NÓDULO UMBILICAL METASTÁTICO (OU NÓDULO IRMÃ MARIA JOSÉ): RELATO DE EXPERIÊNCIA DO DIAGNÓSTICO AOS CUIDADOS PALIATIVOS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE (APS)

 METASTATIC UMBILICAL NODULE (OR SISTER MARY JOSEPH NODULE): A CASE REPORT FROM DIAGNOSIS TO PALLIATIVE CARE IN PRIMARY HEALTH CARE (PHC)

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10712622


Marcelo Ribeiro Artiaga1; Kellen Karenine Pinho de Medeiros2; Kessia Jeane Pinho de Medeiros3; Rafael Barbosa de Almeida4; Caio Álvares Bitencourt5; Samanta Hosokawa Dias de Novoa Rocha6; Raynner Augusto Moreira Parente7; Hiromi Teruya Trevisan8; Heleura Cristina Oliveira9; Pablo Randel Rodrigues Gomes10


RESUMO.

O nódulo conhecido como “Irmã Maria José” é um tumor metastático que afeta a cicatriz umbilical e pode ser o primeiro sinal de disseminação de uma neoplasia intra-abdominal. Os autores do trabalho descrevem o caso de um paciente com o nódulo da “Irmã Maria José” desde o processo de investigação e diagnóstico de tumor no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS). É importante destacar que o nódulo foi identificado durante o exame físico do paciente em uma consulta de acompanhamento por doença crônica. A partir da constatação do sinal, foram solicitados todos os exames e realizados os encaminhamentos necessários para confirmação diagnóstica e avaliação terapêutica de acordo com os protocolos adotados pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Isso ressalta a relevância da atenção primária, não apenas como porta de entrada, mas também como uma fonte de cuidado primário, secundário, terciário e quaternário

Palavras-chave: Metástase cutânea, Nódulo da Irmã Maria José, Nódulo umbilical. Tumor de pâncreas.

ABSTRACT

The nodule known as “Sister Mary Joseph nodule” is a metastatic tumor that affects the umbilical scar and may be the first sign of the spread of an intra-abdominal neoplasm. The authors of the study describe the case of a patient with the “Sister Mary Joseph nodule” from the investigation and diagnosis process of a tumor in the context of Primary Health Care (PHC). It is important to highlight that the nodule was identified during the patient’s physical examination in a follow-up appointment for a chronic disease. Upon noticing the sign, all necessary tests were requested, and referrals were made for diagnostic confirmation and therapeutic evaluation according to the protocols adopted by the Health Department of the Federal District. This underscores the relevance of primary care not only as an entry point but also as a source of primary, secondary, tertiary, and quaternary care.

Keywords:  Cutaneous metastasis, Sister Mary Joseph nodule, Umbilical nodule. Pancreatic tumor.

INTRODUÇÃO 

O primeiro registro de um tumor na região umbilical causado por câncer foi feito em 1846 por Walshe (Shetty)1, e posteriormente o termo “Nódulo de Irmã Maria José” foi utilizado para descrever a lesão metastática na cicatriz umbilical por Bailey2. A Irmã Maria José, uma assistente que trabalhou no Hospital St. Mary em Rochester, Minnesota, de 1889 a 1939, observou a relação entre: nódulo umbilical e a presença de tumor maligno intra-abdominal13-5

O Nódulo de “Irmã Maria José” é um pequeno nódulo endurecido na região umbilical, podendo ser saliente ou não, e às vezes é o primeiro ou único sinal de uma neoplasia maligna13,5-8. Os tumores mais comumente associados a um nódulo umbilical metastático são originados do trato gastrointestinal (estômago5, cólon6,9-11, pâncreas7 e intestino delgado12) e do trato gênito-urinário (ovário13, endométrio14, colo do útero15 e rim16). Mais raramente, podem ser encontradas metástases umbilicais de linfoma17,18, câncer de mama19 e tumor carcinóide20. A disseminação pode ocorrer por via hematogênica, linfática ou por continuidade1,3,4. A avaliação histopatológica do nódulo pode ser realizada por meio de biópsia excisional ou aspiração por agulha1,3-5,13,21.

A metástase cutânea para a região umbilical está frequentemente associada a uma rápida progressão da doença neoplásica, levando ao óbito em poucos meses, raramente com sobrevida superior a 5 anos1,3,7,12,13. No diagnóstico diferencial, é importante excluir hérnia umbilical, infecção local com granuloma piogênico e tumores primários malignos ou benignos na região umbilical.

