A SEGURANÇA DO TRABALHO APLICADA AO TRABALHO EM FERROVIAS: UMA COMPARAÇÃO ENTRE A REALIDADE DO BRASIL E DA EUROPA

OCCUPATIONAL SAFETY APPLIED TO WORK ON RAILWAYS: A COMPARISON BETWEEN THE REALITY IN BRAZIL AND EUROPE

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10437004


Dina Dietrich de Oliveira
João Pedro Matos Sant’Ana
Orientador: Rodrigo Marques de Oliveira


RESUMO

O presente trabalho teve como tema a segurança do trabalho aplicada às ferrovias, comparando a realidade brasileira com a apresentada na Europa. O objetivo do trabalho foi comparar a realidade da segurança do trabalho em ferrovias no Brasil e na Europa. A metodologia utilizada para realização do trabalho foi a revisão narrativa de literatura. No Brasil, as ações voltadas à segurança do trabalho no setor ferroviário têm apresentado resultados positivos, com a redução significativa dos índices de acidentes. No entanto, ainda há desafios a serem superados, principalmente no que se refere à investigação de acidentes, que é realizada pelas próprias concessionárias ferroviárias. Na União Europeia, a segurança do trabalho no setor ferroviário é regulamentada por legislação específica, que estabelece requisitos mínimos para a investigação de acidentes. As investigações são realizadas por organismos públicos independentes, o que garante a imparcialidade e a efetividade das ações de prevenção. A comparação entre as realidades do Brasil e da Europa permite identificar aspectos positivos e negativos em cada contexto. As ações voltadas à segurança do trabalho no setor ferroviário devem ser pautadas pela abrangência, considerando não somente os trabalhadores diretamente envolvidos com os processos cotidianos, mas também os riscos externos, como os acidentes de passagem de nível. Além disso, a investigação de acidentes deve ser realizada por organismos públicos independentes, o que garante a imparcialidade e a efetividade das ações de prevenção.

Palavras-chave: Ferrovias. Segurança do Trabalho. Europa. Brasil.

ABSTRACT

The theme of this work was occupational safety applied to railways, comparing the Brazilian reality with that presented in Europe. The objective of the work was to compare the reality of workplace safety on railways in Brazil and Europe. The methodology used to carry out the work was a narrative literature review. In Brazil, actions aimed at occupational safety in the railway sector have shown positive results, with a significant reduction in accident rates. However, there are still challenges to be overcome, especially with regard to accident investigation, which is carried out by the railway concessionaires themselves. In the European Union, work safety in the railway sector is regulated by specific legislation, which establishes minimum requirements for accident investigation. Investigations are carried out by independent public bodies, which guarantees the impartiality and effectiveness of prevention actions. The comparison between the realities of Brazil and Europe allows us to identify positive and negative aspects in each context. Actions aimed at occupational safety in the railway sector must be guided by scope, considering not only workers directly involved in daily processes, but also external risks, such as level crossing accidents. Furthermore, accident investigation must be carried out by independent public bodies, which guarantees the impartiality and effectiveness of prevention actions.

Keywords: Railways. Workplace safety. Europe. Brazil.

1 INTRODUÇÃO

A segurança do trabalho é um tema de extrema importância para qualquer atividade profissional, e no caso do trabalho em ferrovias, essa importância é ainda maior. Isso porque as ferrovias são ambientes de trabalho perigosos, com riscos de acidentes graves, inclusive fatais.

No Brasil, a segurança do trabalho é regulamentada por um extenso arcabouço legal, que estabelece normas para a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais, mas temos ainda espaço para ampliarmos os olhares quanto a segurança ferroviária. 

Na Europa, a segurança do trabalho também é regulamentada por legislação específica, abrangente e rigorosa. Observa-se, inclusive, que os países europeus possuem um histórico de elevados investimentos no setor ferroviário que sugere a necessidade de atenção quanto às questões intrínsecas à segurança do trabalho.

A partir destas considerações, discute-se a forma como tem sido aportada segurança ao transporte ferroviário no Brasil, bem como na Europa, tanto aos trabalhadores do setor quanto aos usuários e à população em geral. 

O objetivo do trabalho foi comparar a realidade da segurança do trabalho em ferrovias no Brasil e na Europa. Para tanto, tem-se como objetivos específicos discutir os aspectos históricos e o desenvolvimento do setor ferroviário brasileiro, analisar os preceitos normativos e os dados quantitativos que se relacionam aos acidentes de trabalho e demais ocorrências de acidentes nesse modal.

Destaca-se que a relevância da proposta do presente trabalho situa-se na necessidade de que sejam compreendidos os aspectos dizem respeito à segurança do trabalho no setor ferroviário, a partir da observação acerca dos elevados riscos existentes nas atividades cotidianas e a extensão desses riscos ao público em geral, considerando tratar-se de atividades predominantemente executadas em locais onde existe o fluxo de pessoas e veículos.

A metodologia utilizada no trabalho foi a revisão narrativa de literatura, realizada a partir de artigos científicos, livros, teses, dissertações, leis, textos normativos e informações disponibilizadas por instituições que se relacionam ao setor. A pesquisa teve o caráter qualitativo.

