USE OF RESIDUAL CURRENT DEVICES AS LEAKAGE CURRENT DETECTORS OF SURGE PROTECTION DEVICES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10520896


João S. S. Luna1
Gustavo O. Cavalcanti2


Abstract— Surge protection devices are equipment used to combat damage at electronic equipment caused by power surges produced by lightning discharges. Its main component, the varistor, acts as a variable resistor, depending on the voltage to which it is subjected. Leakage currents above 1ma at operating voltage indicate that the varistors have exceeded their acceptable current limits, and that their life expectancy is nearing the end. This article presents a solution for detecting leakage currents above acceptable limits in surge protection devices using residual current devices.

Index Terms— Surges, Lightning protection, Current measurement, Current-voltage characteristics, Residual current devices.

I. INTRODUÇÃO

O dispositivo de  Proteção contra Surtos (DPS) é um equipamento amplamente utilizado no combate a danos em sistemas elétricos provocados por descargas atmosféricas [1]. Seu princípio de funcionamento consiste no uso de varistores, cuja relação entre tensão e corrente é não-linear, funcionando como um elemento altamente resistivo em tensão normal de operação, e altamente condutivo durante um evento de sobretensão [2]. 

Fig. 1.  Curva tensão/corrente de varistores de óxido de zinco.
Fonte: Hu, Jun [2].

Mesmo em modo de alta resistência, quando submetido a tensões de operação, ocorrem em varistores correntes de fuga, cujos valores normalmente se encontram abaixo de limites aceitáveis. À medida que adsorvem surtos de tensão, os varistores perdem gradativamente sua característica de alta resistência, permitindo a passagem de correntes de fuga de valores cada vez mais elevados, mesmo em tensão normal de operação, ultrapassando os limites aceitáveis de corrente e de temperatura, até que ocorra sua degradação total, quando o varistor atinge a característica permanente de alta condutividade, ocorrendo sua queima e o final de sua vida útil.

Para promover a proteção física dos DPSs, utiliza-se fusíveis, que atuam contra as correntes subsequentes que continuam a fluir quando um varistor está danificado, em modo de baixa resistência, e ainda se encontra conectado à energia. A relação entre corrente e tensão que ocorre nos varistores é expressa através de gráficos, em escala logarítmica [4]. Os valores de correntes indicados vão desde baixíssimos níveis, geralmente da ordem de 10-5 A, até altos valores, em torno de 105 A. Já a tensão é apresentada em valores entre 10 V e 5000 V. 

Fig. 2.  Curvas tensão/corrente de varistores de óxido de zinco da referência SIOV-S05 (5mm de diâmetro), indicando os estados de corrente de fuga (i<1mA) e de nível de proteção (i>1mA).
Fonte: Copyright TDK Electronics AG 2022.

As curvas sempre iniciam na menor corrente e no valor da máxima tensão de operação admissível, e seguem até a máxima corrente e o maior valor de tensão estabelecido. Devido a pequenas flutuações nos processos de fabricação e montagem, ocorrem leves variações na real característica dos varistores em relação à corrente e à tensão, existindo uma faixa de tolerância para estes valores. Estes limites de tolerância são bem definidos individualmente para cada tipo de varistor: cada um possui uma curva central de corrente/tensão, com limites de tolerância superior e inferior, e são esses limites de tolerância que aparecem nos gráficos.

Fig. 3.  Curvas tensão/corrente de varistores de óxido de zinco da referência SIOV-S20 (20mm de diâmetro), indicando os estados de corrente de fuga (i<1mA) e de nível de proteção (i>1mA).
Fonte: Copyright TDK Electronics AG, 2022.

A indicação do limite inferior ou superior ocorre de acordo com o estado de operação do varistor, considerandose a corrente que o percorre, em dois intervalos: correntes inferiores a 1mA e iguais ou superiores a este valor.  Quando as correntes são inferiores a 1mA, o varistor se encontra no estado de corrente de fuga; a partir de 1mA, o varistor passa para o estado de nível de proteção. Este valor de 1mA não tem nenhum significado eletrofísico [3], sendo apenas um valor escolhido como limite de corrente entre os dois estados a serem considerados.

No estado de corrente de fuga (inferior a 1mA), que é a situação de alta resistência, é importante considerar a máxima corrente que pode passar pelo varistor em determinada tensão, e por isso, o limite inferior da curva é indicado nos gráficos; já no estado de nível de proteção (corrente superior a 1mA), correspondente à situação de alta condutividade, considera-se importante o valor da máxima queda de tensão que o componente pode suportar, e então, o limite superior da curva é indicado.