A Atenção Primária à Saúde é a porta de entrada e o centro articulador de acesso dos usuários do SUS. Em se tratando de neoplasias malignas, sabe-se que muitas vezes o sucesso de seu tratamento e/ou otimização da qualidade de vida do paciente decorre de um diagnóstico precoce. Essa é a justificativa para o rastreamento universal de alguns cânceres, como o de colo de útero, de mama e de cólon, realizados pelo Sistema Único de Saúde. Contudo, a maior parte dos cânceres, como o de pâncreas, não possuem programas de rastreamento, seja pela inexistência de métodos com sensibilidade e valores preditivos satisfatórios ou pela inviabilidade financeira. Assim, entende-se que o médico de família e comunidade tem papel fundamental na condução dessas enfermidades, uma vez que é ele quem não somente conduz o acesso do usuário aos serviços de que necessita, mas também quem inicialmente suspeita e identifica esses quadros. Isso acontece porque é a atenção primária o nível ao qual o usuário tem mais fácil acesso e, portanto, são seus serviços que buscará o usuário quando instalado um novo sintoma e porque são os profissionais da APS quem têm a maior possibilidade de avaliação integral e longitudinal do paciente, podendo mais frequentemente perceberem sinais de neoplasias não universalmente rastreáveis.

METODOLOGIA

Trata-se de um relato de experiência, estudo descritivo e observacional, no qual será avaliado, de forma retrospectiva, o prontuário de um indivíduo com histórico de hipertensão arterial sistêmica não compensada, diabetes mellitus tipo 2 não compensado, depressão grave e diagnóstico de neoplasia intra-abdominal maligna em uma Unidade Básica de Saúde do Distrito Federal no período de Janeiro de 2022 a Junho de 2023.

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Paciente C.A.A de 65 anos de idade vem a consulta para acompanhamento de DM2 insulino-dependente, hipertensão arterial sistêmica e depressão moderada/grave. Paciente não realiza as medicações de forma correta. Paciente em uso de Insulina NPH 0-0-10UI, Metformina de ação prolongada 500 mg 0-2-2, Amitriptilina 0-0-1. Sinvastatina 40mg 0-0-1. Logo é notado que paciente está com vestimentas largas e feito perguntas sobre hábitos alimentares e se necessidade fisiológicas estavam preservadas, porém paciente relata que há aproximadamente 5 dias não conseguia evacuar. Feito exame físico nota-se crescimento de nodulação periumbilical com crescimento constante.  

Paciente no momento em Regular estado geral, normotenso, acianótico e anictérico, porém emagrecido, relato de perda de 10 kg em 7 meses segundo checagem de prontuário. Ao continuar exame físico abdominal é encontrado sinal de Mary Joseph, nódulo umbilical de coloração avermelhada/acastanhada, endurecida e irregular, concomitantemente com distensão abdominal e ascite. Pergunta-se ao paciente a quanto tempo o sinal surgiu, paciente relata que há aproximadamente 4 meses, porém sem certeza. 

Figura 1: Nódulo Irmã Maria José

Fonte: elaborada pelo autor.

Imediatamente é solicitado via regulação SUS (SISREG) Tomografia Computadorizada de Abdome superior e pelve, testes rápidos para hepatite b, hepatite C, HIV e Sífilis, Exames laboratoriais e retorno imediatamente após resultado de exames e retorno imediato assim que exames estivessem prontos e mesmo ponderado visita domiciliar. Regulação aceita pedido de tomografia para ser realizada no dia posterior o qual laudo relata : Tumor hipodenso septado ao longo do corpo e cauda do pâncreas, medindo cerca de 9 cm com aparente infiltração da cabeça pancreática. Volumosa ascite com sinais de carcinomatose peritoneal havendo múltiplos nódulos peritoneais/ mesentéricos e espessamento peritoneal difuso. Nódulo com densidade de partes moles periumbilical medindo cerca de 2 cm. Espessamento do ileo terminal. Espessamento nodular da adrenal esquerda. Fígado sugerindo hepatopatia crônica. 

