O IMPACTO DO PROGRAMA DE RESIDÊNCIA DE MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE SESAU/FIOCRUZ NA NOTIFICAÇÃO DE SÍFILIS GESTACIONAL EM CAMPO GRANDE – MS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10611864


Fabio Passos Dos Santos;
Jéssica De Oliveira Ramos Neves;
Orientador: Maicol Ferreira Barbosa


RESUMO

OBJETIVO: Analisar a prevalência de diagnósticos de sífilis em gestantes entre 15 e 44 anos nas unidades básicas de saúde (UBS) e unidades básicas de saúde da família (UBSF) onde o Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade Sesau Campo Grande – MS / Fiocruz está presente, em comparação com as outras unidades sem o Programa.
MÉTODOS: Este estudo é composto por dados secundários provenientes do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Município de Campo Grande – MS, disponíveis no Tabulador de Informações de Saúde (TABNET). Os casos de sífilis gestacional entre mulheres de 15 a 44 anos nos anos de 2020, 2021 e 2022 foram analisados de acordo com o centro de saúde (UBS ou UBSF) onde houve o atendimento.
RESULTADOS: No município de Campo Grande – MS a notificação de sífilis gestacional evidenciou ser maior nas UBS e UBSF, quando analisadas em conjunto, nos anos de 2020 e 2021, onde o programa de residência médica está inserido, em comparação aos outros centros sem o programa. As UBS com o Programa apresentaram nos anos de 2020, 2021 e 2022 uma razão de 51,5; 71,6 e 40,1 casos de sífilis gestacional a cada 100 mil habitantes, respectivamente, o que demonstrou relevância estatística em relação às UBS sem a residência médica. A respeito das UBSF, isoladamente, a diferença de proporções a qual evidenciou impacto estatístico apareceu apenas em 2020, onde os locais com o programa apresentaram proporção de 88 casos por 100 mil habitantes e os locais sem o programa tiveram uma proporção de 71,7 casos por 100 mil habitantes.
CONCLUSÕES: Os programas de residência de medicina de família e comunidade surgem como proposta de qualificação para os profissionais a fim de realizar o diagnóstico, notificação e tratamento eficaz com abordagem metodológica capaz de induzir as desejadas mudanças na prática médica, voltadas para a essência dos princípios da Atenção Primária.

PALAVRAS CHAVES: sífilis, notificação, residência médica

1 INTRODUÇÃO

O Treponema pallidum é a bactéria responsável por ocasionar a doença crônica, sistêmica, curável e exclusiva do ser humano denominada Sífilis. A transmissão desta se dá em especial por contato sexual; todavia, há a possibilidade de ocorrer a infecção por meio da gestação, isto é, a chamada transmissão vertical para o feto, quando a gestante está infectada e não realizou o tratamento ou este foi inadequado (SAÚDE, 2022b).

Diante disso, a sífilis apresenta riscos consideráveis a saúde pública do Brasil, pois por ser uma doença em sua maioria assintomática, quando surgem os sinais e sintomas, eles não geram preocupações pelos pacientes, o que ocasiona o aumento de sua disseminação. Quando não ocorre o tratamento, formas mais graves podem surgir, comprometendo os sistemas cardíaco e nervoso. Já no cenário da sífilis gestacional, pode haver o abortamento, nascimento prematuro, natimortalidade, manifestações congênitas ou até a morte do recém-nascido (SAÚDE, 2022a).

A sífilis gestacional é uma doença que pode desencadear distintos efeitos prejudiciais para a saúde do binômio mãe e filho. Dessa forma, faz-se necessário o rastreamento e a notificação correta dessa patologia na abertura de pré-natal, já que há a possibilidade de a gestante estar na fase de latência da enfermidade, isto é, assintomática, o que induz ao erro de presumir que não está infectada (MACÊDO et al., 2009).

