INTERVENÇÕES PSICOEDUCACIONAIS NO MANEJO DA PESSOA COM TEA: REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10809666


Adriane Lima da Silva Oliveira¹; Laísa Andréa Ferreira Sampaio²; Maria Luziane Costa Pinto³; Kevin Silva de Oliveira4; Elaene Castro Vieira5; Ariel Elias Guimarães Rodrigues Branches6; Edilene Ferreira Machado Tavares7; Arthur Hector Viana de Alcântara8; Vitor Daniel Godinho dos Santos9; Valdilon Jáder Costa Lopes10.


Resumo

Objetivo: Identificar a prevalência de intervenções psicoeducacionais no manejo da pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) com resultados mais satisfatórios. Metodologia: Revisão de Literatura, com abordagem descritiva. Para a delimitação do tema foi inserido no Portal da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), por assunto, a junção dos descritores: “desenvolvimento AND autismo”; “Intervenções AND transtorno de espectro autismo” e “métodos AND autismo”. Estes Descritores foram redirecionados a vários bancos de dados, do qual utilizouse a base LILACS. Obteve-se 21 publicações disponíveis e, após os critérios de exclusão, 7 artigos foram selecionados. Resultados: Emergiram duas categorias temáticas a partir da análise dos artigos: “Intervenções motoras e sua influência na interação social de pessoas com TEA” e “A importância do mediador nas intervenções psicoeducacionais, que pro- movem aprendizado na pessoa com TEA”. Foi identificado que não há uma intervenção única que seja totalmente eficaz a nível psicoeducacional para as pessoas com TEA. As experiências mais eficazes são as que envolvem atividades que são propícias a favorecer e estimular o desempenho cognitivo, comportamental e comunicacional, como, por exemplo, dançaterapia, musicoterapia, treinamento em habilidades sociais, comunicação alternativa, entre outras. Considerações finais: Pode-se inferir que nas intervenções psicoeducacionais para pessoas com TEA, primeiramente, implica a compreensão do funcionamento da pessoa e de que forma pode-se adequar o ambiente e atividades que estimulem seu desenvolvimento.

Palavras-chave: Autismo. Intervenção psicoeducacional. Métodos. Profissionais.

Abstract

Objective: To identify the prevalence of psychoeducational interventions in the management of people with Autism Spectrum Disorder (ASD) with more satisfactory results. Methodology: Literature Review, with a descriptive approach. To delimit the topic, the following descriptors were inserted into the Virtual Health Library (VHL) Portal (VHL), by subject: “development AND autism”; “Interventions AND autism spectrum disorder” and “methods AND autism”. These Descriptors were redirected to several databases, from which the LILACS database was used. 21 available publications were obtained and, after the exclusion criteria, 7 articles were selected. Results: Two thematic categories emerged from the analysis of the articles: “Motor interventions and their influence on the social interaction of people with ASD” and “The importance of the mediator in psychoeducational interventions, which promote learning in people with ASD”. It was identified that there is no single intervention that is totally effective at a psychoeducational level for people with ASD. The most effective experiences are those that involve activities that are conducive to promoting and stimulating cognitive, behavioral and communicational performance, such as, for example, dance therapy, music therapy, training in social skills, alternative communication, among others. Final considerations: It can be inferred that in psychoeducational interventions for people with ASD, firstly, it involves understanding how the person functions and how the environment and activities that stimulate their development can be adapted.

Keywords: Autism. Psychoeducational intervention. Methods. Professionals.

1. INTRODUÇÃO

O autismo, também conhecido como Transtorno do Espectro Autista (TEA), é definido, segundo a American Psychiatric Association (APA, 2014), como um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, que mostram uma gama de manifestações de acordo com a idade e a capacidade, intervenções e apoios atuais. Os comportamentos incluem estereotipias motoras simples, como, por exemplo, abanar as mãos e estalar os dedos. Mas também, uso repetitivo de objetos, como girar moedas e enfileirar objetos, e fala repetitiva, como ecolalia, repetição atrasada ou imediata de palavras ouvidas, uso de “tu” ao referir-se a si mesmo, uso estereotipado de pala- vras, frases ou padrões de prosódia.

