MORTE NA ÓTICA DA PERÍCIA CRIMINAL: CONCEITOS, PROCESSOS, DIAGNÓSTICO E IDENTIFICAÇÃO DE CORPOS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248291630


Fabia Demarqui Albertoni Volpe
Orientador: Profa. Dra. Thaiz Ferraz Borin


RESUMO

Após a cessação da vida, na perícia criminal o que realmente importa são os efeitos e fatos consequentes da morte no corpo. No entanto, é necessário entender que a morte é o resultado gradativo de fenômenos que acontecem em vários órgãos e sistemas de manutenção da vida. Deste modo, neste estudo, fizemos uma revisão de literatura sobre a Tanatognose, que auxilia no entendimento sobre os diagnósticos da realidade da morte, destacando o papel dos perítos na consideração destes sinais de modo a compreender a cronologia da morte e desvendar sua data aproximada. Como metodologia utilizamos artigos científicos e livros de literatura específica, disponíveis em bibliotecas físicas e digitais, nos últimos 30 anos. E destacamos, os fenômenos abióticos, subdivididos em imediatos e consecutivos. Os fenômenos transformativos, que compreendem os destrutivos (autólise, putrefação e maceração) e os conservadores (mumificação e saponificação). Como também na cronotanatognose, o processo de estimativa e cálculo do tempo da morte de acordo com parâmetros da decomposição do corpo. Ressaltamos ainda, o papel da perícia criminal na investigação sobre a morte e os principios éticos envolvidos na perícia e na formação desse profissional.

Palavras-chave: Mudanças Postmortem. Perícia Forense. Tanagnose. Sinais Cadavéricos.

ABSTRACT

After the cessation of life, in criminal expertise what really matters are the effects and consequent facts of death on the body. However, it is necessary to understand that death is a result of a gradual phenomenon that occur in various organs and life-sustaining systems. Therefore, in this study, we carried out a literature review on thanatognosis, which helps in understanding the diagnoses of the reality of death, highlighting the role of experts in considering its signs in order to understand the chronology of death and unveil its approximate date. As a methodology, we used scientific articles and books of this specific literature, available in physical and digital libraries, in the last 30 years. Thus, we highlight the abiotic phenomena, subdivided into immediate and consecutive. Transformative phenomena, which include the destructives (autolysis, putrefaction and maceration) and the conservatives (mummification and saponification). As well as chronothanatognosis, the process of estimating and calculating the time of death according to parameters of the body’s decomposition. We also called attention to the role of criminal expertise in investigating death and the ethical principles involved in the expertise and training of this professional.

Keywords: Postmortem Changes; Forensics; Thanatology; Tanagnosis; Cadaveric Signs.

1. Introdução

Várias vezes, as coisas mais simples e óbvias, são as mais difíceis de conceituar, definir e compreender. Tal é o que acontece com a morte. Tão difícil é definí-la, quanto conceituar sua antítese, a própria vida. A morte pode ser caracterizada como o fim da condição humana e das funções vitais, sociais e psíquicas do ser e como um dado essencial da existência humana. A morte é justamente esse fim que não tem mais começo, esse término definitivo. É a possibilidade humana que finda todas as outras (Gonçalves, 2007).

Para constatar a cessação da vida, a morte como elemento definidor de o fim de um ser vivo, não pode ser explicada pela parada ou falência de um único órgão. É necessária uma seqüência de fenômenos gradativamente processados, nos vários órgãos e sistemas de manutenção do organismo, sendo assim, a morte não é um momento, mas sim um processo como um todo (Lima, 2005).  

O conceito de morte, interessando a áreas tão diversas das ciências biológicas, jurídicas e sociais, está longe de ter um consenso quanto ao momento real de sua ocorrência. É que a morte, observada desde o ponto de vista biológico, e visando-se para o corpo em sua totalidade, não é um fato único e instantâneo, antes o resultado de uma série de processos, de uma transição gradual (França, 2012).

Na Tanatologia preocupa-se com a morte e o morto em todos os seus aspectos médico-legais, os fenômenos cadavéricos, a data da morte, o diagnóstico da morte, a morte súbita e a morte agônica, a inumação, a exumação, a necropsia, o embalsamento e a causa jurídica da morte (Figueiredo, 2020).

1.1 Justificativa

É imprescindível o conhecimento do mecanismo da morte e pós-morten, a diferenciação de morte natural, morte violenta e morte duvidosa, os fenômenos que sucedem tal fato, devem ser conhecidos além do médico legista, por todos profissionais que participam da investigação criminal, e também advogados e juízes que vão receber os relatórios da autópsia e que tem que ter um entendimento preciso sobre a seqüência fenomenológica da evolução do cadáver e da terminologia médico-legal empregue para descrever, sob pena de fazerem interpretações erradas.

2. Objetivos

2.1 Geral

 Este trabalho tem por finalidade demonstrar os vários conceitos sobre a morte; a cessação da vida; diagnóstico da realidade da morte, formas de morte, além dos sinais visíveis da morte como, os sinais abióticos, as provas: circulatória e respiratória; mecanismos da morte; sinais microscópicos e macroscópicos; fenômenos cadavéricos e transformativos.

2.2 Específicos

Identificando criteriosamente esses processos por meio da ótica da perícia criminal, que serão apresentados e discutidos no decorrer deste trabalho.

3. Metodologia para Pesquisa

Como metodologia de pesquisa utilizamos uma revisão de literatura que consistiu em uma busca de livors e artigos científicos de revisão de literatura específica, disponíveis em bibliotecas físicas e digitais como, pubmed, biblioteca virtual em Saúde (bireme), scielo, teses.usp e universidades locais, buscando os descritores: Mudanças Postmortem; Perícia Forense; Tanatologia; Tanagnose; Sinais Cadavéricos.

 Foram critérios de exclusão do estudo, artigos publicados em outras línguas que não fossem português, inglês ou espanhol; que não fossem publicados na íntegra, que não estivessem disponíveis gratuitamente no momento da busca do estudo; ou ainda, os que não tratassem da temática específica do estudo e aqueles que ultrapassassem o período de publicação limite de até 30 anos (1994-2024).

4. Revisão de Literatura

Foram levantados 367 artigos de revisão de literatura usando os descritores de busca já citados. Delimitando o período de anos de publicação obtivemos ainda 329 artigos. Excluindo artigos não publicados na íntegra (72), indisponíveis gratuitamente (188) e em línguas não especificadas na metodologia (25), obtivemos 40 artigos. Desses, somente 23 artigos estavam relacionados com a especificidade do tema, em que desenvolveremos a seguir.

4.1 Diagnóstico da Realidade da Morte

Á princípio para se diagnosticar a realidade da morte é necessário saber a diferença entre morte real e morte aparente. Distinguir quanto à temporalidade, causa e mecanismos da morte. Identificar as provas de cessação da vida, fenômenos cadavéricos, transformativos, destrutivos e conservadores. E, por fim, reconhecer a tanatocronologia ¨post-mortem¨ e o papel da perícia criminal na tanatologia e seus principios éticos.

4.2 Morte Aparente

A morte aparente pode ser definida como um estado transitório em que as funções vitais “aparentemente” estão abolidas, em conseqüência de uma doença ou entidade mórbida que simula a morte. Nestes casos que, também podem ser provocados por acidentes ou pelo uso abusivo de substâncias depressoras do sistema nervoso central (SNC), a temperatura corporal pode cair sensivelmente e ocorrer um rebaixamento das funções cardio-respiratórias de tal envergadura que ofereçam, ao simples exame clínico, a aparência de morte real (Thoinot, 1913 apud Vanrell, 2016).

