 artigos relacionados ao tema. Na sequência, ao aplicar o filtro do ano de publicação, a fim de selecionar apenas os estudos publicados entre 2019 e 2022, foi possível reduzir o número para 184 artigos. Em seguida, foi aplicado um filtro para identificar somente os artigos que estivessem disponíveis na íntegra e em língua portuguesa, resultando em um total de 24 artigos. Após isso, fez-se a leitura integral destes artigos e uma análise mais detalhada deles. Identificou-se que 2 dos 24 artigos selecionados eram repetidos e 17 eram teóricos ou não estavam diretamente relacionados ao tema em estudo, sendo então descartados. Por fim, foram selecionados 5 artigos, os quais tratam de pesquisas empíricas e são relacionados ao tema de interesse. Logo, esses artigos são considerados relevantes para a revisão bibliográfica em questão, uma vez que atendem aos critérios de seleção propostos e tratam diretamente do tema em estudo.
Figura 2. Fluxograma da sistemática de busca e seleção dos artigos
Fonte: elaborado pelo autor (2023)
Síntese sobre os artigos incluídos na revisão
Foram selecionados para esse trabalho um total de 5 artigos. Todos eles dizem respeito ao tema da síndrome da Burnout em profissionais de enfermagem frente à pandemia da Covi-19. Dado a novidade do tema, são artigos recentes e ainda pouco divulgados no meio científico. Eles foram distribuídos numericamente de forma aleatória, em ordem crescente de 1 a 5, para melhor organização do trabalho. Sendo assim, o presente trabalho pode referir-se aos artigos pela numeração distribuídos a eles, ressaltando-se que esta numeração foi estabelecida arbitrariamente e sem juízo de valor.
A tabela 1 contém a distribuição dos 5 estudos que compõem os resultados desse trabalho. Visualiza-se na tabela os autores dos artigos, o título e o periódico de publicação.
Quanto aos autores, verifica-se que são distintos em entre si, ou seja, cada artigo tem uma autoria diferente. Além disso, todos os artigos contam com quatro ou mais autores simultaneamente. Já em relação ao título, os cinco artigos trazem em destaque o tema da síndrome de Burnout, entretanto, usam termos diversificados para referir-se a ela. Dois estudos utilizam simplesmente o termo “Burnout”, outro utiliza o termo “esgotamento profissional”, um utiliza o termo “estresse” e um deles utiliza “síndrome de Burnout”. Ademais, em todos os títulos menciona-se a Covid-19 e os profissionais de enfermagem.
Quanto ao periódico de publicação, eles também divergem. Um foi publicado na Revista Latino-Americana de Enfermagem, um foi publicado na Revista de Enfermagem da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), um foi publicado na Revista Cuidado em Enfermagem, um foi publicado no Jornal Brasileiro de Psiquiatria e um na Revista de Pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, ligada à Escola de Enfermagem Alfredo Pinto. Logo, pode-se apontar que quatro dos cinco artigos foram publicados em periódicos específicos da área de enfermagem e apenas um foi publicado em um periódico ligado à psiquiatria.
Na tabela 2, localizada abaixo, visualiza-se a distribuição dos estudos, os sujeitos da pesquisa, o local da pesquisa, o ano da coleta de dados, o ano de publicação e o instrumento utilizado para a coleta.
Quanto aos sujeitos da pesquisa, três dos cinco artigos contaram com a participação de enfermeiros e técnicos de enfermagem, um artigo teve a participação apenas de enfermeiros e outro apenas de técnicos de enfermagem. O local da pesquisa foi distinto em cada um dos estudos: um foi feito no estado do Rio Grande do Sul, um no Rio de Janeiro, um em São Paulo, um em Minas Gerais e um em Rio Grande do Norte. Pode-se verificar a predominância do Sudeste do país como local de pesquisa (n=3). Sobre o ano da coleta dos dados, dois estudos coletaram em 2020, um em 2021 e os outros dois não continham essa informação. Sobre o ano de publicação, três estudos foram publicados em 2020 e dois em 2021. Quanto ao instrumento utilizado, dois estudos utilizaram o Maslach Burnout Inventory versão Human Services Survey (MBI-HSS), um utilizou o Maslach Burnout Inventory (MBI), conjuntamente com o Resilience at Work Scale Brasil 20 (RAW) e o Self Reporting Questionnaire (SRQ-20), um utilizou o Inventário de Sinais e Sintomas de Lipp (ISSL) e um utilizou um questionário autoral.
