FATORES AMBIENTAIS, CELULARES, HORMONAIS, GENÉTICOS E HEREDITÁRIOS QUE INFLUENCIAM NO SURGIMENTO DO CÂNCER DE TIREOIDE

ENVIRONMENTAL, CELLULAR, HORMONAL, GENETIC AND HEREDITARY FACTORS THAT INFLUENCE THE EMERGENCE OF THYROID CANCER

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10428401


Adilson Bras Pessim Borges Filho
Aira Martins Alves
Alfredo Oliveira Sarruby Do Nascimento
André Avyner Campos Teodoro
Giovana Inserra Bortolin
Gustavo Mendes Morais Pessim Borges
Marcos Henrique Pereira
Maria Julia Rodrigues Silva
Rafael Queiroz De Freitas


Resumo

A neoplasia maligna originaria do câncer de tireoide possui a maior dominância considerando as ocorrências de tumores relacionados ao sistema endocrinológico,somado a isso os desfechos após o diagnostico podem ser simples e resolutivos ou complexos e recorrentes. Assim esse estudo teve o objetivo de apresentar fatores como: ambientais, hormonais e genéticos que são considerados como fortes influenciadores no risco de desenvolver esse tipo de câncer, somado a isso também será apresentado como cada fator desses podem alterar o comportamento fisiológico desta glândula. Para tanto, foi necessário fazer uma busca na literatura relacionada com o tema nas principais plataformas digitais e livros, por conta da vasta carga de informações e atualizações que ocorrem na área oncológica foi limitada as buscas para trabalhos publicados entre os anos de 2002 a 2020, nas plataformas BVS, Scielo, Pubmed, Lilacs, foi incluído nas pesquisas artigos na língua portuguesa, inglesa e espanhola. A discussão de cada fator de risco analisado individualmente permite entender como a soma de isolados pontos podem se unir e desencadear um processo de multiplicação de células tumorais, facilitando o entendimento de como inicia o processo fisiopatológico. Conclui-se que existem diversos fatores que contribuem para a manifestação do câncer de tireoide, desde fatores ambientais até aqueles genéticos. O tema em questão é de suma importância para que a incidência e prevalência dessa doença possa diminuir e o prognóstico do paciente acometido seja positivo, além disso percebeu-se a necessidade de estudos mais aprofundados em relação a alguns fatores específicos.      

1. INTRODUÇÃO

A tiroide é uma glândula endócrina folicular, em qual as células formam a parede de pequenas esferas denominadas folículos, que armazenam a secreção hormonal chamada coloide composta principalmente por tireoglobulina, uma glicoproteína que auxilia na produção de T3 e T4. O tipo das células nas estruturas foliculares varia, podendo ser cubicas ou escamosas. Além de células foliculares, no parênquima tireoidiano há células C, ou parafoliculares (TORTORA; 2013). Grande parte dos tumores na glândula tireoide, exceto o carcinoma medular, deriva-se da célula folicular, em qual pode ocorrer neoplasias benignas ou malignas, diversas em relação a características fenotípicas, biológicas e clínicas (TALINI; et al., 2012).  Os carcinomas papilífero e folicular correspondem a 94% dos casos e são considerados diferenciados, compondo os Carcinomas Diferenciados da Tireoide (CDT), visto que mantem semelhança estrutural e funcional do tecido tireóideo normal (GOLBERT; et.al, 2005), enquanto o medular e o anaplásico são indiferenciados (MAGALHÃES; et. al, 2003). Os tumores possuem comportamentos variados biologicamente, alguns são de baixo potencial letal e outros extremamente agressivos com alta mortalidade (TALINI, et al., 2012). Quanto ao tipo histológico, o adenocarcinoma é o mais frequente na tireoide, sarcomas e metástases são pouco descritos na literatura (CARVALHO; 2001).

