IMPACTO DA PANDEMIA PELA COVID-19 NAS COBERTURAS VACINAIS NO TERRITÓRIO BRASILEIRO DE 2017 A 2022

IMPACT OF THE COVID-19 PANDEMIC ON VACCINATION COVERAGES IN BRAZILIAN TERRITORY FROM 2017 TO 2022

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10682730


Krishna Sisnando Araújo Amorim1; Maria Gabriela Dias da Silva; Ana Katarina Gonçalves de Siqueira1; Mariane Barboza Soares1; Fernanda Maria Fernandes de Carvalho1; Bruna Miranda Barbosa1; Ana Beatriz Tavares Cruz de Albuquerque1; Rafaela Cristina Vieira Silva1; Gabriella Priscila Pereira de Melo Napoleão2; Conceição Maria de Oliveira3 


RESUMO

Objetivo: descrever os impactos da pandemia pela covid-19 nas coberturas vacinais da população brasileira no período de 2017 a 2022. Método: realizou-se um estudo descritivo observacional com abordagem quantitativa baseado em dados epidemiológicos da cobertura vacinal de toda população, segundo o calendário vacinal do Ministério da Saúde, do período de 2017 a 2022. Para avaliar o impacto nas coberturas vacinais, comparou-se os dados dos triênios 2017 a 2019, antes da pandemia pela covid-19, com 2020 a 2022, período pandêmico. Os dados da cobertura vacinal foram obtidos do Departamento de  Informática do Sistema Único de Saúde. Resultados: no Brasil constatou-se decréscimo de 9,8% nas coberturas vacinais, variando de 72,9% em 2017 para 65,8% em 2022, atingindo a menor cobertura em 202 (61,1%). Já no comparativo por regiões o Nordeste apresenta um dos piores valores de cobertura vacinal desde 2017  (70,1%). Os imunizantes com maior redução na cobertura vacinal, na comparação do  triênio pré-pandêmico com o pandêmico, em todas as regiões do país foram: tetra viral, tríplice viral D2, e dupla adulto + tríplice acelular gestante. A vacina tetra viral possui a pior variação de cobertura vacinal com uma redução de mais de 50% no período pandêmico em todas as regiões. Conclusão: O Brasil apresentou decréscimo na cobertura vacinal durante a pandemia pela covid-19, sendo mais acentuado nas regiões Nordeste e Norte, assim como nos imunobiológicos tetra viral/SRC+VZ e dT+dTpa gestante. 

Palavras-chave: Cobertura vacinal. Pandemia. Covid-19.

ABSTRACT

Objective: Describe the impacts of the covid-19 pandemic on the vaccination coverage of the Brazilian population from 2017 to 2022. Methods: Carried out through a descriptive observational study with a quantitative approach based on epidemiological data of vaccination coverage of the entire population, according to the vaccination schedule of the Ministry of Health (MH), from 2017 to 2022. To assess the impact on vaccination coverage, the target and vaccine abandonment in trienniums were compared, 2017 to 2019 before the covid-19 pandemic, with 2020 to 2022, the pandemic period. The vaccination coverage data was obtained of the Department of Informatics of the Unified Health System (DATASUS). Results: In Brazil there was a decrease of 9.8%, ranging from 72.9% in 2017 to 65.8% in 2022, reaching the lowest coverage in 2021 (61.1%). In the comparison by regions, the Northeast presents one of the worst rates ​​of vaccination coverage since 2017 (70.1%). The vaccines with the greatest reduction in vaccination coverage, in the comparison of the pre-pandemic with the pandemic triennium, in all regions of the country were: tetra viral (SCR+VZ), triple viral D2, and double adult + pregnant acellular triple (dT + pregnant dTpa). The tetra viral vaccine (SCR+VZ) has the worst variation in vaccine coverage with a reduction of more than 50% in the pandemic period in all regions. Conclusion: The Brazil showed a decrease in vaccination coverage during the covid-19 pandemic, being more pronounced in the Northeast and North regions, as well as in the tetraviral immunobiologicals/SRC+VZ and dT+dTpa.

