LARINGOESPASMO EM CRIANÇAS DURANTE PROCEDIMENTOS SOB ANESTESIA

LARYNGOSPASM IN CHILDREN DURING PROCEDURES UNDER ANESTHESIA

LARINGOESPASMO EN NIÑOS DURANTE PROCEDIMIENTOS BAJO ANESTESIA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202407311403


Luisa Lobo Sousa1
Danilo Marques de Aquino1
Guilherme Groto Santos1


RESUMO 

Introdução: O laringoespasmo pode resultar em perda parcial ou completa das vias aéreas do paciente. É uma emergência anestésica causada por um reflexo exacerbado que pode acontecer com o fechamento das cordas vocais, acompanhado pela descida da epiglote sobre o orifício laríngeo, e que ainda é responsável por morbidade e mortalidade significativas em pacientes pediátricos. É mais comum em crianças menores de dois anos de idade. O manejo do laringoespasmo consiste na sua prevenção, reconhecimento, tratamento e cuidados pós-anestésicos. Objetivo: Identificar na literatura recentes abordagens do laringoespasmo em crianças durante procedimentos anestésicos. Metodologia: Trata-se de uma revisão de literatura, evidenciando o laringoespasmo em crianças sob procedimentos anestésicos. Considerações finais: O laringoespasmo em crianças durante a anestesia é uma situação crítica. É importante um manejo eficaz com intervenções rápidas e apropriadas para restaurar a permeabilidade das vias aéreas e garantir a oxigenação adequada da criança, evitando-se complicações. O anestesiologista deve-se atentar aos fatores de risco envolvidos, sendo a compreensão aprofundada desses aspectos crucial para os médicos, que em conjunto com a equipe cirúrgica, podem garantir a segurança e o bem-estar dos pacientes pediátricos durante os procedimentos anestésicos.  

Palavras-chave: laringoespasmo; criança; anestesia; pediatria.

ABSTRACT 

Introduction: Laryngospasm can result in partial or complete loss of the patient’s airway. It is an anesthetic emergency caused by an exacerbated reflex that can occur with the closure of the vocal cords, accompanied by the descent of the epiglottis over the laryngeal orifice, and which is still responsible for significant morbidity and mortality in pediatric patients. It is most common in children under two years of age. The management of laryngospasm consists of its prevention, recognition, treatment and post-anesthetic care. Objective: To identify recent approaches to laryngospasm in children during anesthetic procedures in the literature. Methodology: This is a literature review, highlighting laryngospasm in children undergoing anesthetic procedures. Final considerations: Laryngospasm in children during anesthesia is a critical situation. Effective management is important with rapid and appropriate interventions to restore airway patency and ensure adequate oxygenation of the child, avoiding complications. The anesthesiologist must pay attention to the risk factors involved, and an in-depth understanding of these aspects is crucial for doctors, who, together with the surgical team, can guarantee the safety and well-being of pediatric patients during anesthetic procedures.

Keywords: laryngospasm; child; anesthesia; pediatrics.

RESUMEN

Introducción: El laringoespasmo puede resultar en la pérdida parcial o completa de la vía aérea del paciente. Se trata de una emergencia anestésica provocada por un reflejo exacerbado que puede ocurrir con el cierre de las cuerdas vocales, acompañado del descenso de la epiglotis sobre el orificio laríngeo, y que aún es responsable de una importante morbimortalidad en pacientes pediátricos. Es más común en niños menores de dos años. El manejo del laringoespasmo consiste en su prevención, reconocimiento, tratamiento y cuidados postanestésicos. Objetivo: Identificar abordajes recientes del laringoespasmo en niños durante procedimientos anestésicos en la literatura. Metodología: Se trata de una revisión de la literatura, destacando el laringoespasmo en niños sometidos a procedimientos anestésicos. Consideraciones finales: El laringoespasmo en niños durante la anestesia es una situación crítica. Es importante un manejo eficaz con intervenciones rápidas y adecuadas para restablecer la permeabilidad de las vías respiratorias y garantizar una oxigenación adecuada del niño, evitando complicaciones. El anestesiólogo debe prestar atención a los factores de riesgo involucrados, y un conocimiento profundo de estos aspectos es crucial para los médicos, quienes, junto con el equipo quirúrgico, pueden garantizar la seguridad y el bienestar de los pacientes pediátricos durante los procedimientos anestésicos.