2 O TRANSPORTE FERROVIÁRIO NO BRASIL: HISTÓRICO E EVOLUÇÃO

A história das ferrovias no Brasil tem como ponto de partida para seu estudo o ano de 1854, com a construção, no Rio de Janeiro, da Estrada de Ferro Mauá. Entre as iniciativas de grande importância no campo do desenvolvimento das ferrovias no Brasil situa-se a criação da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), em 1957, que funcionou até 1999. Diante das concessões realizadas pelo Governo Federal, a malha da extinta RFFSA tornou-se de responsabilidade de empresas privadas, com o patrimônio da estatal sendo transferido para o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT, s/d).

O DNIT tem como objetivos a supervisão e a fiscalização das entidades que delegam os serviços e as obras de infraestrutura, a gestão de projetos, assim como a operação e a administração de todos os recursos para o transporte. Compete a esse órgão todos os investimentos em infraestrutura de transporte terrestre e aquaviário. Dito de outra forma, a gestão da operação e a administração dos modais de transporte, bem como a manutenção, e a recuperação dos terminais, das vias de rodagem e navegação, da infraestrutura portuária, entre outras. A mesma Lei que instituiu o DNIT (Lei nº 10.233), estabeleceu também a ANTT, posteriormente regulamentada por meio do Decreto nº 4.130, de 13 de fevereiro de 2002. A ANTT é uma agência que faz parte do Ministério da Infraestrutura, ou seja, da administração federal, mas com independência jurídica, assim como autonomia funcional e financeira (PIGOZZO, 2021).

Conforme Pires (2013), o desenvolvimento do transporte ferroviário em todo o mundo pode ser considerado como um fator essencial para o desenvolvimento. Um exemplo pode ser observado nos Estados Unidos, tanto considerando a tração a diesel, quanto a precursora a vapor e os trens elétricos, que vêm sendo utilizados naquele país desde os anos 1920. Atualmente, as ferrovias norte-americanas somam um pouco menos que um milhão de quilômetros, dos quais 25% são eletrificados e 75% utilizam tração a diesel. 

Entretanto, os volumes transportados por esses dois modos de tração se equilibram: 50% em tração elétrica e 50% em tração a diesel. Assim como a tração a vapor foi progressivamente abandonada em função dos outros tipos de tração, é muito provável que outros tipos de tração venham a surgir, como a tração a células de hidrogênio (PIRES, 2013). No Quadro 1 podem ser observados aspectos relacionados ao transporte ferroviário no Brasil:

Quadro 1 – Aspectos relacionados ao transporte ferroviário no Brasil

VANTAGENSDESVANTAGENSPOSSÍVEIS MELHORIAS
• Ideal para grandes quantidades de carga;  

• Baixo custo para grandes distâncias;
 
• Bom para produtos de baixo valor e alta densidade;
 
• Pouco afetado pelo tráfego;   •Bons fatores ambientais.
• Serviços e horários pouco flexíveis;  

• Pouco competitivo para distâncias curtas e cargas pequenas;  

• Grande dependência de outros transportes (rodoviário);  
•Pouco flexível, só de terminal em terminal;  

• Elevados custos de movimentação de carga e descarga.
• Aumento da velocidade de trajeto e das cargas/descargas;  

• Comboios mais frequentes;  

• Melhoria de equipamento dos terminais;  

• Uso de sistemas de informação que permitam melhorar o controle das frotas ferroviárias e programação de rotas.

Fonte: Dias (2022)

As estradas de ferro são classificadas quanto a sua importância e também em função da bitola utilizada. Existem, ainda, classificações quanto à classe de serviço, relacionada à velocidade máxima autorizada; à nomenclatura, relacionada à posição geográfica, e à densidade de tráfego, que diz respeito à tonelagem transportada. Quando a bitola é menor do que 1.435 mm, a ferrovia é caracterizada como sendo de bitola estreita; quando é maior, uma ferrovia de bitola larga (ALBANO, 2016).

A capacidade de carga do transporte ferroviário é uma vantagem significativa. Segundo a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU, 2018), um vagão de metrô tem capacidade para 250 passageiros, equivalente a três ônibus ou 50 carros. Um trem com duas locomotivas e 96 vagões pode transportar 8.400 toneladas de carga, o equivalente a 220 caminhões modelo bitrem, que é o maior veículo de carga rodoviário sem autorização especial. 

No entanto, a construção de uma ferrovia requer um projeto de infraestrutura mais complexo em comparação com uma rodovia. Isso inclui a preparação do leito ferroviário, instalação de trilhos, pontes, viadutos, túneis e sinalização adequada. No Brasil, atualmente há uma retomada significativa de projetos ferroviários. Por exemplo, em 2021, foi autorizada a construção de nove ferrovias no país e esses projetos representam um investimento de aproximadamente R$ 50 bilhões e adicionam 3,5 mil quilômetros à malha ferroviária, abrangendo estados como São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Maranhão, Minas Gerais, Espírito Santo, Piauí e Pernambuco (INFOMONEY, 2021).