O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), cujo objetivo é registrar dados provenientes do Sistema de Vigilância Epidemiológica, no intervalo de 2005 a 2023, apresentou 624.273 casos de sífilis em gestantes nos anos de 2005 até junho de 2023, de modo que 8,5% eram residentes na região Centro-Oeste. No ano de 2022, o número total de casos de sífilis gestacional registrado no país foi de 83.034, sendo 6.745, isto é, 8,1% no Centro-Oeste. Por fim, o percentual que retrata a prescrição de tratamento adequado para sífilis gestacional no ano de 2022 foi de 82,6%, um aumento de 11,8%, em referência a 2021 (SAÚDE, 2023).

No ano de 2018, os dados do Ministério da Saúde (MS) apontam que o município de Campo Grande – MS era a segunda capital do País com maior número de sífilis adquirida. Já a sífilis na gestação ocupou o terceiro lugar quando comparada com as demais capitais (SILVA; SILVA, 2021). No ano de 2022, Campo Grande foi a décima oitava capital quando analisada a taxa de detecção de sífilis em gestantes (SAÚDE, 2023). Sabe-se que o Brasil para avaliar a expansão da sífilis gestacional e congênita no País, implementou o Rede Cegonha, por meio do Ministério da Saúde (MS), com o enfoque de aumentar o acesso ao diagnóstico e tratamento. O diagnóstico da sífilis gestacional é identificado no pré-natal mediante sinais e sintomas clínicos e/ou teste sorológico não treponêmico reagente. Diante deste histórico, uma assistência bem articulada pelos profissionais da saúde durante este período gestacional, é capaz de identificar, tratar e prevenir as possíveis complicações ao binômio (SOUZA MARQUES et al., 2018).

O cenário da Atenção Primária, em conjunto da Estratégia da Saúde da Família, demonstra como um modelo de assistência qualificado – cujo desafio inclui o combate à sífilis gestacional – é indispensável para identificar a prevalência desta comorbidade na população-alvo em seus respectivos territórios (SANTOS; GOMES, 2020). Visto que a Sífilis na gestação é uma doença que pode ser evitada quando há recursos disponíveis nas unidades de saúde, é imprescindível identificar falhas na realização do exame sorológico de triagem das gestantes, assim como, oportunidades perdidas durante as consultas, seja para diagnóstico ou o tratamento assertivo. Logo, faz-se necessário também proceder com o pré-natal dos parceiros, ou a busca ativa destes, durante a assistência longitudinal. No ano de 2022, apenas 35,6% das parcerias sexuais receberam tratamento correto, o qual representa baixo percentual (MACÊDO et al., 2009; SAÚDE, 2023).

Perante o exposto, o presente estudo analisa como a inserção do Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade SESAU – Campo Grande – MS / Fiocruz nas unidades básicas de saúde da família, o qual se iniciou em 2020, pode impactar na prevalência do diagnóstico da sífilis gestacional, via fichas de notificação compulsória, no município de Campo Grande – MS em comparação com as unidades sem os residentes.

2 OBJETIVOS

O objetivo do trabalho foi analisar a prevalência de diagnóstico de sífilis em gestantes entre 15 e 44 anos nas UBS e UBSFs onde o Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade Sesau Campo Grande – MS / Fiocruz está inserido em comparação às demais unidades sem o Programa em todo o município. Logo, será possível responder à hipótese de que nestas unidades em que o Programa atua a notificação foi maior devido a uma melhor assistência do serviço de saúde prestado durante o pré-natal em comparação as demais unidades.

Além disso, o estudo seria capaz de despertar reflexões, após análise estatística dos dados, acerca das notificações nas unidades de saúde, sob supervisão ou não de residência médica, a fim de motivar sugestões de medidas para aperfeiçoar o diagnóstico em toda atenção primária à saúde, independente do resultado.