A adesão excessiva a rotinas e padrões restritos de comportamento pode ser manifestada por resistência a mudanças, como, por exemplo, sofrimento relativo a mudanças aparentemente pequenas, insistência em aderir a regras, rigidez de pensamento, ou por padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal, como realizar perguntas repetitivas ou percorrer um determinado perímetro. Os interesses são altamente limitados e fixos no autismo e tendem a ser aumentados em intensidade ou foco, como no caso de criança pequena muito apegada a uma panela, ou criança preocupada com aspiradores de pó, ou ainda, adulto que gasta horas escrevendo tabelas com horário (APA, 2014).

O percurso histórico do autismo se inicia por volta de 1940 com o psiquiatra infantil Leo Kanner e com a pesquisa de um pediatra, Hans Asperger, que descreveu um transtorno semelhante ao autismo descrito por Kanner. Até 1943, para às crianças que apresentavam graves transtornos mentais, eram reservados diagnósticos variados, que incluíam a debilidade mental, a psicose infantil e a esquizofrenia infantil. Kanner, médico austríaco emigrado para os EUA, descreveu em seu artigo, onze crianças cujo “distúrbio patognomônico” seria a incapacidade de se relacionar de maneira normal com pessoas e situações, desde os anos iniciais de vida. Para Kanner, o autismo englobava características como dificuldade de se relacionar com as pessoas, falha no uso da linguagem, resistências a mudanças, dificuldade cognitiva e intelectual, tumulto emocional, dentre outros (WHITMAN, 2019).

Atualmente, ainda é desconhecida a etiologia do autismo. Consideram-se que fatores ambientais, como, idade parental avançada, baixo peso ao nascer ou exposição fetal a ácido valpróico, podem contribuir para o risco de ocorrência do transtorno do espectro autista (APA, 2014). Comumente, as manifestações clínicas são identificadas por pais, cuidadores e familiares que experienciam padrões de comportamentos característicos do autismo, tendo em vista as necessidades singu- lares de cada criança (CARDOSO et al., 2014).

Neste sentido, considera-se de fundamental importância a presença da equipe multiprofissional no processo de diagnóstico e intervenção, a fim de compartilhar os questionamentos, as angústias e as necessidades dos familiares que se estabelecem no momento do diagnóstico (PINTO et al., 2016). Assim, o planejamento do tratamento deve ser estruturado de acordo com as etapas de vida do paciente, segundo Aman (2005). Enfatiza-se que as intervenções podem se configurar da seguinte forma, com crianças pequenas, a prioridade deveria ser terapia da fala, da interação social/linguagem, educação especial e suporte familiar. Sob tais perspectivas, com adolescentes, os alvos seriam os grupos de habilidades sociais, terapia ocupacional e sexualidade. Com adultos, questões como as opções de moradia e tutela deveriam ser focadas (BOSA, 2006).

Essas premissas apontam para a relevância de estudos que investiguem modelos de intervenções que se mostram efetivas no acompanhamento da pessoa com TEA, assim sendo, há uma sinalização para a variedade de serviços disponíveis, desde aqueles com abordagens individuais realizadas por profissionais intensamente treinados em uma área específica, até aqueles compostos por clínicas multidisciplinares (LORD; RUTTER, 2002). Para o mesmo autor, a eficácia do acompanhamento das intervenções depende da experiência e do conhecimento dos profissionais sobre o autismo e,  principalmente, de sua habilidade de trabalhar em equipe e com a família.

Em relação às intervenções, segundo Bosa (2006), quatro alvos básicos de qualquer tratamento, são: 1) estimular o desenvolvimento social e comunicativo; 2) aprimorar o aprendizado e a capacidade de solucionar problemas; 3) diminuir comportamentos que interferem com o aprendizado e com o acesso às oportunidades de experiências do cotidiano; 4) e ajudar as famílias a lidarem com o autismo. Portanto, o presente artigo, tem como objetivo, identificar a prevalência de intervenções psicoeducacionais no manejo da pessoa com Transtorno do Espectro Autista com resultados mais satisfatórios.

2. METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa do tipo Revisão de Literatura, com abordagem descritiva, no qual foram utilizados dados secundários de bases bibliográficas. Assim, por se tratar de uma pesquisa com bases bibliográficas não foi necessário a submissão do projeto de pesquisa ao Comitê de Ética Pesquisa, de acordo com a Resolução 510, de 07 de abril de 2016.