Keywords: Vaccination coverage. Pandemic. Covid-19

INTRODUÇÃO

As vacinas constituem uma importante ferramenta para a profilaxia de doenças infectocontagiosas, contribuindo para a diminuição de agravos a saúde (Santos et al., 2022). Trata-se do principal meio de intervenção preventiva e eficaz, capaz de influenciar tanto na morbidade e mortalidade, quanto na diminuição dos custos que o Estado teria em consultas, internamentos e medicações (Nóvoa et al., 2020).

No Brasil, em 1973, foi instituído o Programa Nacional de Imunizações (PNI), com o objetivo primordial de coordenar e sistematizar estratégias de vacinação em todo o território nacional. Tal programa estabeleceu ações para prevenção, controle e erradicação de diversas doenças infectocontagiosas. Neste mesmo ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) concedeu ao Brasil o certificado internacional de erradicação da varíola (Gugel et al., 2021).

O PNI se tornou parte essencial do Sistema Único de Saúde (SUS), e desde a sua criação vem expandindo no âmbito da saúde pública. É um programa reconhecido internacionalmente por sua atuação e abrangência (Xavier; Pontes, 2022). Segundo o Ministério da Saúde (MS), anualmente são ofertados e distribuídos pelo PNI à população 48 imunobiológicos (vacinas, imunobiológicos especiais, soros e imunoglobulinas) (Martins et al., 2023).

Contudo, com o decorrer dos anos, o Brasil passou a registrar redução na cobertura vacinal de alguns imunobiológicos. Esse fato ocasionou o reaparecimento do sarampo (2018) e potencializou o risco da reincidência de doenças como a poliomielite, rubéola, difteria e meningite (Brasil, 2022). O mesmo foi observado em países do continente Africano (Bello et al., 2021). Tal fenômeno pode estar relacionado a questões educacionais, da própria política de imunização, de como está estruturada a distribuição vacinal, pela falta de conhecimento acerca das doenças preveníveis por vacina, por desinformação quanto à segurança e efetividade das vacinas, assim como pela influência do movimento antivacina (Brasil, 2022; Hopkins, 2023).

Mais recentemente, outro fator que também impactou na cobertura vacinal do Brasil, foi a pandemia pela covid-19, doença ocasionada pelo vírus SARS-CoV-2, altamente contagioso e com potencial elevado de adoecimento e mortalidade (Martin et al., 2020).  As primeiras vacinas contra o SARS-CoV-2 foram criadas apenas 11 meses após a notificação do primeiro caso da covid-19 (Orellana et al., 2022). Em janeiro de 2021, a vacina contra o SARS-CoV-2 chegou ao Brasil, trazendo esperanças e dúvidas, pois a população questionava a eficácia e segurança dessas vacinas, visto o seu rápido tempo de elaboração (Fleury; Fava, 2022). 

Simultaneamente à implantação desta vacina no país, o movimento antivacina tomou forças e foi crescendo, principalmente no âmbito das redes sociais, sendo responsável por disseminar informações enganosas que não possuíam nenhuma evidência científica a respeito (Santos et al., 2021). Além disso, a própria vigência da pandemia pela covid-19 inferiu a necessidade de isolamento social, motivo este que inibiu a população de estar em contato direto com os postos de saúde. Esses fatores foram responsáveis por agravar e impactar ainda mais os índices vacinais da população brasileira (Procianoy et al., 2022).

O abandono vacinal seguido das baixas coberturas tem sido um relevante e crescente problema de saúde pública no Brasil, principalmente nos críticos períodos pandêmicos pela covid-19. Quando as vacinas são negligenciadas pela população, acarreta o surgimento de doenças já eliminadas (Sá et al., 2023), ascensão dos grupos de risco, além de gastos onerosos aos serviços públicos, uma vez que estão relacionadas com o aumento de comorbidades e desfechos ruins. Estudos sobre o impacto da atual pandemia pela covid-19 nas coberturas vacinais são úteis, pois podem auxiliar na identificação dos fatores relacionados à ausência de vacinação, norteando a tomada de decisões dos técnicos e gestores da saúde na modificação dessa realidade. O presente estudo tem por objetivo descrever o impacto da pandemia pela covid-19 nas coberturas vacinais da população brasileira.