O prognostico dos CDT costuma ser favorável, mas a doença pode ter um curso agressivo, além disso algumas pessoas passam por recorrência loco-regional ou metástases a distância. O carcinoma papilífero é o mais comum e possui um bom prognostico (GOLBERT; et.al, 2005), pode ser desencadeado por alterações genéticas como rearranjos genéticos exibindo expressão do gene RET/PTC (NEVES; et. al, 2009). O carcinoma folicular é mais agressivo e está associado geralmente a deficiência de iodo e a presença de bócio endêmico, pessoas que passam por essa doença podem cursar com disseminação hematogênica do tumor para ossos, cérebro, pulmão e fígado. Por sua vez, raro Carcinoma Medular da Tireoide (CMT) é um tumor neuroendócrino (GOLBERT; et.al, 2005), que tem origem nas células parafoliculares e ocorre mais de forma esporádica podendo também estar ligado a hereditariedade (NEVES; et. al, 2009). Já o anaplásico ocorre por rediferenciação dos CDT (GOLBERT; et.al, 2005).

A incidência de câncer de tireoide continua a crescer em todo o mundo, principalmente devido à crescente utilização de exames por imagem e à vigilância de diagnóstico, sendo então a maior causa de neoplasia endócrina no mundo (WHO, 2020).

O câncer de tireoide é a neoplasia maligna mais frequente do sistema endocrinológico, correspondendo a 90%, e também a mais comum na região de cabeça e pescoço. Além disso possui prevalência três vezes maior no sexo feminino, acometendo mulheres de 20 a 50 anos principalmente (TALINI; et.al, 2012; VIANNA; et.al, 2012).

O objetivo desse estudo foi apontar alguns dos fatores ambientais, antropométricos, hormonais, genéticos e hereditários que culminam em neoplasia maligna da tireoide e quais os principais carcinomas desencadeados.

A radiação ionizante, excesso de peso, insuficiência ou excesso de iodo, carcinógenos ambientais e exposição a metais pesados podem ser fatores de risco para desenvolvimento de câncer de tireoide (CT) (FERNANDES, 2018). 

Vem sendo discutido que alguns fatores ambientais influenciam no surgimento do câncer de tiroide, tais como tabagismo, etilismo, idade, consumo de iodo e dados antropométricos, o peso principalmente. Desses, tanto o tabagismo quanto a quantidade de iodo podem influenciar na existência de anticorpos que atacam a tireoide, o que contribui para haver a doença (CONCEIÇÃO; et. al, 2015)

Geralmente, tumores benignos são restritos a uma área e apesar de afetarem algumas funções orgânicas, o prognostico tende a ser melhor, quando comparada a uma situação de malignidade. O que diferencia esses tumores é o comportamento das células neoplásicas, no câncer os tecidos saem do estado basal, passa a ter multiplicação exagerada de células, as quais não respeitam os limites teciduais e se disseminam pelo sangue até chegar a outras partes do órgão de origem e em outros tecidos. A malignidade dos tumores em geral e especialmente na tireoide, está relacionada à neovascularização obtida pela angiogênese, desencadeada por fatores secretados pelas células neoplásicas. Dentre esses fatores, se destaca o Fator de Crescimento Endotelial Vascular (VEGF). (CAPP; et. al, 2009).

Os hormônios também podem influenciar no acometimento por esse câncer, pois desempenham um papel vital no funcionamento de cada órgão do corpo humano, diretamente no metabolismo celular, influenciando na produção e excreção de substâncias, feedbacks para início ou interrupções de processos e até mesmo indução de mitose ou pausa de replicações celulares (HALL; GUYTON,2017). Quando há descontrole da secreção hormonal, ocorre perda da homeostasia celular advindo várias alterações, dentre elas o câncer. Os hormônios estão dentre os vários fatores indutores ou promotores da carcinogênese. Sejam endógenos ou exógenos, eles estimulam a proliferação celular predispondo às alterações genéticas (HENDERSON & FEIGELSON, 2000). Em relação ao carcinoma da tireoide, destaca-se uma forte relação entre a carcinogênese e os níveis sanguíneos de Hormônio Tireoestimulante (TSH) e também de hormônios sexuais femininos (MANZANO, 2019)

         Além desses fatores, percebe-se que o perfil do câncer de tireoide também é marcado por traços genéticos e por hereditariedade, como por exemplo o Câncer Medular de Tireoide (CMT), que tem de 20% a 25% de sua manifestação total relacionada às características hereditárias, as quais geralmente estão associadas a alterações genéticas, como mutações que provocam diversos danos em genes importantes que protegem as células de alguma forma, como os responsáveis  pela codificação e síntese de enzimas reguladoras de alguma atividade celular, como a IL-10 que está relacionada à função imunológica, sua disfunção é relacionada  ao surgimento do carcinoma da tireoide (DANTAS, 2007).