Especificamente no Brasil, tem-se a gradativa evolução e a retração dos investimentos e das políticas públicas, ocorrida em curto espaço de tempo, sendo que uma referência importante no segmento ferroviário se trata do primeiro período de evolução, entre 1852 e 1900, com a criação das primeiras estradas de ferro, principalmente com financiamento por parte do governo inglês. No interior de São Paulo algumas ferrovias foram financiadas pelos cafeicultores. O segundo período foi marcado pela nacionalização do sistema, sendo que no ano de 1929, o Estado era proprietário de 67% das ferrovias. Em 1957 foi criada a Rede Ferroviária Federal e nos anos 1980, a Cia. Brasileira de Trens Urbanos, que absorveu as divisões de transporte de passageiro de subúrbio. Na década de 1990 ocorrera a maior parte das privatizações das ferrovias no Brasil (CAIXETA-FILHO; MARTINS, 2014).

3 A SEGURANÇA DO TRABALHO NO SETOR FERROVIÁRIO

3.1 A SEGURANÇA DO TRABALHO NAS FERROVIAS BRASILEIRAS  

Os riscos intrínsecos ao setor ferroviário são diversos, considerando os aspectos que se referem à segurança do trabalhador, bem como os elementos que dizem respeito à população em geral. Nesse sentido, verifica-se que as iniciativas que se voltam à segurança dos profissionais que atuam nas diversas funções relacionadas ao transporte ferroviário, de cargas ou de passageiros, de modo direto influenciam também na segurança do público em geral. 

Conforme a Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes (ITF, 2023), a segurança ferroviária representa a remoção, dos locais de trabalho, do risco e do perigo, promovendo uma modalidade segura de transporte. Para a cumprimento destes objetivos, tem-se a importância do desenvolvimento de ações efetivas, que possam atender às demandas de toda a população, considerando passageiros, pedestres e demais pessoas que trafegam pelas áreas de abrangência das ferrovias, além dos próprios profissionais. 

Os aspectos que dizem respeito à segurança do trabalho no setor ferroviário remetem à complexidade das iniciativas, compreendendo as particularidades intrínsecas às atividades do dia a dia. Desse modo, as ações contam com a análise das características do trabalho executado e do próprio local, considerando os riscos existentes. Conforme Miguel (2020), os acidentes ferroviários são classificados conforme sua natureza, podendo resultar de descarrilamento, atropelamento, colisão, abalroamento, explosão e incêndio. A respeito da causa, os acidentes podem ser motivados por falha humana, por aspectos relacionados à via permanente, material rodante, sistemas de telecomunicação, sinalização e energia, atos de vandalismo e casos fortuitos ou de força maior.

Ressalta-se que a segurança proporcionada pelo próprio modal ferroviário a partir da efetividade das medidas que integram o dia a dia das atividades contribui no sentido de viabilizar as ações de prevenção contra acidentes de trabalho. Conforme a ANTF (2023), a incidência de acidentes, considerando a série histórica desde 1997, apresentou uma redução de 85,34%. Os riscos, no entanto, são elevados, considerando que existem no Brasil mais de cinco mil cruzamentos entre vias e trilhos. Os dados dos acidentes entre os anos de 2011 e 2019 podem ser observados no Gráfico 1:

Gráfico 1 – Acidentes ferroviários no Brasil – 2011 a 2019

Fonte: Adaptado de Miguel (2020)

Segundo a Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer, 2020), a segurança é um fator de essencial observação no contexto do transporte ferroviário, sendo que no Brasil as empresas que atuam nesse segmento se utilizam dos mais modernos equipamentos para a minimização dos riscos existentes.

Os modelos contemporâneos de prevenção de acidentes são sustentados pela ideia de que a segurança e os acidentes emergem das interações entre vários componentes como pressões econômicas, tomada de decisão organizacional e influências culturais. Estes elementos influenciam para que o sistema crie as condições para a ocorrência de acidentes, sendo que sua análise fornece um importante subsídio para melhorar a segurança (READ et al., 2021).

A pressão sobre a gestão da segurança do transporte ferroviário aumentou constantemente com o rápido desenvolvimento da ferrovia. Portanto, o controle de riscos de segurança é a chave para proteger o transporte ferroviário. O controle de riscos de segurança refere-se aos métodos de gerenciamento científico para obter a garantia máxima de segurança com o custo mínimo, controlando os riscos de forma eficaz e otimizando as tecnologias de controle de riscos de segurança com base na avaliação dos riscos de segurança durante as atividades de produção da empresa (ZHANG et al., 2020). 

Segundo Daniellou, Simard e Boissières (2011), os fundamentos essenciais relacionados à segurança têm como fundamento as regras, diante das quais é feita a predefinição de respostas a situações previsíveis; e a segurança gerenciada, que tem como fundamento a presença de iniciativas em tempo real, que possibilita a identificação dos cenários previstos e, ainda que não tenham sido, torna possível a indicação de respostas adequadas.

O índice de segurança utilizado atualmente no Brasil, também denominado como indicador de acidentes ferroviários ou índice de acidentes, utilizado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres e pela Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, tem como unidade o número de acidentes por milhão de trens quilômetro, onde trens representam o número de composições formadas e quilômetro a extensão percorrida no trecho por estes trens. 

No Brasil, a Agência Nacional de Transportes Terrestres apresenta os dados que se relacionam aos acidentes de trabalho, por concessionária. Na Tabela 1 podem ser observados os índices de acidentes por milhão de trem.km.