O primeiro estudo (VIEIRA et al., 2022) a compor os resultados dessa revisão visou compreender a relação entre as dimensões do Burnout e a resiliência no trabalho dos profissionais de enfermagem de terapia intensiva na pandemia de COVID-19, em quatro hospitais do Sul do Brasil. Foi realizado um estudo multicêntrico, de delineamento transversal, com 153 enfermeiros e técnicos de enfermagem de Unidades de Terapia Intensiva. Os participantes responderam a questões sociodemográficas, de saúde e trabalho, além de responderem aos instrumentos Maslach Burnout Inventory e Resilience at Work Scale 20. Os dados coletados foram submetidos à análise descritiva e a correlações bivariadas e parciais (análise de rede).
Os resultados mostraram que a resiliência no trabalho apresentou uma correlação inversa com o desgaste emocional e a despersonalização, e uma correlação direta com a realização profissional. A variável que teve maior influência na rede de correlações foi a percepção do impacto da pandemia sobre a saúde mental. Concluiu-se que a resiliência é um fator que pode interferir nos domínios do Burnout, especialmente no desgaste emocional e na baixa realização profissional. O desgaste emocional é influenciado por distúrbios psíquicos menores e afeta as variáveis de saúde física e mental dos trabalhadores. É recomendável incentivar o desenvolvimento da resiliência no âmbito institucional para ajudar a moderar o adoecimento (VIEIRA et al., 2022).
O segundo estudo (VALÉRIO et al., 2021) objetivou analisar a ocorrência de Burnout em enfermeiros residentes de unidades Covid-19 de um hospital universitário. Este estudo teve uma abordagem quantitativa e descritiva, com um delineamento transversal e uma amostra de 40 enfermeiros residentes de um hospital universitário público do Rio de Janeiro. Os dados foram coletados de outubro a dezembro de 2020, por meio do Google Forms, utilizando um instrumento de caracterização da amostra e o Maslach Burnout Inventory – Human Services Survey.
Os resultados indicaram que a maioria da amostra era composta por residentes do sexo feminino, casados e com mais de 25 anos. Foi observado que 12,5% da amostra apresentou risco de desenvolver a síndrome de Burnout, devido a altos escores de exaustão emocional (55%), médios em despersonalização (47,5%) e baixa realização profissional (20%). Concluiu-se que a pandemia aumentou os riscos de Burnout na amostra, sendo necessário investir em suporte social e técnico pelas instituições formadoras, a fim de minimizar o adoecimento (VALÉRIO et al., 2021).
O terceiro estudo (BARÃO et al., 2022) buscou identificar fatores de esgotamento psíquico e emocional dos profissionais de enfermagem que atuaram na linha de frente em Unidade de Terapia Intensiva especializada no tratamento de pacientes com COVID-19. Foi uma pesquisa de caráter descritivo, quantitativo e transversal, realizado em uma instituição hospitalar. A coleta de dados aconteceu a partir da elaboração de um questionário cientificamente embasado para avaliar o esgotamento profissional em relação à rotina de trabalho durante a pandemia de COVID-19.