As etapas da revisão da literatura estão alicerçadas numa estrutura de trabalho definida por um protocolo previamente elaborado, as quais foram adotadas visando manter o rigor científico, a saber: 1) seleção da pergunta de pesquisa; 2) definição dos critérios de inclusão de estudos e seleção da amostra; 3) representação dos estudos selecionados em formato de tabelas, que representassem todas as características em comum; 4) análise crítica dos achados que identificasse diferenças e conflitos; 5) interpretação dos resultados; 6) apresentação da síntese estabelecida e revisão dos conteúdos.

Para a delimitação do tema foi inserido no Portal da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), no endereço, https://bvsalud.org/ foram realizados os seguintes passos para a busca: na plataforma, no item pesquisa avançada, utilizou-se o primeiro descritor, sendo, “desenvolvimento AND autismo” e os respectivos filtros, Lilacs (526), index psicologia periódicos (47) e BDE NF – enfermagem (10), Assunto principal transtorno do espectro autismo, Pesquisa qualitativa (68), Estudo observacional (26) e Ensaio clínico controlado (9), nos últimos 5 anos. Foram encontrados 44 textos completos, em seguida, foram selecionados 15 artigos pelo tema, para leitura do resumo.

Para o segundo descritor “Intervenções AND transtorno de espectro autismo”, com os filtros Medline, Lilacs, index psicologia – periódico, Estudo de avaliação, Ensaio clínico controlado, Pesquisa qualitativa e estudo observacional. Nos últimos 5 anos. Foram encontrados 9 textos completos e foram selecionados 3 para leitura do resumo.

Para o terceiro descritor métodos AND autismo, com os filtros Medline, Lilacs, index psicologia – periódico, Estudo de avaliação, Ensaio clínico controlado, Pesquisa qualitativa e estudo observacional. Nos últimos 5 anos. Foram encontrados 9 textos completos e foram selecionados 3 para leitura do resumo. Ao todo foram selecionados o N de 21 artigos pelo título, em seguida, foram analisados os resumos, e a partir dos resumos selecionou-se 7 para leitura completa e análise dos textos.

Nessa pesquisa houve a utilização somente de artigos online, com acesso gratuito. Os critérios de inclusão definidos para a seleção foram: artigos publicados em português e completos, artigos de revisão de literatura, artigos que envolviam o manejo comportamental e psicológico de pessoas com TEA, artigos publicados e indexados nos referidos bancos de dados nos últimos cinco anos (2017 a 2022). Foram excluídos documentos técnicos, resumos de congressos, dissertações, teses, anais, editoriais, comentários e opiniões, artigos específicos que envolviam outros campos de atuação e, que não continham envolvimento com práticas psicológicas e comportamentais como, por exemplo, nutrição e enfermagem, trabalhos não encontrados na íntegra e aqueles que não se adequavam segundo os descritores e objetivo do trabalho. Após realizada a busca sendo N de 21, e utilizando-se os critérios de inclusão e exclusão, analisou-se o N de 7 artigos, dos quais foram realizadas as discussões. A figura 1 representa o processo de triagem dos textos.

Figura 1– Fluxograma da seleção dos artigos elegíveis para o estudo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para melhor identificação de cada estudo selecionado, organizou-se uma exposição dos artigos em sequência alfanumérica, iniciando em A1 até A7 (Tabela 1).