É claro que neste quadro, a vida continua sem que, se manifestem sinais externos: os batimentos cardíacos são imperceptíveis, os movimentos respiratórios praticamente não são apreciáveis, ao tempo que inexistem elementos de motricidade e de sensibilidade cutânea. Assim, a denominada tríade de Thoinot define, clinicamente, o estado de morte aparente: imobilidade, ausência aparente da respiração e ausência de circulação (Vanrell, 2016).

A causalidade permite distinguir as seguintes formas de morte aparente segundo Scigliano et al (1989, apud Vanrell, 2016).

Sincopal: É a mais freqüente das causas, resultando, em geral, de uma perturbação cardiovascular central e/ou periférica, bem como por perturbações encefálicas e/ou metabólicas (Rodrigues et al., 2008).

Histérica: (Letargia e Catalepsia). As crises histéricas ocupam o segundo lugar em freqüência na produção de estados de morte aparente. O termo genérico letargia designa todos os estados de sopor de longa duração, acompanhados de perda de movimentos, sensibilidade e consciência, que podem ser confundidos com a morte real.

Asfíctica: É também uma das causas assaz freqüente de morte aparente. Manifesta-se sob duas formas: mecânica, quer com via aérea livre, quer com via obstruída, e não mecânica, asfixia de utilização ou histotóxica (absorção de CO2, cianuretos e venenos meta-hemoglobinizantes).

Tóxica: Compreende a anestesia e a utilização de morfina ou outros alcalóides do ópio (heroína) em doses tóxicas.

Apopléctica: É causada pela congestão (ingurgitação) e hemorragia no território de uma artéria encefálica (em geral a lentículo-estriatal). É mais freqüente em pacientes com antecedentes de hipertensão arterial essencial, mas também pode observar-se em outros quadros:

Traumática Que ocorre em casos em que se produzem outros efeitos gerais simultâneos, como:

Elétrica (por eletroplessão ou fulguração): Pode ser observada nos atingidos por descargas de eletricidade comercial e que sobrevivem, quedando em um estado de morte aparente. A mesma coisa pode ser vista em pessoas afetadas pela indução de descargas de eletricidade natural (quero-aurántica) – fulguração – em uma área de 30 a 60 metros de diâmetro, em torno do ponto da faísca.

Térmica (termopatias e criopatias): A morte aparente, nestes casos, sobrevem quando falham os mecanismos de regulação da temperatura corporal decorrentes de um desequilíbrio no nível de combustão intraorgânica. As termopatias soem ocorrer nos casos de “golpes de calor” hipertérmicos ou de hiperpirexia, com retenção calórica. É uma ocorrência mais freqüente no verão ou em regiões com altas temperaturas e elevada taxa de umidade relativa ambiente, em pessoas com patologias pré-existentes ou sem elas, velhos e crianças, mais sensíveis ao calor. Também podem observar-se com freqüência em certas atividades ou profissões submetidas à intermação (mineiros, foguistas, caldeireiros, cozinheiros etc.) e na intoxicação anfetamínica.

A morte aparente por criopatia ocorre quando há hipotermia global aguda. Observa-se com freqüência em ébrios que dormem ao relento, nos quais a vasodilatação periférica aumenta a perda calórica, facilitando a hipotermia; também nas crianças desabrigadas na época invernal; nos acidentes com queda das vítimas ao mar (pilotos, náufragos); e até por causa iatrogênica (transfusões de sangue frio). O estado de morte aparente pode instalar-se quando a temperatura central diminui abaixo dos 32ºC (Keatinge, 2002).

A morte aparente pode ainda ser observada em algumas formas terminais de cólera, na eclampsia durante o período comatoso, e em algumas formas de epilepsia (Brophy et al., 2012).

4.3 Morte Real

Até não muito tempo, uma das grandes questões era poder determinar se uma pessoa, realmente, estava morta ou se, se encontrava em um estado de morte aparente. Tudo isto visando evitar a inumação precipitada, que seria fatal nesta última situação. O fato assumiu tal importância que chegou a influenciar aos legisladores que acabaram por colocar, na legislação adjetiva civil, prazos mínimos para a implementação de certos procedimentos como a necropsia e o sepultamento (São Paulo, 2013).

O aparecimento das modernas técnicas de ressuscitação e de manutenção artificial de algumas funções vitais como a respiração com uso de respiradores mecânicos, oxigenadores; e na circulação com uso de bomba de circulação extracorpórea, mesmo na vigência da perda total e irreversível da atividade encefálica, criou a necessidade de rever e readaptar os critérios de morte (Schlesinger et al., 2023).

A morte não pode ser definida apenas pela falência de um único órgão, por mais vital que seja. É um processo gradual que envolve a cessação de funções em múltiplos sistemas e órgãos do corpo. Sendo assim, não se trata de um evento pontual, mas sim de um processo em que ocorre a perda irreversível das funções vitais de forma progressiva, nao podendo ser determinada somente pela parada de um único sistema isolado, como o cérebro ou o coração. É necessário avaliar o organismo como um todo e constatar que o processo tornou-se irreversível, com a falência permanente das funções integradas que sustentam a vida (Santos, 2011). A definição de morte encefálica, por exemplo, leva em conta não apenas a ausência de atividade cerebral, mas também a perda definitiva de outras funções vitais como a respiração espontânea e os reflexos de tronco cerebral (Westphal, 2019).

A morte encefálica é um estado clínico irreversível no qual as funções cerebrais (telencéfalo e diencéfalo) e do tronco encefálico estão definitivamente comprometidas. Para defini-la, são necessários três pré-requisitos, como a presença de coma de causa conhecida e irreversível; ausência de hipotermia, hipotensão ou distúrbio metabólico grave; e exclusão de intoxicação exógena ou efeito de medicamentos psicotrópicos. O diagnóstico baseia-se na presença simultânea de coma sem resposta a estímulos externos, ausência de reflexos do tronco encefálico e apneia. O diagnóstico é confirmado após dois exames clínicos, realizados com um intervalo mínimo de seis horas entre eles, por profissionais diferentes e não vinculados à equipe de transplantes. É obrigatória a comprovação, por meio de exames complementares, da ausência de perfusão, atividade elétrica ou metabolismo no sistema nervoso central por meio de eletroencéfalograma (EEG). A morte encefálica é considerada morte tanto legal quanto cientificamente. É essencial que todo profissional de saúde, especialmente os médicos, compreenda o conceito de morte encefálica, para que o uso da tecnologia na sustentação da vida seja benéfico, individual e socialmente responsável, evitando intervenções inadequadas, extensão do sofrimento e angústia familiar, e o prolongamento inútil e artificial da vida (Westphal, 2019).

4.4 Temporalidade da Morte

Quanto à rapidez da morte, esta pode ser classificada como morte rápida ou lenta.

Morte Rápida:

Muita polêmica tem sido criada em torno da valoração da duração do período premortal, isto é, do lapso transcorrido entre a ação da causa desencadeante e a morte propriamente dita (Pinheiro, 2024).

Denomina-se morte rápida ou súbita aquela que, pela brevidade de instalação do processo – desde segundos até horas – não possibilita que seja realizada uma pesquisa profunda e uma observação acurada da sintomatologia clínica, hábil a ensejar um diagnóstico com certeza e segurança, nem poder instituir um tratamento adequado e, muitas vezes, sequer elidir se houve ou não violência (Pinheiro, 2024).