3 MÉTODOS

3.1 ORIGEM E MÉTODO DE EXTRAÇÃO DE DADOS 

Trata-se de um estudo seccional, quantitativo, com dados secundários provenientes do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Município de Campo Grande – MS, disponíveis no Tabulador de Informações de Saúde (TABNET). A amostra é composta por gestantes residentes de Campo Grande, as quais receberam o diagnóstico de sífilis durante o pré-natal nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades Básicas da Saúde da Família (UBSF). O inquérito sobre a amostra foi realizado no mês de agosto de 2023 por meio de extração das informações no banco de dados supracitado.  

3.2 CONTEXTO E PERÍODO DO ESTUDO

Foram coletados os casos notificados de sífilis gestacional entre mulheres de 15 a 44 anos no período de 2020, 2021 e 2022, conforme as unidades de saúde (UBS ou UBSF). No segundo momento, utilizou-se dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), fornecidos pela secretaria de saúde do município de Campo Grande – MS, os quais representam a população total no mês de agosto de 2022 em cada um dos 7 distritos, isto é, regiões demográficas distintas onde estão localizadas pela capital todas as unidades notificadoras escolhidas para análise. Portanto, com o valor da população total residente nestes diferentes territórios, foi estabelecido uma estimativa populacional, a fim de contemplar os anos de 2020 e 2021 em cada uma das áreas dos centros de saúde onde os dados foram extraídos. 

3.3 AMOSTRA

Os critérios de elegibilidade para a seleção da amostra foram os seguintes: pacientes com a faixa etária entre 15 e 44 anos, que residem em Campo Grande e receberam o diagnóstico de sífilis na gestação de modo a acarretar a notificação compulsória registrada via SINAN a partir do ano de 2020 até 2022 – período em que o Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade da instituição Campo Grande – MS SESAU / Fiocruz foi implementado em dez unidades em 2020, posteriormente reduziu para nove unidades em 2021 e, por fim, onze unidades em 2022. 

3.4 ORGANIZAÇÃO DE DADOS

Foi considerado durante análise dos dados no qual o Programa estava inserido no decorrer destes anos, assim como as unidades que ele não estava mais inserido. Como critérios de exclusão, foram retiradas outras unidades notificadoras do município, como por exemplo: UPAs24H, hospitais públicos e privados, hospital-dia, a Maternidade de Campo Grande, dentre outros serviços. A partir disso, a amostra consiste em 1.033 casos notificados de sífilis na gestação.

3.5 ANÁLISE DE DADOS

A proporção de atendimentos é, portanto, a razão entre o total de casos no ano e nos dois grupos (UBS e UBSF) dividido pelo total de população relatada pelo IBGE para cada local onde estão localizadas as referidas unidades.  Por fim, a proporção de atendimentos em locais com o programa é estatisticamente comparada à proporção de pessoas atendidas em locais sem o programa através do teste de proporção. A análise foi feita no software IBM SPSS versão 25 com 5% de significância.  

3.6 ASPECTOS ÉTICOS 

O projeto foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e aprovado sob o parecer número 6.511.491, CAEE 75540023.6.0000.0021.

4 RESULTADOS

A Tabela 1 a seguir compara a proporção de casos de sífilis gestacional em unidades com esem o programa. Foram avaliados os 3 anos – 2020, 2021, 2022 –, e apresentados os valores separados por UBS e UBSF, bem como o resultado total.

Tabela 1 – Relação entre total de casos de sífilis gestacional e população IBGE em cada uma das regiões (proporção para 100 mil habitantes)

Anos UBSUBSFUBS + UBSF
ProgramaProgramaPrograma
Com Semp*ComSemp*ComSemp*
202051,526,20,00028871,70,04178,751,20,0004
202171,623,40,000155,949,40,357360,237,90,0016
202240,122,40,006945,540,20,448944,232,10,0782

Fonte: IBGE, 2022; SINAN, 2020 – 2022.
*p-value do Teste de diferença de proporção entre os casos em locais com e sem o programa

Na primeira linha estão os dados do ano de 2020. Considerando a UBS, os centros de saúde com o programa encontraram uma razão de 51,5 casos de sífilis em mulheres a cada 100 mil habitantes. Já os locais sem o programa detectaram 26,2 casos para cada 100 mil habitantes. Estatisticamente houve uma diferença (p = 0,0002) confirmando uma maior quantidade de casos em locais com o programa. Essa mesma diferença voltou a acontecer em 2021 (p = 0,0001) e 2022 (p = 0,0069).