METODOLOGIA 

Realizou-se um estudo descritivo observacional com abordagem quantitativa baseado em dados epidemiológicos da cobertura vacinal de toda população brasileira (crianças, adolescentes, adultos, idosos e gestantes), obtidos do Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), do período de 2017 a 2022, estes, foram utilizados como critério de inclusão da pesquisa. Foram excluídas as vacinas não disponibilizadas pelo SUS para os grupos descritos anteriormente, ou que seus dados estejam desatualizados no período analisado. Para avaliar o impacto nas coberturas vacinais, comparou-se os dados dos triênios 2017 a 2019, antes da pandemia pela covid-19, com 2020 a 2022, período pandêmico. 

Os dados da cobertura vacinal foram obtidos no site do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (ww.datasus.gov.br). Foram estudados os dados sobre cobertura vacinal para cada região brasileira para as vacinas de bacilo Calmette-Guérin (BCG), hepatite B em crianças até 30 dias, hepatite B, rotavírus humano, meningocócica C (conjugada), meningocócica C (1º reforço), pentavalente (difteria, tétano, coqueluche, Haemophilus influenzae B e hepatite B), pneumocócica, pneumocócica (1º reforço), poliomielite, poliomielite (1º reforço), poliomielite (4 anos), febre amarela, hepatite A, tríplice viral D1 (sarampo, caxumba e rubéola – 1ª dose), tríplice viral D2, tetra viral/SCR+VZ (sarampo, caxumba, rubéola e varicela), tríplice bacteriana/DTP 1º ref (difteria, tétano e pertussis), DTP REF (4 e 6 anos), dT + dTpa gestante (difteria e tétano + tríplice acelular gestante) e dTpa gestante. 

Para as vacinas da poliomielite foram utilizados dados de forma segmentada por idade e reforço conforme disponibilizado no site do Datasus. Já para as vacinas em gestantes, o sistema computou doses de atraso vacinal pela substituição do primeiro esquema perdido de dT gestante por uma dose conjunta de dT+dTpa gestante. 

Os dados foram tabulados pelo Tabnet e transferidos para o programa Excel®, onde foram tratados por meio de análises estatísticas (frequência, proporção e variação). A pesquisa atendeu aos preceitos éticos emanados pela Resolução Nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, não sendo necessária a apreciação de um Comitê de Ética em Pesquisa por utilizar dados agregados e de domínio público.

RESULTADOS 

No Brasil, no período de 2017 a 2022, observou-se decréscimo na cobertura vacinal de 9,8%, variando de 72,9% em 2017 para 65,8% em 2022, atingindo a menor cobertura em 2021 (61,1%). Comportamento semelhante constatou-se em todas as regiões do país, sendo o maior declínio no Sudeste (15,0%) e menor no Nordeste (5,6%). No entanto, o Nordeste apresenta um dos piores valores de cobertura vacinal desde 2017 (70,1%), ficando acima apenas da região Norte (66,2%), que além dos piores valores se manteve abaixo da cobertura nacional no período pré e pandêmico (Figura 1).

Figura 1 – Cobertura vacinal por região de residência. Brasil, 2017 a 2022.

 Fonte: Dados extraídos do SI-PNI.

No Brasil, quando comparado os triênios pré-pandêmico (2017-2019) e pandêmico (2020-2022), verificou-se redução de 12,7% na cobertura vacinal, visto que a maior parte dos imunobiológicos apresentaram diminuição na cobertura vacinal no período pandêmico. As exceções foram as vacinas de febre amarela, DTP 1º ref e DTP ref (4 e 6 anos), que apresentaram aumento nas coberturas vacinais, respectivamente, de 3,5%, 2,4% e 4,7%. Já as vacinas com maiores redução na cobertura vacinal foram: tetra viral/SRC+VZ (63,1%) e dT+dTpa gestante (50,2%), as quais são destinadas às crianças e gestantes, respectivamente (Figura 2).