Morte Lenta:

Recebe o nome de morte lenta ou agônica aquela que, em geral, vem de maneira esperada, devagar, significando a culminação de um estado mórbido, isto é, de uma doença ou da evolução de um traumatismo (Pais et al., 2019).

Afora as características e dados que eventualmente aflorem do exame Peri necroscópico, alguns dos quais podem apontar para morte rápida – como, e. g. espasmo cadavérico – outros também podem orientar no sentido de uma morte lenta, demorada, ponto final de uma longa agonia, tal o caso da emaciação, da caquexia, da presença de extensas escaras de apoio, entre outros (Pais et al., 2019).

Contudo, desde o ponto de vista médico-legal, e em persistindo dúvidas, o diagnóstico diferencial entre morte rápida e morte lenta, se baseia em docimasias químicas ou histoquímicas, isto é, na pesquisa do glicogênio e da glicose no fígado, e na constatação da adrenalina ou do pigmento feocrômico nas supra-renais. As várias provas que existem em tal sentido se embasam no maior consumo ou gasto de citadas substâncias durante o demorado processo agônico, gasto este que se não observa, dada a rapidez do processo, na morte súbita (Pais et al., 2019).

4.5 Causalidade da Morte

Quanto à Causa de morte podemos classificar em três principais conceitos como, Morte Natural;  Morte Violenta, no qual inclui mortes por homicídio, suicídio e acidente; e, por fim, Morte Duvidosa, que pode ser subclassificada como: Morte Súbita, Sem Assistência e Morte Suspeita (descritas a seguir).

4.5.1 Morte Natural

É aquela que sobrevem como conseqüência de um processo esperado e previsível como, por exemplo, com o decorrer do tempo, quando é de se prever que o envelhecimento natural, com o esgotamento progressivo das funções orgânicas, que se acompanham de processos de involução, esclerose e atrofia de órgãos e sistemas, levará à extinção da vida (Figueiredo, 2020).

Em outros casos, o óbito é um corolário de uma doença interna, aguda ou crônica, a qual pode ter acontecido e transcorrido sem a intervenção de qualquer fator externo ou exógeno. É evidente que, “strictu senso”, a causa do óbito não é “natural” e sim patológica, isto é, como conseqüência de uma doença ou de uma degeneração. Todavia, o uso habitual do termo, considera este tipo de morte como “natural”, uma vez que tanto a sua causa, quanto o seu desenlace, soem ocorrer de forma espontânea, como evolução natural e previsível do processo mórbido (Michaud et al 2014).

4.5.2 Morte Violenta

No extremo diametralmente oposto das mortes naturais, encontramos as mortes de causa violenta: homicídios, suicídios e acidentes. Nestes casos, muito embora a causa final do decesso possa ser previsível, a gênese do processo não é a causa primeira da morte. Por exemplo, em casos de morte por anemia aguda decorrente de uma hemorragia fulminante traumática por lesão de grandes vasos do pescoço. Neste caso, por existir o fator violência, ou seja, uso intencional de força física ou poder, definição de violência segundo ONU), isto é, um fenômeno no qual, de uma ou outra forma (intencional ou não), interveio a força como causa desencadeante da morte (Croce et al, 2012).

Estas são também denominadas mortes médico-legais, porquanto no seu estudo e apreciação, deve mediar a intervenção médica e judicial, ambas agindo em benefício da segurança coletiva e como tutela dos bens jurídicos da sociedade.

A necropsia nos casos de morte violenta é obrigatória por força de lei; todavia, fica a critério do peritus, diante de uma morte violenta, quando não houver infração penal que apurar, ou se as lesões externas permitirem precisar as causae mortis e não houver necessidade de exame visceral para a verificação de alguma causa relevante, fazer o exame interno do de cujus, conforme se depreende da leitura do parágrafo único do art. 162 do Código de Processo Penal. Não será enfadoso lembrar que: a) é obrigatória a necropsia quando a morte resultou de acidente do trabalho; b) a mesma somente será paga quando realizada por médico não legista, fora dos Institutos de Medicina Legal; c) diante de uma consulta médico-legal uma necropsia jamais poderá ser repetida ou recomeçada. Havendo necessidade de exames de laboratório, a este serão encaminhados o material colhido (do qual se guardará quantidade suficiente para a eventualidade de nova perícia, cf. o art. 170 do CPP), os objetos e as pessoas para serem examinados (Brasil, 2016).

4.5.3 Morte Duvidosa: Morte Súbita

Denomina-se morte súbita aquela que, pela brevidade de instalação do processo – desde segundos até horas – não possibilita que seja realizada uma pesquisa profunda e uma observação clínica mais demorada, hábil a ensejar um diagnóstico com certeza e segurança. Tampouco oferece chances para poder instituir um tratamento adequado e, é por isso que toma ao paciente, sua família e relações, de surpresa. O termo morte súbita tem uma dupla conotação: objetiva, a rapidez com que ocorre o óbito; e, subjetiva, caráter inesperado, inopinado, com que se dá o decesso (Abreu et al., 1999).

            Assim, existem três critérios hábeis para definir uma morte como inopinada, a saber:

1) período pré-mortal – ou seja a rapidez entre a causa desencadeante e o óbito – estimado de minutos a horas é aquele que, por sua brevidade, não permite identificar uma sintomatologia clínica utilizável para um diagnóstico seguro, nem realizar um tratamento de acordo ou descartar uma violência. 2) Estado de saúde prévio ou curso de uma doença não grave, incapaz de levar ao óbito em prazo breve. A morte, assim, é inesperada. O “inopinado” do fato é o que levanta a dúvida. 3) Aspecto de morte natural, sem elementos de violência aparentes (Abreu et al., 1999).

Destarte, a morte súbita ou inesperada, implica na morte de um sujeito em bom estado de saúde aparente, com agonia breve e que, pelo seu caráter inopinado, desperta dúvidas médico-legais quanto à sua causa jurídica.

Como se vê, pois, a morte pode ser súbita, mas esperada, isto é, pode encontrar-se dentro das previsões de quem conhecesse o real estado de alguma patologia da qual a vítima fosse portadora, por exemplo, uma pessoa com uma úlcera péptica não tratada, que se perfura causando hemorragia fulminante. Tal caso, muito embora possa ser rotulado de morte súbita, também foge, completamente, da alçada médico-legal (Reis et al., 2006).

Todavia, se a patologia do paciente fosse desconhecida pelos seus familiares, então, essa morte súbita deixa de ser um fato previsível, esperado pelas relações, para transformar-se em um fato inesperado e inexplicável que, destarte, tornará a morte suspeita para eles, exigindo – (o que seria totalmente prescindível e desnecessário) – a intervenção do médico legista (Reis et al., 2006).

É evidente que a conotação de inesperado ou inexplicável de um óbito, é diferente para os populares leigos, que para o médico assistente. Com efeito, eis que para este último, a morte, em que pesem os tratamentos instituídos, pode acontecer em questão de umas poucas horas, face a gravidade do quadro. Assim, para a família, esta morte poderá ser súbita e inesperada, não assim para o médico assistente, para quem o decesso poderia ser esperado e, muito embora ocorrido em curto lapso, isto é, de forma rápida, não será súbito (Reis et al., 2006).

Em algumas condições, pois, proceder-se-á à perícia médico-legal da qual poderá resultar o diagnóstico final sob a forma de uma das seguintes hipóteses (segundo Pinheiro, 2024):

Causa certa da Morte: Quando os achados da necrópsia são absolutamente incompatíveis com a vida (por exemplo: ruptura de aneurisma de aorta).