Avaliando a UBSF, a diferença de proporções apareceu apenas em 2020 onde os locais com o programa apresentaram proporção de 88 casos por 100 mil habitantes e os locais sem o programa tiveram uma proporção de 71,7 casos por 100 mil habitantes. Há uma diferença estatística entre eles (p = 0,041). Nos anos de 2021 (p = 0,3573) e 2022 (p = 0,4489) a diferença não aconteceu. Ao analisar os dois tipos de unidades em conjunto (UBS e UBSF) a diferença apareceu em 2020 (p = 0,0004) e 2021 (p = 0,0016) porém não foi identificada em 2022 (p = 0,0782).

5 LIMITAÇÃO DO ESTUDO

O município de Campo Grande é segmentado por sete distritos, em que as unidades de saúde que foram analisadas neste estudo estão situadas em territórios muito distintos, tanto em população quanto em dimensão. Por conta destas particularidades, sabemos das implicações da escolha da população do IBGE proveniente dos dados fornecidos pela secretaria de saúde do município de Campo Grande – MS, uma vez que sem o valor exato da amostra total de cada ano observado, foi necessário utilizar a mesma estimativa da população nos três períodos observados, e entende-se que esta pode variar durante a análise do tempo. 

Portanto, somente por meio de uma população estimada, foi possível construir uma prevalência a partir do total de pessoas disponíveis. Além disso, não foi possível identificar em cada unidade os médicos que são egressos do Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade SESAU/ Fiocruz e os que se formaram em outros municípios, além daqueles que não são especialistas, uma vez que essa quantificação interfere na interpretação dos resultados da pesquisa.

Por fim, em algumas unidades onde o Programa de residência está inserido existe também o Programa de residência multiprofissional da saúde da família, a qual também impacta na análise dos dados observados.

6 DISCUSSÃO

A notificação compulsória da sífilis gestacional foi estabelecida em 2005, sendo posteriormente autorizada sua inserção no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (SINAN) em 2007. (SARACENI; MIRANDA, 2012) Portanto, os médicos hoje inseridos na atenção primária à saúde somente poderão melhorar o planejamento de ações frente a este cenário, se houver a qualidade do preenchimento das fichas de notificação, a fim de diminuir a subnotificação, compreender a prevalência no território adscrito e promover medidas preventivas acerca do tema. (LAGUARDIA et al., 2004)

À vista disso, através da análise da Tabela no setor dos resultados, percebese com a implementação do Programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade SESAU – Campo Grande – MS / Fiocruz nas UBS e UBSFs do município, que a notificação compulsória de Sífilis Gestacional se tornou mais eficiente nas unidades com o programa, de modo que ao analisarmos em conjunto os locais do estudo, houve relevância estatística nos anos de 2020 e 2021.

O Brasil, em relação às notificações de sífilis gestacional, ainda apresenta uma subnotificação considerável, mesmo diante do aumento destas nos últimos anos (LOPES DE OLIVEIRA et al., 2023). Ao analisarmos a região do Centro-Oeste, no ano de 2013, o diagnóstico de sífilis nas gestantes foi de 8,7 casos/1000 nascidos vivos, de modo que o estado do Mato Grosso do Sul, o qual pertence nesse espaço demográfico, evidenciou, entre todos os outros estados do país, a maior taxa: 16,7 casos/1000 nascidos vivos (TIAGO et al., 2017).