Assim que se tem resultado em mãos é programada visita domiciliar já no outro dia e realizado protocolo spikes de más notícias com paciente e familiares, onde há o acolhimento e solicitado para que paciente vá em Unidade Básica de Saúde para passar por profissionais do NASF.  Paciente mesmo se recusando, comparece a Unidade Básica de Saúde e é feito acolhimento, sendo feito consultas com nutricionista e psicóloga. E até mesmo levando-o ao grupo de HiperDia, porém logo a doença em sua evolução natural levou-o a não responder mais, sendo solicitada os cuidados paliativos onde veio a falecer.

DISCUSSÃO

O nódulo conhecido como “Irmã Maria José” indica a presença de uma neoplasia intra-abdominal disseminada1-5,23,24. Esse nódulo é um achado raro durante o exame físico e pode ser o primeiro sinal de uma neoplasia intra-abdominal avançada, geralmente não passível de ressecção. A presença do nódulo da “Irmã Maria José” deve ser considerada um indicador de neoplasia intra-abdominal, com origem principalmente no trato gastrointestinal (52%) ou ginecológico (28%). Em 40% dos casos, o nódulo pode indicar recidiva de neoplasias previamente ressecadas25. Os tumores mais comumente associados a esse tipo de metástase cutânea são o ovário em mulheres e o estômago e cólon em homens1,4,5.

A hipótese de adenocarcinoma de pâncreas metastático foi reforçada pela positividade do anticorpo anti-CA-19,9. A presença desse antígeno é observada em 90% dos pacientes com adenocarcinoma de pâncreas. 

No caso relatado, o nódulo cutâneo umbilical metastático (“Nódulo da Irmã Maria José”) e a positividade do CA 19,9, juntamente com os resultados dos exames de imagem (Ressonância Magnética com Contraste  e tomografia computadorizada), nos permitiram fazer retrospectivamente o diagnóstico de adenocarcinoma pâncreas na atenção primária o que nos fez realizar todos os protocolos sendo autores no cuidado primário até o cuidado quaternário, onde houve paliação do paciente.

Destacamos a importância da Unidade Básica de Saúde 05 – Taguatinga Sul  de avaliar com critério e cuidado qualquer lesão umbilical e correlacioná-la com o diagnóstico. É importantíssimo mostrar para outros médicos a importância do exame físico e de tudo que foi feito na Unidade Básica de Saúde com rapidez e resolubilidade. No caso de suspeita de malignidade, o uso do exame físico, da clínica e de exames de imagem e laboratoriais, embora este estiverem todos normais, mostrou-se totalmente útil para determinar o diagnóstico da neoplasia metastática e ter rapidez em todo seu cuidado, seguindo protocolos e fluxos estabelecidos pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse caso clínico apresentado tem uma forte importância, pois demonstra o quanto a Medicina de Família e Comunidade agiu em todos os campos de atenção, com rapidez e resolutividade assim que detectado no exame físico um achado clínico muito raro.  Importante ressaltar também que o caso irá ajudar a capacitar médicos a não deixarem sinais como esses passarem despercebidos a capacidade da APS de exercer a integralidade do cuidado tanto para o paciente quanto para seus familiares. Demonstrando, assim, que a Atenção Primária à Saúde, quando realizada com responsabilidade, mostrou-se eficaz em todos seus níveis:  atenção primária, secundária, terciária e quaternária.

REFERÊNCIAS

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1Autor Principal – Unidade Básica de Saúde 05 de Taguatinga – Médico Residente Medicina de Família e Comunidade Secretária de Saúde do Distrito Federal;
2Coautora – Clínica Médica pelo HRAN e Residente de Endocrinologia do Instituto Hospital de Base do Distrito Federal;
3Coautora- Estudante de Medicina pelo Centro Universitário do Planalto Central Aparecido dos Santos (UNICEPLAC);
4Coautor- Interno de Medicina pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB);
5Coautor – Interno de Medicina pela Universidade de Brasília –UnB;
6Orientadora Médica de Família e Comunidade pela Unidade Básica de Saúde 05 de Taguatinga do Distrito Federal;
7Orientadora Médica de Família e Comunidade pela Unidade Básica de Saúde 05 de Taguatinga do Distrito Federal;
8Orientadora Médica de Família e Comunidade pela Unidade Básica de Saúde 05 de Taguatinga do Distrito Federal;
9Orientadora – Psicóloga Clínica pela Unidade Básíca de Saúde do Distrito Federal;
10Orientador pela Estratégia de Saúde da Família do Distrito Federal.