Causa Sugestiva da Morte: Os achados da necrópsia não são, necessariamente, incompatíveis com a vida, mas, na ausência de outros dados, explicam o óbito (por exemplo: hipertrofia concêntrica do miocárdio, pneumonia lobar).

Causa Compatível com a Morte: Decorre mais da análise das informações clínicas colhidas na anamnese familiar, existindo ou não achados da necrópsia ou nos exames complementares que possam ser correlacionados com os dados obtidos sobre a doença (por exemplo: um paciente com epilepsia, no qual, eventualmente poderá ser encontrado um tumor cerebral compatível com o óbito).

Causa Indeterminada da Morte: São aqueles casos em que, nem as informação colhidas, nem os achados da necrópsia, apontam para uma causa provável que determinara a morte. Daí que se diga que a morte resultou de causa indeterminada. Corresponde as denominadas coloquialmente de autópsias brancas.

Causa Violenta da Morte: Quando os achados da necrópsia, realizada em um suposto caso de morte natural súbita e inesperada demonstram que, mesmo na ausência de dados de anamnese ou de sinais externos de violência, o exame necroscópico acaba revelando uma causa violenta.

4.5.4 Morte Duvidosa: Morte sem Assistência

As maiores dúvidas que suscita este tipo de óbito se relacionam com o fato de ocorrer sem testemunhas, em locais isolados ou em pessoas que moram sozinhas ou, pelo menos, que no momento da morte não havia ninguém na residência, e que tampouco procuraram por auxílio (Brasil, 2011a).

Nestas circunstâncias, não há qualquer orientação diagnóstica e via de conseqüência deverá proceder-se à necrópsia como forma possível de determinar a “causa mortis”, tanto médica quanto jurídica, elucidando se, se trata de morte de causa natural ou foi produzida mediante violência (Brasil, 2011a).

Por estas razões, a medida mais correta, é proceder ao exame necroscópico, incluindo o exame toxicológico das vísceras, desde que nenhuma outra causa de morte natural exsurja, quer da perinecroscopia, quer da própria necrópsia (Brasil, 2011a).

4.5.5 Morte Duvidosa: Morte Suspeita

Rotula-se como morte suspeita aquela que, mesmo com testemunhas, e com alguns dados de orientação diagnóstica, se mostra duvidosa quanto à sua origem, logo desde a investigação policial sumária, quer por atitudes estranhas do meio, quer por indícios que impedem descartar de plano a violência (possibilidade de intoxicação, presença de ferimentos etc.) (França, 2012).

Sua freqüência é bastante elevada, e de acordo com estatística realizada na Cidade de São Paulo, onde foi observada uma incidência da ordem de 69,41 % de mortes de causa natural definida e de 18,53 % de mortes de causa violenta, sendo que os restantes 12,06 % são casos de morte de causa indeterminada (Santo, 2008).

A necrópsia deve ser precedida da colheita de informações, anamnese familiar, exame das vestes e dos documentos, onde podem encontrar-se dados de valor diagnóstico (por exemplo, carta de suicídio, bilhetes anônimos, contas a pagar etc.) que ajudam a orientar se estamos em presença de um caso de morte súbita, de causa natural ou violenta (Mendo, 2019).

Esta diagnose da “causa mortis” – natural ou violenta -, em nosso meio, tanto mais se aproximará da realidade quanto maior seja o número de informações que se possam coligir no exame necroscópico “lato sensu” e que implicam no exame do estado das vestes, os vestígios de cabelos ou pelos, as manchas de líquidos e secreções humanas (sangue, esperma, saliva), o exame das lesões corporais mínimas (escoriações em volta do pescoço, narinas e boca, petéquias palpebrais ou subconjuntivais, lesões peri ou intravaginais ou anais), a minudente autópsia acompanhada, conforme o caso, de exames toxicológicos (dosagem alcoólica, venenos nas vísceras e secreções), seguida dos exames microscópicos ou outros exames complementares, incluindo a pesquisa de reação vital, macro e microscópica, nas lesões (Mendo, 2019).

Mecanismos da Morte

É a seqüência, de alterações fisiopatológicas, ou de desequilíbrios bioquímicos, que são desencadeados pela causa da morte (“Causa Mortis”) e que se tornam incompatíveis com a vida. Ou seja, a “causa mortis” é um termo referido à causa médica, válida e plausível dos mecanismos da morte que se manifestaram das formas mais variadas e que ao final e fatalmente, alcançaram como denominador comum a morte de um indivíduo (Mendo, 2019). Entre essas causas mais comuns estão as entidades nosológicas básicas, descritas como: Anemia Aguda; Asfixia; Assistolia/Fibrilação Ventricular; Choque Metabólico; Choque Toxêmico; Choque Traumático-neurogênico; Depressão ou Paralisia Respiratória; Envenenamento; Síncope; Traumatismo Crânio-Encefálico (TCE); entre outros (França, 2012; Croce et al., 2012).

Havendo a necessidade de esclarecer a “causa mortis” do ponto de vista juridico, com o intuito de explicar um crime oculto, há como prioridade o esclarecimento da “causa mortis” primeiro do ponto de vista patológico/natural para então reunir provas criminais que desvendem casos de “causa mortis” Jurídica (de causa violenta), como: Homicídio (Morte de um indivíduo em mãos de outro, em forma dolosa, culposa ou preterintencional); Suicídio (Morte de um indivíduo pelas lesões que se auto-inflige com o objetivo de por fim a sua vida); Acidente (quando causado um indivíduo por causas fortuitas e não previsíveis, ou que, em sendo previsíveis, não o foram por ignorância, negligência ou imprudência, isto é, por culpa) (França, 2012; Croce et al., 2012; Mendo, 2019).

Além da “causa mortis” no estudo dos mecanismos da morte, faz-se a comparação das características “intra-vitam” e “post-mortem”, cada vez mais utilizada para a identificação cadavérica e também para saber se alterações extra e intra corporais ocorreram antes ou depois da morte, o que pode ser crucial para esclarecer uma sequência de fatos (Dresseno, 2017). Dentre as lesões “intra vitam” e “post mortem” estão considerados os seguintes sinais: Reação vital; Sinais macroscópicos; Hemorragia; Coagulação sangüínea; Retração de tecidos; Reação inflamatória; Reação vascular; eritema e flictenas; arborescências de Lichtenberg, nas descargas de eletricidade natural; marcas de Jellinek, nas descargas de eletricidade industrial; Miscelânea; cogumelo de espuma; fuligem nas vias respiratórias ou aspiração de materiais; embolias gordurosas e gasosas; bossas linfáticas; CO no sangue; espasmo cadavérico; Provas microscópicas: pelo afluxo de leucócitos (Verderau), pela histoquímica (Raekallio), pela ferritina em gânglio linfático regional, entre outros (França, 2012; Croce et al., 2012; Dresseno, 2017).

Provas de Cessação da Vida

O diagnóstico da morte não é subjetivo, mas se baseia no estudo de uma série de fenômenos objetivos, que podem ser imediatos ou não, que ocorrem no corpo. Estes fenômenos podem ser, esquematicamente, divididos em dois grandes grupos, a saber (Brasil, 2006):

a) Sinais de cessação da vida ou sinais abióticos ou vitais negativos, que aparecem imediatamente após a morte antes do surgimento dos fenômenos transformativos do cadáver, como: Ausência de batimentos cardíacos e respiração; Perda de tônus muscular; arrefecimento do corpo; Desaparecimento de reflexos; Midríase paralítica; entre outros.

b) Sinais positivos de morte ou fenômenos cadavéricos, que são sinais destrutivos, consecutivos, transformativos e/ou conservadores que ocorrem posteriormente a morte, como: Rigidez cadavérica; Livores; Desidratação; Putrefação; Mumificação; entre outros.