No início de sua vida útil, os varistores se comportam conforme suas curvas de corrente/tensão, dentro dos limites de tolerância. À medida que absorvem surtos de tensão, os varistores vão perdendo a característica de alta resistência, e as correntes de fuga vão se tornando cada vez maiores, em relação à tensão à qual são submetidos, até que os valores de corrente ultrapassam o limite máximo para corrente de fuga; o varistor passa conduzir uma corrente superior àquela para o qual foi projetado, em determinada tensão, e com isso, o processo de degradação avança [11], com elevação da temperatura e posterior curto-circuito, mesmo na tensão normal de operação, quando acontece o rompimento do componente e o final de sua vida útil.

Os varistores suportam certa quantidade de surtos de tensão, mantendo sua capacidade de mudança de estado (alta resistência para alta condutividade, e retorno para alta resistência), de acordo com a intensidade destes surtos. Esta quantidade é expressa em gráficos [4], conforme o tempo de duração do surto e sua intensidade de corrente. 

Os valores para as durações dos surtos vão desde 10 até 104 microssegundos, enquanto os valores de corrente são indicados de 100mA a 104 A. Para valores de corrente abaixo de 100mA e duração abaixo de 104 microssegundos, é indicado nos gráficos que os varistores suportam uma quantidade indefinida de surtos.

Fig. 4.  Gráficos indicativos da quantidade de surtos suportados pelo varistor da referência SIOV-S07 (7mm de diâmetro). Fonte: Copyright TDK Electronics AG 2022. diâmetro). 
Fonte: Copyright TDK Electronics AG 2022.

Fig. 5. Gráficos indicativos da quantidade de surtos suportados pelo varistor da referência SIOV-S20 (20mm de diâmetro). Fonte: Copyright TDK Electronics AG 2022.

II. FINAL DA VIDA ÚTIL DE DPSS

Quando varistores sob tensão de operação normal permitem a passagem de correntes de fuga de valores superiores aos limites indicados nas curvas de corrente/tensão, estão em processo de degradação, seguindo para o final de sua vida útil [5]. Para prevenir uma queima total do varistor, uma explosão, ou mesmo um processo de incêndio nos DPSs, são utilizados fusíveis de proteção [3], os quais se abrem quando ocorre uma corrente superior à sua capacidade.  Com isso, duas situações podem acontecer no final da vida útil de um DPS: a abertura do fusível de proteção ou a queima do varistor, no caso em que o fusível não atua. Nos dois casos, o estado de degradação do varistor é avançado, uma vez que permite a passagem de correntes bem superiores aos limites aceitáveis em tensão de operação normal, bem como não resiste à passagem de corrente e tem sua temperatura elevada até sua queima [6]. Até que se chegue a este estado, o DPS se mantém em uma condição indesejável em termos de funcionalidade, mesmo em tensão normal de operação, pois as correntes de fuga que ocorrem nesse processo de degradação podem contribuir para o desperdício de energia (mesmo que pouco, devido à baixa corrente, mas ainda assim, desperdício), bem como para o aquecimento gradual do DPS, acima de temperaturas toleráveis, o que nunca é bom que aconteça [5].  Os fusíveis empregados não podem ser de baixíssima resistência, pois isso poderia inviabilizar a principal função do DPS, que é a proteção contra surtos de tensão e picos de corrente; os DPSs precisam permitir a passagem desses surtos quando ocorrem. De fato, os menores fusíveis empregados em DPSs são de capacidade de 1 A [3], de modo que só protegem o conjunto quando as correntes de fuga são superiores a este valor. De acordo com as condições de funcionamento descritas pelas curvas de corrente/tensão dos varistores, uma corrente de fuga de 1 A percorrendo um varistor em sua tensão máxima de operação representa uma elevada queda de tensão, chegando a ser superior ao valor da própria tensão máxima de operação. Daí esse ser um estado bastante crítico, quando inferior a este não são apresentadas como correntes  suficientes para a degradação total dos varistores [4]. Jinliang [6] afirma que as características de corrente/tensão abaixo de 100mA/cm2 são geralmente medidas usando uma fonte elétrica DC, enquanto aquelas acima de 1A/cm2 são medidas por uma fonte de corrente de impulso para evitar a geração de calor e ruptura térmica, o que traduz a preocupação quanto à ruptura de varistores quando submetidos a correntes superiores a 100mA.

A medição das correntes de fuga é possível com o uso de medidores de alta precisão [12], mas nem sempre as equipes de manutenção de pequenas edificações, como comércios até indústrias de pequeno porte, dispõem de equipamento e pessoal que possa estar monitorando DPSs por meio destas medições. A rotina comum é que os DPSs sejam substituídos quando se percebe que não estão mais funcionando, ou seja, chegaram ao final de sua vida útil, momento em que o componente apresenta um alerta visual, normalmente uma mudança de cor de verde para vermelho, ou um LED aceso. 