Palabras clave: laringoespasmo; niño; anestesia; pediatría.

INTRODUÇÃO 

O laringoespasmo pediátrico é uma situação delicada e que exige um reconhecimento rápido e a tomada de medidas imediatas para se evitar a hipoxemia e suas consequências que podem ser deletérias (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014). O manejo do laringoespasmo consiste na sua prevenção, reconhecimento, tratamento e cuidados pós-anestésicos (GAVEL E WALKER, 2014). Constitui-se em um reflexo problemático que ocorre frequentemente sob anestesia geral (GAVEL E WALKER, 2014). Na criança, o evento se apresenta em cerca de 1,7 a 25% das anestesias. É mais comum em crianças menores de 2 anos de idade que, na maioria das vezes, respondem ao tratamento sem sequelas (MOURA et al., 2018).

 O fechamento da abertura da epiglote por meio da constrição dos músculos intrínsecos da laringe é um reflexo protetor das vias aéreas necessário para se prevenir a aspiração pulmonar. A resposta exagerada desse reflexo é responsável pelo laringoespasmo, que, embora possa ocorrer em qualquer criança, é mais frequente naquelas com infecção respiratória superior ou que apresentam crises recentes de asma (MOURA et al., 2018).

O presente estudo teve como objetivo: identificar na literatura recentes abordagens do laringoespasmo em crianças durante procedimentos anestésicos.

REVISÃO DA LITERATURA

Considerações Gerais

O laringoespasmo pode resultar em perda parcial ou completa das vias aéreas do paciente (GAVEL E WALKER, 2014). É uma emergência anestésica que ainda é responsável por morbidade e mortalidade significativas em pacientes pediátricos (ORLIAGUET et al., 2012). Causada por um reflexo exacerbado que pode acontecer com o fechamento das cordas vocais, acompanhado pela descida da epiglote sobre o orifício laríngeo. Pode progredir de um estridor inspiratório, com retrações da parede torácica e respiração paradoxal, para a completa cessação do movimento do ar, apesar de intenso esforço inspiratório. É observado durante a indução, manutenção ou despertar da anestesia, geralmente durante níveis superficiais de anestesia, e deve ser reconhecido e tratado rapidamente para se evitarem graves complicações (MOURA et al., 2018).

É uma complicação relativamente frequente, cujo risco aumentado de laringoespasmo pode ser uma combinação de múltiplos fatores, incluindo-se os relacionados aos pacientes, a anestesia e/ou procedimento cirúrgico (COSGROVE et al., 2022; MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014; ORLIAGUET et al., 2012). Uma vez feito o diagnóstico, os principais objetivos são identificar e remover o estímulo ofensivo, aplicar manobras nas vias aéreas para abri-las de modo a administrar agentes anestésicos se a obstrução não for aliviada (ORLIAGUET et al., 2012).

O laringoespasmo pode resultar em complicações fatais, incluindo hipóxia grave, bradicardia, edema pulmonar por pressão negativa e parada cardíaca. Continua sendo a principal causa de parada cardíaca perioperatória de origem respiratória em crianças (LEMOS et al., 2024; ORLIAGUET et al., 2012).

Fatores de Risco

A idade é um dos fatores de risco mais importantes. A incidência de laringoespasmo durante a anestesia foi de 1,7% nas crianças de 0 a 9 anos, e apenas de 0,9% em crianças com idade maior e adultos (OLSSON E HALLEN, 1984).  No geral, alguns estudos confirmaram a predominância em uma idade jovem, permanecendo na faixa de 50 a 68% dos casos em crianças menores de 5 anos. Portanto, as crianças são mais propensas a desenvolver laringoespasmo (OLSSON E HALLEN, 1984; ORLIAGUET et al., 2012). 

Em outros estudos que apresentaram relatos sobre eventos adversos respiratórios, incluindo o laringoespasmo, a incidência geral de eventos respiratórios perioperatórios foi maior em lactentes de 0 a 1 ano em comparação com crianças mais velhas (MOURA et al., 2018).