4.7.1 Sinais Abióticos:

É com base nos critérios reais da morte que são estabelecidas as provas cruciais, por meio de testes circulatórios, respiratórios, químicos, dinamoscópicos e neurológicos, descritos a seguir: 

Provas Circulatórias:

Baseiam-se na pesquisa da parada circulatória: pela ausculta (Bouchut), pelo fundo de olho, pela oscilação de uma agulha implantada no coração (Middeldorff), pela cianose ao ligar um dedo (Magnus); pela falta de batimentos na radioscopia de tórax (Piga), pelo eletrocardiograma (Guérin e Fache), pela sucção com ventosa escarificada (Boudimir e Lavasseur), pela hiperemia conjuntival pelo éter (Halluin) ou pela dionina (Terson), pelo não aprecimento de flictena pela aproximação de uma chama (Ott), pela não disctribuição da fluoresceína injetada intravenosa (Icard), pela perda da turgência dos globos oculares (Stenon-Louis), pela medição da radioatividade no “clearance” de Xe133 na córtex cerebral (Antonucci et al., 2023). 

Provas Respiratórias:

Baseiam-se na pesquisa da parada respiratória: pela ausência de murmúrio vesicular na ausculta, pela ausência de mobilidade de uma superfície líquida, pela ausência de embaçamento de um espelho colocado na frente da boca ou narinas (Winslow) (Antonucci et al., 2023).

Provas Químicas:

Baseiam-se na pesquisa de substâncias ou modificações que se originam das fases iniciais da decomposição cadavérica: pela eliminação de ácido sulfídrico gasoso (Icard), pela oxidação ou fosqueamento de uma agulha de metal (Cloquet-Laborde), pela aumento da acidez tecidual (Ascarelli, Silvio Rebello, Lecha-Marzo, De Dominicis) (Antonio, 2016; Antonucci et al., 2023).

Provas Dinamoscópicas:

Baseiam-se na ausência de movimentos ou respostas dinâmicas de defesa: pela ausência de vibração pulsátil (Collongest), pela falta de reação à injeção subcutânea de éter (Rebouillat), deformação persistente da pupila pela compressão ocular (Ripauld), aproximação de uma haste quente na planta do pé (Lancisi), “mancha negra da esclerótica” (“livor scleroticae nigrescens”, de Sommer e Larcher), pela ausência de contração muscular ao choque elétrico (Roger e Beis) (Antonio, 2016; Antonucci et al., 2023).

Provas Neurológicas:

Baseiam-se na ausência de atividade cerebral: Assim sendo a morte cerebral pode considerar-se, justamente, como o ponto de irreversibilidade, porquanto ao se perderem, de forma definitiva, as funções cerebrais o indivíduo deixa de possuir aquilo que o caracteriza como ser humano, qual seja a atividade psíquica (Antonio, 2016; Antonucci et al., 2023).

Fenômenos Cadavéricos

Os fenômenos cadavéricos abióticos (ou avitais) são classificados em imediatos e consecutivos. Os fenômenos abióticos imediatos não confirmam o óbito, uma vez que em certos casos eles podem ser revertidos por meio de manobras terapêuticas emergenciais. Por outro lado, os fenômenos consecutivos indicam o óbito, mas a presença de alguns sinais isoladamente não possui valor absoluto (Bessa et al., 2020).

Fenômenos Abióticos Imediatos:

Os sinais abióticos imediatos que sugerem a morte, são: parada cardio-respiratória, inconsciência, imobilidade, insensensibilidade, palidez, midríase ou dilatação pupilar, abolição do tônus muscular (Luz; Domingues e Naves, 2018; Silveira, 2015 apud Bessa, 2020).

Fenômenos Abióticos Mediatos (Consecutivos):

Os sinais abióticos consecutivos surgem gradualmente após o óbito e incluem desidratação, resfriamento gradual do corpo, rigidez e espasmo, manchas cutâneas hipostáticas e livores cadavéricos (Luz; Domingues e Naves, 2018; Croce e Croce Jr., 2012 apud Bessa, 2020). É crucial destacar que o local e as condições do óbito exercem uma influência significativa no desenvolvimento desses fenômenos cadavéricos, portanto, uma análise meticulosa é essencial para evitar erros de interpretação (Bessa, 2020).

Desidratação Cadavérica. Perda de peso devida à perda e água, que é da ordem de 8,0 g/kilo de peso por dia, em fetos e recém-nascidos, e de 10,0 e 18,0 g/kilo de peso por dia, em adultos (Teixeira, 2021).

Esfriamento do Cadáver. A perda de calor do corpo se dá por: convecção, radiação, condução e evaporação. A queda da temperatura do corpo é da ordem de 0,8 a 1,0 ºC por hora, nas primeiras doze horas, e de 0,3 a 0,5 ºC por hora, nas doze horas seguintes. Na prática admite que o esfriamento se faz de maneira mais célere, em uma média de 1,5 ºC por hora (Teixeira, 2021).

Livores Hipostáticos. Manchas arroxeadas, que se iniciam como um fino pontilhado (sugilação hipostática) que por coalescência se transformam em manchas maiores e que resultam do sangue acumulado, por congestão passiva, em aquelas regiões que ocupam a posição mais declive. Isto tanto é válido para a pele, quanto para os órgãos internos (Teixeira, 2021).

Rigidez Cadavérica. Substitui a flacidez inicial e começa a instalar-se entre 30 minutos e 6 horas após o óbito. Trata-se de um processo progressivo que segue uma marcha descendente (lei de Nysten): músculos mandibulares; músculos do pescoço; músculos do tórax; músculos dos membros superiores; músculos do abdome, e músculos dos membros inferiores, por último. O processo inverso – resolução da rigidez – ocorre entre as 24 e 36 horas seguintes ao óbito, em média (Teixeira, 2021).

4.8 Fenômenos Transformativos do Cadáver

São os processos abióticos que transformam o cadáver, quer pela sua destruição, quer pela conservação.

Fenômenos Destrutivos:

Os sinais destrutivos são: a autólise, putrefação e maceração; que serão descritos a seguir.

Autólise

Na autólise ocorre o processo auto-destrutivo de células e tecidos, que se opera sem interferência externa, decorrente do aumento da permeabilidade das membranas plasmáticas, que possibilita a liberação enzimas proteolíticas contidas nos lisossomas (“suicide bags”). Isto leva a uma acidez temporária que, pela putrefação se neutraliza e inverte pela alcalinização progressiva com valores de pH da ordem de 8,0 a 8,5 (Moura & Sálvia, 2021).

Putrefação

É o processo de decomposição da matéria orgânica por bactérias e pela fauna macroscópica, que acaba por devolvê-la à condição de matéria inorgânica. A putrefação do corpo não é um processo resultante do evento morte, apenas. É necessária a participação ativa de bactérias cujas enzimas, em condições favoráveis, produzem a desintegração do material orgânico. Daí, que nas condições térmicas que impeçam a proliferação bacteriana, ou pela ação de substâncias antissépticas, o cadáver não se putrefaz. As bactérias encarregadas da putrefação do cadáver, na sua maioria, são as mesmas que, em vida, formam a flora intestinal do indivíduo (Antonucci et al., 2023).