Tabela 1 – Trabalhos com intervenções psicoeducacionais com pessoas com TEA

TítuloAutor/AnoObjetivosResultados
A1Adequações didático-
metodológicas
na prática do surfe para pessoas com
transtorno do espectro autista
MORAES;
MARINHO,
2021.
Identificar as adequações didático-
metodológicas utilizadas nas aulas de surfe para pessoas com transtorno de espectro autista.
O surfe se apresentou como uma atividade de oportunidade de desenvolvimento para pessoas com TEA e os professores devem respeitar as individualidades dos
alunos e estarem dispostos a realizar adaptações.
A2Estratégias para o transtorno do espectro autista: interação social e intervenções terapêuticasNASCIMENTO; BITENCOURT; FLEIG, 2021.Identificar os fatores que dificultam as intervenções terapêuticas motoras em crianças com TEA.A concepção metodológica com a prática de imitação, associada a uma dinâmica prazerosa do exercício rítmico, é a melhor sugestão para contemplar o direcionamento das pesquisas contemporâneas, uma vez que, quando prevalece a inter-relação entre interação social, aprendizagem motora e percepções sensoriais, os desfechos são mais significativos para essas crianças.
A3Práticas com- plementares ao transtorno Do espectro autista infantilVIANA; LIMA; SOUZA; BORGES, 2020.O objetivo deste estudo e identificar as práticas complementar es ao transtorno do espectro autista infantil encontradas em publicações nacional e internacional.Conclui-se que as práticas complementares contribuem de forma eficaz para o tratamento do TEA, possibilitando um prognostico e evolução positiva no desenvolvimento físico, motor e na comunicação verbal e não verbal.
A4Transtorno do Espectro Autista e Interações Escolares: Sala de Aula e PátioLEMOS; NUNES; SALOMÃO, 2020.Analisar episódios interacionais de crianças com autismo nos contextos de sala de aula e pátio, considerando seus pares e professores.Sobre as interações entre os pares, destaca-se que as trocas propostas, foram mais frequentes durante as atividades livres, sem direcionamento, no contexto de sala de aula. Por fim, ressaltasse o papel do estudo dos episódios interacionais para os processos de pesquisa, avaliação e intervenção na área escolar.
A5Inclusão escolar e autismo: sentimentos e práticas docentesWEIZENMANN; PEZZI; ZANON, 2020.Investigar a experiência de professores em relação à inclusão de alunos com TEA, contemplando sentimentos e práticas docentes.O estudo mostrou que os primeiros sentimentos que emergiram nos professores foram o medo e a insegurança. Após o período de adaptação, esses sentimentos modificaram-se, transformando-se em segurança no seu trabalho. Com relação à prática pedagógica, foi verificado que os docentes realizaram adequações pedagógicas de acordo com as características de cada aluno.
A6Habilidades comunicativas de crianças com autismoPEREIRA; SAN- TOS; LEITE; XAVIER; MON- TENEGRO, 2022.Investigar as habilidades de comunicação de um grupo de crianças com transtorno do espectro do autismo e a relação com a faixa etária e intervenção fonoaudiológica.Os resultados obtidos demonstram que há relação entre as habilidades comunicativas e faixa etária e que a intervenção com comunicação alternativa contribui para o desenvolvimento da atenção compartilhada.
A7Estudo de Caso sobre Atividades Desenvolvidas para um Aluno com Autismo no Ensino Fundamental IAPORTA; LACERDA, 2018.Apresentar atividades propostas para um aluno com Transtornos do Espectro Autista que frequentou o segundo ano do Ensino Fundamental em uma escola na rede privada de ensino em uma cidade de médio porte do interior do Estado de São Paulo.Os resultados mostraram adequações realizadas pela professora e a identificação do desenvolvimento da aprendizagem do aluno durante o ano letivo, reforçando-se a ideia da prática de procedimentos especiais aos alunos PAEE por meio de adequações eficazes. A professora não deixou o aluno com TEA com atividades diferentes em relação à toda a turma, oferecendo a ele condições diversificadas para a aprendizagem.

Para analisar e discutir a perspectiva das intervenções psicoeducacionais, organizaram-se os estudos selecionados em categorias por adesão temática apresentada, a saber: “Evidência de intervenções eficazes e sua influência na interação social de pessoas com TEA” e “A importância do mediador nas intervenções psicoeducacionais, que promovem aprendizado na pessoa com TEA” (Tabela 2).

Tabela 2 – Classificação dos estudos em categorias temáticas

CategoriasArtigos selecionados
Evidência de intervenções eficazes e sua influência na interação social de pessoas com TEA;A1, A2, A3, A4.
A importância do mediador nas intervenções psicoeducacionais, que promovem aprendizado na pessoa com TEA.A5, A6 e A7.

3.1 Evidência de intervenções eficazes e sua influência na interação social de pessoas com TEA

O manual de Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais (APA, 2014) aponta que o TEA apresenta características cognitivas, comportamentais e comunicacionais. Para tanto, as intervenções psicoeducacionais em pessoas com TEA são de fundamental importância, levando em consideração a necessidade de superar desafios para proporcionar melhor qualidade de vida. Logo, elenca-se que os resultados obtidos, a partir do levantamento dos estudos, mostram que as intervenções contribuem como uma ferramenta que auxilia no desenvolvimento de novos repertórios comportamentais e relacionais. Para Moraes e Marinho (2021), atividades como o surfe, por exemplo, envolvem inclusão social, autonomia, dessensibilização, interação com o meio ambiente, desenvolvimento e bem-estar, ainda, para os autores supracitados, tais práticas favorecem mais conteúdos de habilidades sociais, psicológicos e físicos.