Figura 2 – Cobertura vacinal por tipo imunizante e triênio. Brasil, 2017-2019 (pré-pandêmico) e 2020-2022 (pandêmico).

Fonte: Dados extraídos do SI-PNI. 

Os imunizantes com maior redução na cobertura vacinal, na comparação do triênio pré-pandêmico com o pandêmico, em todas as regiões do país foram: tetra viral/SCR+VZ, tríplice viral D2, e dupla adulto + tríplice acelular gestante (dT+dTpa gestante). A vacina tetra viral/SCR+VZ possuiu a pior variação de cobertura vacinal de todos os imunizantes, atingindo redução de mais de 50% no período pandêmico em todas as regiões, sendo a maior redução nas regiões Sudeste (70,6%) e Norte (69,3%). Em seguida a dupla adulto e tríplice acelular em gestante apresentou redução na cobertura vacinal de 37,9% na região Norte e 58,8% no Centro-Oeste. A tríplice viral D2 mostrou decréscimo na cobertura vacinal em todas as regiões, sendo a região Norte com pior resultado, declínio de 37,9%, seguida do Centro-Oeste (30,8%) e do Nordeste (25,2%) (Tabela 1).

Constatou-se disparidade na variação de alguns imunizantes específicos, em comparação com as demais regiões, como a vacina da hepatite B em crianças de até 30 dias e BCG, que apresentaram redução de 25,5% e 22,8%, respectivamente, na região Sudeste, ao contrário da região Sul, onde esses imunizantes exibiram redução de aproximadamente 8% (Tabela 1).

Em relação à vacina da febre amarela, constatou-se aumento na cobertura vacinal nas regiões Nordeste (27,3%), Sudeste (8,3%) e Sul (5,4%); e redução nas regiões Norte (21,6%) e Centro-Oeste (14,9%). As vacinas que apresentaram menor variação nas coberturas vacinais por região durante o período pré e pandêmico foram: tríplice bacteriana DTP 1ª ref na região Norte (-0,1%) e Sudeste (+2,3%), poliomielite 4 anos no Nordeste (+0,7%) e no Centro-Oeste (-1,7%), hepatite B (-0,4%) e pentavalente (-0,4%) no Sul (Tabela 1).

Tabela 1 – Cobertura vacinal por tipo imunizante e região de residência. Brasil, 2017- 2019 (pré-pandêmico) e 2020-2022 (pandêmico).

  Fonte: Dados extraídos do SI-PNI.

DISCUSSÃO

No Brasil, quando comparado o período pré-pandêmico e pandêmico pela covid-19, constatou-se redução na cobertura vacinal de cerca de 13%. Resultado semelhante ao observado em outros países, como nos Estados Unidos, que apresentou declínio das coberturas vacinais em crianças, na semana após a declaração de emergência nacional (13 de março de 2020) para a covid-19 (Santoli et al., 2020). Na Inglaterra, três semanas após o início do distanciamento social, houve redução de 19,8% das doses aplicadas da vacina de sarampo-caxumba-rubéola, comparando-se com o mesmo período em 2019 (Bramer et al., 2020).

Esses estudos apontam interferências da pandemia pela covid-19 nas coberturas vacinais, uma vez que o comparecimento aos serviços de saúde reduziu consideravelmente em muitos países, inclusive para a vacinação infantil, devido às medidas de distanciamento social, que foram implantadas para diminuir a transmissão do vírus SARS-CoV-2 (Bramer et al., 2020; Santoli et al., 2020).