Tabela 1 – índice de acidentes por milhão de trem.km

Fonte: Brasil (2022)

Barbosa Filho (2015) afirma que o Sistema de Saúde e Segurança do Trabalho tem como responsabilidade providenciar ações com a finalidade de preservar a integridade, não sendo exclusividade dos trabalhadores, mas das pessoas que podem ser atingidos por um dado evento indesejado originado nas condições nas quais determinadas tarefa é realizada. Nesse contexto, conserva-se que as empresas devem priorizar os conhecimentos, definidos como requisitos que devem ser atendidos para a promoção das ações de segurança do trabalho, indicados na Figura 1:

Figura 1 – Antecedentes a serem satisfeitos para segurança do trabalho

Fonte: Barbosa Filho (2015)

A empresa, para atender de modo específico às exigências para a efetividade das ações de segurança no trabalho deve ter como ponto de partida o conjunto tridimensional de conhecimentos, geralmente chamado de antecedentes ou requisitos que devem ser satisfeitos simultaneamente por esse sistema. Estes requisitos suportam a definição das estratégias e ações para o cumprimento das expectativas de manutenção da integridade de todos os que podem ser afetados por eventos indesejados nos processos produtivos (BARBOSA FILHO, 2015). 

O ponto mais crítico no âmbito da segurança nas ferrovias, que representa um aspecto que diz respeito tanto aos profissionais quanto ao público em geral, trata-se das passagens de nível. Conforme Read et al. (2021), a prevenção de acidentes e quase acidentes em passagens de nível é uma preocupação fundamental de segurança devido aos significativos impactos financeiros e sociais causados por esses eventos. 

Ressalta-se que a prevenção de acidentes em passagens de nível leva em consideração a criticidade dessa passagem. Nesse sentido, a norma ABNT NBR 7613:2020 indica as considerações que se relacionam aos cruzamentos rodoferroviários. Uma delas trata-se do Grau de Importância, que estabelece a relação entre o fluxo de veículos rodoviários e ferroviários, bem como as características físicas do cruzamento, definindo se a proteção deve ser ativa ou passiva. Outro aspecto refere-se ao Momento de Circulação, que é semelhante ao Grau de Importância, mas faz considerações acerca do fluxo, durante as 14 horas do dia, determinando o tipo de sinalização rodoviária que deverá ser empregado (ABNT, 2020).

No sistema ferroviário, diferentes métodos de controle são adotados para lidar com diferentes fatores de risco, o que faz com que sejam considerados diferentes custos e contribuições para o nível geral de risco do sistema. Portanto, o controle de risco sistemático visa reduzir o nível de risco do sistema de forma eficaz, controlando seletivamente diferentes fatores de risco e economizando custos (ZHANG et al., 2020). 

No entanto, importa compreender que existem metodologias voltadas à avaliação tanto dos riscos especificamente relacionados ao trabalho nas ferrovias quanto aos indicadores inerentes a estas atividades. Tais indicadores de acidentes de trabalho, conforme Rosa (2016), são o número de acidentes com perda de tempo, o número de acidentes sem perda de tempo, o número de horas de afastamento por acidentes operacionais e o número de mortes no exercício das atividades do trabalho.

Com relação ao quantitativo de acidentes por causa, que é outro indicador empregado, trata-se do número total de ocorrências ocasionadas diretamente pelo veículo ferroviário, provocando danos ao próprio material rodante, ou a instalação fixa, pessoa, animal e/ou outro veículo. As ocorrências, de acordo com suas causas, podem ser categorizadas como via permanente; material rodante; falha humana; sinalização, telecomunicações e eletrotécnica entre outras. A apresentação é por unidade e possui periodicidade de apuração mensal ou por outra determinação. Sua aplicabilidade está na avaliação dos planos de transportes no que se refere à segurança operacional (ROSA, 2016).

Considerando as categorias profissionais envolvidas no trabalho nas ferrovias, os dados relacionados aos acidentes de trabalho nos anos de 2019, 2020 e 2021 podem ser observados no Gráfico 2:

Gráfico 2 – Acidentes de trabalho – ferroviários

Fonte: Adaptado de Brasil (2023)

Verifica-se que o transporte metroferroviário de passageiros é o responsável pelo maior número de acidentes de trabalho, tendo apresentado no ano de 2021 um aumento na quantidade de ocorrências em relação ao ano de 2020, ainda que ainda seja uma quantidade significativamente menor que o ano de 2019. Esta condição por ser observada também nos outros segmentos ferroviários, porém com uma menor disparidade na comparação entre os anos de 2019 e 2021. 

A explicação pode ser encontrada a partir da observação de que a pandemia teve influência em diversas áreas, inclusive nas ferrovias, o que explica esse aumento dos casos de acidentes de trabalho, considerando que os dados incluem os acidentes de trajeto e as doenças do trabalho. Quanto ao percentual de acidentes típicos, em relação ao total, por tipo de ocupação, os dados podem ser observados no Gráfico 3:

Gráfico 3 – Percentual de Acidentes de trabalho típicos – ferroviários

Fonte: Adaptado de Brasil (2023)

A elevada participação dos acidentes típicos, em comparação com os acidentes de trajeto e doenças profissionais, sugere a necessidade de que sejam desenvolvidas políticas de prevenção voltadas principalmente à minimização destes riscos, com uso de metodologias especificamente adaptadas às demandas do transporte ferroviário. 