      Diante do exposto o estudo fez-se necessário visando um melhor entendimento da doença, visto que a mesma possui epidemiologia prevalente. Com isso foi objetivado elucidar as principais fisiopatologias do câncer de tireoide, assim como demonstrar os mais importantes fatores relacionados a ele.

2 . METODOLOGIA

O presente trabalho trata se de uma revisão bibliográfica, realizada nos principais bancos de dados de trabalhos acadêmicos. As pesquisas foram publicadas entre os anos 2002 e 2020, utilizando as plataformas: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scielo, PubMed e Literatura Latino-Americano e do Caribe em ciências e saúde (Lilacs), utilizamos palavras chaves estabelecidas pelos descritores em ciência da saúde (DeCS).

Nos sites descritos foram usados os filtros de pesquisa, “texto completos” e “humanos”, para excluir trabalhos curtos e pesquisas em animais. Para a plataforma BVS os descritores utilizados foram neoplasia tireoidea, mutação e biomarcador, resultando em três trabalhos dos quais um foi escolhido por maior especificidade em relação ao tema. No Scielo foram encontrados nove artigos com as palavras tireoide, câncer e mutação dos quais foram usados quatro, os excluídos eram sobre síndrome endócrina, um tema que não faz parte dos tópicos desta pesquisa. Somando a esses, três artigos foram encontrados no Pubmed com os descritores thyroid neoplasms, genes, mutation e thyroid hormons, dos quais apenas um se destacou pelo conteúdo diferenciado, visto que se tratava de um ensaio clinico. Além disso, encontramos sete artigos na plataforma Lilacs com os descritores fatores neoplásicos e glândula tireoide, desses descartamos cinco pela abordagem de neoplasias fora da tireoide, não relevantes para a pesquisa. Após a revisão dos títulos e dos resumos e a utilização dos critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 8 trabalhos e descartados 14, para atender de forma mais ampla a revisão bibliográfica deste trabalho foi utilizado descritores diferentes em cada plataforma de pesquisa. Alguns artigos adicionais foram usados para agregar a construção do conhecimento científico acerca da patologia em questão. Como se trata de uma revisão de dados da literatura, não foi necessária aprovação do Comitê̂ de Ética em Pesquisa (CEP).

Nos artigos obtidos nas pesquisas realizadas, estão contidos conteúdos sobre uma abordagem geral de neoplasias da tireóide como os principais tipos e o comportamento na comunidade, assim como os tópicos mais específicos que serão abordados no presente estudo, como os fatores angiogênicos que facilitam a formação de tumores, genes envolvidos nas mutações, o comportamento dos hormônios tireoidianos em situação de neoplasia, assim como as raridades histológicas em meio aos tipos de tumores.

3 . RESULTADOS E DISCUSSÃO
  • Fatores Ambientais

Existem atualmente, vários fatores externos que representam risco para o surgimento de câncer da tireoide, o mais bem estabelecido deles é a exposição prévia à radiação ionizante, principalmente quando ocorre na infância e adolescência, isso foi confirmado a partir de um estudo que demonstrou aumento dos casos desse câncer um tempo após o acidente de Chernobyl (IGLESIAS ML; et al., 2017). Além disso há uma relação da a deficiência de iodo e da radioterapia com os tumores (GOLBERT; et. Al, 2005). Há também a influência do sexo, visto que o câncer de tireoide ocorre mais em mulheres o que aparentemente está ligado fatores reprodutivos e hormonais. O aumento nos casos pode estar relacionado também com a obesidade, tabagismo, etilismo, envolvimento de doenças autoimunes como a tireoidite de Hashimoto, histórico de nódulos benignos, além outras doenças da tireoide (MANZANO, 2019). 

Os casos de câncer de tireoide em obesos vem aumentando nos últimos anos, em quais os hábitos de vida e alimentação estão se tornando mais precários. Estudos que demonstram tal fato, indicam influência de adipocinas como adiponectina, leptina e resistina e também a grelina. Essas substancias estão ligadas a ação inflamatória, que por sua vez se mostra intimamente relacionada ao perfil molecular de indivíduos com Câncer Diferenciado de Tireoide (CDT). As adipocinas são produzidas pelo tecido adiposo e desempenham bioatividades diretas, como as inflamatórias, que favorecem o processo de tumorigênese, já a grelina está presente nos linfócitos T e monócitos e age por meio do receptor do hormônio de crescimento GHSR visando atuar na liberação de citocinas pro-inflamatórias, desempenhando também esse elo entre inflamação-obesidade-câncer (MARCELLO, 2015).