Um estudo sobre a intensificação da redução de cobertura vacinal brasileira em consequência da covid-19, evidencia pelos dados de 2015 a 2018 que a cobertura vacinal do país já estava em crise, e que o medo da contaminação pelo vírus SARS- CoV-2 diminuiu ainda mais a procura por vacinação (Pidde et al., 2021). Pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) constatou declínio nas imunizações em maio de 2020 em 85% dos 61 países entrevistados. As principais causas para essa redução foram: redução da procura pela população (73%); falta de equipamentos de proteção individual (49%); restrições de viagem (40%) e falta de profissionais de saúde (43%) (Brasil, 2020).

Em relação às regiões do Brasil, o presente estudo aponta o Norte e Nordeste como locais de maiores reduções na cobertura vacinal, respectivamente. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) em 2019 demonstram que as regiões Norte (7%) e Nordeste (12,9%) possuem população que detém o maior índice de analfabetismo do Brasil e municípios com o pior Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) (IBGE, 2019).

No entanto, um estudo de coorte sobre hesitação vacinal em brasileiros de classe alta numa cidade brasileira, mostrou que a partir de 2015 o padrão vacinal entre classes sociais inverteu, trazendo as classes sociais mais pobres com elevado índice de cobertura vacinal, já as classes sociais com maior poder socioeconômico apresentaram aumento na hesitação vacinal (Silveira et al., 2020). O que também foi verificado em outro estudo sobre desigualdades socioeconômicas e cobertura vacinal em todas as capitais brasileiras (Barata et al., 2012). Esse padrão de comportamento é observado em outros países, sendo esse declínio uma tendência global (Sato, 2018). Portanto, pressupõe-se que a relação entre as baixas coberturas vacinais vai além dos problemas socioeconômicas, podendo englobar fatores relacionados a gestão da saúde e as estratégias para captação da população para adesão de campanhas vacinais.

Uma pesquisa sobre cobertura vacinal no Brasil elucidou fatores relacionados à baixa adesão na primeira infância, como: negligência do responsável em suas obrigações de prover o necessário para o desenvolvimento da criança; influência dos fatores sociais, culturais e religiosos; desinformação da população como um obstáculo à imunização; importância da atenção primária e atuação dos seus profissionais, sendo este último o mais prevalente dentro dos artigos avaliados pelo estudo (Oliveira et al., 2021).   

Quanto à cobertura vacinal por imunizante, observou-se heterogeneidade nos achados com pequenas variações das coberturas vacinais por região, dentre elas: DTP bacteriana 1º REF, poliomielite (4 anos), hepatite B e pentavalente, apresentando as menores variações no período de triênios pré-pandêmico e pandêmico. No caso da pentavalente e hepatite B houve um aumento desses índices apenas em 2020, para ambas as vacinas. O mesmo ocorreu em Cingapura, que obteve redução, ainda com imunobiológicos disponíveis (Zhong et al., 2021).

Um inquérito realizado em 28 países da União Europeia, entre os anos de 2016 e 2019, verificou a escassez de vacinas, dentre elas: dT, hepatite B e BCG, com duração média de 5 meses de falta, sendo a interrupção do fornecimento e a escassez global as causas mais apontadas, podendo levar à redução das taxas de cobertura vacinal (Filia et al., 2022).

Os imunizantes, tetra viral (SCR+VZ), tríplice viral D2, dupla adulto e tríplice viral em gestante apresentaram as maiores redução na cobertura vacinal. O Boletim Epidemiológico Doença pelo Coronavírus COVID-19 de 2021 do Ministério da Saúde, aponta para uma insuficiência na produção de tetra viral para suprimir a demanda no Brasil, não havendo fornecedores no período de 2021. Este fato explicaria a redução da cobertura da tetravalente, principalmente no ano pandêmico mais crítico, o qual houve um desabastecimento global. Sendo necessário esquema alternativo com a tríplice viral e a varicela monovalente. Ainda assim, com a substituição de um novo esquema vacinal, a tríplice viral foi insuficiente para elevar o indicador de cobertura vacinal, o qual apresentou uma das maiores declínio nacional no período pandêmico (OPAS, 2020). O que também foi descrito em um estudo sobre a tríplice viral realizado no Brasil entre 2014 e 2021, o qual aponta uma tendência de queda da cobertura vacinal e aumento da taxa de abandono em todas unidade federativas (Moura et al., 2023).