Além da idade, anormalidades nas vias aéreas superiores, refluxo gastroesofágico, índice de massa corporal elevado e distúrbios do sono também são fatores de risco para laringoespasmo perioperatório com comprometimento de crianças (MOURA et al., 2018). Em se tratando de infecção do trato respiratório superior, está associado a um aumento de duas a cinco vezes no risco de ocorrer laringoespasmo. Anestesiologistas responsáveis ​​por pacientes pediátricos devem estar cientes de que os riscos associados a essas infecções em crianças são ampliados nessa faixa etária, especialmente naqueles com infecção pelo vírus sincicial respiratório (ORLIAGUET et al., 2012). Essas crianças são propensas a desenvolver hiperatividade das vias aéreas (alta e brônquica) que tem duração além do período de infecção viral. Enquanto o dano epitelial se resolve em uma a duas semanas, a sensibilização das vias de referência autonômica brônquica induzida pelo vírus pode permanecer por até seis a oito semanas. Alguns autores demonstraram um risco aumentado de laringoespasmo quando os sintomas do resfriado estão presentes no dia da cirurgia ou menos de duas semanas antes. Por isso, muitos anestesiologistas optam pelo adiamento das cirurgias eletivas dessas crianças por pelo menos quinze dias, sendo esta uma conduta recomendada (MOURA et al., 2018).

Há indícios de que a exposição domiciliar à fumaça do tabaco pode aumentar a incidência de laringoespasmo de 0,9% para 9,4% em crianças programadas para cirurgia otorrinolaringológica e urológica. Essa forte associação entre exposição passiva à fumaça do tabaco e complicações das vias aéreas em crianças é verificada na literatura, sendo recomendado que se verifique o histórico familiar do paciente (ORLIAGUET et al., 2012). 

Outros fatores relacionados ao procedimento cirúrgico também estão ligados à maior incidência de laringoespasmo. Cirurgias sobre a faringe e laringe são responsáveis por mais de 20% dos episódios de (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014; ORLIAGUET et al., 2012; OLSSON E HALLEN, 1984). Os procedimentos realizados em caráter de urgência também apresentam maior risco de laringoespasmo do que os procedimentos eletivos. Apendicectomia, dilatação anal, mediastinoscopia e reparo de hipospadias estão associados a um risco aumentado de laringoespasmo (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014). 

Plano Anestésico

Diversos estudos mostram que metade dos casos de laringoespasmo ocorreram durante o despertar da anestesia ou sedação, sendo este o momento mais crítico. O restante da incidência foi dividida de forma aproximadamente igual entre a indução e manutenção. Quando realizada a intubação orotraqueal, o laringoespasmo é mais frequente no momento do despertar. No entanto, quando utilizada máscara laríngea ou máscara facial, a complicação ocorre mais durante a indução e manutenção da anestesia. De certa maneira, entende-se que o momento de maior risco depende então do tipo de técnica anestésica empregada para o gerenciamento da via aérea da criança (MOURA et al., 2018).

Os gatilhos comuns da resposta laríngea reflexa durante a anestesia são secreções, sangue, inserção de um cateter de sucção das vias aéreas orofaríngeas e laringoscopia. Qualquer estimulação na área suprida pelo nervo laríngeo superior, durante um plano leve de anestesia, pode produzir laringoespasmo (ORLIAGUET et al., 2012). 

A inexperiência do anestesista também está associada a uma maior incidência de laringoespasmo e eventos adversos respiratórios perioperatórios (GAVEL E WALKER, 2014; ORLIAGUET et al., 2012). A prática rotineira de anestesiar crianças e a anestesia de crianças em centros de anestesia pediátrica interfere de maneira positiva para a redução dos casos de laringoespasmo nesses pacientes (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014).

Alguns fatores estão associados a um menor risco de laringoespasmo: indução intravenosa, manejo das vias aéreas com máscara facial e manutenção inalatória da anestesia. A indução e a emergência da anestesia são os períodos mais críticos. No entanto, alguns autores observaram que o surgimento da anestesia tende a se tornar o período mais crítico, possivelmente em relação a mudanças na prática, incluindo o uso de máscara laríngea e/ou propofol e novos agentes inalatórios (ORLIAGUET et al., 2012). 

Dentro deste contexto, em relação a manutenção das vias aéreas sob máscara facial, quanto mais puder ser evitada a manipulação das vias aéreas superiores, menor será a possibilidade de um reflexo exacerbado de fechamento glótico (MOURA et al., 2018; ORLIAGUET et al., 2012). Em crianças com infecção do trato respiratório superior, o uso de um tubo endotraqueal pode aumentar em onze vezes o risco de eventos adversos respiratórios, em comparação com uma máscara facial (ORLIAGUET et al., 2012).