Em uma Unidade de Terapia Intensiva, participaram 69 profissionais de enfermagem, incluindo 45 técnicos e 24 enfermeiros. Os resultados mostraram que 24 (34,8%) dos participantes se sentiram ocasionalmente esgotados emocionalmente, mas 37 (53,6%) nunca perderam a confiança na profissão de enfermagem. O estudo identificou fatores relevantes para o esgotamento profissional, incluindo a necessidade de apoio emocional no enfrentamento da pandemia, assim como o reconhecimento profissional. Em conclusão, os autores apontam que medidas de segurança devem ser implementadas para os trabalhadores de enfermagem e espera-se que o estudo possa contribuir para o desenvolvimento de programas de saúde ocupacional específicos para este grupo de profissionais (BARÃO et al., 2022).
O quarto estudo (FREITAS et al., 2021) objetivou avaliar a prevalência e a existência de fatores preditores da síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem que atuavam em unidade de terapia intensiva (UTI) durante a pandemia da COVID-19. Foi conduzido um estudo descritivo de caráter transversal com abordagem quantitativa em uma amostra de 94 técnicos de enfermagem de terapia intensiva. Os instrumentos utilizados foram um formulário para coleta de dados sociodemográficos, ocupacionais e comportamentais, além do Maslach Burnout Inventory (MBI) em sua versão Human Services Survey (HSS). A prevalência da síndrome de Burnout foi verificada por análise bivariada seguida de regressão de Poisson hierarquizada com variância robusta para avaliar a associação entre as variáveis estudadas e a síndrome de Burnout.
Como resultado, obteve-se que a síndrome de Burnout foi observada em 25,5% da amostra analisada. A análise múltipla identificou as seguintes variáveis como preditores associados à maior prevalência de síndrome de Burnout: idade acima de 36 anos, realização de hora extra, consideração da carga horária de trabalho como rígida e etilismo. Os autores concluíram que a prevalência da síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem que atuam em UTIs e estão na linha de frente da pandemia da COVID-19 é alta e fatores sociodemográficos, ocupacionais e comportamentais se mostraram como preditores da síndrome. Este estudo destaca a importância da implementação de medidas preventivas para reduzir os riscos de Burnout em trabalhadores da saúde (FREITAS et al., 2021).
Por fim, o quinto e último estudo (NASCIMENTO et al., 2022) buscou identificar os sinais e sintomas do estresse prevalentes em profissionais da enfermagem que atuaram no combate a COVID-19. Foi conduzido um estudo transversal de abordagem quantitativa em um hospital universitário localizado na região nordeste do Brasil, no primeiro semestre de 2021. A pesquisa contou com uma amostra de 109 profissionais da enfermagem que atuam diretamente no cuidado a pacientes diagnosticados com COVID-19, sendo 29 enfermeiros e 80 técnicos em enfermagem. Para a coleta de dados, foi aplicado um questionário de caracterização dos participantes, contendo perguntas sobre sexo, idade e estado civil, a fim de identificar os sujeitos da pesquisa. Além disso, foi utilizado o Inventário de Sinais e Sintomas de Lipp (ISSL), um instrumento validado nacionalmente e desenvolvido pela psicóloga Marilda Lipp. O ISSL tem como objetivo identificar a presença de estresse nos profissionais e caracterizar as fases desse processo.
O estudo revelou que 47% dos profissionais da enfermagem apresentaram estresse ocupacional. Dentre os sintomas mais prevalentes, destacaram-se os físicos, tais como tensão muscular (10,1%), sensação de desgaste físico (8,7%), problemas de memória (7,7%), cansaço constante (6,3%) e insônia (6,3%). Os sintomas psicológicos mais comuns foram cansaço excessivo (11,3%), angústia ou ansiedade diária (8,1%), sensibilidade emocional excessiva (8,1%) e irritabilidade sem causa aparente (6,9%). Concluiu-se que o estresse ocupacional foi encontrado nos profissionais da enfermagem, sendo que muitos deles se encontravam nas fases de resistência e exaustão, e apresentaram diversos sintomas tanto de caráter físico quanto psicológico (NASCIMENTO et al., 2022).