Um estudo demonstrou que 36,59% dos pacientes que apresentaram câncer de tireoide possuíam um diagnóstico concomitante de tireoidite de Hashimoto. Essa doença autoimune é uma das principais causas de hipotireoidismo na população, causada por um evento inflamatório precursor seguido de uma resposta autoreativa do sistema inflamatório contra antígenos próprios de pessoas suscetíveis geneticamente, a inflamação é primariamente causada por anticorpos anti tireoide com a posterior migração de células inflamatórias para esse tecido, visualizada histologicamente por infiltrados linfocitários difusos e alterações focais, quadro semelhante do que ocorre no câncer de tireoide, em qual há substituição do parênquima tireoidiano por essas células.  Acredita-se que a instalação de um processo inflamatório crônico na Tireoidite com ativação de genes relacionados à multiplicação celular, poderia ser mais um fator para haver o câncer. Demonstrou-se, dessa forma, uma possível relação causa e feito entre essas duas doenças (TALLILI; et.al, 2012).

Em desacordo com outros dados da literatura, um estudo analisado não indicou uma relação direta entre etilismo e tabagismo e CDT, apesar disso, sabe-se que o principalmente o tabaco promove danos teciduais em estruturas do pescoço e via aérea superior, além de outras partes do corpo. Levando em consideração a tireoide, é perceptível um aumento do metabolismo corporal basal quando há contato com a fumaça do cigarro, concomitantemente a uma elevação da produção de hormônios pela glândula tireóide. Além disso, percebe-se uma relação direta entre os níveis de nicotina dosados no sangue e na urina e o aumento das taxas metabólicas e da secreção de hormônios pela tireóide. Dessa forma, mesmo com divergências sobre a relação carcinoma de tireoide e tabagismo, é inegável que esse habito provoca danos capazes de modificar um tecido (GONÇALVES; et.al, 2012).

Quando as células, por algum ou alguns dos fatores de risco, já estão em neoplasia, algumas substancias favorecem a malignidade do tumor, como moléculas que estimulam a angiogênese, processo no qual há formação de novos vasos a partir daqueles pré-existentes no local do tumor, esse processo favorece o desenvolvimento tumoral, pois promove aporte nutricional às células neoplásicas em proliferação e condições favoráveis para a disseminação metastática. Algumas dessas substancias são o fator de crescimento fibroblástico básico (bFGF), fatores de crescimento ligados à heparina, o fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), fatores de necrose tumoral (TNFα e TNFß), fator de transformação de crescimento (TGFα) e o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), esse último apontado como mais relevante por ser um potente mitógeno. Essa citocina age por meio de sua ligação a receptores específicos do tipo tirosina quinase (RTK), desencadeando uma cascata de processos dentro das células endoteliais que culminam em proliferação, invasão e atividade quimiotática. Estudos mostram que o VEGF e seus receptores possuem um importante papel nas doenças da tireoide em geral e não só nos carcinomas, como na doença de Graves, tireoidite e bócio (CAAP, et al., 2009). Outro autor apontou ainda que o VEGF está presente em tumores localizados malignos e benignos (JEBREEL, 2007), já outros estudos demonstraram que esse fator tem um aumento mais significativo em metástases (KLUBO-GWIEXDZINSKA, et al., 2007).

  • Fatores hormonais

A discussão sobre a influência de hormônios no comportamento não fisiológico da glândula da tireoide é de extrema relevância. Tendo em vista que por ser uma glândula endócrina que além de ser produtora de hormônios é fortemente regulada pelos sistemas de feedback por outros hormônios como TSH e TRH (GUYTON, 2011).

O funcionamento fisiológico dos mecanismos hormonais das gestantes, incluindo o estimulador da tireoide, a tri-iodotirosina e a tiroxina são fundamentais para a formação do sistema nervoso central no feto. A investigação dos parâmetros de normalidades possibilita diagnosticar possíveis má formação e funcionamento da tireoide ainda em recém-nascidos (Mermiglio, 2019).