Diagnóstico

O laringoespasmo com bloqueio parcial à passagem de ar pode ser observado com graus variados de obstrução das vias aéreas. Os sinais mais comuns são a retração supraesternal, retrações supraclaviculares, retração da fúrcula esternal, tórax paradoxal e movimentos abdominais. O estridor inspiratório pode ser ouvido durante um laringoespasmo parcial, mas está ausente no espasmo completo. No laringoespasmo completo, não há movimento de ar ou sons de respiração, não se observam movimentos da bolsa reservatória e a curva na capnografia está ausente. Quando a obstrução não é aliviada, ocorrem sinais clínicos tardios que incluem a rápida dessaturação de oxigênio, seguida por bradicardia e cianose (MOURA et al., 2018; ORLIAGUET et al., 2012).

O laringoespasmo deve ser diferenciado de outras causas de obstrução das vias aéreas em crianças, como broncoespasmo ou obstrução supraglótica. Tanto a obstrução supraglótica como o laringoespasmo parcial estão associados a estridor inspiratório e retração intercostal com rápida deterioração da oxigenação. Essas duas complicações podem ser diferenciadas pela visualização direta das cordas vocais com laringoscópio enquanto o paciente realiza esforços inspiratórios. No entanto, inserir um laringoscópio para visualizar as cordas vocais em tal situação pode piorar o laringoespasmo. Por isso, diante deste cenário, é indicada a manobra da inclinação da mandíbula ou da cabeça (“jaw thrust” ou “head tilt”) enquanto é aplicada uma ventilação com pressão positiva, que aliviará tanto a obstrução supraglótica quanto o laringoespasmo parcial. Caso essas manobras não sejam suficientes para tratar a obstrução, deve-se então suspeitar de laringoespasmo completo e o anestesiologista deve prosseguir com a sequência de condutas preconizadas pela instituição médica (MOURA et al., 2018; ORLIAGUET et al., 2012).

Portanto, o manejo do laringoespasmo consiste na sua prevenção, reconhecimento, tratamento e cuidados pós-anestésicos (GAVEL E WALKER, 2014). A prevenção e o manejo eficazes do laringoespasmo são essenciais para minimizar as complicações associadas (COSGROVE et al., 2022).

Prevenção 

O reconhecimento de crianças com fatores de risco para o desenvolvimento de laringoespasmo deverá ser um alerta para assegurar um plano profundo de anestesia antes de qualquer estímulo desencadeante, inclusive a punção venosa periférica. Recomenda-se aguardar pelo menos dois minutos de indução inalatória para realizar a cateterização venosa de crianças (MOURA et al., 2018; ORLIAGUET et al., 2012).

A indução inalatória deve, preferencialmente, ser realizada com um agente menos irritante das vias aéreas, como o sevoflurano. No entanto, a indução intravenosa com propofol é mais suave e menos problemática, podendo beneficiar ainda mais as crianças susceptíveis. Durante a indução com sevoflurano, é recomendada a punção venosa pelo menos dois minutos após a perda do reflexo palpebral. A laringoscopia e intubação traqueal devem ser realizadas em plano anestésico profundo, muitas vezes complementado com hipnóticos venosos (MOURA et al., 2018).

Durante a fase de despertar, as crianças podem ser desintubadas em um plano profundo de anestesia ou totalmente acordadas, mas nunca em um plano intermediário, quando os reflexos das vias aéreas podem ainda estar descoordenados. Isto é válido tanto para quando se utilizam tubos endotraqueais quanto para os dispositivos supraglóticos.  Há muitas controvérsias entre os anestesiologistas sobre a melhor técnica para reduzir o laringoespasmo, porém nenhuma foi considerada superior. O treinamento e a experiência em anestesiar crianças são alguns aspectos que ainda se mostram positivos (MOURA et al., 2018).