Análise de conteúdo dos artigos selecionados
A análise de conteúdo de Bardin (2011) é uma técnica de análise de dados qualitativos utilizada em pesquisa. Ela permite analisar o conteúdo de documentos, como entrevistas, discursos, textos escritos, entre outros, com o objetivo de identificar os principais temas, categorias e significados presentes no material analisado. A análise de conteúdo de Bardin (2011) é um processo sistemático que envolve diversas etapas, como a definição da amostra, a seleção e codificação dos dados, a categorização do conteúdo e a interpretação dos resultados. Ela é amplamente utilizada em diversas áreas do conhecimento, como na psicologia, na sociologia, na educação, na comunicação, entre outras.
Na análise de conteúdo do presente trabalho, analisa-se a amostra dos artigos da revisão de literatura, buscando dar ênfase aos fatores de risco para o desenvolvimento da Síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem durante a pandemia de Covid-19. Logo, pode-se extrair como resultado as seguintes categorias, expostas na tabela 3.
DISCUSSÃO
Ao analisar a figura 2, que demonstra a sistemática de busca e seleção dos artigos, pode-se perceber que ainda são escassos os estudos acerca da temática aqui levantada. Foram encontrados apenas 197 artigos utilizando os descritores “síndrome de Burnout”, “enfermagem” e “covid-19” na Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), que é a base de dados que reúne um dos maiores números de periódicos indexados na área da saúde e disponibilizados eletronicamente (ANDRADE; CARDOSO, 2012). Isso pode ser explicado pela novidade do tema e pelo contexto atual da pandemia de Covid-19. A produção de ciência durante a pandemia se esbarra nas constantes mudanças causadas por ela e nas incertezas dos impactos futuros. Porém, ainda que em pequena escala, a comunidade científica vem se esforçando para entender, analisar e traduzir os acontecimentos recentes, bem como as consequências deixadas pela Covid-19.
Além disso, pode-se perceber pela figura 2, que a filtragem dos artigos pelo ano de publicação resultou em poucas exclusões (n=13), demonstrando que a maioria dos estudos foram realizados nos últimos 4 anos (2019 a 2022), quando emergiu o vírus da Covid-19. Em contrapartida, ao aplicar o filtro para identificar os artigos disponíveis na íntegra e em língua portuguesa, 160 foram descartados. Pode-se aferir que a produção científica nacional nesta área ainda é muito incipiente. Ademais, dos 24 artigos restantes, 17 eram teóricos ou não estavam diretamente relacionados ao tema em estudo, explicitando a falta de estudos empíricos para avaliar a prevalência da síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem no período pandêmico.
Os cinco artigos que compõem os resultados dessa revisão foram distribuídos na tabela 1 e 2. A tabela 1 traz informações sobre os autores, o título das publicações e os periódicos. É possível notar que todos os artigos incluídos na revisão contam com quatro ou mais autores simultaneamente. Esse fato vai de encontro ao encontrado na literatura da área, onde os estudos são publicados coletivamente (FERREIRA; LUCCA, 2015; TAVARES et al., 2014; SILVA et al., 2015; GALINDO et al., 2012). Já em relação ao título, os cinco artigos trazem em destaque o tema da síndrome de Burnout, utilizando termos diversificados para referir-se a ela.
Também pelo título, nota-se que três das cinco pesquisas foram conduzidas em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). (VIEIRA et al., 2022; BARÃO et al., 2022; FREITAS et al., 2021) e as outras duas em hospitais, de modo geral (VALÉRIO et al., 2021; NASCIMENTO et al., 2022). Segundo a literatura levantada, a atividade laboral hospitalar é marcada pela presença de uma carga excessiva de trabalho, exposição a situações desafiadoras com níveis elevados de tensão e riscos. Em virtude das particularidades desse tipo de trabalho, as equipes médicas e de enfermagem estão mais propensas a desenvolver o estresse ocupacional. É importante destacar que o estresse tem um impacto significativo no desempenho dos médicos, enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem que atuam em setores críticos, em decorrência da sobrecarga física e mental (SILVA et al., 2015). Logo, justifica-se que os estudos realizados sobre Burnout sejam realizados com os sujeitos inseridos no ambiente hospitalar e em áreas críticas, como as UTIs.