III. SOLUÇÃO PROPOSTA: DISPOSITIVO DE CORRENTE RESIDUAL (DR)

Um equipamento que pode ser adotado como alerta para a condição do processo de degradação dos DPSs, ainda no estado de funcionamento e antes de sua ruptura, é o Dispositivo Diferencial Residual (DR). O DR é um componente amplamente disponível no mercado, sendo utilizado para a proteção contra choques e contra correntes de fuga prejudiciais a sistemas elétricos [7].

No esquema de instalação do DR, os condutores fase e neutro são conectados através de enrolamentos primários, em um transformador toróide, de modo que um enrolamento secundário é usado como bobina sensora e é conectado a um dispositivo de comutação, cuja operação aciona o mecanismo de disparo [9]. Em um circuito equilibrado, as correntes de fase e neutro produzem fluxos magnéticos iguais e opostos no núcleo do toróide, não havendo corrente gerada na bobina sensora; já na condição em que haja um desequilíbrio entre as correntes é induzida no enrolamento secundário do núcleo do toróide, que é usado para operar o mecanismo de disparo.

Fig. 6. Esquema de um dispositivo diferencial residual, indicando o transormador, a bobina sensora e o dispositivo de seccionamento. Fonte: Shopov, Yordan [8].

 O DR pode ser utilizado como um detector de correntes de fuga em DPSs; há no mercado DRs para proteção contra choques elétricos com precisão para correntes de fuga de 10mA [10], que é um valor bem próximo de 1mA. Além disso, a forma de instalação de um DR para este fim pode ser tal que não comprometa a integridade do sistema; sua instalação deve ser feita logo após o DPS, em paralelo com o aterramento, utilizando-se um condutor de seção superior ao condutor terra, de modo que sua resistência à passagem de corrente seja comprovadamente igual ou inferior à do aterramento. A conexão do condutor ao DR deve ser feita apenas na entrada e saída de fase, deixando-se a entrada e saída de neutro sem qualquer conexão.

No momento em que correntes superiores a 20mA começarem a passar pelo DPS, ocorrerá a abertura do dispositivo DR, avisando que o DPS está em processo de degradação. O valor de 20mA é devido à instalação do DR em paralelo com o aterramento, uma vez que não se deve fazer esta instalação em série, para que a continuidade do percurso do surto até o aterramento não seja prejudicada; o trecho de condutor com o DR deve ter resistência elétrica igual ou inferior à resistência do condutor de aterramento, para que seja garantida a passagem da maior parte da corrente nesse trecho em paralelo através do DR, ou mesmo, de parcela igual à da corrente que trafega no condutor até o aterramento. Assim, uma corrente a partir de 20mA será dividida entre os dois percursos em paralelo, sendo 10mA o valor da corrente a passar pelo DR, ocasionando seu disparo de seccionamento.

Fig. 7.  Diagrama unifilar de conexão do dispositivo diferencial residual como detector de correntes de fuga de um DPS em um sistema monofásico.
Fonte: próprio autor.

O monitoramento dos DPSs pode ser feito com o uso do DR através de simples verificação periódica do quadro elétrico, quando a equipe de manutenção pode proceder à substituição do DPS ao constatar que o DR de monitoramento se encontra desligado, estando ainda o DPS em funcionamento, e, portanto, antes de sua degradação total e final de vida útil, evitando-se a ocorrência mais duradoura de correntes de fuga e reduzindo riscos de queima e explosões.

Na situação em que seja adotado um DR de 30mA de corrente residual [10], o raciocínio é o mesmo, apenas tendose um valor de detecção de corrente de fuga de 60mA, superior ao de 20mA, mas ainda inferior a 100mA.

Fig. 8.  Curva de disparo do DR, indicando a sensibilidade para correntes de 30mA.
Fonte: Devadas, Preethi [10].

Para o caso de sistemas trifásicos, em que são utilizados quatro DPSs, sendo um em cada fase e um no neutro, o monitoramento com DR segue o mesmo princípio de instalação e funcionamento, apenas sendo necessário, no caso de disparo do DR, a verificação de qual DPS se encontra danificado, o que pode ser feito mediante desligamento dos disjuntores de proteção dos DPSs e posterior acionamento dos respectivos disjuntores, um a um, ou mesmo através da desconexão dos DPSs e teste individual: o DR irá disparar quando o DPS danificado for testado.

Fig. 9.  Esquema de conexão do dispositivo diferencial residual como detector de correntes de fuga de DPSs em um sistema trifásico. Fonte: próprio autor.

IV. CONCLUSÕES

O presente artigo descreve uma análise dos Dispositivos de Proteção contra Surtos, com foco nas correntes de fuga, no processo de degradação até o final da vida útil e em uma solução proposta para um método prático de detecção, que permita a identificação da condição de início da degradação dos varistores e possibilite a substituição do componente antes do final de sua vida útil. 