Ao se planejar uma desintubação em plano profundo, as vias aéreas devem ser aspiradas com antecedência. A criança deve ser colocada em posição de decúbito lateral, com o pescoço levemente estendido. Quando a via aérea estiver sem secreções, devem ser evitados quaisquer estímulos na criança, mesmo após a desintubação. A desintubação com a criança acordada deve ocorrer quando a criança exprime fácies de choro, tem volume corrente adequado, padrão respiratório regular, tosse e, preferencialmente, mantém abertura ocular (MOURA et al., 2018).

A técnica “no touch” é uma forma de desintubação acordada. Consiste em sucção faríngea e posicionamento em decúbito lateral enquanto a criança ainda está anestesiada, evitando-se qualquer estímulo até a abertura ocular e sinais que a criança está desperta, seguindo-se então pela desintubação. Essa técnica está associada a uma baixa incidência de laringoespasmo no período pós-desintubação (MOURA et al., 2018). 

A desintubação traqueal mantendo-se ventilação com pressão positiva sobre as vias aéreas diminui a excitabilidade dos músculos adutores da laringe. Alguns autores afirmam que esta técnica reduz a probabilidade de laringoespasmo por evitar a presença de secreções e sangue na via aérea (MOURA et al., 2018).

Alguns fármacos também tem sido utilizados para prevenir o laringoespasmo em crianças que serão submetidas à manipulação das vias aéreas. O magnésio intravenoso, administrado no intraoperatório (15mg/Kg), reduz a frequência de laringoespasmo em crianças após desintubação acordada devido ao aumento da profundidade da anestesia e ao relaxamento muscular (MOURA et al., 2018).

 A lidocaína intravenosa (1,5 a 2 mg/Kg) também parece prevenir o laringoespasmo em crianças, especialmente durante a intubação orotraqueal. Lidocaína tópica (4mg/kg) é frequentemente utilizada antes da intubação ou manipulação da laringe e tem representado mais uma opção de prevenção do laringoespasmo (MOURA et al., 2018).

Estudos concluíram que o propofol em doses sub-hipnóticas (0,5mg/kg) também previne o laringoespasmo em crianças (MOURA et al., 2018).

A hipercapnia protege contra o reflexo de fechamento da glote por deprimir a atividade adutora. Por outro lado, a hipocapnia prolonga o fechamento de glote. A hipóxia (PaO2 < 50 mmHg) também tem um efeito depressivo sobre os neurônios adutores, mas um PaO2 > 50 mmHg tem apenas um efeito mínimo sobre o reflexo de fechamento da glote. Embora ocorram relatos de que o laringoespasmo possa ser solucionado quando há hipóxia grave, esta não é uma abordagem sensata para o manejo do evento (MOURA et al., 2018).

Tratamento

O laringoespasmo das crianças sob anestesia deve ser reconhecido e tratado imediatamente. Recomenda-se adotar um plano de ação sequencial para que sejam evitadas as consequências deletérias da hipoxemia (MOURA et al., 2018). Após a exclusão de outras causas óbvias de obstrução das vias aéreas, este plano deve ser colocado em ação (GAVEL E WALKER, 2014).

O tratamento do laringoespasmo que ocorre tanto na indução quanto no despertar da anestesia é o mesmo: identificação e remoção do estímulo desencadeante (secreção, sangue ou corpo estranho na via aérea), aplicar a manobra de elevação da mandíbula, realizar uma ventilação com pressão positiva contínua nas vias aéreas, por via oral ou nasal, com 100% de oxigênio. Caso essa técnica seja suficiente para tratar o espasmo, provavelmente o laringoespasmo era parcial. Se a obstrução não ceder com essas medidas iniciais, deve-se suspeitar de laringoespasmo completo e o próximo passo será aprofundar o nível de anestesia com anestésicos intravenosos ou inalatórios se o acesso venoso não estiver disponível (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014). Uma boa comunicação com outros membros imediatos da equipe é vital para garantir o sucesso do procedimento (GAVEL E WALKER, 2014).

O propofol deve ser a primeira opção medicamentosa em doses de 0,25 a 0,8 mg/Kg. Possui latência curta e sua ação é mais previsível do que os anestésicos inalatórios (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014). Caso essa técnica não obtenha sucesso e o paciente prosseguir com dessaturação (SpO2<85%), a succinilcolina pode ser administrada em doses de 0,1 a 3mg/Kg, seguindo-se de ventilação sob máscara facial ou intubação orotraqueal. A vantagem de doses pequenas, como 0,1 mg/Kg de succinilcolina, está na possibilidade de resolução do quadro e manutenção da ventilação espontânea. Não é prática altamente recomendada, uma vez que o foco, neste momento, deve ser direcionado para a resolução da hipoxemia. Como o propofol apresenta cerca de 76% de sucesso no tratamento do laringoespasmo, deve ser administrado antes da tentativa com succinilcolina (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014).