Na tabela 2 tem-se informações sobre os sujeitos da pesquisa, local da pesquisa, ano da coleta, ano de publicação e instrumento utilizado. Pode-se ver que a maioria dos artigos contaram com a participação de enfermeiros e técnicos de enfermagem indistintamente. Isso ocorre pois já fora comprovado em produções anteriores que a categoria do profissional de enfermagem, seja ele auxiliar, técnico ou enfermeiro, não constitui fator preponderante para diferença nos índices da síndrome de Burnout, já que todos estão expostos ao mesmo ambiente. (FERREIRA; LUCCA, 2015; TAVARES et al., 2014; SILVA et al., 2015; GALINDO et al., 2012).
Outro ponto interessante observado na tabela 2 é que três dos cinco locais de pesquisa concentram-se na região Sudeste do país. Segundo Machado (2017) apud Silva e Machado (2020), é possível notar uma desigualdade na composição do mercado de trabalho da enfermagem em todo o país, pois há uma concentração desses profissionais na Região Sudeste, enquanto o Norte e o Nordeste sofrem com a escassez de profissionais qualificados. Além disso, há uma clara concentração nos grandes centros urbanos, principalmente nas capitais, onde mais da metade dos profissionais da área vivem e trabalham. Outra disparidade é que dentre os profissionais de enfermagem, 77% são técnicos e auxiliares e apenas 23% são enfermeiros.
Através da tabela 2 também se obtém que as pesquisas que correlacionam a síndrome de Burnout e a Covid-19 começaram a surgir logo no início da pandemia, em 2020, já que dois dos cinco artigos fizeram a coleta de dados em 2020 (VIEIRA et al., 2022; VALÉRIO et al., 2021). Entretanto, as publicações na área vieram somente em 2021 e 2022. Quanto aos instrumentos utilizados nas pesquisas, destacasse o Maslach Burnout Inventory (MBI), seja na versão normal ou na versão Human Services Survey (MBI-HSS), sendo utilizado em três das cinco pesquisas (VIEIRA et al., 2022; VALÉRIO et al., 2021; FREITAS et al., 2021). Este instrumento é amplamente utilizado nas pesquisas que visam avaliar a síndrome de Burnout.
Em resumo, o Maslach Burnout Inventory (MBI) é um instrumento de avaliação psicológica utilizado para medir o nível de Burnout ou esgotamento profissional em indivíduos que trabalham em áreas que envolvem alto estresse emocional, como na área da saúde, educação e assistência social. O MBI foi desenvolvido por Christina Maslach e Susan Jackson em 1981. É composto por um questionário que avalia três dimensões do esgotamento profissional: exaustão emocional, despersonalização e realização profissional. A exaustão emocional se refere ao sentimento de exaustão emocional e física relacionada ao trabalho; despersonalização é a falta de envolvimento emocional com pacientes ou colegas de trabalho e a realização profissional se refere ao sentimento de eficácia no trabalho. Os resultados obtidos no MBI podem ajudar a identificar indivíduos que estão sofrendo de Burnout e necessitam de suporte psicológico e intervenções para prevenir o agravamento da síndrome. (MASLACH; JACKSON, 1981).
Um dos objetos dessa revisão bibliográfica foi descrever os fatores de risco para o desenvolvimento da Síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem durante a pandemia de Covid-19. A tabela 3 indica as três categorias de fatores de risco encontradas por meio da análise de conteúdo dos cinco artigos que compõem a revisão (VIEIRA et al., 2022; VALÉRIO et al., 2021; BARÃO et al., 2022; FREITAS et al., 2021; NASCIMENTO et al., 2022). A primeira categoria é a dupla jornada e refere-se à grande parte dos profissionais da enfermagem que possuem mais de um vínculo empregatício devido à baixa remuneração e divisão do trabalho em turnos. Essa categoria foi constatada nos estudos de Freitas et al. (2021) e Nascimento et al. (2022).