Um exemplo de adoecimento profissional entre os ferroviários refere-se às doenças na coluna. Um exemplo nesse sentido foi a condenação de uma empresa que opera na malha ferroviária de Minas Gerais, diante da constatação de que ocorreu uma lesão na coluna do profissional, que trabalhou por 30 anos na empresa (TRT, 2021).

No bojo dos recursos ora empregados para prover a segurança dos trabalhadores e do público em geral situam-se as câmaras colocadas em passagens de nível, os programas de observação de tarefas, de segurança em malha e em terminais. Os programas de observação de tarefas contam com o controle de riscos a partir da análise dos desvios apontados. Os programas de segurança em terminais contam com auditoria com foco nas rotinas operacionais e na condição de via permanente nos terminais de clientes, com a realização de inspeções (MRS, 2020). A efetividade das iniciativas no campo da segurança do trabalho pode ser observada a partir da análise dos dados a respeito das ocorrências de acidentes de trabalho, considerando trabalhadores terceirizados e próprios, em uma das empresas que atua no setor (Gráfico 4):

Gráfico 4 – Taxa de acidentes

Fonte: MRS (2020)

A redução significativa nas taxas de acidentes na empresa citada tem entre suas motivações a utilização de modelos de gestão da segurança e um exemplo trata-se da utilização da ISO 45001, norma internacional para o Sistema de Gestão de Saúde e Segurança Ocupacional e nas Normas Regulamentadoras para a execução das atividades relacionadas ao trabalho nas empresas do segmento ferroviário, compreendendo tanto as atividades operacionais quanto administrativas. As empresas do setor ferroviário brasileiro vêm desenvolvendo ações especificamente voltadas à segurança no trabalho. No Quadro 2 podem ser observadas as iniciativas de algumas destas organizações.

Quadro 2 – Ações inerentes à segurança no trabalho nas ferrovias

EMPRESAPRINCIPAIS INICIATIVAS
MRSAções com a temática de segurança, destacando o cuidado com as mãos, que é a parte mais afetada nos acidentes e Semana Interna de Prevenção de Acidentes no Trabalho e Meio Ambiente.
FCA (VLI)O Plano Diretor de Saúde e Segurança e as Regras pela Vida, compreendendo os compromissos para garantir a saúde e a segurança de todos que se relacionam localmente com a empresa.
ValePrevenção de acidentes catastróficos por meio de ações imediatas, Permissão de Trabalho Seguro, Requisitos de Atividades Críticas.

Fonte: Dados da Pesquisa (2023)

Destaca-se, no entanto, que a efetividade das iniciativas utilizadas pelas empresas passa pela estrita atenção aos preceitos legais e normativos. Além disso, a conscientização dos profissionais e o desenvolvimento de uma cultura de segurança, com o contínuo aprimoramento, mostra-se relevante nesse contexto.

Nesse contexto, a liderança em segurança é um exemplo de um construto que pode influenciar significativamente a segurança do trabalho. Estas medidas referem-se a um processo no qual uma pessoa orienta e influencia outros indivíduos ou grupos para atingir objetivos de segurança ao concluir tarefas organizacionais. A pessoa comprometida com as iniciativas e que atua influenciando os outros é chamada de líder de segurança. O sucesso da estratégia é afetado principalmente pelo carisma pessoal e pelas características dos líderes, e uma atmosfera segura desempenha um papel intermediário entre a liderança e o comportamento de segurança (LI et al., 2020). 

Grill e Nielsen (2019) consideram que as práticas de liderança direta e indireta podem influenciar o desempenho de segurança dos trabalhadores, existindo diversas intervenções de liderança em segurança sendo implantadas no segmento ferroviário. Além disso, há evidências de que a liderança transformacional específica de segurança impacta positivamente os resultados de segurança, incluindo comportamentos de segurança.

O fator humano é um fator importante nos acidentes de trabalho. Mesmo com o desenvolvimento da tecnologia, o erro humano ainda ocorre e deve ser prevenido para melhorar a segurança no trabalho. Kumar et al. (2016) identificaram quatro categorias principais de erro humano, que são a sonolência e desatenção por rotina; enganos ou lapsos por falha de memória; erros pela necessidade de tomada de decisão imprevista ou falha de conhecimentos e descumprimento das normas.

Atualmente, segundo o relatório executivo do Anuário do Setor Ferroviário, os índices de acidentes ferroviários tiveram redução de aproximadamente 85% na última década. Porém, ainda há discrepância entre as empresas do ramo ferroviário, havendo cenários de até 2.800% dentre estas empresas (DINIZ, 2018).

A análise realizada por Diniz (2018) indicou que as principais fragilidades identificadas na manutenção ferroviária são o volume de demandas e o alto custo envolvido. Apesar de haver uma mudança na cultura empresarial de segurança do trabalho, ainda há resistência à cultura preventiva. Isso se confirma na operação ferroviária, que é mais complexa, mas possui um maior espectro de proteção, neutralizando as fragilidades.