A succinilcolina tem um papel crucial quando o propofol não melhora o quadro e sua administração não deve ser adiada até que a criança apresente saturação periférica de oxigênio abaixo de 85%. Isso porque a administração de succinilcolina seguida de hipóxia pode estar associada a bradicardia severa e parada cardiorrespiratória. Portanto, é altamente recomendado o uso de atropina a 0,02 mg/Kg intravenosa antes da administração de succinilcolina para o tratamento do laringoespasmo (MOURA et al., 2018; GAVEL E WALKER, 2014). Em alguns casos, a succinilcolina pode ser administrada pelas vias intramuscular, intralingual ou intraóssea (GAVEL E WALKER, 2014).

Quando o laringoespasmo é tratado com sucesso, a ventilação inicial deve ser mantida com oxigênio a 100%. A aspiração das vias aéreas deve ser novamente considerada. A intubação orotraqueal pode ser necessária devido a presença de secreções ou edema pulmonar por pressão negativa. Instalar um tubo traqueal permitirá o recrutamento alveolar, prevenindo a retenção de secreções e infecção pulmonar pós-operatória. A necessidade de ventilação pós-operatória ou prolongada deve ser avaliada individualmente (MOURA et al., 2018).

Há estudos com número pequeno de pacientes que obtiveram sucesso no tratamento do laringoespasmo pós-desintubação utilizando-se o bloqueio do nervo laríngeo superior em casos refratários ao tratamento convencional. Porém, há a necessidade de maiores investigações para confirmar essa eficácia (MOURA et al., 2018).

Da mesma forma, o tratamento com nitroglicerina intravenosa na dose de 4 mcg/kg/min foi apresentado em alguns relatos de caso. Sabe-se que a nitroglicerina relaxa os músculos lisos. No entanto, os músculos da laringe são músculos esqueléticos e podem não ser alvo da ação da nitroglicerina. Dessa maneira, permanece a questão se o laringoespasmo foi autolimitado ou realmente tratado com a nitroglicerina (MOURA et al., 2018).

Foram relatadas compressões de tórax suaves como um novo tratamento do laringoespasmo. Os resultados são recentes, mas apresentam-se bem interessantes, com mais de 70% de sucesso no tratamento com compressão torácica contra 38% com o método padrão (MOURA et al., 2018).

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa de literatura, com abordagem qualitativa e documental, demonstrando o laringoespasmo em crianças sob procedimentos anestésicos. Esse tipo de estudo é relevante, pois avalia de forma abrangente a temática, sintetizando o que está disponível na literatura. Constitui-se em um método de pesquisa que requer rigor metodológico em todas as etapas de seu desenvolvimento. 

Foi realizada uma triagem dos artigos analisados de acordo com critérios de inclusão e exclusão pré-definidos. Como critério de inclusão foram adotados todo material encontrado que atendesse o objetivo deste estudo, sem período de corte pré-estabelecido. A pesquisa foi limitada à artigos em português, espanhol e inglês. Os artigos foram obtidos no Google Acadêmico, na Biblioteca Virtual de Saúde (BVS) nas bases de dados a citar: SCIELO, LILACS e MEDLINE, e também no National Center for Biotechnology Information (NCBI) – PUBMED. Foram consultados artigos originais e de revisão sobre o tema, utilizando-se os seguintes descritores: “laringoespasmo; criança; anestesia; pediatria”. Foram analisadas as que mais se adequaram ao tema e que continham informações relevantes e atualizadas.

DISCUSSÃO

A análise de cada estudo escolhido para esta revisão foi realizada de maneira minuciosa, de forma a oferecer um panorama do laringoespasmo em crianças sob procedimentos anestésicos. 

É de suma importância que a equipe médica responsável pela cirurgia pediátrica realize uma avaliação pré-operatória cuidadosa, identificando fatores de risco, especialmente infecções respiratórias recentes e condições pré-existentes das vias aéreas como asma ou hiper-reatividade brônquica (LEMOS et al., 2024).