Observaram-se algumas exceções de imunobiológicos que se mantiveram crescentes em sua cobertura vacinal durante o período pandêmico, como: febre amarela na região Nordeste, Sudeste e Sul; DTP 1º reforço na região Sudeste, Sul e Centro-Oeste; e DTP reforço (4 e 6 anos) em todas as regiões. No caso da vacina contra a febre amarela, sabe-se que em 2020 o MS ampliou o público-alvo desse imunizante, propondo uma dose de reforço para crianças aos quatro anos de idade, como também a inclusão de todos os estados do Nordeste, passando a ser área de recomendação de vacinação. A ampliação dessa região no calendário vacinal colaborou para um aumento da cobertura deste imunizante, mesmo em período pandêmico (Alves, 2020).

Estudo realizado no Brasil, com dados de 2015 a 2020, constatou, principalmente nos anos de 2017 a 2019, uma tendência nacional de redução no número de imunizações das vacinas tríplice viral, BCG e poliomielite (Bravo; Ballailai, 2020). Esses achados corroboram com presente estudo, onde constatou-se redução progressiva da vacina BCG a partir de 2019, principalmente na região Sudeste durante o período pandêmico. Sabe-se que em 2019 ocorreu o racionamento deste imunobiológico em pelo menos 12 estados brasileiros, uma vez que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária realizou sucessivas interdições na fabricação desta vacina (SBMT, 2022).

A vacina da poliomielite apresentou uma queda não tão expressiva devida as doses serem contabilizadas por idade, subestimando o valor total. Mesmo assim, sabe-se que a pandemia pela covid-19 impactou na cobertura da vacina da poliomielite, elevando o risco de uma nova infecção pelo vírus na população brasileira (Brasil et al., 2022). 

O abandono vacinal seguido das baixas coberturas tem sido um relevante e crescente problema de saúde pública no Brasil e vários outros países, principalmente nos críticos períodos pandêmicos pela covid-19. Contudo, as vacinas constituem a principal ferramenta para a profilaxia de doenças infectocontagiosas, contribuindo para a diminuição da morbidade e mortalidade por essas doenças, assimo como para a redução dos custos com consultas, internamentos e medicações. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatou-se redução na cobertura vacinal no Brasil antes mesmo da pandemia pela covid-19, o que foi intensificado durante o período pandêmico. As regiões com coberturas vacinais mais atingidas foram o Nordeste e Norte, e os imunobiológicos tetra viral/SRC+VZ e dT+dTpa gestante.

Conhecer o impacto da pandemia pela covid-19 nas coberturas vacinais brasileiras contribui para implementar novas estratégias de recuperação dos esquemas vacinais, sejam elas, capacitação dos profissionais da saúde para lidar com os desafios da desinformação, fake news e movimento antivacina; investimento em ações voltadas para promoção da saúde ou campanhas de vacinação; esclarecimento e empoderamento da população quanto aos benefícios das vacinas.

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1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, krishnamorim@gmail.com;
 1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco. gabrieladias1409@hotmail.com;
1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, katarinagsiqueira@gmail.com;
1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, marianebsoares29@gmail.com;
1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, fernandafc0903@gmail.com;
1Acadêmica   de Medicina,   Faculdade   de   Medicina  de   Olinda,   FMO,   Olinda –   Pernambuco, brunamiranda16bm@gmail.com;
1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, biatavarees@hotmail.com;
1Acadêmica de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, rafa.vieira1603@gmail.com;
2Docente do curso de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco, Médica Pediatra, gabimelobr@fmo.edu.br;
3Docente do Curso de Medicina, Faculdade de Medicina de Olinda, FMO, Olinda – Pernambuco. Doutora em Saúde Pública (CPqAM/Fiocruz), profa.cmoliveira@gmail.com