Mesmo antes do nascimento a glândula tireoide regula processos metabólicos do sistema digestórios, cardíacos, nervoso, musculoesqueléticos. Portando sensíveis alterações em seus níveis provocam modificações no metabolismo basal, podendo causar patologias relacionadas com sinais de hipertireoidismo ou hipotireoidismo (BEDINOT, 2015).

Quando essas alterações metabólicas se tornam crônicas e não são tratadas a possibilidade da formação do bócio ou podem evoluir para nódulos cancerígenos, que fazem uma hiperestimulação da glândula tornando uma grande secretora de Tri-iodotirosina e tiroxina, ou diminuindo sua capacidade fisiológica até mesmo por completa, inibindo a produção de T3 e T4 (KUMAR,2010).

Segundo Bedinot em seu trabalho publicado em 2015, realizou um estudo transversal de 159 prontuários, contendo 171 nódulos de tireoide, no Hospital universitário da UFSC de 2010 a 2012, concluiu que teve uma análise estatística significativa quando relacionou os níveis de TSH maior ou igual a 1,8 uUI/mL com o diagnóstico de nódulos de tireoide malignos.

Figura 1

Fonte: MAIA. et al, 2007.

      No trabalho publicado por (MAIA. et al, 2007) em conjunto com vários pesquisadores voltados a desenvolver um consenso brasileiro para diagnóstico e tratamento dos nódulos e câncer de tireoide, foi apresentado um importante fluxograma, figura 1. Explica como o método de investigação do nível hormonal de TSH e importante para a conduta de avançar ou não para exames mais complexos. Cabe ressaltar que esse tipo de abordagem é complementar a outras como histórico familiar, palpação, hábitos de vida e outros fatores que contribuem para diagnóstico mais preciso.           

      Se as concentrações de TSH estiverem elevadas, a dosagem de anticorpo anti-peroxidase (anti-TPO) poderá ser solicitada para confirmar Tireoidite de Hashimoto. Diante de um quadro de Tireoidite de Hashimoto, havendo um nódulo bem definido à ultra- sonografia (US), a punção aspirativa com agulha fina (PAAF) deve ser realizada para afastar a coexistência de um câncer diferenciado de tireoide ou mesmo de um linfoma, que, apesar de ser raro e representar menos que 5% das neoplasias malignas da tireoide, é frequentemente associada a tireoidites (PASIEKA, 2000).

  • Fatores hereditários e genéticos

A hereditariedade no carcinoma medular da tireoide (CMT) é representada por 20-25% dos casos podendo ocorrer isoladamente ou como parte da neoplasia endócrina múltipla (NEM) (BARBIERI, 2012). Essa forma hereditária do carcinoma está relacionada às mutações do proto-oncogene RET e essa identificação o difere da forma esporádica. Hoje em dia testes genéticos podem identificar alguma mutação nesse gene e fazer uma terapia de sucesso, como por exemplo a tireoidectomia que pode evitar até antes da neoplasia se desenvolver. Além disso esse rastreamento pode identificar até familiares com essa mutação também (DANTAS, 2007)

Hiperplasia de células “C” é o achado mais precoce na tireoide de pacientes com CMT hereditário, mas pode ser encontrada em 20 a 30% das tireoides sem relação com CMT, mais comumente em homens e em pacientes com CMT esporádico. O câncer medular de tireoide é tipicamente localizado na junção do terço superior com os terços inferiores dos lobos tireoidianos, onde as células “C” são mais numerosas. O CMT hereditário geralmente é multicêntrico e bilateral e os tumores esporádicos usualmente únicos (ROSÁRIO; et. al, 2007).

      Os casos de carcinoma medular de tireoide hereditários estão provavelmente relacionados a mutações genéticas, como a do gene PTEN, que tem função supressora de tumores, e no gene supressor tumoral APC, no entanto esses genes também podem estar relacionados a carcinomas esporádicos. Nesse contexto, vale ainda elencar o proto-oncogene RET (rearrangede during transfection), gene esse responsável pela codificação do receptor de membrana para a tirosina quinase, e tem sua mutação relacionada com a ocorrência de CMT (DANTAS et.al, 2009). O proto-oncogene RET apresenta 21 exons e as principais mutações relacionadas a esse gene são localizadas principalmente nos exons 10, 11 e 16, embora também sejam encontradas, com menor frequência, nos exons 13, 14 e 15 (PUÑALES et.al, 2002).