Em Freitas et al. (2021), os autores destacam que algumas características ocupacionais estão associadas ao desenvolvimento da Síndrome de Burnout. Evidenciou-se que realizar hora extra e ter carga horária de trabalho considerada rígida estiveram associados à maior prevalência da Síndrome de Burnout na população em questão. Já em Nascimento et al. (2021), foi demonstrado que 69,7% dos participantes da pesquisa tinham mais de um vínculo empregatício e trabalhavam em média 43,76 horas semanais, o que poder estar correlacionado aos índices de Burnout. Pode-se observar que as longas jornadas de trabalho para garantir melhores salários acabam por afetar a saúde mental dos profissionais de enfermagem.
A má remuneração dos trabalhadores de enfermagem também foi tema da pesquisa de Machado (2017) apud Silva e Machado (2020), onde constatou-se que metade dos profissionais de enfermagem no Brasil estão em situação de precarização do trabalho, pois 62,5% têm salários de até 3 mil reais e 14,4% estão na condição de sub-salários (igual ou inferior a mil reais). Esse cenário da baixa remuneração aliado à divisão do trabalho em turnos, fazem com que os profissionais busquem por uma fonte de renda complementar, acarretando a dupla jornada.
A segunda categoria da tabela 3 trata do contexto da Covid-19 e as suas consequências para os profissionais da enfermagem. O próprio contexto pandêmico é considerado um fator de risco para o desenvolvimento da síndrome de Burnout nestes profissionais, uma vez que traz diversas consequências para a saúde física e mental deles, como o isolamento social, o afastamento dos entes queridos, o medo de contrair a doença e da sua evolução, a falta de insumos e/ou equipamentos, a sobrecarga emocional devido ao grande número de óbitos, o choque com o desconhecido, entre outros. Essa categoria pode ser constatada em todos os estudos da revisão bibliográfica aqui levantada. (VIEIRA et al., 2022; VALÉRIO et al., 2021; BARÃO et al., 2022; FREITAS et al., 2021; NASCIMENTO et al., 2022).
Sabe-se que os profissionais da saúde, de maneira geral, estão mais suscetíveis à fatores de riscos para o Burnout, devido à especificidade do contexto em que atuam, sobretudo na área hospitalar. Alguns destes riscos são: alta exposição a agentes químicos e físicos; falta de autonomia; sobrecarga quantitativa de trabalho (longas jornadas de trabalho, alto número de pacientes e recursos humanos insuficiente) e sobrecarga qualitativa de trabalho, isto é, o caráter emocional estressante relacionado ao cuidado (FERRARI; FRANÇA; MAGALHÃES, 2012; PERNICIOTTI et al., 2020; JARRUCHE; MUCCI, 2021). Na pandemia de Covid-19, esses fatores de risco se acentuaram e ainda surgiram outros.
Dentre os estudos revisados, Vieira et al. (2022) observaram que a percepção do impacto da pandemia na saúde física e mental e a percepção sobre a exposição à doença demonstraram interferir na saúde mental dos profissionais de enfermagem, sob a presença de distúrbios psíquicos menores e de alto desgaste emocional. Outrossim, o estudo conduzido por Valério et al. (2021) concluiu que a pandemia aumentou os riscos de Burnout na amostra de enfermeiros residentes.