Algumas das substâncias intermediárias formadas durante o processo de decomposição das proteínas, são altamente fétidas, tornando-se as responsáveis pelo cheiro característico dos corpos em putrefação. Essas substâncias, como putrescina, cadaverina, indol e escatol, são as principais responsáveis pelo odor característico e nauseabundo dos corpos em decomposição. Já a decomposição catalítica dos lipídios (glicerídeos e ácidos graxos) em aldeídos, cetonas e ácidos carboxílicos, não produzem odores tão intensos quanto os compostos gerados na decomposição das proteínas (Galli, 2014; Antonucci et al., 2023).

Este processo de decomposição paulatina, é bastante lento. As larvas de insetos todas com atividade necrofágica, se deixadas agir livremente, podem destruir o cadáver em um tempo bem menor: de 4 a 8 semanas (Galli. 2014; Moura & Sálvia, 2021).

Com efeito, em um cadáver exposto à intempérie, a putrefação se vê acelerada, sendo certo que os corpos enterrados, têm a sua decomposição retardada até em oito vezes, com relação aos primeiros (Moura & Sálvia, 2021).

Fases da Putrefação.

            A putrefação se desenvolve em quatro fases ou períodos distintos e consecutivos, a saber:

1º – Período cromático (período de coloração, período das manchas). Tem início, em geral de 18 a 24 horas após o óbito, com uma duração aproximada de 7 a 12 dias, dependendo das condições climáticas. Inicia-se pelo aparecimento de uma mancha esverdeada na pele da fossa ilíaca direita (mancha verde abdominal), cuja cor é devida à presença de sulfometahemoglobina. Nos recém-nascidos e nos afogados, a mancha verde é torácica e não abdominal (Souza et al., 2018).

2º – Período enfisematoso (período gasoso, período deformativo). Inicia-se durante a primeira semana e se estende, aproximadamente, por 30 dias. Os gases produzidos pela putrefação (notadamente gás sulfídrico, hidrogênio fosforado e amônia) infiltram o tecido celular subcutâneo modificando, progressivamente, a fisionomia e a forma externa do corpo. Esta distensão gasosa é mais evidente no abdome e nas regiões dotadas de tecidos areolares como face, pescoço, mamas e genitais externos. Os próprios gases destacam a epiderme do córion, formando extensas flictenas putrefativas, cheias de líquido transudado (Moura & Sálvia, 2021).

3º – Período coliquativo (período de redução dos tecidos). Inicia-se no fim do primeiro mês e pode estender-se por meses ou até 2 ou 3 anos. Caracteriza-se pelo amolecimento e desintegração dos tecidos, que se transformam em uma massa pastosa, semilíquida, escura e de intensa fetidez, que recebe o nome de putrilagem. Há atividade das larvas da fauna cadavérica (miase cadavérica), que auxilia grandemente na destruição total dos restos de matéria. Como mencionado, os insetos e suas larvas podem destruir a matéria orgânica do cadáver com extrema rapidez (4 a 8 semanas) (Galli, 2014; Moura & Sálvia, 2021).

4º – Período de esqueletização. No final do período coliquativo, a putrilagem acaba por secar, desfazendo-se em pó. Desta maneira, exsurge o esqueleto ósseo, que fica descoberto e poderá conservar-se por longo tempo (Moura & Sálvia, 2021; Antonucci et al., 2023).

Maceração

É o processo de transformação destrutiva em que ocorre o amolecimento dos tecidos e órgãos quando os mesmos ficam submersos em um meio líquido e nele se embebem. O mais freqüente é que aconteça com a água e o líquido amniótico (Moura & Sálvia, 2021).

Na maceração, a pele se torna esbranquiçada, friável, corruga-se e faz com que a epiderme se solte da derme e possa até se rasgar em grandes fragmentos. Isto é bastante evidente nas mãos, onde a pele de desprende a modo de “luvas”. Externamente, a derme, pelas razões acima apontadas, fica exposta, mostrando-se em geral vermelha brilhante, luzidia, por causa do próprio edema que a embebe e a torna túrgida (Souza et al., 2018; Antonucci et al., 2023).

Fenômenos Conservadores:

Nem sempre o destino do cadáver é a sua transformação destrutiva. Muitas vezes, as formas macroscópicas ou anatômicas, podem ser relativamente conservadas pela ocorrência de processos biológicos ou físico-químicos, naturais ou artificiais, incluem a saponificação, a mumificação, a petrificação (ou calcificação) e a corificação (França, 2012).

Saponificação

Trata-se de um fenômeno cadavérico que depende de que o corpo ou parte dele, seja colocado em um meio que obedeça a duas exigências: a) ambiente muito úmido (pântano, fossa séptica, alagado ou terra argiosa), e b) ausência de ar ou escassa ventilação (Souza et al., 2018; Moura & Sálvia, 2021).

O processo tem início por volta de dois meses após a inumação e se completa em torno de um ano. A putrefação este sofre um desvio, pára, e algumas enzimas microbianas provocam mudanças nas estruturas moles que se transformam em sabões de baixa solubilidade, conhecidos pela denominação genérica de adipocera. Esta é uma substância de início branco-amarelada, de consistência mole, com aspecto característico de sabão ou de queijo, e com um cheiro próprio, rançoso, “sui generis”. Com o passar do tempo, esta massa passa a apresentar uma cor mais escura, amarelo-pardacenta, tornando-se mais seca, dura, friável e quebradiça (Souza et al., 2018; Moura & Sálvia, 2021).

Mumificação

Nesta modalidade de fenômeno cadavérico que é uma dessecação rápida, seu aparecimento depende, exclusivamente, das condições em que o corpo seja colocado: a) ambiente muito seco, em torno de 6% de umidade relativa do ar, e b) temperatura elevada, acima dos 40 ºC; c) abundante ventilação (Moura & Sálvia, 2021).

O processo tem início desde logo, uma vez que é impedida a putrefação e se completa entre seis meses e um ano. Todavia em climas propícios a mumificação pode ocorrer em poucas semanas (Galli, 2014).

Como decorrência da perda de água, a pele fica coriácea, se retrai, enruga e endurece, adquirindo uma coloração terrosa, entre marrom e preto. O processo tem início na parte distal dos quirodáctilos e dos pododáctilos, nos lábios e no dorso e ponta do nariz. A perda da água de constituição, faz com que o corpo diminua notavelmente o ser peso, chegando a atingir valores da ordem de 10 a 5 kg, ao todo (Galli, 2014).

Petrificação

Trata-se de um processo transformativo cada vez mais raro, em que ocorre a infiltração dos tecidos do cadáver por sais de cálcio, as quais acabam por precipitar em meio às estruturas celulares e teciduais. Assume o aspecto de uma verdadeira “calcificação” generalizada. Só encontrar-se, quase que exclusivamente nos embriões ou fetos mortos, por vezes “intra utero” e, mais freqüentemente, nos resultantes de gravidezes ectópicas, tubárias ou peritoniais, retidos, nos quais, até pelas próprias características individuais do meio ou do local, o corpo asséptico, ao invés de entrar em maceração, sofre uma incrustação por sais calcários. O resultado deste processo é a formação de um litopédio (criança de pedra), somente passível de retirada cirúrgica (Moura & Sálvia, 2021).