Ainda que as comparações entre os dados apresentados no Brasil e de países com maior extensão da malha ferroviária não devam ser pautadas pelos aspectos eminentemente quantitativos, é importante a consideração acerca dos dados internacionais para a apreciação das causas dos acidentes. Conforme a NSC (2023), as mortes em ferrovias nos Estados Unidos totalizaram 893 em 2021, um aumento de 20% em relação ao total de 2020, de 744, e o maior desde 2007. Lesões não fatais totalizaram 5.781, um aumento de 4% em relação ao total revisado de 2020 de 5.544. De 2020 a 2021, as mortes em cruzamentos rodoviários aumentaram 21%, enquanto as mortes envolvendo outros tipos de incidentes aumentaram 20%. Este último incluiu 617 mortes (94%) atribuídas a invasores. Onze funcionários foram mortos em serviço, igual ao número de mortos em 2020. Houve seis mortes de passageiros de trem, contra duas mortes em 2020.

A partir dos dados apresentados, verifica-se a influência de fatores externos na ocorrência de acidentes ferroviários, o que sugere que as ações voltadas à prevenção de acidentes de trabalho, bem como de outros tipos de acidentes nas ferrovias, sejam pautadas pela abrangência, considerando não somente as pessoas diretamente envolvidas com os processos cotidianos. Conforme Drudi (2007), a maior parte das mortes no trabalho com envolvimento de trens ocorre com trabalhadores em atividades fora da ferrovia, geralmente de trens colidindo com veículos rodoviários em acidentes de passagem de nível. Mesmo que os veículos ferroviários sozinhos estejam envolvidos em quase metade das mortes sofridas pelos ferroviários, os trabalhadores não ferroviários são frequentemente feridos fatalmente em colisões entre um veículo ferroviário e alguns outros tipos de veículo.

Outros dados apresentados, em relação às ocorrências de acidentes ferroviários nos Estados Unidos, referem-se ao fato de que o número de trabalhadores mortos em passagem de nível acidentes diminui gradativamente e que a taxa de mortalidade para ocupações de transporte ferroviário foi reduzida, ainda que seja o triplo da apresentada em trabalhadores em geral. Importa compreender que, ainda assim, essa taxa é menor que a apresentada entre os trabalhadores de outros modais de carga. Além disso, a taxa de fatalidade para operadores de freio, sinal e comutação é muito maior do que as taxas para outros trilhos (DRUDI, 2007). Outras comparações pertinentes dizem respeito à segurança do trabalho nas ferrovias europeias, que apresentam especificidades passíveis de subsidiar as análises nesse contexto.

3.2 A SEGURANÇA DO TRABALHO NAS FERROVIAS EUROPEIAS: COMPARAÇÕES COM AS PRÁTICAS REALIZADAS NO BRASIL

A Agência Ferroviária da União Europeia (ERA) é uma agência da União Europeia que trabalha para integrar o sistema ferroviário europeu. Ela faz isso garantindo que os trens sejam seguros e possam viajar sem problemas entre países. Esta instituição também ajuda a aumentar a competitividade do setor ferroviário, criando um espaço ferroviário comum europeu sem fronteiras. Uma das atribuições da ERA é de desempenhar funções técnicas e científicas que se relacionam à segurança do trabalho no setor ferroviário europeu, fornecendo dados e comparações a esse respeito. A princípio, tem-se a importância de que seja analisada a forma como se processam os inquéritos e investigações sobre os acidentes de trabalho. 

Os Organismos Nacionais de Inquérito (ONI) são responsáveis por investigar todos os acidentes graves e podem investigar todos os acidentes e incidentes que considerem relevantes para a segurança. Os ONI são independentes do setor ferroviário e têm como objetivo principal identificar as causas dos acidentes e propor medidas de prevenção. Os gestores de infraestrutura e as empresas ferroviárias também são responsáveis por investigar acidentes. Eles devem estabelecer Sistemas de Gestão de Segurança (SGS) que contenham procedimentos para garantir a notificação, o inquérito e a análise de acidentes, incidentes, casos de quase acidente e outras ocorrências perigosas. Os SGS também devem conter medidas necessárias de prevenção. O objetivo da investigação de acidentes ferroviários é melhorar a segurança do transporte ferroviário (ANTT, 2018). 

Conforme a Declaração Europeia de Cultura de Segurança Ferroviária, os trabalhadores devem seguir as normas de segurança e agir com responsabilidade, enquanto as organizações devem criar um ambiente de trabalho seguro e incentivar um comportamento positivo de segurança. A segurança é responsabilidade de todos, mas cada um tem uma responsabilidade específica. Apesar de todos os esforços, mesmo os trabalhadores mais qualificados podem cometer erros. Isso ocorre porque a confiabilidade humana é limitada e pode ser afetada por fatores externos, como condições imprevisíveis ou falta de recursos. As organizações devem tomar medidas para mitigar os riscos, incluindo os relacionados com a confiabilidade humana. Isso pode ser feito por meio de treinamento, equipamentos adequados e procedimentos claros (ERA, 2023).

Ao identificar as causas dos acidentes, é possível tomar medidas para prevenir que eles ocorram novamente. Um exemplo de ação voltada à segurança ferroviária trata-se da Diretiva (UE) 2016/798, relativa à segurança ferroviária. Esta diretiva estabelece os requisitos mínimos para a investigação de acidentes ferroviários na União Europeia (ANTT, 2018).