Corroborando, o estudo realizado por Nascimento, Bitencout e Fleig (2021) aponta sobre os benefícios das atividades rítmicas que podem melhorar o desenvolvimento social e estabelece-se, durante a execução, um ambiente agradável e de fácil aprendizagem. No entanto, a pessoa com TEA pode também apresentar níveis reduzidos na execução de atividades motoras, havendo a necessidade da elaboração de instrumentos que abarquem esta demanda. Na pesquisa realizada por Viana et al. (2020) aponta-se que terapias complementares também contribuem no desenvolvimento físico e motor, e exemplificam atividades como a musicoterapia e a dançaterapia, que podem dar leveza aos movimentos, equilíbrio e coordenação, além de melhorar a comunicação, aumentando o vínculo social e familiar.

Viana et al. (2020) abordam que os jogos e brincadeiras são formas de expressão da imaginação, pois a maioria não possui relação afetiva com os brinquedos, ou seja, algumas não se interessam em brincar e outras acabam brincando de forma não tradicional. Nesta perspectiva, Lemos, Nunes e Salomão (2020), em um estudo de caso, citam que atividades como oferecer ajuda física para a pessoa com TEA são mais eficazes quando dão continuidade em comportamentos já iniciados pela própria criança. Tal estudo descreve que a professora favoreceu um ambiente no pátio, de convite para brincar e cantar músicas sentadas no chão em círculos, e estas intervenções proporcionaram interação social por parte das crianças com o colega autista.

Nesta perspectiva, infere-se que a forma relacional com uma pessoa com autismo pode ser administrada de diversas formas, e uma intervenção não tem por função adquirir apenas uma habilidade, e sim favorecer um conjunto de repertórios que auxiliem a pessoa a desenvolver comportamentos até então difíceis. Para confirmar tal assertiva, Moraes e Marinho (2021), ao relatar sobre um aluno da aula de surfe, afirmam que a expectativa não era necessariamente aprender o surfe, mas, com as adaptações realizadas, era possível olhar diretamente no olho do aluno, desenvolver o tato, falar mais devagar, e acrescentam que parece como dar aula para uma pessoa qualquer.

Além disso, Viana et al. (2020) concluem que outras práticas fundamentais podem ser utilizadas nas intervenções da pessoa com autismo, sendo, musicoterapia, equoterapia, cinoterapia, atividade física, ludoterapia e a psicomotricidade, que podem auxiliar na aquisição de autonomia, bem-estar físico e psicológico, sem retirar a energia e potencial da criança.

3.2 A importância do mediador nas intervenções psicoeducacionais, que promovem aprendizado na pessoa com TEA

O processo de incluir a pessoa com autismo perpassa pela capacitação também de profissionais, uma vez que precisa criar um ambiente que promova o desenvolvimento. Neste sentido, Weizenmann, Pezzi e Zanon (2020) elencam alguns fatores que impactam nesta inclusão, sendo que a falta de conhecimento e as crenças ou ideias distorcidas dos mediadores em relação a pessoa com autismo podem interferir na prática pedagógica dos docentes.

O estudo de Weizenmann, Pezzi e Zanon (2020) analisou conteúdos como: 1) sentimentos do professor; e 2) prática pedagógica, e os resultados mostraram que os professores ao receberem aluno com TEA sentiram medo e insegurança, afirmando não ter conhecimento suficiente. Em relação a prática pedagógica, as professoras relatam não interferir na dinâmica das aulas.

Resultados semelhantes foram encontrados por Aporta e Lacerda (2018), em que professores foram entrevistados e externalizaram falas como “sentir-se ansiosa” e “questionarem-se em relação a como seria a metodologia de trabalho”, “considerando o TEA majoritariamente biológico”, e ainda os professores afirmavam que os desafios que eles consideravam que seu aluno autista não conseguiria resolver, não permitiam os alunos vivenciar tal experiência. Assim, compreende-se que privar a pessoa com TEA de determinados desafios, também a impede de adquirir em seu repertório novos comportamentos, novas formas de lidar com as situações.