Corificação

Representa uma modalidade de processo transformativo que ocorre em cadáveres conservados em urnas metálicas – notadamente de zinco galvanizado – herméticamente seladas. O ambiente assim criado dentro da urna inibe parcialmente os fenômenos de decomposição. A pela do cadáver assume o aspecto, a cor e a consistência uniforme de couro recentemente curtido. Começa a observar-se no primeiro ano de colocação do cadáver na urna metálica (Moura & Sálvia, 2021).

Cronotanatognose: Estimativa do Tempo de Morte

A cronotanatognose ou tanatocronologia é um processo de estimativa, não de precisão exata, baseado na análise de múltiplas características post-mortem. A avaliação considera eventos com tempos médios conhecidos. Esses fenômenos apresentam considerável variação entre indivíduos, dependem do ambiente e são influenciados pela percepção do observador. Alguns indicam probabilidade, enquanto outros confirmam a morte. Estabelece-se uma janela de tempo para o óbito, não um momento exato, pois a morte é um processo contínuo em que as funções vitais não cessam simultaneamente (Vidal, 2019).

A seguir apresentamos um Calendário Tanatológico Simplificado segundo a descrição de Vidal (2019).

1 hora após a morte: Surgimento de livores na região cervical; Início da rigidez em nuca e mandíbula; Opacificação da córnea (olhos abertos).

2 horas: Livores cervicais acentuados; Rigidez completa da nuca e mandíbula; Esfriamento de mãos, pés e face.

3 horas: Livores cervicais bem estabelecidos; Início da rigidez nos membros superiores; Esfriamento de toda a pele.

4 horas: Rigidez total dos membros superiores; Início da rigidez nos membros inferiores e quadril.

6 a 8 horas: Rigidez corporal completa

8 a 12 horas: Fixação dos livores nas regiões de declive; Presença de larvas de moscas.

14 horas: Intensidade máxima dos livores cadavéricos; Formação da mancha verde abdominal (dependente da temperatura).

15 a 24 horas: Esfriamento cadavérico máximo (temperatura igual ao ambiente).

18 a 24 horas: Mancha verde abdominal estabelecida.

24 horas: Opacificação das córneas (olhos fechados); liberação de gases não-inflamáveis como CO2.

2 dias: Início do desaparecimento da rigidez cadavérica; liberação de gases inflamáveis como HC e H.

3 dias: Desaparecimento total da rigidez; 70% do abdomen com mancha verde (início da putrefação). Aparecimento dos Cristais de Sangue Putrefeitos que permanecem até o 35o dia depois da morte.

4 dias: Mancha verde em toda extensão do abdomen.

5 dias: Liberação de gases não-inflamáveis como N2 e NH4.

Outros fatores mais complexos são considerados, incluindo temperatura interna, quantidade de líquor, secreções em cavidades, e condições de órgãos internos. Há a perda de peso, os cadáveres perdem em média 8g/Kg/dia. Estima-se, que a algidez ocorra nas primeiras 3h com a queda de temperatura do cadáver de meio grau (0,5°) por hora e de 1° por hora a partir da quarta hora. Os livores de Hipóstase surgem em geral 2 a 3h após a morte, fixando-se definitivamente em torno de 8 a 10h post-mortem. Já a rigidez cadavérica surge na mandíbula depois da 2a hora; em seguida nuca (2-4h); depois nos membros (4-6h) e nos músculos do tórax (6-8 h). O ponto de congelação do sangue (crioscopia) se dá aos -0,57°C. E interessantemente, a digestão do conteúdo estomacal se faz no estômago se faz ainda em torno de 4-7h após a morte (Ataide et al., 2020).

Há o aparente crescimento de pêlos e unhas devido à retração natural dos tecidos, expondo estas estruturas, observando-se o crescimento dos pêlos da barba num taxa de crescimento de 0,021 mm/hora (Vidal, 2019; Ataide et al., 2020).

Cálculo de Determinação do Post-Mortem

Existem vários métodos para determinar o Intervalo Postmortem (IPM), os quais podem depender de fatores internos e/ou externos ao cadáver. Alguns desses métodos estão associados aos fatores bióticos e abióticos do corpo e resultam da observação da decomposição natural. Além desses, há métodos que examinam o ambiente circundante, como a fauna e a flora locais, sendo este método conhecido como Entomologia Forense (Garrido & Naia, 2014; Cavallari, 2018). Apesar dos inúmeros avanços científicos e tecnológicos, a capacidade para estimar a data da morte mantém-se limitada na prática forense. Os métodos existentes apresentam uma margem de erro de 8h o que dificulta essa determinação para cadáveres recentes (Garrido & Naia, 2014).

Nos métodos tradicionais de cronotanatognose, o intervalo post mortem real é inversamente proporcional à sua estimativa, ou seja, quanto maior o intervalo post mortem, menor a possibilidade de uma determinação acurada. Já a estimativa do intervalo post mortem pelo método entomológico é o contrário, quanto maior o intervalo, mais segura é a precisão da estimativa (Goff & Odom, 1987 apud Vanrell).

O conhecimento cientifico dos ciclos vitais dos insetos necrófagos na entomologia forense, permite uma datação do óbito o mais aproximada do possível, levando-se em consideração a época do ano e o clima de cada região (Vidal, 2019).

Depois da fase inicial de decomposição, o corpo começa a emitir odores, resultantes de gases como amoníaco (NH3), ácido sulfídrico (SH2), nitrogênio livre (N2) e dióxido de carbono (CO2), que atrai diferentes insetos para o cadáver. Os insetos que normalmente chegam primeiro são os Dípteros ou moscas, podendo ser, afora as domésticas, as das famílias Calliphoridae e Sarcophagidae (Ataide et al., 2020).

As fêmeas colocarão os ovos sobre o corpo, especialmente ao redor dos orifícios naturais, como o nariz, a boca, os olhos, as orelhas, o ânus, o pênis e a vagina. Caso o corpo apresente algum tipo de ferimento, na ferida também serão depositados os ovos. Assim, os locais infestados por ovos ou larvas em um cadáver podem ser importantes para determinar tanto a causa da morte como, também, para reconstituir alguns eventos anteriores a ela, pois, se houve um trauma do corpo anterior à morte, poderá levar a uma grande infestação em locais não habituais, o que normalmente se vê nos casos de mutilação e nas lesões de defesa (Vanrell; Cavallari, 2018).

Devemos lembrar que as chamadas moscas da carne (flesh flies) são vivíparas, logo, não botam ovos, e sim, depositam as suas larvas já ativas. Outro dado importante e que deve ser levado em conta é que as fêmeas de moscas varejeiras, como ocorre com as demais, também botarão seus ovos na região facial, porém raramente na região genitoanal, exceto quando tenha havido uma agressão sexual antes a morte. Tal agressão, capaz de provocar um sangramento nessa região (genitoanal), provavelmente levará esse tipo de mosca a depositar ali os seus ovos (Cavallari, 2018; Ataide et al., 2020).

Em cadaveres expostos ao ar livre ocorre a colonização sucessiva de diferentes tipos de insetos conforme o avanço do processo de decomposição, de uma forma regular, tornando o ambiente propicio para a chegada do grupo seguinte, sendo do processo composto por 8 legiões, descritas a seguir: 1a Legião:Dipteros, Muscina stabulans (8-15 dias); 2a Legião:Lucila coesar (15 a 20 dias); 3a Legião:Dermester lardarins 20 a 30 dias/3a 6 meses; 4a Legião: Pyophila patasionis. Depois da fermentação; 5a Legião: Tyreophora Cyrophila. Na liquefação; 6a Legião: Uropoda nummularia. Absorvem os humores; 7a Legião: Aglossa cuprealis (12 a 24 meses); 8a Legião: Tenebrio Obscurus (3 anos após a morte) (Cavallari, 2018; Ataide et al., 2020).