Já a pesquisa de Barão et al. (2022) enfatizou as alterações psíquicas e emocionais de profissionais de enfermagem relacionados ao trabalho em uma UTI durante a pandemia. Os participantes do estudo relataram diversos sentimentos de esgotamento profissional: 34,8% dos participantes afirmaram sentir-se ocasionalmente esgotados, enquanto 25 36,2% referiram sentir-se frequentemente exaustos ao final da jornada de trabalho. Além disso, 34,8% relataram acordar ocasionalmente já se sentindo exaustos e 43,5% sentiram que poderiam ter feito mais pelos pacientes durante o período de trabalho. Além disso, o sofrimento no ambiente de trabalho foi mencionado por diversos indivíduos. Cerca de 53,6% dos profissionais referiram sentir medo com muita frequência após o diagnóstico de Covid-19, temendo que a doença evoluísse para sua forma mais grave. Além disso, 23,2% relataram evitar assistir noticiários sobre a pandemia. E 31,9% dos profissionais sofreram com a morte dos pacientes assistidos nas UTIs, causando grande impacto emocional.
Em Freitas et al. (2021), os resultados indicaram uma alta prevalência da síndrome de Burnout entre os técnicos de enfermagem que atuam em UTIs e estão na linha de frente no enfrentamento da pandemia da Covid-19. Além disso, fatores sociodemográficos, ocupacionais e comportamentais foram identificados como preditores da síndrome.
Já em Nascimento et al. (2022), foram identificados os sintomas físicos e psicológicos associados ao Burnout mais referidos pelos profissionais de enfermagem durante a pandemia. Dentre os sintomas físicos relacionados ao estresse, os mais frequentes foram: tensão muscular, mencionada por 10,1% dos participantes; sensação de desgaste físico constante, relatada por 8,7%; problemas com a memória, apontados por 7,7%; cansaço constante, mencionado por 6,3%; e insônia, relatada também por 6,3% profissionais. No que se refere aos sintomas psicológicos, destacaram-se o cansaço excessivo, mencionado por 11,3% dos participantes; a angústia ou ansiedade diária, relatada por 8,1%; a sensibilidade emotiva excessiva, mencionada por 8,1%; a irritabilidade excessiva, relatada por 6,9%; e a irritabilidade sem causa aparente, relatada por 6,9% profissionais. Diante disso, podem ocorrer repercussões na instituição, como o aumento do absenteísmo, número de atestados e afastamentos dos profissionais.
Por fim, a terceira categoria da tabela 3 diz respeito aos achados que indicam o consumo de bebida alcoólica estando correlacionado à prevalência da síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem durante a pandemia de Covid-19. O uso abusivo de substâncias, como álcool, pode ser um mecanismo de fuga para esquecer do trabalho, ou buscar o prazer que não encontram nas atividades laborais, em decorrência dos problemas já mencionados. Em Freitas et al. (2021) a correlação entre etilismo e síndrome de Burnout foi atestada por uma análise estatística, na qual verificou-se a significância entre as duas variáveis. Já em Valério et al. (2021) não houve a validação estatística dessa correlação, mas analisou-se que os indivíduos que apresentavam a síndrome de Burnout apresentavam o consumo de bebida alcoólica mais elevado do que aqueles indivíduos sem a síndrome.
A fim de compreender a prevalência da síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem frente à pandemia de Covid-19, fez-se um levantamento dos índices de Burnout constatados nos cinco estudos desta revisão bibliográfica. Em Vieira et al. (2022), 11,1% dos trabalhadores apresentaram a síndrome. Em Valério et al. (2021) o percentual foi de 12,5%. Em Barão et al. (2022) os sentimentos psíquicos e emocionais associados ao esgotamento profissional ocorreram em 36,2% dos participantes do estudo. Em Freitas et al. (2021) observou-se uma prevalência da síndrome em 25,5% da amostra. Já em Nascimento et al. (2022), a prevalência do estresse ocupacional foi de 47% entre os profissionais de enfermagem.