Em um estudo realizado por Pereira et al (2022), elenca-se que crianças autistas, entre dois e sete anos, foram constatadas com características pré- linguísticas como protestar, sorrir e expressar comodidade. Além da linguagem, estas apresentavam comprometimento no uso funcional do brincar e no brincar simbólico. Contudo, considerando que o brincar está associado ao desenvolvimento afetivo, social, cultural e motor, a criança com TEA com dificuldades no brincar pode apresentar limitações na aprendizagem, participação social e com pares, o que revela a importância de intervenções eficazes e precoces.

Ainda no estudo de Pereira et al. (2022), identificou-se que as crianças que foram submetidas a intervenção com comunicação alternativa apresentavam melhora significativa na atenção compartilhada. Levando a inferência de que a comunicação alternativa contribui de forma positiva e, consequentemente, interfere no desenvolvimento da comunicação e interação social. Para observação de comunicação alternativa foi utilizado no estudo o protocolo de avaliação ACOTEA, que descreve afirmativas, como por exemplo, “expressa incomodo quando sente dor, fome ou assustado”.

Assim sendo, compreende-se que a linguagem é expressa quando a pessoa entende o outro como agente comunicacional, ou seja, trabalhar com a linguagem supera a ideia de que um conteúdo formal do jeito que é apresentado nem sempre será de fácil acesso para a pessoa com TEA. Logo, ressalta-se que tais habilidades requerem do profissional conhecimento, para que não dificulte o desenvolvimento das mesmas.

É importante elencar que, nesta perspectiva de desempenho do profissional, o âmbito científico vem apresentando importantes contribuições. Em relação às atividades psicoeducacionais, o estudo realizado por Steinbrenner et al. (2020) categorizou 28 Práticas Baseadas em Evidências – PBE no manejo para a pessoa com TEA. Observa-se que as atividades descritas englobam também alguns dos resultados encontrados no presente estudo.

Para melhor compreensão, a seguir, serão detalhadas as 28 práticas de PBE encontradas por Steinbrenner et al. (2020), e suas respectivas descrições, e serão classificadas aqui, com a identificação de (1) a (28) e, concomitante, será feito o diálogo com os textos levantados no presente estudo, classificados de (A1 a A7).

À guisa de exemplificação, o texto (A1) de Moraes e Marinho (2021) que identificou o surfe como uma atividade de oportunidade de desenvolvimento para pessoas com TEA, e que os professores devem respeitar as individualidades dos alunos e estarem dispostos a realizar adaptações, pode estar inclusa na PBE, elencada por Steinbrenner et al. (2020), sendo a prática de (1) Exercício e Movimento (EXM), que consiste em intervenções que usam esforço físico, habilidades motoras específicas/ técnicas de movimento consciente para direcionar uma variedade de habilidades comportamentais.

O estudo de Viana et al. (2020) considerou que as práticas complementares como musicoterapia, por exemplo, contribuem de forma eficaz para o tratamento do TEA, possibilitando um prognostico e evolução positiva no desenvolvimento físico, motor e na comunicação verbal e não verbal. E pode dialogar com a PBE, sendo a (2) intervenção mediada por música – que consiste em intervenções que incorpora canções, entonação melódica para apoiar a aprendizagem ou o desempenho de habilidades/ comportamentos. Isso incluía a musicoterapia e outras intervenções que incorporam música para trabalhar comportamento alvo.

O estudo de Pereira et al. (2022), que identificou relação entre as habilidades comunicativas e faixa etária, e que a intervenção com comunicação alternativa contribui para o desenvolvimento da atenção compartilhada, pode dialogar com a PBE (3), Treino de Comunicação Funcional (FCT), que consiste em um conjunto de práticas que substituem um comportamento desafiador, que tem função de comunicação por meios mais adequados e eficazes de comunicação e habilidades comportamentais. E ainda, a intervenção de PBE (4), Comunicação alternativa e aumentativa (AAC), que consiste em intervenções usando e/ ou ensinando o uso de um sistema de comunicação não verbal/ vocal que pode ter ajuda, por exemplo, dispositivo, caderno de comunicação, ou sem ajuda, por exemplo, linguagem gestual.