Nos ultimos anos testes laboratoriais mais sofisticados têm sido desenvolvidos como métodos de determinação do IPM. No geral, estes novos métodos baseiam-se em alterações biológicas, metabólicas e orgânicas que ocorrem no cadáver, como por exemplo o método da quantificação do citrato e da quantificação do DNA. O uso da taxa de citrato no corpo humano para a determinação do IPM, e de DNA em tecido ósseo, demonstrou uma relação temporal de decréscimo. No entanto, não existe ainda um método que seja o método ideal. Todos os que existem até então, apresentam aspetos negativos e que atrapalham o andamento da investigação criminal (Garrido & Naia, 2014).

Papel da Pericia Criminal na Tanatologia

Para esclarecer questões judiciais relevantes, a perícia ou diligência médico-legal emprega um conjunto de investigações essencialmente médicas realizadas em pessoas, cadáveres, animais e objetos. No caso de pessoas, as perícias têm como objetivo determinar identidade, idade, raça, sexo e altura; diagnosticar gravidez, parto, puerpério, lesões corporais, distúrbios psicopatológicos, estupro e doenças sexualmente transmissíveis; excluir paternidade, avaliar doenças mentais e retardo mental, simulação de doenças mentais; investigar envenenamentos, intoxicações, doenças ocupacionais e acidentes de trabalho.

Em cadáveres, o objetivo é diagnosticar a realidade da morte, a causa legal, o momento da morte, a identificação do falecido; diferenciar lesões ocorridas em vida de lesões pós-morte; realizar exames toxicológicos das vísceras; proceder à exumação; extrair projéteis.

Embora o perito atue com uma função oficial, suas atribuições são limitadas, uma vez que não julga, não defende e não acusa. Sua responsabilidade é apresentar às autoridades responsáveis pelo processo as observações feitas no local do crime ou da morte, nas armas, nas lesões, nos exames cadavéricos e quaisquer sintomas detectados no indivíduo vivo e suas respectivas sequelas naturais. O perito jamais deve sobrepor suas conclusões ao prudente arbítrio do julgador através de opiniões emocionais. Portanto, cabe ao perito apenas examinar e relatar fatos específicos e permanentes necessários para esclarecer o processo; ele vê e relata: visum et repertum. Assim, conclui-se sua nobre missão de esclarecimento.

Principios Éticos Envolvidos na Perícia

A ética determina o comportamento correto dos indivíduos, ajudando-os a discernir entre o certo e o errado. A transgressão das normas sociais resulta em comportamentos éticos questionáveis. Assim, um dos problemas éticos mais significativos no campo forense, conforme identificado pela Academia Americana de Ciências Forenses, é a competência. Nesse contexto,  destacam-se dois requisitos éticos principais: o uso de métodos confiáveis e a redação de relatórios que se restrinjam à área de expertise do perito, escritos com honestidade sobre sua qualificação e experiência (Barros et al., 2021).

Os tribunais geralmente aceitam laudos periciais sem contestação, devido à dificuldade que leigos têm em questionar informações técnicas. Portanto, é crucial que as evidências apresentadas pelos peritos sejam confiáveis, precisas e o mais imparciais possível (Costa Filho & Abdalla-Filho, 2010; Barros et al., 2021; Brasilia, 2022).

Ao testemunhar em sua área específica, o perito deve seguir um comportamento ético, não exagerando suas qualificações ou experiência. É antiético e ilegal fornecer informações falsas sobre sua carreira e assumir responsabilidades para as quais não possui competência nas ciências forenses. Caso não esteja qualificado para opinar sobre determinado assunto, o perito não deve emitir uma opinião científica. Portanto, o treinamento adequado e a adesão a um código de ética profissional são fundamentais. Um profissional ético apresenta resultados de forma clara e explícita, sem viés, e reconhece os limites de suas habilidades, competências e conhecimentos. Ele valoriza a importância de uma investigação minuciosa antes de formular uma conclusão (Costa Filho & Abdalla-Filho, 2010; Barros et al., 2021; Brasilia, 2022).

A responsabilidade social da atividade pericial é crucial. Os relatórios dos peritos frequentemente embasam decisões judiciais que podem determinar o destino de uma pessoa, seja sua condenação ou absolvição. Além disso, erros na identificação de corpos, restos cadavéricos ou ossadas podem ter graves repercussões jurídicas, patrimoniais e emocionais (Barros et al., 2021; Brasilia, 2022).

Considerações Finais

Neste estudo científico foi possível detalhar sobre os fenômenos cadavéricos, sendo que esses fatores são primordiais para o diagnóstico de certeza da morte, feito através da observação minuciosa por parte dos médicos legistas. Para o diagnóstico de realidade do óbito, precocemente são analisados sinais considerados sugestivos de morte, que são os fenômenos imediatos. Nos fenômenos consecutivos surgem sinais mais seguros que indicam a morte do indivíduo, podendo auxiliar também em que momento ocorreu e de que forma o evento se deu. Já os fenômenos transformativos traduzem uma alteração significativa do corpo em um processo de decomposição. Na cronotanatognose ou tanatocronologia vimos o processo de estimativa do tempo da morte e os mecanismos usados para calcular o post-mortem de acordo com parâmetros da decomposição do corpo. Além disso, destacamos o papel da Pericia Criminal na investigação sobre a morte e os principios éticos envolvidos na perícia e na formação desse profissional.

Assim, concluímos que a partir do estudo realizado é possível facilitar a interpretação da morte e de seus fenômenos cadavéricos, por legistas, peritos, advogados, juízes e demais profissionais da área de interesse. Com base nessas informações é possível que o profissional responsável compreenda o que o cadáver e o local onde o corpo se encontrava estão indicando sobre a cessação da vida, revelando que tipo de morte ocorreu e seu tempo de morte, esclarecendo assim a causa da morte.

Imagens dos Fenômenos Cadavéricos

Figura 1: Livores de Hipóstases no dorso. Acúmulos de sangue provocados pela falta de circulação, cadáver em decúbito dorsal. Disponível: www.malthus.com.br

Figura 2: Mancha verde abdominal. Surge na fossa ilíaca direita, é o primeiro sinal de putrefação do cadáver, dando início ao período cromático. Disponível: www.malthus.com.br

Figura 3: Opacificacao da córnea. Instala –se a partir da morte. Disponível:  www.malthus.com.br

Figura 4: Bolha sub epidérmica: Conteúdo hemoglobinico (sangue já em decomposição). Disponível em: www.malthus.com.br

Figura 5: Circulação póstumo de Bouardel: è o desenho produzido dentro dos vasos sanguíneos subcutâneos, dilatados pela decomposição do sangue. Disponível: www.malthus.com.br          

Figura 6. Fase da Coloração: Em evolução, 72 horas de óbito. Disponível em www.malthus.com.br

Figura 7 Inicio da fase gasosa. Se inicia a partir de 48 horas. Disponivel em  www.malthus.com.br

Figura 8 –Putrefação: Pele enegrecida, distenção gasosa moderada, destacamento da pele,início de liquefação. Disponível: www.malthus.com.br

Figura 9 – Maceração: É um processo de autólise. Fenômeno encontrado em fetos que morrem intra-útero. Disponível: www.malthus.com.br

 Figura 10 -Mumificação: Alteração pós morte que detém, em parte, o processo tissular pela decomposição. Disponível: www.geocities.com

Referências Bibliográficas

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