Comparando esses dados com a literatura consultada anteriormente, têm-se que a prevalência da síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem aumentou consideravelmente durante a pandemia de Covid-19. Os cinco estudos da revisão (VIEIRA et al., 2022; VALÉRIO et al., 2021; BARÃO et al., 2022; FREITAS et al., 2021; NASCIMENTO et al., 2022) indicaram maiores índices de Burnout do que os estudos de Galindo et al. (2012) e Ferreira e Lucca (2015), ambos utilizando o instrumento Maslach Burnout Inventory (MBI) na metodologia e realizados em anos anteriores à pandemia. A pesquisa de Galindo et al. (2012) apontou que 4,7% da amostra apresentou Burnout. Já o estudo de Ferreira e Lucca (2015) demonstrou que 5,9% dos profissionais apresentavam a síndrome.
Em comparação ao estudo de Tavares et al. (2014), que visou identificar a ocorrência da síndrome de Burnout em residentes de enfermagem, anteriormente à pandemia, 20,83% apresentaram a síndrome de Burnout. Ainda sim, três dos cinco estudos da revisão (BARÃO et al., 2022; FREITAS et al., 2021; NASCIMENTO et al., 2022) apresentaram índices maiores que este. Além disso, deve-se considerar que a abrangência dessa pesquisa foi apenas com profissionais enfermeiros residentes, diferenciando-se da maioria dos estudos desta revisão, que contaram com a participação de técnicos de enfermagem e enfermeiros.
Por fim, a pesquisa de Silva et al. (2015), realizada com 130 profissionais de enfermagem que trabalhavam em unidades de terapia intensiva de hospitais de grande porte, constatou a prevalência de síndrome de Burnout em 55,3% dos participantes, utilizando o Inventário de Burnout de Maslach (MBI-HSS). Este foi o único estudo da literatura consultada que contradiz os achados em relação ao aumento da prevalência da síndrome de Burnout em profissionais de enfermagem durante a pandemia de Covid-19. Entretanto, ele não anula as proposições aqui expostas, já que não representa a maioria da produção científica da área, anterior ao período pandêmico.
CONCLUSÃO
Por meio da presente revisão bibliográfica, fica evidente que a prevalência da síndrome de Burnout em profissionais da enfermagem aumentou consideravelmente durante a pandemia de Covid-19. Através dos resultados apresentados, nota-se que esses trabalhadores estão suscetíveis a fatores de riscos para o Burnout, devido à especificidade do contexto em que atuam, sobretudo na área hospitalar. O contexto pandêmico acentuou tais fatores e trouxe diversas consequências para a saúde física e mental dos profissionais de enfermagem, como o isolamento social, o afastamento dos entes queridos, o medo de contrair a doença e da sua evolução, a falta de insumos e/ou equipamentos, a sobrecarga emocional devido ao grande número de óbitos, o choque com o desconhecido, entre outros.
Espera-se que este estudo seja um objeto de reflexão importante para os profissionais de enfermagem, alertando sobre as causas da síndrome de Burnout. Ademais, é essencial que sejam elaboradas ações específicas voltadas para mudanças no ambiente de trabalho, a fim de minimizar os danos à saúde, reduzir o estresse no trabalho e melhorar a qualidade dos serviços prestados. Para isso, atividades preventivas de estresse crônico devem ser executadas no ambiente de trabalho, com a participação de equipes multidisciplinares, buscando resgatar a afetividade e um ambiente agradável de trabalho.
Tais atividades podem prevenir novos casos da síndrome de Burnout, bem como recuperar aqueles que já foram afetados. Além disso, deve buscar-se promover condições de vida e trabalho saudáveis, de modo a garantir a saúde física e mental dos trabalhadores. Portanto, é crucial buscar e desenvolver atitudes que visem à transformação organizacional, de forma que o trabalho não contribua para o desgaste e o adoecimento, mas sim para a saúde como um todo.
O estudo apresentou algumas limitações, como um baixo número de estudos empíricos encontrados sobre a temática. É de interesse geral que essa pesquisa seja replicada no futuro, a fim de verificar-se o surgimento de novos estudos sobre o tema.
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