Se tratado corretamente, com sucesso e em tempo hábil, o laringoespasmo é revertido, e vale ressaltar que a aspiração laríngea deve ser considerada. Pode ser necessário suporte adicional das vias aéreas com intubação traqueal (especialmente quando há obstrução das vias aéreas ou ocorreu edema). Isso permitirá sucção das vias aéreas e recrutamento dos alvéolos pulmonares para prevenir retenção de secreção pós-operatória e infecção. A necessidade de ventilação prolongada ou pós-operatória deve ser avaliada individualmente (GAVEL E WALKER, 2014).

A literatura sugere que o propofol pode ser a melhor escolha para aprofundar a anestesia e ajudar a relaxar as cordas vocais, enquanto que a succinilcolina, um agente bloqueador neuromuscular de ação rápida, pode ser utilizado em casos graves para facilitar a ventilação, como também a intubação (LEMOS et al., 2024).

Em um estudo multicêntrico realizado em 2017 com crianças submetidas a cirurgia, Michelet e colaboradores afirmaram que o laringoespasmo perioperatório é uma emergência com risco de vida em pacientes pediátricos, com incidência de eventos críticos respiratórios de 3,1%. O laringoespasmo foi uma das complicações respiratórias mais frequentes (0,2–6,7%). Seu manejo eficaz requer diagnóstico adequado, seguido de manejo rápido e agressivo. A utilização de um algoritmo estruturado levaria a um reconhecimento mais precoce e a uma melhor gestão (LEMOS et al., 2024; MICHELET et al., 2017).

CONSIDERAÇÕES GERAIS

O laringoespasmo em crianças durante a anestesia é uma situação crítica que requer reconhecimento rápido e medidas imediatas para evitar complicações. Se caracteriza pela contração involuntária, resultando em obstrução parcial ou total das vias aéreas.

A prevenção é a chave, com uma avaliação pré-operatória meticulosa, técnicas de anestesia suaves e manuseio cuidadoso das vias aéreas. O manejo eficaz do laringoespasmo envolve intervenções rápidas e apropriadas para restaurar a permeabilidade das vias aéreas e garantir a oxigenação adequada da criança. 

O anestesiologista pode evitar o laringoespasmo, desde que tenha atenção aos fatores de risco envolvidos, e esteja preparado para lidar com situações de emergência como é o caso. A partir do momento que se estabelece o diagnóstico, em conjunto com a equipe, deve-se direcionar para um manejo eficaz e adequado à resolução do laringoespasmo.

A compreensão aprofundada desses aspectos é crucial para os anestesiologistas e equipes cirúrgicas, visando garantir a segurança e o bem-estar dos pacientes pediátricos durante os procedimentos anestésicos.  

REFERÊNCIAS

  1. COSGROVE P, et al. Predictors of laryngospasm during 276,832 Episodes of Pediatric Procedural Sedation. Annals of Emergency Medicine. 2022;80(6):485-496.
  2. GAVEL G, WALKER RWM. Laryngospasm in anaesthesia. Continuing Education in Anaesthesia Critical Care & Pain. 2014;14(2):47–51. https://doi.org/10.1093/bjaceaccp/mkt031
  3. LEMOS AO, et al. Laringoespasmo na anestesia pediátrica: prevenção e manejo. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação. 2024;10(6). https://doi.org/10.51891/rease.v10i6.14348.
  4. MICHELET D, et al. Management of perioperative laryngospasm by French paediatric anaesthetists. British Journal of Anaesthesia. 2017;119(2):342-343.
  5. MOURA ATS, SILVA FCP, TAVES LOAF. Laringoespasmo em anestesia pediátrica. Rev Med Minas Gerais. 2018;28 (Supl 8): S20-S27. 
  6. OLSSON GL, HALLEN B. Laryngospasm during anaesthesia. Acta anaesthesiol. scand. 1984;28(1):567-575.
  7. ORLIAGUET GA, GALL O, SAVOLDELLI GL, COULOIGNER V. Case scenario: perianesthetic management of laryngospasm in children. Anesthesiology. 2012;116(2):458-71. doi: 10.1097/ALN.0b013e318242aae9.

1 Santa Casa de Franca, Franca – São Paulo.