No Brasil, as investigações de acidentes ferroviários são realizadas pelas próprias concessionárias ferroviárias. Essas investigações são enviadas à ANTT, mas não são conduzidas por um organismo público independente. Isso significa que não há uma investigação imparcial, que visa apenas aprimorar a segurança do sistema ferroviário, sem se preocupar em responsabilizar indivíduos ou empresas (ANTT, 2018). Verificam-se diferenças significativas entre os tipos de acidentes, se considerada a realidade da União Europeia e do Brasil, como pode ser observado na Figura 2:

Figura 2 – Aspectos comparativos entre os tipos de acidentes

Fonte: ANTT (2018)

No Brasil e na União Europeia, há diferenças nas definições de termos relacionados a acidentes ferroviários. A primeira diferença é na própria definição de acidente ferroviário. Na União Europeia, um acidente ferroviário é definido como um acontecimento súbito indesejado ou involuntário, com consequências danosas. Os acidentes são classificados em colisões, descarrilamentos, acidentes em passagens de nível, acidentes com pessoas e material circulante em movimento, incêndios e outros.

Na União Europeia, cada país tem um órgão independente que investiga acidentes ferroviários para melhorar a segurança. Além disso, as empresas ferroviárias e os gestores de infraestrutura também investigam acidentes, mas com focos diferentes. As empresas ferroviárias devem estabelecer sistemas de gestão de segurança (SGS) que incluam procedimentos para notificar, investigar e analisar acidentes, incidentes, quase acidentes e outras ocorrências perigosas. Esses sistemas também devem incluir medidas de prevenção (ANTT, 2018).

No Brasil, um acidente ferroviário é definido como uma ocorrência que, com a participação direta de um veículo ferroviário, provoca danos a este, a pessoas, a outros veículos, a instalações, a obras-de-arte, à via permanente, ao meio ambiente e, desde que ocorra paralisação do tráfego, a animais (ANTT, 2018). 

As duas definições têm em comum o fato de considerar um acidente ferroviário como um acontecimento que causa danos. No entanto, a definição europeia inclui a exigência de que o acontecimento seja indesejado ou involuntário. Essa exigência não é obrigatória no Brasil. Essa diferença tem implicações práticas. Por exemplo, um descarrilamento provocado por sabotagem não é considerado um acidente na UE, mas um crime. No Brasil, esse descarrilamento seria considerado um acidente. A definição europeia pode ser considerada mais precisa, pois inclui a exigência de que o acontecimento seja indesejado ou involuntário. No entanto, essa definição também é mais complexa, pois exige critérios claros para distinguir um acidente de um acontecimento intencional (ANTT, 2018). Outra questão passível de análise no campo da pesquisa relacionada aos acidentes de trabalho no setor ferroviário refere-se à sobrecarga de trabalho e estresse.

O estresse é um risco psicossocial que afeta 14% dos trabalhadores europeus. No contexto laboral, o estresse é um desafio para a saúde ocupacional e para a segurança no trabalho, pois é uma situação comum e pode levar a um absenteísmo significativo. No entanto, o estresse é frequentemente estigmatizado como um problema de saúde mental individual, sendo associado a uma falha do trabalhador. No entanto, o estresse pode ser controlado se abordado numa perspectiva organizacional, através da identificação e eliminação das causas do estresse (QUEIRÓS et al., 2017).

A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho alertou para os riscos psicossociais no trabalho, incluindo o stress crónico ou pós-traumático. Os trabalhadores da ferrovia estão expostos a situações que podem causar estados emocionais negativos e trauma, como acidentes, suicídios e agressões de passageiros. Os dados de 293 trabalhadores revelaram que a intensidade do stress e do trauma era moderada. 32% dos trabalhadores apresentavam trauma, o que explicava até 22% do stress. Os acidentes tiveram um impacto traumático maior do que as agressões. Como os trabalhadores da ferrovia são obrigados a interagir com passageiros num espaço fechado e a passar no mesmo local onde podem ter tido acidentes, é importante prestar mais atenção à gestão do stress e à prevenção do trauma, sendo que isto ajudará a evitar que os estados emocionais negativos se tornem uma vulnerabilidade para a ocorrência de erros humanos nos acidentes, afetando a segurança ferroviária (QUEIRÓS et al., 2017).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os aspectos relacionados à segurança do trabalho no setor ferroviário dizem respeito à complexidade das atividades, incluindo as peculiaridades inerentes ao dia a dia. As ações assentam, assim, na análise das características do trabalho, tendo em conta os riscos existentes. 

As comparações entre os dados apresentados no Brasil e nos países com maior malha ferroviária não se baseiam necessariamente em aspectos quantitativos, mas é importante considerar os dados internacionais na avaliação das causas dos acidentes. O modelo moderno de prevenção de acidentes baseia-se na ideia de que a segurança e os acidentes surgem da interação de vários fatores, como restrições econômicas, decisões organizacionais e influências culturais. 