 Diante desse contexto, ao verificarmos na Tabela que as unidades onde o programa de residência médica atua apresentaram uma melhora na notificação, compreende-se que, neste período observado, existe a possibilidade de avanço, pelo menos na capital, da notificação de sífilis gestacional nas unidades aonde a residência médica atua, de modo a aperfeiçoar a assistência nos serviços de saúde assim como incentivar a permanência ou expansão do Programa de Residência Médica.

Neste estudo, avalia-se na Tabela que nos locais nomeados como UBS, nos três anos observados, foi identificado outra relevância estatística de caráter positivo em comparação com as UBS onde o Programa está ausente. A maior incidência da sífilis pode ser explicada pelas situações de vulnerabilidade social, as quais envolvem desde as características comportamentais e reprodutivas às práticas sexuais inseguras da população (CARRENO; COSTA, 2006). Diante dessa análise individual das UBSs, é válido ressaltar que as áreas sociodemográficas, as quais são distintas em relação a cada território de atuação das unidades, pode interferir na prevalência dos casos de sífilis gestacional, porém entende-se que a residência médica auxiliou nas notificações durante os três anos por conta dos valores expressivos alcançados.  Já em relação às UBSFs, a diferença de proporções apareceu apenas em 2020, onde os locais com o programa apresentaram uma maior quantidade de casos notificados comparado aos locais sem o programa. Nos anos de 2021 e 2022, embora haja diferença numérica onde o programa está presente, não houve relevância estatística. Desse modo, uma justificativa para esse resultado poderia ser a própria falha no processo de notificação ou a sua não realização. 

O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), criado na década de 1990, objetiva principalmente a coleta e o processamento dos dados sobre agravos de notificação em todo o território nacional. Entre as principais dificuldades a afetar a qualidade dos dados do SINAN relativos à sífilis em gestantes, destacam-se a subnotificação dos casos nas bases de dados nacionais e falhas no preenchimento das fichas (TIAGO et al., 2017).

Sabe-se que a qualidade do registro, a subnotificação e o preenchimento incompleto podem ocorrer tanto pela existência de dados que são inacessíveis no momento da notificação, quanto pela presença das opções “ignorado” e “não se aplica”, principalmente em campos considerados obrigatórios ou essenciais. Além do fato de o último formulário instrucional para preenchimento ser do ano de 2008, data em que a ficha foi revisada pela última vez (OLIVEIRA; OLIVEIRA; ALVES, 2021).

Um estudo que avaliou a residência médica na formação dos médicos de família e comunidade de Fortaleza, mostrou que houve uma insatisfação destes acerca do tema de vigilância epidemiológica das áreas adscritas sob suas responsabilidades, o qual gera um efeito na gestão de planejamentos individuais e coletivas (CASTRO; NÓBREGA-THERRIEN, 2009). Portanto, ao analisar as unidades de saúde onde a residência médica está inserida, mas sem relevância estatística no período específico, um motivo pelo qual a notificação não gerou impacto pode ser pela dificuldade diante do entendimento desta vigilância do território por meio do registro e a não valorização desse assunto pelos profissionais que compõem o Programa.

Embora esses resultados não sejam inesperados, eles levantam aspectos que precisam ser discutidos por todos os profissionais da assistência pré-natal em unidades sem o programa, já que a menor quantidade de casos notificados se deve à ausência ou o não cumprimento da rotina mínima preconizada pelo Ministério da Saúde, incluindo as ações de aconselhamento, vigilância epidemiológica, farmacológica, laboratorial e o rastreamento de parceiros comprometem o controle da transmissão da sífilis(MACÊDO et al., 2009).

Outro fator que pode estar associado a menor incidência de casos de sífilis na gestação em unidades sem o programa estão as variáveis que mostram maior associação para a sífilis gestacional, sendo elas a história anterior de infecção sexualmente transmissível e o número inadequado de consultas no pré-natal (PINTO et al., 2014).