      O carcinoma papilífero da tireoide é outro câncer de tireoide que tem forte relação genética. A enzima Glutationa S-transferase (GST) desempenha papel protetivo importante para o desenvolvimento desse tumor, ajudando a neutralizar a ação mutagênica de algumas substancias. As classes mu e theta são as mais importantes do CT. A ausência dos genes GSTT1 e GSTM1 (codificadores das classes theta e mu respectivamente) está relacionada com o aumento em 2,6 vezes do risco de desenvolver CT. As células cancerosas possuem a habilidade de superexpressar determinados genes para que consigam se multiplicar de maneira descontrolada (GONÇALVES et.al, 2009). Outro importante fator a ser levado em conta na análise de alterações genéticas que favorecem o desenvolvimento desse tipo de câncer é a análise de uma alteração nos genes responsáveis pela produção do oxido nítrico (NO). O óxido nítrico apresenta papel complexo na carcinogênese. Observa-se que ele tem um papel dual em diversos processos, sendo capaz de causar danos no DNA e proteger a célula de toxicantes. A expressão de NOS3 atua na modulação de diferentes eventos relacionados ao câncer, tais como a angiogênese, apoptose e ciclo celular (MUNTANÉ & DE LA MATA, 2010). O polimorfismo íntron 4 do gene NOS3 foi associado à susceptibilidade ao câncer papilífero da tireoide na população brasileira (CERQUEIRA, 2020)

      Os CTs em geral apresentam fatores genéticos que predispõem a sua manifestação. Sabe-se que marcadores tumorais como envolvidos em sistemas de reparo do DNA, como reparo de excisão de bases – BER (XRCC1), reparo de excisão de nucleotídeos – NER (XPD) e recombinação homóloga – HR (XRCC3) estão associados à tumorigênese da tireoide, assim como mutações presentes em genes responsáveis pela regulação da resposta inflamatória (LUTZ, 2017).

      A interleucina-10 é uma citocina com fortes propriedades imunossupressoras, sendo incisiva na regulação da resposta imune, principalmente por meio da inibição de mediadores pró-inflamatórios (SABAT; ROBERT et al. 2010). Foram descritos certo número de polimorfismos do promotor do gene IL-10, a região promotora do gene IL-10 é polimórfica e se localiza no cromossomo 1q31-32, possuindo três polimorfismos de nucleotídeo único em -1082 (G/A), -819 (C/T), e -592 (C/A) (LIU et al. 2013).

      Dentre os polimorfismos descritos acima, a mutação -1082 (G/A) já foi associada com carcinoma papilar de tireoide (ÇIL, et al. 2014), porém os outros polimorfismos foram descritos na IL10 foram descritos para outros tipos de câncer (PEIXOTO, 2018).

4 . CONCLUSÕES

Diante dos fatos tomados neste artigo, observa-se grandes influências de fatores externos como o sexo (ligado principalmente a reprodução e hormônios), doenças autoimunes, em especial tireoidite de Hashimoto, obesidade e tabagismo. Vale ainda ressaltar os fatores hereditários e hormonais, que contribuem com parcela importante dos casos de câncer de tireoide, dessa forma o conhecimento acerca dos mesmos é de suma importância principalmente para o diagnóstico precoce e rastreamento familiar das neoplasias de tiroide. Essa revisão contribui para o conhecimento dos principais fatores que influenciam e que podem influenciar na manifestação do CT, assim como dos mecanismos de ação dos mesmos, além disso essa revisão traz à tona em um só estudo o que se tem de conhecimento acerca desses fatores. O assunto abordado apresenta uma ampla gama de estudos, porém para que o prognóstico do paciente seja cada vez mais favorável, ainda é necessário maior aprofundamento nos fatores que podem servir para um diagnóstico precoce do tumor, bem como nos mecanismos de ação fisiopatológicos de alguns aspectos que ainda permanecem sem explicação detalhada, ademais existem divergências entre autores sobre o assunto o que torna necessário uma abordagem mais elaborada do tema em questão.

5. REFERÊNCIAS

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