A pressão sobre a gestão da segurança no transporte ferroviário está aumentando continuamente e gerenciar os riscos de segurança é, portanto, fundamental para a promoção da segurança no transporte ferroviário. Os recursos atuais utilizados para garantir a segurança dos trabalhadores e do público em geral incluem câmeras instaladas em cruzamentos ferroviários, programas de monitoramento e segurança de redes e terminais. O programa de acompanhamento das tarefas assenta na gestão do risco com base na análise dos desvios detectados. 

O programa de segurança de terminais é baseado em auditorias que enfocam e inspecionam as condições operacionais e de superestrutura dos terminais dos clientes. Ressalta-se que a significativa redução dos índices de sinistralidade nas ferrovias no Brasil acima se baseia, entre outros aspectos, na utilização de modelos de gestão da segurança. Tem-se a norma internacional para sistemas de gestão de segurança e saúde ocupacional e as normas regulatórias para o desempenho de atividades relacionadas ao trabalho em empresas do setor ferroviário.

A liderança em segurança é um exemplo de conceito que pode ter um impacto significativo na segurança do trabalho. Essas medidas referem-se ao processo pelo qual os indivíduos dirigem e influenciam outros indivíduos ou grupos para atingir metas de segurança no desempenho de tarefas organizacionais. Aqueles que defendem iniciativas e trabalham para influenciar os outros são conhecidos como líderes de segurança. O sucesso estratégico é influenciado principalmente pelo carisma pessoal e pelas características do líder, sendo que o ambiente seguro desempenha um papel mediador entre a liderança e o comportamento seguro. 

Várias medidas de gestão de segurança estão em vigor no setor ferroviário e as práticas de gestão direta e indireta podem afetar o desempenho da segurança do trabalhador. Observou-se a existência de métodos que visam avaliar tanto os riscos especificamente associados ao trabalho nas ferrovias quanto os indicadores associados a essas atividades. Estes indicadores de acidentes de trabalho são o número de acidentes com afastamento, o número de acidentes sem afastamento, o número de horas de férias por acidente de trabalho e o número de óbitos relacionados ao trabalho. 

Os dados dos acidentes de trabalho em 2019, 2020 e 2021, tendo em conta os grupos profissionais envolvidos no trabalho ferroviário, indicou que a maioria dos acidentes de trabalho foi causada pelo transporte metroviário de passageiros e, embora o número de acidentes seja maior em 2021 do que em 2020, ainda é significativamente menor do que em 2019. O impacto ocorreu em vários setores, inclusive ferroviário.

No Brasil e na União Europeia, há diferenças nas definições de termos relacionados a acidentes ferroviários. A primeira diferença é na própria definição de acidente ferroviário. Na União Europeia, um acidente ferroviário é definido como um acontecimento súbito indesejado ou involuntário, com consequências danosas. Os acidentes são classificados em colisões, descarrilamentos, acidentes em passagens de nível, acidentes com pessoas e material circulante em movimento, incêndios e outros.

No Brasil, um acidente ferroviário é definido como uma ocorrência que, com a participação direta de um veículo ferroviário, provoca danos a este, a pessoas, a outros veículos, a instalações, a obras-de-arte, à via permanente, ao meio ambiente e, desde que ocorra paralisação do tráfego, a animais. As duas definições têm em comum o fato de considerar um acidente ferroviário como um acontecimento que causa danos. No entanto, a definição europeia inclui a exigência de que o acontecimento seja indesejado ou involuntário. Essa exigência não é obrigatória no Brasil.  A definição europeia pode ser considerada mais precisa, pois inclui a exigência de que o acontecimento seja indesejado ou involuntário. No entanto, essa definição também é mais complexa, pois exige critérios claros para distinguir um acidente de um acontecimento intencional.

Outra questão passível de análise no campo da pesquisa relacionada aos acidentes de trabalho no setor ferroviário refere-se à sobrecarga de trabalho e estresse. O estresse é frequentemente estigmatizado como um problema de saúde mental individual, sendo associado a uma falha do trabalhador. No entanto, o estresse pode ser controlado se abordado numa perspectiva organizacional, através da identificação e eliminação das causas do estresse.

A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho alertou para os riscos psicossociais no trabalho, incluindo o stress crónico ou pós-traumático. Os trabalhadores da ferrovia estão expostos a situações que podem causar estados emocionais negativos e trauma, como acidentes, suicídios e agressões de passageiros. 

Como os trabalhadores da ferrovia são obrigados a interagir com passageiros num espaço fechado e a passar no mesmo local onde podem ter tido acidentes, é importante prestar mais atenção à gestão do stress e à prevenção do trauma. Isto ajudará a evitar que os estados emocionais negativos se tornem uma vulnerabilidade para a ocorrência de erros humanos nos acidentes, afetando a segurança ferroviária. As diferenças nas definições de acidente ferroviário entre a União Europeia e o Brasil podem ter implicações práticas na investigação e prevenção de acidentes. A definição europeia, que inclui a exigência de que o acontecimento seja indesejado ou involuntário, pode ser considerada mais precisa, mas também é mais complexa.

Destaca-se a escassez de publicações a respeito da segurança do trabalho nas ferrovias, desproporcionalmente à relevância do tema. Desse modo, sugere-se a realização de novas pesquisas acerca do assunto, principalmente indicando dados qualitativos inerentes às medidas de segurança adotados pelas empresas e os dados quantitativos a respeito da incidência dos diferentes tipos de acidentes.

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