Assim, há a necessidade de reorganização das ações em UBS e UBSF sem o programa, priorizando mulheres com as características de risco identificadas, reorganizando os fluxos e ações assistenciais, busca ativa das gestantes e parceiros sem atendimento e tratamento, visitas domiciliares, ampliação do planejamento familiar e vigilância efetiva, priorizando mulheres em condição de risco. Já em UBS e UBSF com o Programa de Residência Médica é patentea necessidade de estratégias direcionadas para essas populações a fim de promover uma redução da transmissão vertical da sífilis.

Com a reestruturação das unidades para Unidades Básicas de Saúde da Família, objetiva-se principalmente ações preventivas e, portanto, há o questionamento se os profissionais que estão formando possuem uma visão integral dos indivíduos, família e comunidade, e se os programas de Residência Médica voltados para atenção primária estão atuando de forma efetiva em notificações de Sífilis na Gestação (BUZINARO, 2019). 

Este mesmo estudo refere que não se pode usar um modelo único nas unidades de saúde a fim de alcançar uma melhora na notificação, já que o perfil dos habitantes das localidades atendidas não é o mesmo, havendo a necessidade de encontrar estratégias dinâmicas e eficazes diante da realidade de determinadas regiões (BUZINARO, 2019).

Apesar de haver um grau significativo de amostra após o Programa de Residência Médica iniciado em 2020, aparentemente faltam elementos para que se desencadeiem mudanças profundas para a correta execução de notificação de pacientes diagnosticados com sífilis na gestação.

O médico residente é submetido a uma avaliação interna de conteúdo teóricoprático, portanto há a necessidade de avaliações mais frequentes de desempenho pelo seguimento de protocolos de doenças de notificação compulsória. Tendo em vista que os estágios dos médicos residentes são supervisionados por preceptores das equipes das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades Básicas da Saúde da Família (UBSF) integrantes do programa é indispensável uma maior exigência quanto as notificações de casos de Sífilis na Gestação (CIAMPO; RICCO; DANELUZZI, 2021).

Por conseguinte, é importante ressaltar que não há outros estudos na literatura a respeito de uma análise robusta na qualificação da notificação de sífilis em gestantes num determinado período em que um Programa de residência médica de medicina de família e comunidade está implementado. Dessa forma, faz-se necessário que mais estudos sejam elaborados a fim de gerar dados estatísticos para efeito de comparação e discussão; já que a implicação desse tema gera impacto na nas políticas de saúde. 

7 CONCLUSÕES

Por conseguinte, é imprescindível que a formação do Médico de Família e Comunidade esteja diretamente ligada às competências necessárias para atuar conforme as especificidades existentes em cada localidade. Sendo assim, os programas de residência de medicina de família e comunidade surgem como proposta de qualificação para os profissionais a fim de realizar o diagnóstico, notificação e tratamento eficaz com abordagem metodológica capaz de induzir as desejadas mudanças na prática médica, voltadas para a essência dos princípios da Atenção Primária. Porém, melhorar a qualidade dos serviços prestados neste nível de atenção ainda é um desafio e sua melhoria revalida os princípios doutrinários e organizativos proposto pelo Sistema Único de Saúde (BUZINARO, 2019).

Estudos mais amplos são necessários sobre a completitude dos dados das fichas de notificações, atualização da ficha e das recomendações de preenchimento (OLIVEIRA; OLIVEIRA; ALVES, 2021). O Programa está ligado a uma instituição plenamente capacitada para oferecer estas possibilidades, atenta e participante do momento atual da medicina brasileira. Naturalmente, a constante avaliação interna do programa e suas consequentes modificações, além da avaliação de seus egressos, é que poderão levar ao seu aprimoramento e à plena realização de notificações de Sífilis na gestação (CIAMPO; RICCO; DANELUZZI, 2021).

REFERÊNCIAS

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