Um DPS avariado em uso constitui uma situação indesejada, por conta de desperdício de energia elétrica, deficiência na proteção do sistema contra surtos e risco de queima e explosões. Os DPSs disponíveis no mercado possuem como proteção o uso de fusíveis, que atuam em correntes bem superiores aos limites aceitáveis. O uso de Dispositivo Diferencial Residual (DR) como detector de correntes de fuga de DPSs se mostra apropriado como método prático, uma vez que são componentes disponíveis no mercado e possuem características de detecção que combinam com as propriedades dos varistores, no tocante aos valores de corrente de fuga. Apesar de antagônicos em seu objetivo, uma vez que os DPSs são usados para permitir a passagem de surtos de tensão e os DRs são utilizados para o seccionamento de circuitos na ocorrência de corretes de fuga, os dois componentes em conjunto, instalados conforme apresentado, consistem em uma solução eficaz na proteção de sistemas elétricos contra surtos de tensão. 

REFERÊNCIAS

[1] Gustavo O. Cavalcanti, Marcílio A. F. Feitosa, Kayro F. H. Pereira, Manoel H. N. Marinho, Antonio S. Neto, Lucas C. Sobral, Pollyana M. R. Gonçalves, Douglas T. M. Lara, Thiago F. Gomes, Renato J. Teixeira and Wagner A. Barbosa, “Efficiency of Class III Surge Protection Devices against Lightning Surges,” IEEE LATIN AMERICA TRANSACTIONS, VOL. XX, NO. X, ABRIL 2020.

[2] Hu, Jun, “Research of ZnO varistor with high voltage gradient applied in ultra-high voltage arrester,” Tese de doutorado, Universidade de Tsinghua, Beijing, China, 2008.

[3] TDK Electronics AG 2018, “SIOV metal oxide varistors: General technical information,” Tóquio: 2018.

[4] TDK Electronics AG 2018, “SIOV metal oxide varistors: Leaded varistors, Standard Series,” Tóquio: 2018.

[5] Dolník, Bystrík, “Investigation of Electrical Properties of ZnO Varistors Stressed by Current Pulses,” Anais da 15ª Conferência Científica Internacional de Engenharia de Energia Elétrica (EPE), 2014.

[6] He, Jinliang, “Metal Oxide Varistors. From Microstructure to Macro-Characteristics,” Beijing, China: Wiley-VCH, 2019.

[7] ASSOCIAÇÃO  BRASILEIRA  DE  NORMAS TÉCNICAS, “ABNT NBR 5410: Instalações elétricas de baixa tensão,” Rio de Janeiro: ABNT, 2004.

[8] Shopov, Yordan; Filipova-Petrakieva, Simona; Boyshev, Borislav, “Investigation of residual current  devices in high frequencies,” 10º Congresso da Faculdade de Engenharia Elétrica (BulEF,) 2018.                      

[9] Erdei, Z.; Horgos, M.; Lung, C.; Pop-Vadean, A.; Muresan, R. “Frequency behavior of the residual current devices,” IOP Conference Series: Materials Science and Engineering, 2017.

[10] Devadas, Preethi; Abeth, Rathi; Singh, Shruthi; Siluvairajan, Abeth; Singh, Raja, “Study of RCD on Industrial Commercial and Residential Electrical Safety – A Hazard Awareness,” IOP Conference  Series: Materials Science and Engineering, 2020.  

[11] Khanmiri, Dawood Talebi, “Overvoltage and Surge Protection in Variable Frequency Drives,” Tese de doutorado, Universidade do Nordeste, Boston, EUA, 2020.

[12] Voncina, V.; Pihler, J.; Milanovic, M. “Extracting the Resistive Current Component from a Surge Arrester’s Leakage Current without Voltage Reference,” Sensors, 21,1257, Basel, Switzerland, 2021.


1Graduado em Engenharia Civil (2001) e Engenharia Elétrica (2023), Especialista em Instalações Elétricas Residenciais e Industriais (2020), Especialista em Engenharia de Sistemas Prediais (2021), Engenheiro de Segurança contra Incêndio e Pânico (2021). Atualmente é Engenheiro de Instalações da Rede Dor São Luiz, Regional PE, e aluno no Programa de Mestrado em Engenharia de Sistemas, da Universidade de Pernambuco, orientando do Prof. Dr. Gustavo Oliveira Cavalcanti. Suas áreas de interesse são: instalações prediais comerciais, hospitalares e industriais.

2Graduado em Engenharia Elétrica (2005), Mestre (2008) e Doutor em Engenharia Elétrica (2013) pela Universidade Federal de Pernambuco. Atualmente é professor Associado da Universidade de Pernambuco. Suas áreas de interesse são: qualidade da energia elétrica, interferência e compatibilidade eletromagnética e sensoriamento.