A pesquisa de Lemos, Nunes e Salomão (2020), que teve como resultado que as interações propostas em sua pesquisa foram mais frequentes durante as atividades livres, ou seja, aquelas que não haviam direcionamento específico, no contexto de sala de aula, pode dialogar com a PBE (5), Modelação (MD), que consiste na demonstração de comportamentos alvos desejados, que resultam na aquisição desse repertório pelo aluno, ou seja, propostas em sala de aula, estruturadas ou livres, favorecem ao aluno modelar comportamentos. Portanto, observa-se que, do levantamento de 7 textos neste estudo, foram correlacionados 4 textos, que englo- bam práticas baseadas em evidência.

As demais classes de PBE, elencadas por Steinbrenner et al. (2020), são as seguintes: (6) Intervenções baseadas no antecedente (ABI); (7) Momentum Comportamental (BMI); (8) Comportamento cognitivo/ Estratégias instrucionais (CBIS); (9) Reforço diferencial de comportamento alternativo, incompatível ou outro (DR); (10) Instrução Direta (DI); (11) Treino em Tentativa Discreta (DTT); (12) Extinção (EXT); (13) Avaliação Funcional de Comportamento (FBA); (14) Intervenções naturalísticas (NI); (15) Intervenção Implementada pelos pais (PII); (16) Instrução e intervenção baseada em pares (PBII); (17) Dicas (PP); (18) Reforçamento (R); (19) Interrupção da resposta/ redirecionamento (RIR); (20) Auto monitoramento (SM); (21) Integração sensorial® (SI); (22) Narrativas Sociais (SN); (23) Treino de Habilidades Sociais (SST); (24) Análise de Tarefas (TA); (25) Instruções e intervenções assistida por tec- nologia (TAII); (26) Atraso de Tempo (TD); (27) Vídeo Modelação (VM); (28) Suportes Visuais (VS).

A importância de se identificar as práticas psicoeducacionais que apontam resultados positivos no manejo da pessoa com TEA, baseadas em evidências científicas, podem nortear profissionais e familiares na aquisição de comportamentos e, assim, favorecerem um ambiente propício ao desenvolvimento e a interação social objetivadas. As pesquisas com pessoas com TEA ainda mostram algumas carências, como o pequeno número de participantes ou ainda o desenho metodológico, que no caso das práticas psicoeducacionais, deveria ser longitudinal. Por outro lado, evidencia-se um interesse aumentado na investigação de condições que interferem na qualidade de vida das pessoas com TEA.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se inferir que nas intervenções psicoeducacionais para pessoas com TEA, primeiramente, implica a compreensão do funcionamento da pessoa e de que forma esta considera um ambiente de desenvolvimento. Os estudos aqui levantados mostram que não há uma única alternativa, e as atividades existentes são propícias a favorecer as habilidades sociais, o relacionamento interpessoal, e acadêmicas.

Este estudo objetivou identificar a prevalência de intervenções psicoeducacionais no manejo da pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) com resultados mais satisfatórios. Para tanto, o levantamento realizado não evidenciou uma forma, um método único que se apresente com total eficácia, e sim, uma construção de conhecimentos e conteúdos que abarquem a temática e perpassam pela capacitação de profissionais e informação ao público.

Neste sentido, os resultados sugerem a necessidade da realização de novos estudos que contemplem o objetivo, em decorrência das limitações apresentadas como o baixo número amostral de pesquisas levantadas. Contudo, espera-se contribuir e abrir novos questionamentos em relação as intervenções no contexto TEA.

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WHITMAN, T. L. O desenvolvimento do autismo: social, cognitivo, linguístico, sensório-motor e perspectivas biológicas. São Paulo: M. Books, 2019.


¹Docente na Universidade da Amazônia – UNAMA
²Acadêmica na Universidade da Amazônia – UNAMA
³Acadêmica na Universidade da Amazônia – UNAMA
4Acadêmico na Universidade da Amazônia – UNAMA
5Acadêmica na Universidade da Amazônia – UNAMA
6Acadêmica na Universidade da Amazônia – UNAMA
7Acadêmica na Universidade da Amazônia – UNAMA
8Acadêmico do Instituto Esperança de Ensino Superior – IESPES
9Acadêmico do Instituto Esperança de Ensino Superior – IESPES
10Acadêmico do Instituto Esperança de Ensino Superior – IESPES